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quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Auto-Realização

Realizar-se é tornar-se de forma manifesta o que somos em essência. Ninguém pode realizar algo externo, seja sujeito ou objeto - apenas pode realizar a si mesmo. Porque a porta da sabedoria e da salvação é algo que se abre de dentro para fora - e não de fora para dentro.

Antes de chegarmos à auto-realização devemos atingir o auto-conhecimento. Ou seja, conhecermos a nós mesmos. "Conhece-te a ti mesmo" é a frase que está na entrada do Oráculo de Delfos. Ela sintetiza o roteiro para atingirmos a salvação - um tópico muito explorado pelas religiões monoteístas. De modo que cada civilização, cada corrente de pensamento, cada ideia, cada coisa desenvolvida por nós, humanos, faz parte de um grande quadro cósmico que revela a Verdade. Para chegarmos a ela (Verdade) precisamos antes juntar todas as peças. Não apenas isso, mas também encaixá-las da forma correta.

Fig.1: Para nos salvarmos, precisamos conhecer nossa natureza superior.
Porque é nela que está registrado o infinito que somos.

Se tornar consciente da própria ignorância é causa primordial para ascender. É saber que não atingimos o ponto ômega (perfeição) e consequentemente nos movermos em direção a ela. Porque se nossa mente estiver convicta de que estamos já na perfeição, - ou seja, tudo que sou e faço é o melhor que posso ser e fazer, em todas vertentes da vida - então não há motivo para buscarmos algo diferente. Sem desafios, sem esforços, sem pesquisas ou buscas ou estudos ou ousadias. Uma vida que apenas desliza na horizontalidade das distrações e obrigações vazias. Uma vida sem Vida. Uma vida orgânica apenas. Estacionada, estática em termos psíquicos. Uma vida que segue apenas a lei da fome e da reprodução.

Medo e desejo determinam a forma de relacionamento que temos com as coisas e seres. Quando predomina o medo, existem limitações que forçam a pessoa a investir pesadamente em determinadas habilidades, fortalecendo laços específicos. A base é a segurança. Isto é, estar imune a eventuais críticas, ataques, eventos inesperados. Isso tudo se baseia numa visão de mundo, em que a meta é estar em segurança. Parecer mais do que ser. 

Por outro lado, quando predomina o desejo, há menos amarras. A liberdade desponta e conseguimos ir além de certos pontos. A busca é menos tensa. No entanto, ainda persiste a ansiedade que traz nervosismo ao não conseguirmos aquilo que desejamos. Mas pelo menos nesse ponto a escolha é (relativamente) livre: escolho investir em algo que me parece com sentido, agradável. A segurança é secundária - a aquisição e o gozo são o fundamental.

Dentro dessa dualidade medo-desejo existe um terceiro modo de agir, que é doar a si mesmo. 

"There is a third emotion that is beyond both fear and desire — a need for giving, to give or share with fellow humans, animals and nature. If this sense of giving predominates, then the purpose becomes defined around charity, philanthropy, activism, religious evangelism etc. This transcends both the fear based need of security and the desire based need of acquisitiveness and thus unleashes even greater energy and drive"

Fonte: [1] (grifos meus)

"Existe uma terceira emoção que está além do medo e do desejo - a necessidade de se doar, de dar e receber com os companheiros humanos, com os animais, com a natureza. Se essa perspectiva predomina, então o propósito se define em torno da caridade, filantropia, religiosidade, etc. Isso transcende tanto o medo baseado na necessidade de segurança quanto o desejo baseado na necessidade de aquisições e portanto libera ainda maior energia e orientação."

Tradução minha (grifos meus)

Quando nos doamos a algo estamos sintonizados com uma forma mental mais elevada. Essa doação é de qualquer coisa mensurável (quantidades) nesse universo: dinheiro, tempo, energia, conhecimentos, etc. Nesse ponto podemos dizer que nos conhecemos melhor. Porque a nossa natureza está enraizada nas profundidades imateriais e eternas de nosso ser, e o que deve evoluir antes de mais nada é o espírito (consciência), e não as formas. Estas irão se transformar como consequência.

Os três modos de perceber o mundo se relacionam com as gunas.

"This provides the framework for how most of us perceive our purpose of life to be. These three needs of fear, desire and giving that drive how we perceive our purpose represent the fundamental three modes of the mind respectively — inertia, excitement and goodness (tamasrajas and sattva in Sanskrit)."

Fonte: [1] (grifos meus)

"Isso fornece a base da qual a maior parte de nós percebemos o propósito da vida. Essas três necessidades de medo, desejo e doação que dirigem o modo com percebemos nosso propósito representam os três modos fundamentais da mente, respectivamente - inércia, excitação e bondade (tamas, rajas e sattva, em sânscrito)."

Tradução minha (grifos meus)

Inércia está para a segurança - reter, estabilizar-se na forma mental, controlar e desconfiar.

Excitação está para desejo - agredir, violar, tramar, mover-se para conquistar, gozar.

Bondade está para conexão - aprender, ensinar, criar.

Mas dizem os ensinamentos que até mesmo o modo bondade deve ser superado para atingirmos a libertação (a salvação, o nirvana). Porque as gunas são coisas do mundo (do AS). Não fazem parte da verdadeira natureza do espírito. A bondade é apenas a mais alta manifestação de algo indescritível nesse universo decaído. Mas do ponto em que nos situamos, é claro que devemos antes focar em transformar segurança em desejo, desejo em bondade. E nos conhecendo, isso se torna mais fácil.

A auto-realização tem a ver com superarmos o medo que nos encastela em nossa mente para nos tornarmos seguros de nós mesmos e ousados. E daí, usarmos esse dinamismo agressivo para ascendermos para uma visão mais vasta do mundo. Dilatar nossa ambição, buscando a maior conquista de todas, espiritual - ao invés de lutarmos por coisas terrenas como dinheiro, posses, títulos, publicações, fama, socialização, gozos e etc.

É uma questão de libertação - no sentido mais amplo.

Referências:

NATARAJAN, Suresh. What is the purpose of life? Transcending the psychological needs. 08 Out., 2021. Disponível em: < https://sureshn13.medium.com/what-is-the-purpose-of-life-7b9379116d40>

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

Nem falar, nem agir: é preciso ser

Falar é, no máximo, dizer coisas profundas, com sinceridade e elegância.

Agir é, no máximo, fazer coisas significativas, com esforço e cansaço.

Tudo isso é bom, muito bom. No entanto, são ações que não se sustentam ao longo do tempo. Elas tendem a se enfraquecer à medida que são executadas. Elas não vêm carregadas de substância. São portanto degradáveis à medida que são feitas. Devem ser sustentadas por algo externo, artificial ao universo interior, do espírito. 

Necessidade de reconhecimento (nem que mínimo). Ter um público seguidor. Alguma coisa. Algum sinal. Alguma manifestação exterior, objetiva. Esse é o problema. Essa é a barreira que se impõe entre o mundo esforçado e trabalhoso humano e o mundo espontâneo e suave divino. 

Ser é (simplesmente), ou seja, essência. Sem passado ou futuro, apenas um eterno presente. Sem dimensões espaciais, mas além delas. Centrado nela (essência), age-se diretamente, na raiz, efetivamente, para resolver problemas. Fala-se pouco e diz-se muito. Não há esforço - apenas alegria de criar. Ou melhor, alegria de revelar através de uma vivência profunda os caminhos da evolução.

Nossa civilização como um todo está baseada em princípios errôneos. Há culturas mais próximas de um equilíbrio social, de um dinamismo do conhecimento e das práticas, de uma síntese entre os polos, de uma harmonização com o meio ambiente. Mas ainda assim, são passos pequenos. Insuficientes para os desafios da nova civilização que deverá surgir - por bem ou por mal, isto é, pela força da Lei ou pelo esforço humano.

Fig.1: Os hábitos refletem a forma mental. Esta é típica de um baixo grau de consciência.

Nós temos um problema quando se trata de compreender o nosso destino e nosso papel no Universo. 

Porque isso ocorre? 

Porque estamos imersos duplamente no reino do relativo. 

Por um lado vivemos no Anti-Sistema (AS), em que existe o dualismo, o movimento, a degradação, a matéria e energia (espaço-tempo) e as dores. Por outro, nossa espécie vive um momento de exaltação do relativo (relativismo), tornando-o um absoluto e assim caindo numa contradição conceitual que leva a horrores quando desenvolvemos esse princípio até as últimas consequências. 

Criamos o hábito de pensar que tudo pode ser feito desde que as argumentações sejam convincentes ou a força impeça a frenagem de absurdos. Criamos a mania de albergar montanhas de informações, objetos, likes, publicações, momentos de prazer, dinheiro e coisas relacionadas às aparências, à matéria e à posse. Criamos o vício de gozarmos por meio de comparações, nos atendo mais às relações entre as coisas do que à filtragem de qual coisa é mais englobante do que a outra; de qual está mais alinhada à corrente evolutiva; à vontade de Deus. Estamos viciados...

