quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Do que a Alma Precisa?

Uma das coisas mais interessantes que existe é envelhecer - com saúde, claro. A passagem do tempo em nossas vidas pode servir como meio de rever nossos conceitos e até nos conduzir a outros caminhos. Caminhos nunca planejados, nunca vistos, nunca considerados. E toda essa transformação, se ocorrer, se dá de forma lenta. Muito lenta. Mas firme. E nem a rapidez nem a inteligência nem a esperteza nem o dinheiro nem o corpo sarado serão capazes de gerarem o mesmo efeito que um bom envelhecimento.

Um professor de literatura que eu tive no colegial - um bom professor - uma vez nos contou sobre uma pesquisa que ele leu feita com casais. Segundo ele esse estudo afirmava que, à medida que o tempo passa, a atração que cada uma das partes sente uma pela outra tende a se tornar cada vez mais espiritual do que física. Pra ser mais exato, cerca de 90% dos motivos que levam um homem a se relacionar com uma mulher (e vice-versa) consistem basicamente na aparência física, status social, saúde e posses. Forma basicamente. Apenas 10% do peso da escolha do namoro se deve a fatores como idéias, valores e grandezas imateriais. Agora, após o relacionamento iniciar, e com seu desenvolvimento, se tudo ocorrer de maneira estável e saudável, esses pesos começam a se inverter: à medida que ambos envelhecem o motivo de admiração passa a entrar na esfera espiritual. O casal passa a se gostar pelo que o outro é por dentro. Coisas que no início dificilmente era vistas ou percebidas. E a relação inverte: um casal idoso que se gosta se sente atraído 90% devido à características espirituais e 10% devido a características materiais. Isso é perceptível e demonstra qual deve ser o caminho de nossa evolução - em vida e como civilização.

Agora, uma coisa que talvez desagrade ao grande público: nossa sociedade está estruturada para encobrir ou ridicularizar quase qualquer tentativa de libertação material sincera e determinada manifestada por um grupo ou ser. Especialmente por este último, por ser mais isolável. A conseqüência é que se torna muito difícil viver de acordo com sua consciência ao longo da vida.

Muitos de nós, desde a mais tenra infância, nos vemos submetidos a um modo de vida que não condiz às nossas aspirações. Somos obrigados a nos alimentar de tal modo, nos vestirmos de tal modo, termos ambição (ambição...) para possuir casas e carros e bens e terras e mulheres (ou homens) e etc. Isso traz e vem trazendo conseqüências nefastas para o mundo. A causa de diversos conflitos coletivos se encontra na opressão do ser em seus primeiros anos de vida. Muitas famílias, escolas e ambientes laborais matam tudo ou quase tudo do que o ser pode ser pra ele e para o seu ambiente logo de cara. E se um desses ou uma combinação desses (ou todos) são assim, onde e em que é possível encontrar um espaço para se desenvolver? Bem...do jeito que as coisas estão estruturadas hoje em dia, acredito que os ambientes livres são a fenda que irradia a luz tão buscada por todos e todas. Consciente e inconscientemente.

Uma lavagem de alma é bom de vez em quando...
Ambientes institucionalizados geralmente tem horários rígidos e impõem um comportamento ao indivíduo, moldando seu corpo e sua mente. Conformando-o. Na escola devemos aprender tal assunto de tal modo. É engraçado por exemplo notar que não se estuda a História do Continente Africano, berço da humanidade e de grandes civilizações. Ou que certas escolas particulares (caras) e públicas (que deveriam ser boas) não tenham disciplinas extracurriculares de artes, esportivas, de jogos educativos e diversas áreas do conhecimento. E - pior ainda - nas faculdades essa cultura continua: poucas são as oportunidades de buscarmos algo diferente. Na maioria das instituições somente a formação profissional é enfocada. Como se o as áreas e os fenômenos fossem desconexos. Como se as profissões fossem isoladas. E as pessoas...Cada um no seu canto. Isso me assombra tanto quanto a ameaça de me lançarem num caldeirão fervendo.

É claro que eu não nego que devemos ter uma dose de disciplina nos primeiros anos. O que eu questiono é a continuidade desse adestramento à medida que vamos adquirindo consciência. E também a falha nesse modelo de formação, que vicia o ser humano a reproduzir o modo de operação atual das coisas - aparentemente contraditório e pobre.

Mas, voltando ao ponto, o que eu queria dizer é que, do meu ponto de vista, os únicos ambientes propícios para o ser humano desenvolver um pouco de suas habilidades - sociais, comunicativas, artísticas, científicas, filosóficas, religiosas, afetivas e morais - são lugares em que inexista algo prendendo ele ao local. Além disso, o ambiente deve possibilitar a prática de uma diversidade de atividades. E - condição "sine qua non" - o ambiente precisa ter ar livre, luz e espaço para permitir ao indivíduo estar mais próximo ao Universo. Podemos encontrar isso nas ruas, em parques, em centros culturais, na casa de alguns amigos, em pequenas lojinhas, em comunidades rurais e lugares abertos.

Eis do que a alma precisa: liberdade. Para se desenvolver. Para se expressar. E para com isso conseguir a tão buscada conexão com os fenômenos de nosso Universo e com os seres à nossa volta. Mas essa busca é individual (individual, não individualista), e assim que tivermos adquirido a consciência disso, trilharemos o nosso caminho firmes e fortes, independentemente do que o mundo pensa. E iremos crescendo, nos tornando mais numerosos.

Devemos mudar o mundo dando o exemplo. E questionando sempre que possível. E estudando e amando as coisas simples. E assim a matéria vai ganhando um aspecto cada vez menos interessante e sedutor. Como deve ser. Como será.

A alma precisa disso.

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