segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Enigma - O Jogo da Imitação

O Cinema...o bom Cinema - o Cinema de verdade - é capaz de brindar o espectador com uma obra que não apenas amplia seu repertório cultural ao mesmo tempo que o mantém entretido, mas também aponta para o infinito com sua miscelânea de recursos. Trata-se de um trabalho que é exclusivo da Arte, capaz de nos manter deslumbrados e curiosos. Deslumbrados porque sempre que (se parece) fechar uma grande questão, abre-se outra maior, mais complexa, mais desafiadora; Curiosos como consequência do deslumbramento, nos mantendo firmes no sofá até o último momento.

Alan Turing deixou sua marca no século XX - em em toda História humana - pelo que ele era (ou melhor, é). Mas esse mundo só soube o que ele é através do resultado de seu mais importante trabalho: a criação de um computador capaz de decifrar os códigos alemães criptografados pela máquina Enigma. Calcula-se que as consequências desses feitos adiantou o fim da guerra em dois anos, poupando nada menos do que 14 milhões de vidas humanas. Esse é o poder da genialidade traduzido em resultados concretos.

Um filme triste mas profundo. Excelente sob
vários aspectos. É um mergulho num mundo
até então desconhecido. Na forma de diversão.
Diversão construtiva. 
Ao contrário de louvar Turing, o filme se preocupa em mostrar sua pessoa humana, com todos seus defeitos, diferenças, traumas e ousadias. Não existem nem elogios nem desprezo. As críticas, quando aparecem, se direcionam a estupidez humana, seja ela manifestada pelos governos (britânico, neste caso), ao se preocupar mais com questões da vida sexual-afetiva do gênio do que com suas potencialidades, sonhos e realizações; seja com a pequenez de Turing em reconhecer a importância do contato humano para o pleno desenvolvimento individual e coletivo; seja na pouca visão dos colegas de Turing, que viviam no plano das pessoas "normais", ignorando possibilidades além do labirinto paradigmático que a humanidade se encontra - presa.

Cenas memoráveis sintetizam a diferença entre um ser que opera com a mente acima do plano: no bar, durante um dos poucos momentos de descanso, enquanto a equipe de matemáticos está preocupada em se divertir e se socializar com o sexo oposto - jogando conversa fora no linguajar comum - a mente de Turing trabalha ardentemente no problema que até então não fora resolvido: a decifração do código alemão. O grupo se diverte, fala, se articula. Ele, no meio disso, arremessado num jogo sem finalidade maior, age lentamente e nada compreende - pois está em outro plano. O que está à volta dele só será objeto de interesse se conseguir se provar subordinável à grande questão: decifrar o código. Isso é o que diferencia o tipo humano do tipo super-humano.

A trilha sonora progride transmitindo a sensação de melancolia do protagonista. Em todos momentos, com todas pessoas, sua vivência é árdua. Ele tem sede de algo que o mundo não compreende integralmente. Ele quer mergulhar num mundo em que ele possui afinidade: a lógica, a matemática, as máquinas. E quer viver sua vida pessoal. Mas o mundo de então não admitia isso - e ainda tem dificuldade em admitir hoje. Vê-se assim a lentidão da marcha evolutiva da humanidade - e a dor causada por essa inércia.

Alan Turing, gênio atormentado por duas coisas:
seu espírito ardente que exigia do corpo e
pelo governo que exigia adequação a padrões.
Impressionante é a cena em que Turing, após "pescar" (no bar) a ideia que decifra todos os códigos em todos momentos, pede aos colegas que não alertem as autoridades britânicas, evitando no momento que centenas de vidas sejam salvas no dia. Um soco e xingamentos. Depois Joan Clarke compreende sua atitude. Por que? Porque ele viu mais: salvar todas vidas aliadas iria indicar que o código foi decifrado. Os alemães - nada burros - iriam imediatamente reconfigurar a máquina e invalidar o árduo trabalho do maior gênio do século depois de Einstein. Turing não iria querer isso, criando um método estatístico que otimizasse as ações aliadas. Ou seja, apenas algumas mensagens seriam usadas para dar vantagem na guerra. O suficiente para não levantar suspeitas do alto comando alemão. Um equilíbrio dinâmico. Uma ação ótima. "É lógico", diz Turing, após visualizarem o que ele viu com antecedência. E assim, com visões cada vez mais vastas, aproximamo-nos um pouco mais das grandes verdades.

A máquina Enigma.
O filme é muito bom. O tempo passa num piscar de olhos. Diverte e serve de estímulo aos estudos. É trabalho porque relaciona a História com a Ciência, a afetividade com as legislações, os costumes humanos com a individualidade, o absoluto com o relativo. E mais: mostra o quão lento é o progresso humano e como o efeito do tempo se relaciona com o despertar de consciência.

O que se vê no filme era segredo há quatro ou cinco anos. Tamanho é o poder de feitos da mente. Mente guiada - consciente ou inconscientemente - pelo Pensamento Diretor que rege a Vida: a consciência.


Dicas
https://pt.wikipedia.org/wiki/Alan_Turing









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