Essa tara pelo relativo (relativismo, ideologia dos tempos) nos levou a um beco sem saída, em que pondera-se em meio à catástrofe. Isso leva sempre a cálculos metódicos, reuniões seguidas, argumentações elaboradas, pensamentos sistematizantes e sistematizados e toda geração de coisas que nos pesa. Coisas que dão armas a quem não deseja progredir. Coisas que causam mais atritos, desentendimentos (porque quantidade em excesso polui a mente, cansa, confunde e coloca os seres e debaterem sobre pontos de forma, de letra, de símbolos). 

Debatemos sobre os símbolos e esquecemos o simbolizado. A essência imutável e eterna foi jogada de lado. Os mais adiantados se prenderam apenas ao devenir, ao vir-a-ser, que é uma das grandes verdades de nosso Universo - mas não a única.

O Universo possui um esquema monístico. Ele é essência, vir-a-ser e forma.  

Essência está para espírito. Espírito está para pensamento (profundo), princípio e lei.

Vir-a-ser está para energia. Energia está para movimento (íntimo), evolução e complexidade.

Forma está para matéria. Matéria está para física, manifestação, aparência.

Os três aspectos coexistem. Não podem ser separados na menor escala de espaço ou tempo. Independente da cultura, não será feita uma leitura da realidade saudável (fiel) sem levar em consideração essa trindade. Não podemos compreender a realidade sem levar em conta (e vivenciar) as três fases do cosmo. Nada dará certo sem uma lente metafísica adequada. E essa lente - a única que poderá nos salvar de uma catástrofe que levará séculos ou milênios para nos recuperarmos, é o monismo.

Para vencermos o desafio ecológico, devemos nos espiritualizar. Para vencermos a desorganização política e a destruição econômica, devemos superar a política e a economia. Como? Criando uma nova forma mental, que irá gerar novos métodos. E quando digo 'criando', é gerando algo imaterial, dentro de nós.

I truly and emphatically believe that a shift/return to a new/ancient nature-based spirituality is the only way we are going to move into the next phase of our evolution.

Fonte: [1

Eu realmente e enfaticamente acredito que um translado/retorno para uma nova/antiga cultura natural baseada na espiritualidade é a única forma de nos movermos para a próxima etapa de nossa evolução.  

Tradução

Eu recebo e leio coisas que muito busco. Os mecanismos de buscam viciam apenas aqueles que não estão orientados - que é a imensa maioria da humanidade. Por isso tantos alertas sobre o perigo dos algoritmos. Sem dúvida, para um ser que possuí um baixo grau de consciência, as más intenções podem causar muitos danos. Por outro lado, quem já está fervorosamente orientado para certas coisas consegue tirar proveito de todas essas más intenções. 

Buscais e achareis (Mt, 7:7).

Buscar o quê? O que realmente interessa para a sua libertação. Para a libertação do espírito e todas suas faculdades maravilhosas e poderosas. Sem aparências demasiadas. Sem posses exageradas. Sem objetivos voltados para coisas do mundo. Nada disso. Apenas o mínimo indispensável para sua evolução. 

Vamos falar um pouco sobre o grau de consciência humano e a questão da alteração do clima.

Fig.2 : Concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera no período 1960-2020.
Destacados os eventos (COP's) e publicações relevantes. 

Vocês estão vendo o gráfico acima? Ele expressa o nível de CO2 (em ppm, partes por milhão) na atmosfera da Terra nos últimos 60 anos. E há setas apontando para as datas em que ocorreram grandes conferência do clima (COP's) e pesquisas sérias foram publicadas (ex.: como a do Clube de Roma, em 1972).

Veja bem...todos esses encontros internacionais, esses estudos sérios interdisciplinares, esses acordos assinados...tudo isso visava em primeiro lugar reduzir as emissões do gás CO2. Gás considerado o mais controlável (e também o mais crítico, junto com o metano, CH4) para frear o efeito estufa. Percebem o que estou querendo dizer? 

Falamos muito. Planejamos muito. Estudamos muito. Podemos até dizer que fazemos muito - mas no sentido emborcado, de superfície, e não na raíz. Mas nada ocorre. Nada! Por quê? Porque não estamos mexendo na essência (de nossa psique), e com isso nossos objetivos são contraditórios, nossos métodos são ineficientes, nossas ferramentas são obsoletas. 

As emissões continuam seguindo a mesma tendência: aumento acelerado. Essa tendência reflete a relação entre o grau de consciência coletivo e a complexidade que se tornou o sistema geosfera-biosfera-noosfera. Ou seja, nosso grau de consciência (como espécie) não está à altura da configuração sistêmica do sistema-Terra, do sistema-Vida e do sistema-Cultura.

Vamos mostrar outra tendência, agora mais voltada para a questão econômica e social.

Fig.3 : Evolução do PIB e do DIB ao longo do período 1945-2005. 
Fonte: [3]

O que o gráfico acima mostra é a evolução do Produto Interno Bruto, o PIB (a riqueza produzida e movimentada pelo mundo dividida pelo número de habitantes) e a evolução do Desenvolvimento Interno Bruto, o DIP (a riqueza que se torna qualidade de vida no mundo dividida pelo mesmo número de habitantes).

Um (PIB) se interessa pela movimentação de coisas, ou prestação de serviços e produção de bens - independentemente deles serem úteis ao crescimento do ser humano (ou seja, aumentar a consciência, a maturidade evolutiva, integrar o ser).

O outro (DIB) se interessa pela utilidade intrínseca dessas movimentações. Ou seja, qual a riqueza real gerada? Ela está servindo para as pessoas terem mais educação, mais saúde, mais cultura, mais tempo livre para se expressar e viver e desenvolver? Para terem menos contratempos? 

Fica claro qual indicador é mais substancial. E com o gráfico percebe-se o que está ocorrendo conosco. 

De nada adianta se mover se o movimento é inteiramente circular. De nada adianta velocidade se não se sabe para aonde vai.

Avançamos numa dimensão: a secundária (meios)

Estagnamos em outra: a principal (meta)

Para além da riqueza real (saúde, educação, segurança, previdência, cultura, lazer), é preciso ainda apontar essa riqueza para a realização do ser (conscientização, iluminação, sensibilização). Esse é o objetivo supremo. Objetivo que um sistema econômico - por melhor que seja - só pode atingir como servo. Servo de que? De uma noosfera efervescente que almeja crescer e se reproduzir, adentrando cada vez mais no infinito, na eternidade e no absoluto. 

Estamos parados na estrada evolutiva. O movimento espacial é uma constante. O movimento íntimo da substância também o é. Mas até um ponto o ser pode decidir se mover ou não em seu universo interior. Ele possui essa liberdade. Mas se não usá-la bem, a partir de certo ponto, o que deveria ter sido feito será cobrado. E quanto mais adiamos evolver, mais forte será o choque de correção. É simples lei de equilíbrio.

A Lei de Deus, sendo absolutamente perfeita, deve ser seguida cedo ou tarde, pelo bem ou pelo mal - respectivamente. Isso significa que a liberdade dada deve ser usada par alinhar-se à Lei. E isso não é ditadura, e sim amor. 

Coerção apenas ocorre quando a lei que coage é imperfeita, é relativa, é particular a uma época, circunstância, povo, cultura, perspectiva.

Amor ocorre quando a lei que coage é perfeita, absoluta, geral e, ao mesmo tempo, flexível para todas épocas, circunstâncias, povos, culturas e perspectivas. 

Está na hora de adotarmos uma nova metafísica para conduzirmos nossas vidas. E assim nos aproximarmos um pouco mais de nosso espírito. 


Referências:

MARSHALL, Stephen. Climate worship will doom us forever. May, 2021.  Link: <https://stephenmarshall.medium.com/climate-worship-will-doom-us-forever-a0f78c971745>

REMBLANCE, Erin. Life in a Degrowth Economy and Why You'll Love It. Oct, 2020. Link: <https://medium.com/postgrowth/life-in-a-degrowth-economy-and-why-youll-love-it-a0eb96c44ec7>

KUBISZEWSKI, Ida. Beyond GDP: Measuring and achieving global genuine progress.  Link: <http://www.bioline.org.br/pdf?nd13075>

sábado, 13 de novembro de 2021

Teoria da Queda

Pietro Ubaldi apresentou uma visão de Deus e do Universo inteiramente nova. Seu método intuitivo é uma antecipação evolutiva que uma humanidade adulta irá ter como prática normal para nos aproximarmos da verdade. O místico da Umbria ousou publicar em seus 24 volumes uma visão vasta (em conhecimentos e exemplificações) e profunda (em sabedoria e vivência) da evolução, de nossa origem, de nosso destino, da função da dor e de Deus.

Fig.1: A queda dos espíritos não foi espacial. Foi dimensional. 
O espírito livre se embatumou na matéria, refém das leis deterministas.

Depois do monismo ubaldiano a humanidade jamais será a mesma. Trata-se da forma de expressar uma metafísica poderosa - talvez a única que não se abale por todo o transformismo e complexidade de nosso mundo pós-moderno - de forma a conjugar todos os domínios científicos num único fenômeno: a grande equação da substância. Daí podemos derivar os motos fenomênicos, a evolução das dimensões, os movimentos vorticosos e todas belezas da criação incessante - que em sua forma emborcada, no Anti-Sistema, assume o dinamismo de um evolucionismo perpétuo que degrada uma forma inferior para gerar uma forma superior, e assim sucessivamente, até os limites do concebível.

É uma visão gloriosa! Quem estudou bem e de forma orientada, busca ardentemente a auto-realização e tem em si um senso moral já desperto, é tocado pela Obra como uma agulha toca um nervo vital. Daí em diante a vida nunca será a mesma. 

Vê-se tudo com outros olhos. Compreende-se antes mesmo de entender; ama-se antes de sistematizar; sintetiza antes de analisar; age antes de planejar. Porque a única atuação certeira é aquela que é guiada por um senso de realização que jaz no âmago da alma - e ela é instantânea...é uma ousadia inteligente que se planeja enquanto o ser está pairando entre a terra firme e o abismo. Um salto de fé. Um ato de coragem guiado pela sinceridade e pela simplicidade. 

Para superarmos as barreiras da lógica econômica; para superarmos os desentendimentos da política; para aceitarmos a diversidade religiosa; para reconhecermos a importância dos saberes; enfim, para amarmos incondicionalmente, é imperativo adotarmos um novo método. Esse método só pode ser implementado seguramente (ou seja, eficazmente) quando superarmos a forma mental presente. Exatamente: é preciso adquiri uma nova forma mental.  

Fig.2: A progressão é por oitavas. A música reflete isso. Essa lei de coesão obriga a uma 
retomada de movimentos inferiores para que eles revivam em oitavas mais altas. O alto de sobra para baixo para que todo o Universo marche para a frente. Glória e Salvação. Graças a Deus.

A Teoria da Queda de Ubaldi é aquela ideia que, mesmo sem possuir referências bibliográficas, mesmo sem seguir os formalismos (cada vez mais) engessantes da academia, mesmo sem parecer relacionada com nossa vida quotidiana (cheia de dramas e misérias), é algo que convence e nos dá um senso de preenchimento interior sem igual. Porque ela é simples e profunda. Através de palavras orquestradas de forma semi-musical, de um rigor lógico-científico orientado e apenas suficiente para a assimilação da pobre mente racional, de uma estética apaixonada e apaixonante, o profeta de Gubbio apresenta ao mundo a visão mais avançada até o momento. 

Foi erigido um edifício conceitual sem igual - no máximo com outros conceitos que se aproximam - através de um sincretismo envolvente. A fusão de diversos sistemas de crenças e valores, sem ofender nenhuma teoria científica, resultou numa teoria toda revigorada sobre a nossa origem, o nosso destino e a causa de nossas dores. É fantástico sob todas as perspectivas. Basta ter os olhos para ver. Olhos espirituais - não carnais.

Para começar a entender do que se trata, um vídeo do Dr. Gilson Freire explica essa nova visão da queda:

"Que absurdo!", alguém pode pensar. "Como pode a obra de Deus conter a possibilidade de falha?"..."Das duas uma: Ou Ele é imperfeito ou Ele não existe!". Mas essas observações passam pela cabeça de muitos porque o grau de compreensão da natureza divina ainda é muito pequeno. Se observarmos com mais cuidado, na essência, percebemos que essa possibilidade de falha é a comprovação da magnanimidade e inteligência do Criador.

Mas como poderia acontecer fosse o Sistema, obra de Deus, tão imperfeito que pudesse desmoronar a cada momento? Não. Ao contrário, era tão perfeito, podendo até desmoronar sem dano definitivo, justamente por isso podia conter, deixada à mercê da livre vontade do ser, a possibilidade de uma queda. Se isso tivesse ocorrido, é porque o Sistema era perfeito a tal ponto, que teria tido a possibilidade de ressurgir de sua queda. Esta implícita capacidade de automedicação, apta a resolver qualquer crise, tornava inócuo, em última análise, esse perigo e erro. Não se tratava, pois, de imperfeição. Ao contrário, na perfeição do Sistema, tudo estava previsto, até a possibilidade de uma desordem e de uma queda; por isso, foi deixada nas mãos do ser a escolha entre obediência e a desobediência, com a possibilidade de uma desordem e uma queda.

O Sistema, Cap. III  (grifos meus)

Sabendo que, haja o que houver, tudo permanecerá sob controle, e com isso dar liberdade plena à criatura é o maior ato de amor (liberdade concedida) e sabedoria (domínio de Sua Criação) imaginável. Para cinco minutos para refletir sobre esse ponto.

A queda dos anjos (nós, espíritos tendo uma experiência humana atualmente) se deu por termos uma perfeição que era relativa, não absoluta. Pois caso tivéssemos perfeição absoluta nos igualaríamos a Deus em potência (Criador = Criatura), resultando num sistema anárquico, com infinitos deuses - ou seja, sem Deus de fato. Absurdo completo. 

O que temos de compreender é que somos da mesma natureza de Deus - mas não de mesma potência. Isso é destacado por Ubaldi em sua obra. É um ponto capital na teoria apresentada. Sem ele não podemos fazer um estudo com vistas a realmente compreender o que aconteceu.

Como se deu o processo?

Fora dada por Deus, à multidão dos espíritos, uma livre autonomia de vontade, com a condição desta ser coordenada em harmonia com a Lei, em função Dele. Mas, este poder estava nas mãos deles que, sendo livres, podiam dirigi-lo mesmo em direção errada, contra a ordem, contra a Lei, contra o próprio Deus. Bastava aquele poder, ser canalizado pela vontade livre deles, para fora do caminho justo, e ocorreria a queda.

O Sistema, Cap. III  (grifos meus) 

 E isso foi o que se deu para todos nós que estamos aqui.

Não se tratou simplesmente de uma desordem qualquer, que semeasse o caos no seio da ordem. Dada a natureza do impulso de onde nascera, essa desordem assumiu uma direção precisa e significou exatamente o emborcamento do Sistema num estado antagônico ao anterior: o Anti-Sistema.

O Sistema, Cap. III  (grifos meus) 

Um impulso contra a vontade de Deus só pode resultar em algo catastrófico. Pois a melhor atitude que sempre podemos tomar é sempre (sempre, sempre, sempre) aquela que se alinha inteiramente à Vontade de Deus. De um estado unitário decaímos num estado dualista. Mas não há com o que se preocupar: o monismo continuou no domínio, envolvendo o dualismo. Assim, os aspectos fenomênicos de nosso universo são (muito discretamente) coordenados por uma sábio princípio diretor. 

Com efeito, o nosso atual universo é baseado no dualismo: Sistema e Anti-Sistema, e só assim podem ser encontradas e compreendidas as suas primeiras causas. Só assim podemos compreender por que, em nosso universo, tudo se baseia no contraste dos elementos, impulsos e conceitos opostos e complementares. 

O Sistema, Cap. III  (grifos meus) 

O dualismo gerou o relativo. Com este surge o ritmo, os oposto, o contraste. E assim surge o movimento  tal qual a ciência o concebe (e conhece). Não um movimento intrínseco, mas espacial, molecular, atômico. Nasce a energia e a energia se embatuma na matéria. A trajetória, outrora não-vibracional e aberta ao infinito (livre do espaço-tempo), se torna ondulatória (energia) e fechada (matéria). Uma contração dimensional pré-tempo (big crush) atinge o fundo do abismo, explodindo em seu ponto mais baixo, involuído (big bang), que a partir daí se expande, evoluindo sem cessar, até o momento presente. 

A ideia de uma criação do nada é absurda, conforme pessoas já estão percebendo (BAKER, 2021). Houve uma causa para o fenômeno da origem de tudo que conhecemos. Mas essa causa está no superconcebível. Um universo super-dimensional (o Sistema), que está curando o nosso universo de espaço-tempo (o Anti-Sistema). 

Vejamos o que uma pessoa leiga nas questões da ciência, mas intuitiva (que é o que realmente interessa), pensa:

Whether you ascribe the causal power of the Big Bang to a physical law or to the classical ideal of God, the result is the same for both. To be able to create time, space, and all matter and energy; the cause must be timeless, beyond the constraints of space, and immensely powerful. This again sounds exceedingly close to God whether you call it a law or God, it doesn’t matter.

(BAKER, 2021), grifos meus

Traduzindo:

Quer você atribua a causa do evento do Big Bang a uma lei física ou ao ideal clássico de Deus, o resultado é o mesmo para ambas ideias. Para ser capaz de criar tempo, espaço e toda matéria e energia; a causa deve ser atemporal, além dos limites do espaço, e imensamente poderosa. Isso novamente parece excessivamente próximo a Deus quer você chame isso a Lei ou Deus, não interessa. 

(BAKER, 2021), grifos meus

Para causar os princípios de nosso universo (leis físicas) é preciso recorrer a princípios superiores (leis metafísicas). Isso é lógico para quem já percebeu o esquema geral do cosmos e arde pelo invisível e intangível. Pelo absoluto que guia os relativos. Absoluto discreto, paciente e sábio. Absoluto amoroso, que se revela na da arte através da estética da beleza interior; da ciência através da sistematização dos fenômenos; da religião através da devoção sem preconceitos e pela contemplação; da filosofia através das sínteses intuitivas. Estamos à beira de descobrirmos um princípio que guiará tudo e todos nesse turbilhão evolutivo. É glorioso. Eu o vejo de forma nítida. Sinto de modo forte. Saboreio intensamente quando me ponho em contato com esse pensamento diretor. 

Há pessoas chegando muito próximas à visão. Arranhando o grande monismo apresentado pelo profeta de Gubbio, porta-voz da Nova Civilização do Terceiro Milênio. Uma civilização do espírito, pautada por valores mais do S do que do AS. Uma humanidade regenerada, em que teremos superado a barreira mais árdua, em que na balança universal as forças do S predominam levemente sobre as do AS. 

No momento atual, tudo me faz crer que o S e o AS estão em equilíbrio quase total, o que dá uma sensação de desespero. Muito esforço para o alto e igual esforços para se desmontar tudo isso. Desânimo e tristeza. Mas não se desespere, viajor do deserto dimensional. A tendência é uma e só uma: o avanço das forças do Bem e o recuo das forças do Mal. 

Bem é unificação, é integração, é ver as propriedades emergentes (relações) entre as partes e o telefinalismo (meta), é síntese, é moral e inteligência elevados de mãos dadas.

Mal é separação, é desintegração, é ver apenas as partes que se relacionam de modo competitivo, se destroçando e gozando na medida do possível, é análise, é baixa moral e muita inteligência, ou muita moral sem inteligência, ou ambas baixas, sempre divorciadas.

A ideia de movimento íntimo é essencial aqui. Esse é o dinamismo que devemos almejar. Dinamismo intenso, de substância, que se manifesta em atitudes que podem até ser lentas e sem adeptos, mas certeiras e intensas. Esse é o dinamismo que realmente interessa. Não movimento de superfície para aparecer e ter - e sim movimento profundo para vir a ser cada vez mais. Até atingirmos o ser de Parmênides...

Heráclito percebeu o movimento incessante e transformador. Movimento que é vida. Os relativos.

Parmênides vislumbrou a causa sem causa, a essência, o ser. Causa que contém a salvação. O Absoluto.

Ubaldi funde ambos numa síntese magistral, em que Absoluto guia relativos - que são gerados no Absoluto e a ele retornarão, por simples natureza do Todo.

Essa é a teoria que devemos compreender. Pois compreendendo a aceitaremos. E com isso, avançaremos, chegando a continentes nunca antes explorados. Continentes imateriais, intangíveis, maravilhosos. Continentes do espírito.

Será glorioso...

Celebremos esses novos tempos com a forma mais elevada de arte, a música. Deixemos nossos tímpanos carnais albergar a mensagem espiritual de Ludovico Einaudi - um compositor que soube captar aspectos do infinito e traduzi-los em música. Vamos celebrar a vida através do vir a ser (divenire). O fluxo ao qual nos devemos nos alinhar para chegarmos ao Reino de Deus.

Vídeo do canal: Jacob's Piano

Referências:

BAKER, Jeremiah. The Universe Created from Nothing is Absurd. 25 Out., 2021. Disponível em: < https://medium.com/@randomgadfly/the-universe-created-from-nothing-is-absurd-e4114b7cb972>

UBALDI, Pietro. O Sistema: gênese e estrutura do universo. Ed. FUNDAPU. PDF disponívl em: <http://www2.uefs.br/filosofia-bv/pdfs/ubaldi_14.pdf>

UBALDI, Pietro. Queda e Salvação. Ed. FUNDAPU. PDF disponívl em:<http://www2.uefs.br/filosofia-bv/pdfs/ubaldi_19.pdf>

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

A máquina do tempo

O domínio de uma dimensão ocorre quando ela é superada. Estar acima em termos dimensionais significa atuar numa dimensão superior, dominando todas as precedentes. O centro de gravitação do comportamento da personalidade está num plano superior, que apenas usa o inferior para manifestar o trabalho criado e desenvolvido no campo do superconcebível.

Logos guia lúcifer. Isso significa que a intuição plenamente desenvolvida deve guiar a razão. É uma consciência profunda que vê além do espaço-tempo. A intuição se conecta intimamente com o infinito (ausência de espaço que atordoa), com o eterno (ausência de tempo que limita) e com o Absoluto (ausência de relatividade que confunde). Ou seja, quem opera na dimensão da intuição (superconsciência) não se perturba com nada; executa seu dever calmamente e muito produz; e sempre tem a certeza de seu futuro.

Fig.1: Pensar demanda tempo enquanto ele ainda está sintonizado com a forma energia
(que é a fase jungida à dimensão tempo). Quando não mais for assim, será instantâneo (intuição).

Estamos muito longe de conquistar esse nível de consciência. Mas no entanto as trombetas já soam alto. O ímpeto da História se faz presente. O século XX trouxe os fundamentos - este século trará os desenvolvimentos e vivências. É um processo lento mas persistente, que não irá parar, por mais que sejam interpostas barreiras. Porque a ignorância, presa ao curto prazo e à superfície dos fatos, não é capaz de impedir a sabedoria, que opera num plano superior, fazendo uso de uma dimensão profunda que domina a dimensão manifesta. 

A atuação do sábio é calma e profunda. Ele sabe o que interessa. Os efeitos dizem pouco, muito pouco, em suas partes. O que interessa é o conjunto. O resultado final. O que fica cravado no âmago do ser - o espírito. 

É em meio ao inferno de uma sociedade desorientada e desorganizada que surge a oportunidade para os maiores avanços no campo da dimensão profunda. Nada pode frear o desabrochar de uma ideia cujo tempo chegou. E as ferramentas que estão implementando essa grande ideia são persistentes e ousadas. São seres fora do comum, que não medem esforços para cumprir seu destino. Nada os desanima. Podem ser abalados dia ou outro; podem ser ameaçados, ignorados, ter problemas de saúde ou emocionais ou barreiras conceituais. Mas continuam. Se refazem em tempo curto e reorientam sua marcha, que se torna mais incisiva. Um caminhar elegante e sintético. Que fica cada vez menos preocupado é mais criativo.

A preocupação é um empecilho para a criatividade. E esta, uma vez acionada, diminui progressivamente a preocupação, de modo a eliminar o atrito que diminui a energia do movimento ascensional. Compreendamos que o paradigma atual visa diminuir o atrito da horizontalidade dos processos de bem-estar e divertimentos, mas não percebe as imensas resistências (atritos) de quem visa se movimentar na verticalidade evolutiva (maturação interior, do espírito).

Fantasia-se com o viajar no tempo fisicamente. Um deslocamento cronológico em qualquer direção e intensidade de coisas físicas. Mas como pode algo físico, preso aos limites do espaço-tempo, transitar livremente no próprio tecido que molda suas limitações?

Fig.2: Visto de 'dentro' para 'fora': nosso infinito possui limites. Ou, visto de 'fora' para 'dentro': o finito superior a nós é ilimitado. Deu nó na cabeça? Tudo bem. É normal...esse é o meu mundo. Que bebe dos iluminados...da Fonte Suprema

A verdadeira viagem no tempo se dá pela libertação das amarras de leis físicas. Através do domínio de outras leis. Leis superiores, do campo psíquico. Alinhando-se a elas completamente, obtemos a libertação da dimensão tempo. Perceba que é uma questão de evolução. E evolução aponta para o interior do ser - e não para sua aparência. Então pode-se dizer 'eu não tenho pressa'. Pode-se viver com tranquilidade, sem peso algum na consciência, sabendo que está a ser feito o melhor possível, da melhor forma. Pode-se dizer 'os prazos não me limitam' ou 'as aparências não me desorientam'. Liberdade que leva à salvação...

A verdade liberta. Mas...o que é a verdade

Uma palavra: Deus.

Viajar no espaço requer o uso do tempo - através do movimento.

Viajar no tempo requer o uso da consciência - através do pensamento.  

Percebamos: basta apenas pensar. Que nos leva a conceber, imaginar, recordar, planejar, representar, comparar, melhorar. É uma viagem no âmbito psíquico que melhora a vida e nos faz evoluir em todos os níveis - incluindo o físico. Mas é uma viagem. Realiza-se um movimento que não é espacial, mas conceptual. 

Agora podemos compreender melhor o significado da palavra movimento. Não se trata de um mero deslocamento espacial. Apenas o é do ponto de vista físico. Mas se formos observar outro plano, em que vigoram dimensões superiores, esse movimento assumirá outra forma. Será um movimento íntimo, de deslocamento de informação que leva à construção do conhecimento. E, num plano ainda mais alto (intuição), será um deslocamento de visão de mundo que leva à sabedoria.

Não se trata de uma quimera - mas de uma realidade a ser reconhecida e devidamente sistematizada pela ciência. E num próximo passo, uma realidade a ser absorvida pelas (novas) instituições, de um (novo) sistema pautado por outra lógica. Sistema forjado e consolidado por uma nova forma mental. Percebamos: é uma questão de expandir a consciência. Nada mais, nada menos.

Daqui para frente, a superação se dará por vias interiores...

Aula 04 - Teoria Unificada do Conhecimento Humano

 4ª (e última) aula do minicurso.

Tópicos: 

  • Teoria Unificada de Pietro Ubaldi (Parte II)
A Grande Equação da Substância.
Trajetória Típica dos Movimentos Fenomênicos.
Evolução das Dimensões.

segunda-feira, 18 de outubro de 2021

O amor mais elevado gera o milagre

O maravilhoso filme Milagres do Amor (que vi recentemente) é a segunda parte de uma história que começa com o filme O Milagre. A beleza da história é tanta que me sinto impelido a escrever mais uma resenha - ainda mais elevada, inspirada, que transmita o sentimento que atingiu minha alma ao assistir o desenrolar dessa bela (e verídica) história.  

Fig.1: Um filme belíssimo, que retrata uma história verídica. A vontade, a perseverança e a coragem se revelam ingredientes fundamentais para a gênese da cura de uma deficiência. Através da postura do professor perante a situação, Aziz se direciona para a transformação.

Aqui o foco é na gênese da amizade entre o professor (Talat Bulut) e Aziz (Mert Turak). É o acontecimento que gera uma relação entre duas pessoas. Uma relação que molda uma aldeia. Que inicia um processo de transformação de um espírito que deseja expressar sua bondade da forma mais energética. Um espírito bom enclausurado num corpo deficiente, com restrições aos movimentos, à fala, aos gestos. Mas o olhar transmite a essência e o ímpeto se faz persistente. Esse é Aziz, o rapaz deficiente de 31 anos que é constantemente zombado pelas crianças de sua vila. 

As cenas iniciais mostram a belíssima cidade natal do professor. Suas filhas percorrem as ruas com seus sorvetes de casquinha. A paisagem é viva e está em harmonia com a animosidade da cidade. Uma cidade litorânea, banhada de sol e de vida. De caos criativo e vivo. 

As filhas adentram na casa e o professor está discutindo com sua esposa. Ele deve ir a uma vila do interior para lecionar. É uma tarefa que lhe foi designada. Como funcionário público, deve cumprir o dever para ter garantida sua aposentadoria e conforto. Sua esposa não gosta da ideia, fazendo com que o professor vá por conta até a vila. 

Sobre o professor, não se trata de um homem qualquer. Desde o começo percebemos seus traços peculiares. Sua determinação em cumprir seu dever. Sua vontade em realizar construções - sejam elas de uma escola ou de uma personalidade. 

Após uma longa viagem de ônibus, o professor chega ao ponto final - ainda longe de seu destino. A estrada só vai até aquele ponto, já dando ideia do grau de isolamento do local em que ele irá lecionar. E continua sua jornada a pé, vencendo espaços belos porém inóspitos. 

De montanha em montanha, vencendo o isolamento, o professor chega a uma vila distante. Um local belíssimo porém inóspito, sem eletricidade, sem serviços básicos, esquecido pelo governo. E sem... escola. Uma vila que lhe recebe com muito temor logo de cara. Pois não esperavam um professor naquele local. Mas que, logo após perceber quem é, acaba por albergá-lo.

Através do professor, o espectador passa a conhecer melhor a vila e seus habitantes. Pessoas simples que "dependem de Deus durante oito meses e do governo durante quatro meses". É o que o "chefe" da vila afirma para o professor quando o inverno se aproxima, cuja duração é de oito meses e deixa o local isolado completamente do mundo.

O professor tenta conversar com políticos da cidade, mas não encontra nenhuma preocupação (ou sensibilidade) das autoridades em edificar um local para que ele possa dar sua contribuição para a pequena vila. Ele está sozinho em sua vontade. Os habitantes do lugarejo, abandonados, são impotentes face às circunstâncias. O destino parece ser mais do mesmo - de sempre. E assim nada resta a não ser retornar à sua cidade.

Mas na iminência de voltar à sua morada, o professor toma uma decisão: irá construir a escola. Com o próprio dinheiro. Vai à cidade e telefona para sua esposa. Inventa uma história mirabolante e ao mesmo tempo convincente, dizendo que foi sequestrado e que precisa de duas mil liras turcas para que tenha sua vida preservada. A encenação é realmente intensa e cômica. Uma mentira necessária para conseguir fazer um gesto de bondade, pois sua esposa jamais aceitaria dar dinheiro da família para terceiros de um local remoto. Como eu disse, trata-se de uma criatura fora de série.

Mas há uma condição para ele ficar e construir a escola: as meninas poderem estudar também. Os "chefes" aceitam e a história conjunta do professor e os habitantes continua. E surpresas continuam vindo.

A construção recebe auxílio de bandidos - na verdade os leões da montanha, pessoas não violentas. Um grupo que, sem complicações ou aparente interesses, ajuda a construir aquela escola. E em pouco tempo está tudo feito. As aulas começam. E o corpo físico (escola, a construção), conjuntamente com o espírito (professor), dão novo sopro de vida à pequena comunidade. 

Aziz chama a atenção do professor ao longo do tempo. O que causa esse interesse por parte do mestre? A persistência do rapaz deficiente de 31 anos - sua curiosidade pelo novo, sua alegria pelas coisas simples do mundo e da vida - parecem exercer uma influência magnética sobre a personalidade do professor, que decide dar um passo além: admite Aziz em suas aulas, dedicando-se a ele. Ele o aceita. Acredita em seu potencial. Não mede esforços para fazer o que sente ser sua mais sincera vontade.

Fig.2: Uma relação genuína, profunda, desprovidas de interesses pessoais. 
Apenas na vontade de melhorar...ou evoluir.

Ao longo desse trajeto, a vida do professor causa influências no comportamento de Aziz. Este ganha confiança e passa a perceber que existe uma outra realidade possível. Por mais longínqua que seja ela, parece haver algo. Mas nem ele nem o professor imaginam qual será o resultado final de tantos princípios seguidos com tanta perseverança e desinteresse (=amor). 

As surpresas da vida podem causar um abalo muito profundo nas pessoas. E o modo como esse abalo é sentido muda tudo. Quem está ao seu lado, próximo a você, nos momentos mais críticos, pode ser a chave para a verdadeira transformação. A natureza da pessoa se revela pelas conexões que consegue atrair e pelos choques que lhe golpeiam. E assim, após um evento crítico e por forças do destino, Aziz acaba se casando com a mulher mais linda que jamais pisou na vila, Mizgin (Biran Damla Yilmaz).

Mizgin conhece o Alcoorão. Ela cozinha de tudo. É inteligente e dedicada. Bonita, muito bonita. Simpática. Uma mulher bondosa. O destino a une com Aziz, alguém deficiente porém diferente de todas pessoas por dentro. O pai de Mizgin, quando é advertido pelo pai de Aziz sobre a sua proposta ("meu filho é deficiente"), responde: "contanto que não seja deficiente do coração". E isso Aziz realmente não o é. Muito ao contrário, o que o espectador sente ao longo do filme é uma alma bondosa, que jamais faria o mal a qualquer criatura, e que se alegra pelas coisas simples da vida (=gratidão). Uma alma em busca da melhoria constante, apesar de todas barreiras e de toda concretude de sua deficiência física. Uma alma reage por outras vias, interiores. Que sofre uma maturação íntima para alimentar sua vontade e esforço externo.

Mizgin sofre junto com Aziz. Inicialmente, por não aceitar seu destino. Depois, por ver seu marido sofrer porque ela está sendo caçoada pelas mulheres da vila. Ele já se acostumou a ser caçoado e desacreditado como pessoa capaz. Mas não suporta nem admite ver alguém sofrer (especialmente sua esposa, tão boa e bela e inteligente) devido a situação. E assim ambos co-evoluem. Ela através da tristeza que se torna preocupação conjunta que vira dedicação que se plasma em aceitação que vira dedicação amorosa que finda num...milagre.

Ao contrário do que li numa resenha, o milagre vem de Deus sim (como tudo). Mas através de um esforço humano ímpar, com participação de um dedicado professor, uma esposa que evolui junto com seu marido, e choques da vida. Não é um milagre no sentido comum do termo (como as pessoas entendem), mas um milagre que se opera a todo momento. 

Um milagre que se constrói a cada instante (continuum da psique), em que cada olhar, gesto, atitude a ato tem um valor registrado na eternidade;

Um milagre que é sempre possível, mas cuja materialização depende da persistência, da lealdade, da vontade e do amor;

Um milagre que está a espera de ocorrer, mas que depende do estofo espiritual dos seres que o viabilizam;

Um milagre que não é um simples apertar de um botão, uma reza, um ritual ou uma demonstração de força, mas uma sintonização...um ato de fé que não se interessa nos resultados. Que busca incessantemente, apesar de todas barreiras. 

Um milagre que se atinge através da imersão no processo...na vivência sincera...na superação deste plano...

Um milagre que depende de uma co-participação: da Fonte (Deus) e do esforço da Criatura (nós). Um é fonte incessante de vida - o outro precisa despertar para se alinhar ao máximo com Sua vontade.

Esse é o verdadeiro milagre. E ele existe. 

O filme é baseado numa história real. 

Aziz vive e sua esposa também. E seus filhos e seus netos. E essa história, através da Arte que expressa o pensamento de Deus (Suprema bondade e inteligência), fica assim marcada na eternidade, pois a ela pertence.

Trailer do filme:

Trilha sonora do filme:

Links:

Pietro Ubaldi completando Carl Jung

Carl Gustav Jung foi um pioneiro na área de psicologia. Seu trabalho influenciou vários campos, como a antropologia, a filosofia e a teologia. Baseado em seu trabalho no hospital psiquiátrico, ele chegou a cinco conclusões importantes, como destacado pelo artigo da revista Galileu [1]:

1) Nenhum indivíduo é totalmente introvertido ou extrovertido;

2) Todas as pessoas carregam quatro funções cognitivas principais;

3) O ego é o centro do consciente humano;

4) Todo indivíduo assume uma “máscara” sobre o inconsciente coletivo;

5) “Mesmo uma vida feliz não pode existir sem um pouco de escuridão”.

Fig.1: A porta da iluminação se abre de dentro para fora - e não de fora para dentro.
Não há alo-realização, apenas auto-realização. 

Vamos comentar cada uma das conclusões à luz da obra ubaldiana: 

1) Não há absolutos no relativo - apenas o Absoluto coordenando os relativos

Ninguém é 100% um dos pólos. Inteiramente feio ou belo; supremamente inteligente ou não; falante ou quieto; teórico ou prático; etc. Podemos ter uma predominância de um pólo, mas jamais seremos um pólo apenas. Isso é evidente quando observamos a pessoa e compreendemos o aspecto trifásico de nosso Universo (matéria, energia e espírito). Não podemos separar um do outro. Todos estão presentes em tudo a todo momento - em diferentes proporções e modos, claro. 

Quando estamos teorizando já carregamos em si uma prática (o ato de estudar o conceito, compreendê-lo). E toda prática se apoia numa teoria, que pode ser feita de modo pensado e sujeito a correções (consciente) ou automático e certeiro  (subconsciente). O mesmo vale para todas outras habilidades que exercitamos. 

2) Quatro fatores constroem e definem a personalidade integral

A teoria sobre 'tipos' psicológicos de Jung demonstrou que as pessoas pensam, sentem e experimentam o mundo de maneiras muito distintas. E isso é evidente, pois segundo Pietro Ubaldi cada indivíduo foi influenciado pelo seu meio (geográfico, cultural e familiar), possui sua genética particular (de pai e mãe) e seu nível de consciência (espírito).

O famoso psiquiatra identificou quatro funções psicológicas fundamentais: sensação, pensamento, sentimento e intuição. E elas podem operar tanto através de introvertidos quanto extrovertidos (predominantemente, não totalmente, lembremos). E normalmente apenas uma dessas características é mais dominante - as demais funções são mantidas no inconsciente. Para Ubaldi o inconsciente se subdivide em subconsciente (funções já consolidadas, automatizadas nos instintos) e superconsciente (em estado de germe, em vias de desenvolvimento).

O que Jung chama de dominante é aquela que opera no consciente. Aqui podemos descrever em linhas gerais as quatro funções:

sensação indica a existência de algo.

pensamento estabelece o significado desse algo.

sentimento declara se esse algo nos convém, e se devemos aceitá-lo.

intuição é uma percepção inconsciente das coisas, indicando de 'onde' vieram e 'para onde' estão indo.

Novamente, as definições de Jung são muito consistentes, exceto pela 'intuição', que não está definida claramente - sendo necessário nos apoiarmos na visão de Ubaldi. 

Sensação está para os instintos (zona do subconsciente). Pensamento está para a razão (zona consciente). Sentimento está para a moral (zona do consciente). Intuição está para o desconhecido que engloba tudo conhecido e vai além (zona do superconsciente). Na verdade, ser consciente ou não depende do grau evolutivo da criatura: um ser evoluído pode ser consciente na intuição e inconsciente nas zonas inferiores - e um involuído pode ser consciente na zona da razão e inconsciente na zona da moral e além. 

Quando Jung fala que nascemos com uma herança psicológica e outra biológica, ele se refere a um aspecto individual, interior e progressivo (base espiritual, construção da personalidade via experiências); e outro coletivo, exterior e cíclico-oscilante (base material, através da genética de nossos antepassados). E ele diz que ambas são importantes para determinarmos traços de comportamento.

Ubaldi não apenas está em plena sintonia com o pensamento jungiano, como dá uma visão mais vasta sobre o mesmo, enquadrando todos esses conceitos numa fenomenologia universal. 

O inconsciente coletivo - para Jung - seria o centro do material psíquico, cujo conteúdo é compartilhado por pessoas de todas as épocas, locais e culturas. Logo, esse 'reino' seria algo imaterial, que está além do espaço-tempo. Ele vai se moldando e progredindo à medida que as criaturas que o impulsionam adquirem experiência e avançam evolutivamente. Os rishis chamam (esse inconsciente coletivo) de Akasha. A Ciência começa a abordá-lo, dando o nome de Campo Akáshico. Ervin Laszlo vem desenvolvendo um trabalho muito interessante em relação a isso.

Fig.2: Ervin Laszlo começa a preparar o terreno para uma nova ciência. 
Uma ciência do espírito. Ubaldi deu as diretrizes gerais, supremas. 
Mesmo sem conhecê-lo, grandes almas começam a trabalhar em
prol da divulgação dos princípios contidos na Obra...

3) O ego (eu individualista) é a referência do biótipo médio

O consciente humano do nível evolutivo atual está centrado no ego. Isto é, no interesse de nível individual. No melhor dos casos, um interesse familiar ou de classe social. Isso se traduz numa arquitetura sistêmica pautada em lógicas que viabilizem esquemas de interesse restrito - de curto prazo, com efeitos bem tangíveis e que estimulem o ego. Não à toa temos um algoritmo (político, econômico, social) que reflete a forma mental predominante. 

É preciso 'vencer na vida'. E gozar sempre que se está numa posição boa. Usar as condições para se refestelar nos prazeres e garantir o domínio futuro. Jamais promover o esclarecimento das pessoas. A não ser que isso seja apenas uma aparência para enaltecer a imagem própria e enganar aqueles simples (como as pombas). É assim que a sociedade funciona. Cada estrato social, cada cultura, cada época, se pautou por esse princípio. Nos últimos séculos ele se tornou mais sofisticado: adquirimos um verniz de civilidade, de cultura. Uma primeira aproximação do conhecimento - porém, conhecimento fragmentado.

O nível consciente é aquele que está em atividade, em construção. Que calcula, pensa, erra, refaz, melhora, percebe. Para Jung "o ego fornece direção às nossas vidas conscientes". Traduzindo: ele (nossos interesses restritos) serve de bússola para a nossa operação no nível consciente. 

Sob a ótica ubaldiana percebe-se que esse consciente está em movimento. Ele avança ao longo de experiências de várias existências. E o que muito foi trabalhado, é sedimentado no subconsciente. O que é inútil, não penetra no ser - o que é útil à vida, entra na consciência de profundidade e passa a operar de modo perfeito, automático. Assim o consciente perde 'espaço' na retaguarda. E querendo manter sua amplitude de atuação no espectro, só lhe resta avançar rumo ao que está (também) na profundidade do ser, porém no inconcebível. Um inconcebível cuja conquista garante o domínio no plano consciente. Todo esse dinamismo da personalidade humana é detalhado no volume Princípios de uma Nova Ética (figura abaixo).

Fig.3: Por que o ser humano se comporta de maneira aparentemente inexplicáveis?
Como orientar alguém? Qual a base para educarmos nossos filhos? Como descobrir a essência
de alguém (inclinações, traumas, habilidades e sonhos)? Esse volume explica, em linhas gerais,
tudo isso, fazendo a psicossíntese do ser.

4) Todo indivíduo assume uma persona (=máscara) perante o mundo que lhe é estranho

Esse mundo - na verdade todo o Universo, o AS - é um palco em que o ser não pode vivenciar integralmente sua natureza. Logo, não pode igualar sua essência com sua aparência. Aqui a vida é um jogo cujo sucesso depende do grau de sofisticação da mentira. As sinuosidades, as enganações, podem ser baseadas no medo (tamas), na ambição (rajas) ou na doação (sattva). São níveis diferentes com propósitos muito distintos. Mas o princípio é o mesmo: interesse. Não há desprendimento (das gunas), mas apenas evolução do nível de resultados almejado.

Para podermos atuar, devemos incorporar um papel. Mesmo que a gente sinta que é aquilo que vestimos, que pensamos, que gostamos, que fazemos, a verdade é que nosso Ser está muito além disso tudo. 

Com Ubaldi fica claro que essa natureza - que se manifesta de forma cada vez mais clara, potente, coesa e bela - interage com a forma manifesta (nossa persona) para que a forma exprima melhor o estado atual de consciência do ser. Esse processo é gradual. Irá ser função do meio, da tarefa que foi incumbida ao ser (por ele mesmo ou por forças superiores, a depender do nível evolutivo), dos pais e de seu espírito. 

5)  Uma vida plena necessita de trevas para ser verdadeiramente integral

Esse princípio jungiano se encaixa perfeitamente na Grande Equação da Substância. Como a substância se apresenta em três formas (matéria, energia, espírito) em nosso universo; e cada forma subdividia em outros níveis, e daí por diante, formando as individuações; e essas formas são contíguas, ou seja, estão sempre juntas em todo ser e local e momento; então é possível chegar à conclusão de que uma individuação saudável possui todas formas interagindo em equilíbrio. 


Fig.4: Para chegar ao ápice celestial, é preciso pegar impulso no abismo do inferno.

Dominar os meandros do inferno sem esquecer das maravilhas do céu é a arte e a ciência da vida humana. É Logos guiando Lúcifer. Ou seja, a intuição guiando o intelecto. A moral elevada pautando o uso do intelecto - e o intelecto afiado buscando construir um senso moral elevado. 

Além disso, há ainda a questão do dualismo que, para formar uma unidade, deve combinar de forma harmônica os opostos. Ou seja, não é eliminando um dos pólos que se obtém a unidade - mas desenvolvendo os extremos numa dança rítmica que sempre imprime impulsos para a verticalidade mística. Uma dança que oscila no plano físico e mental, mas cujo produto mais fino (quintessência) é a vetorização para o plano espiritual

Isso é monismo.

Referências:

[1] https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2017/02/6-reflexoes-para-entender-o-pensamento-de-carl-jung.html

[2] UBALDI, Pietro. Princípios de uma Nova Ética.

sexta-feira, 15 de outubro de 2021

Parábola do Filho Pródigo, Evolucionismo e a Nova Cosmologia

Allan Kardec fez uma compilação brilhante sobre ensinamentos de um conjunto de espíritos de grau de consciência acima da média. Ele foi um codificador. Isto é, tomou conhecimento do fenômeno de manifestação de espíritos desencarnados, através de estudo minucioso e sério, e com esse conhecimento construiu uma obra de seis volumes estabelecendo a base da doutrina espírita. 

O livro-base é sem dúvida O Livro dos Espíritos (LE). Se trata de um volume com 1019 perguntas feitas pelo pedagogo francês, com respostas de um conjunto de espíritos desencarnados - e comentários pertinentes, esclarecendo ou tornando menos ambíguas algumas respostas. Nesse livros há vários ensinamentos importantes a respeito de diversos tópicos, dentre os quais podemos elencar os principais: Deus, criação, elementos do Universo, princípio vital, a natureza dos espíritos, pluralidade das existências e leis morais.

Vale aqui destacar que apesar de se tratar de uma obra fenomenal, com o esclarecimento de vários pontos e solução de diversos paradoxos das religiões criacionistas-monoteístas, em vários pontos são deixadas lacunas. Há várias passagens explicadas parcialmente ou com respostas do tipo "não o sabemos". Isso no entanto não diminuí a grandeza da obra de Kardec, mas aponta para o aspecto evolucionista da doutrina - que todo seguidor fiel deveria abraçar. 

Como o próprio Kardex afirma, deve-se sempre abraçar uma verdade maior, deixando de lado a verdade menos abrangente. Isso caracterizaria o aspecto evolucionista, dando ao espiritismo o status de espiritualismo evolucionista-monoteísta

O fato de eu classificar a doutrina como monoteísta significa que ela não afirma a plenos pulmões o monismo, isto é, um Deus que é o Criador e a Criação. Um Deus além das dimensões, nem grande nem pequeno, nem sujeito ao transformismo deste Universo (apesar de atuar nele incessantemente através de sua imanência benévola). 

Mas como Gilson Freire sabiamente aponta em seu trabalho, o espiritismo contém germes de um monismo. 

Há passagens no LE que revelam a abertura da doutrina para uma realidade mais vasta. Como se todo o trabalho elaborado pela alma iluminada de Kardec fosse uma preparação de terreno para algo profundo...muito profundo...

Fig.1: Ás vezes vivemos no melhor dos mundos e não percebemos isso. Porque nossa perfeição não é
igual à de Deus (caso contrário seriamos iguais a Ele, acabando com Sua Grandeza e Seu Domínio).
Possuímos a mesma natureza (substância divina) de Deus - mas não a mesma potência (conhecimento das coisas).

De 1850 a 1950 a humanidade (e também o planeta) passou por uma transformação profunda. Foram plantadas as bases de uma nova civilização através de progressos no campo da Ciência e da Espiritualidade. Grandes pensadores, cientistas e artistas surgem, inovando em seus campos. Paralelamente, surge muita coisa vazia, sem conteúdo, além de eventos catastróficos. Mas é em meio aos gritos e pontapés de um mundo barulhento e superficial que operam as almas que preparam o terreno para uma nova civilização, criando as bases conceituais, existenciais, organizacionais, científicas e filosóficas para o mundo dar um passo gigante rumo à libertação.

Foram cem anos de revoluções. Surge a Relatividade Geral e a Mecânica Quântica. Com elas forma-se uma teoria cosmogônica inteiramente nova: a do Big-Bang. Tudo isso é comprovado nas décadas seguintes à formulação de George Gamow. Adicionalmente, Watson e Crick descobrem o DNA, o mecanismo operacional da vida. A computação nasce através das contribuições de Turing e Von Neumann. Na psicologia, Freud e (especialmente) Jung lançam bases para a melhor compreensão da personalidade. 

Em meio a tantos progressos e tantas destruições, as doutrinas espiritualistas-evolucionista se enfraquecem. Pois se revelam incapazes de explicar várias novas descobertas satisfatoriamente. Os paradoxos que já eram percebidos pelos esclarecidos se tornam evidentes. Quem sente o infinito começa a ficar sedento por algo capaz de orientar em meio a tantas descobertas e tantos acontecimentos. São poucos...pouquíssimos. Mas necessitam de um alimento mais substancial.

Pietro Ubaldi desenvolveu sua obra na parte central do século XX: de 1931 a 1971. Foram produzidos 24 volumes que resolvem em grande parte os grandes problemas - não apenas da humanidade, mas de toda a fenomenologia universal. Esse marco inicial foi dado no Natal de 1931, quando o apóstolo de Cristo começa a receber as Grandes Mensagens. Mensagens sublimes que falam direto ao coração. E logo em seguida, para arrastar o mundo frio e cético da ciência e da objetividade, lança A Grande Síntese (AGS), volume monumental escrito nos verões de 1932 a 1935 em Colle Umberto, na Tenuta Santo Antônio. Estavam lançadas as bases de uma obra sem igual, que dá as diretrizes gerais para a solução dos problemas da espécie.

Em 1951, com o lançamento de Deus e Universo, fecha-se o ciclo explicado por Sua Voz em 1932 (AGS). Trata-se da Grande Equação da Substância em seu aspecto cíclico. Com isso fica explicado o fenômeno evolutivo (semiciclo gama >> beta >> alfa) e involutivo (alfa >> beta >> gama) de nosso Universo.

Agora podemos compreender melhor o papel de Kardec e Ubaldi na construção de um conhecimento pleno a respeito dos fenômenos. Não apenas seu transformismo profundo, mas sua gênese (fenomenogonia).

Fig.2: O trabalho de Ubaldi complementa o de Kardec. Enquanto este dá o pontapé inicial para a 
compreensão do Todo, o primeiro parte daí e constrói um edifício conceptual capaz de explicar 
os fenômenos mais díspares.

A Parábola do Filho Pródigo fica mais clara quando percebemos os dois semiciclos de nosso Universo. Com Ubaldi o Cristianismo revive num nível mais alto e a Ciência ganha significado divino - que encanta o ser humano comum, leigo. 

Fomos 'criados' simples e ignorantes (átomo) se considerarmos o ponto de partida este universo material. Mas somos 'criados' à imagem e semelhança de Deus (anjos) se considerarmos o Seu Reino (universo imaterial, além do espaço, do tempo e da relatividade). 

No Absoluto (Sistema = Reino de Deus = Céu) nada verdadeiramente nasce - nem morre. Pois tudo que nasce um dia morre. E o espírito é eterno e infinito, além de todas as escalas humanas e deste universo. Apenas no relativo (Anti-Sistema = Universo material = Terra) as coisas nascem e morrem: civilizações, ideias, teorias, criaturas, planetas, estrelas, galáxias, máquinas, relações.

Vamos entrar com um pouco da Nova Cosmologia para sustentar as afirmativas incisivas.

As três primeiras décadas do século passado consolidaram uma nova ciência. Essa ciência ainda está se desdobrando, com avanços apoiados nela. Ela construiu uma nova história do Universo. Um cosmos em transformação perpétua cuja criação coincide com a gênese do espaço e do tempo, da matéria e da energia. E - mais importante - muitos começam a perceber suas implicações filosóficas e teológicas dessa nova teoria.

A Teoria do Big-Bang se firma a partir da década de 1950. A partir dela muitos físicos teóricos tentam buscar a causa que deu início ao processo evolutivo do cosmos. No entanto, quanto mais se aproxima da singularidade (instante t=0), mais impotente se torna a nossa ciência. Um ponto infinitamente pequeno, de densidade infinita, em que a temperatura é inimaginável e nenhuma lei física aparentemente funciona. Ou seja, as próprias evidências atestam que as leis de nosso Universo tem seus limites. A partir de um ponto elas não são válidas. 

Quem 'criou' essas leis? Por quê?

Fig.3: Uma origem (das leis, do movimento e da forma), que inicia um transformismo, 
que aponta para um destino final. A origem é um mistério para a mente racional e seu produto 
mais elevado, a Ciência. O destino é assombroso para o nível de consciência atual, refém do
contexto, da forma e das aparências. Mas para quem vislumbra o infinito nas coisas, tudo está resolvido.

A Ciência não o sabe. Mas é aceito pela comunidade científica que a teoria possui uma solidez muito grande. Quem afirma é um astrofísico da USP, cujo podcast (curto, de 5 min.) pode ser ouvido aqui [1].

"A noção de que o Universo surgiu numa espécie de grande explosão, sendo originalmente muito quente e denso em algum tempo finito no passado e, desde então, tem se resfriado e continua em expansão atualmente é conhecida como big-bang. Mais do que uma simples ideia, a principal explicação para a origem de tudo que conhecemos é uma teoria muito bem fundamentada em evidências científicas e observação. Sabe-se inclusive, com uma margem mínima de erro, que a idade do Universo é de 13,9 bilhões de anos."
Fonte: [1] (grifos meus)

Observação: sendo o erro máximo dos cálculos de aproximadamente 1%, é razoável estarmos abertos a idades do Universo que variem entre 13,7 e 13,9 bilhões de anos.

O que (e quem) garante(m) essa solidez?

Penzias e Wilson. Eles fizeram observações que comprovam a teoria. O que foi feito por esses dois sujeitos foi, a partir das condições iniciais (teorizadas), captar o 'eco' da expansão inicial, conhecido como radiação cósmica de fundo em microondas

Fig.4: Mapa de 2013 da radiação cósmica de fundo deixada no Big Bang, 
tomada pela nave espacial Planck da ESA, capturou a luz mais antiga do universo. 
Esta informação ajuda os astrônomos a determinar a idade do universo [2].
Crédito: ESA e a colaboração da Planck.

No começo havia um caldo especial composto de quarks e elétrons. Posteriormente, nêutrons, prótons e elétrons - que não conseguiam formar átomos devido às condições de ambiente, com temperatura elevadíssima que impedia a formação da matéria. Até o instante t=1s, a nucleossíntese foi efetivada: a junção entre prótons e nêutrons, via força nuclear forte (com alcance de até 10E-13 metros). No entanto, durante muito tempo, a energia dos fótons (devido às altas temperaturas) impedia a união entre os núcleos e os elétrons. 

A expansão do espaço-tempo trouxe uma diminuição de temperatura, e consequentemente de energia associada aos fótons. Estes não foram mais capazes de impedir a junção de núcleo e elétrons (força eletromagnética). E assim nasce a matéria (t ~380 mil anos), sendo sua primeira forma o átomo de Hidrogênio. 

Essa sopa inicial não era visível, pois a luz não podia atuar dentro dela (os fótons estavam ocupados impedindo a relação entre núcleo e elétrons). Mas assim que a união formou os átomos (equilíbrio de cargas), os fótons, sem nada para 'fazer', ficaram livres para se espalhar pelos quatro cantos do universo.

Essa luz inicial (pós-brilho) é denominada de radiação cósmica de fundo em microondas, e foi prevista pela primeira vez por Ralph Alpher e um grupo de cientistas, em 1948. E foi encontrada por Arno Penzias e Robert Wilson, ambos da famosa Bell Telephone Labs, em Nova Jersey. Essa dupla estava construindo um receptor de rádio em 1964 e obtendo temperaturas superiores às esperadas segundo a NASA. Eles pensaram que a anomalia era devido a pombos e seus excrementos. Então fizeram uma limpeza geral em sua antena - inclusive matando pombos, pelo que parece. Mas o problema persistiu. Daí em diante ficou óbvio que se tratava de algo real, concreto. E que esses eram os registos da 'pré-história' do Universo.

A Radiação Cósmica de Fundo dá várias pistas aos astrônomos. Por exemplo, qual a composição do Universo. Os cosmólogos acreditam que a maioria da matéria e energia do cosmos não pode ser percebida através dos nossos instrumentos. Essa parcela despercebida é denominada matéria escura e energia escura (aprox. 95% de tudo que existe).

A expansão do espaço (=do Universo) se deu muito rapidamente no início - e continua até hoje, e continuará até o seu término. E essa expansão inicial se deu a velocidades maiores do que a da luz. Isso não viola o limite de velocidade de Einstein, pois esse limite está restrito a coisas dentro do universo (não ele em si).

O mais interessante é perceber que a gravitação - uma das quatro forças fundamentais - está intimamente relacionada à matéria, uma vez que é a primeira forma dinâmica (tipo de energia = onda) que surge no cosmos. As ondas gravitacionais, por estarem muito próximas da matéria em termos de origem, são muito difíceis de serem detectadas. Ela é o tipo de energia (gravífica) que serve de base para todas as outras - assim como o Hidrogênio o é para toda a série estequiogenética.

"Como o hidrogênio é o tipo do protozoário monocelular da química inorgânica e o carbono o da química orgânica, assim, a gravitação é a protoforça típica do universo dinâmico."
AGS, Cap. 38

E quando estamos lidando com a gravitação, precisamos compreendê-la no seu sentido mais vasto. Newton iniciou esse estudo. Einstein continuou. E Ubaldi, através de Sua Voz (AGS), forneceu seu significado substancial.

"A primeira gênese de β , a gravitação, aparece, portanto, como forma originária de energia, matriz da qual nascerão, como filhas, todas as outras formas, por meio de distinção e diferenciação no processo evolutivo. Particularizemos. Entendo aqui, como gravitação, não a pequena gravitação de Newton, caso particular ao vosso planeta; mas uma gravitação de sentido mais amplo, que resulta do equilíbrio das forças inversas de atração e repulsão, opostas e complementares (lei de dualidade, que veremos agora); uma gravitação filha direta do movimento, isto é, energia gravífica, filha da energia cinética." 
AGS, Cap. 38 (grifos meus)

Equilíbrio de forças que viabiliza a coesão da matéria e o movimento dos objetos. É a lei de dualidade (princípio universal). Ela é a expressão do movimento no plano energético. Por isso está intimamente relacionada com a dimensão 'tempo'.

Não iremos continuar essa história nem essas descrições. Elas são interessantíssimas se vistas sob o prisma monista. O importante aqui é perceber as relações entre os fenômenos. As derivações e diferenciações. O esquema geral do cosmos. De sua construção. Ou melhor...reconstrução.

Fig.5: Desenvolvimento do nosso Universo. Os períodos não estão em escala. 
Parte-se do caos, da ignorância, para se chegar à vida e com esta à manifestação de uma consciência
de alto grau. E daí, parte-se para a desmaterialização...(o fim?).
Mas será que somos filhos do caos e da matéria? Ou existe uma outra explicação? Uma outra teoria?

Com os fatos apresentados, é possível concluir que nosso Universo é movimento perpétuo. Sua origem está além das manifestações contidas em seu seio - por mais evoluídas que sejam essas manifestações. E ele caminha para seu fim (Lei da Entropia e Radioatividade). Mas ele, sendo manifestação, é apenas um aspecto momentâneo do Absoluto. Uma variação da eternidade. Em que criaturas mais ou menos evoluídas digladiam incessantemente. 

Para completar todos esses avanços da Ciência, mister se faz superar a própria Ciência, espiritualizando-a, conforme já foi dito algures [3]. E por isso a obra de Ubaldi é fundamental. Ela fornece um esquema geral que descreve, em linhas gerais, o íntimo do fenômeno evolutivo (A Grande Síntese) e a nossa origem e destino, causa de nossas dores (Deus e Universo + O Sistema).

Fig.6: Pode-se fugir das grandes questões. 
Mas se não buscarmos compreendê-las, elas sempre irão nos dominar...

A Parábola do Filho Pródigo é a síntese do processo da queda (big-crush), com a criação do caos (big-bang) e de toda a odisséia evolutiva (transformismo incessante), até o retorno ao Pai - cujo Reino não é deste mundo...

Cristo disse tudo de forma simples.

Para quem desejar se aprofundar, uma palestra do Maurício Crispim é esclarecedora: