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quarta-feira, 24 de maio de 2017

Como Seria a Transição para o Outro Lado.

Há mais ou menos um mês fui ao parque fazer exercícios. Eu não havia comido meu pão com manteiga matinal - apenas duas bananas com aveia e mel. Sem sal. "Um dia apenas", pensei. Não deve fazer mal. 

Ao chegar iniciei as atividades. Estava um dia morno. Sol saindo. Poucas nuvens. Bem agradável. As árvores ao redor. As crianças brincando e alguns velhos aproveitando seus dias agradáveis dos anos finais em liberdade simples em meio à natureza. Nada de mais, tudo de bom. E eu, jovem (ainda), aproveitando esse intervalo de tempo para me manter minimamente são. 

Os exercícios que faço servem única e exclusivamente para uma coisa: fortalecer certas regiões do corpo para aliviar o peso sobre minha coluna. Mais uns minutos para tonificar um pouco. Fora os alongamentos, para evitar engessar movimentos e dar flexibilidade física. Gasto uns 30~40 minutos. Tempo precioso nos dias atuais, em que a tecnologia, se não nos seduz, nos consome a cada momento. É preciso se desconectar - o que faço ao sair nas ruas para ir ao mercado, à feira, ao conversar com pessoas, e à noite, quando assisto a filmes e produzo ideias e textos.

Mas voltando aos exercícios...

Estava trabalhando duro nas atividades. E quando me aproximava do fim senti um certo desconforto. Nesse momento já sentia o que iria acontecer. E mais: já sentia (mas não tinha certeza) de que, por mais que eu tomasse alguma atitude, o que fosse acontecer aconteceria, inexoravelmente.

Quando observo isso me dou conta de que sistemas funcionam dessa forma. A partir do momento em que algo (organismo humano) está debilitado de um nutriente fundamental (sal, NaCl), e falta-lhe água (H2O), inicia-se um apagão geral. Nada que se faça pode impedir, exceto tempo, alimentação e ingestão de muita água ou suco. Aliado descanso. Pode-se no máximo preparar-se para o que está por vir. Deve ser assim que se dará o colapso do nosso sistema econômico e organização sócio-política - só que em grande escala, de forma mais complexa.

Eu me sentei num banco e comecei a respirar profundamente. Já não ouvia bem os sons ao redor. Transpirava cada vez mais. Escorria suor frio pelo corpo. Pelas costas, pela testa, pelas pernas, pelos braços, pelo peito, pelo pescoço, pelos pés,...É uma sensação bem desagradável. Uma espécie de ânsia de vômito, na qual sabe-se que este nunca se realiza porque trata-se de algo de outra natureza (causa), porém com alguns sintomas superficiais semelhantes. 

Continuei respirando. Me apoiei bem no banco, na esperança de me recobrar. Mas logo me toquei: havia exigido demasiado do organismo (povo), sem dar nada a ele (direitos, pontos de sustentação, mecanismos de desenvolvimento). O processo se desencadeava automaticamente. Agora era o automatismo sábio - e cruel - da natureza a guiar-me, com toda sua crueldade e eficácia. Quem permitiu isso foi minha falta de uso da racionalidade (comer o pão de manhã), por excesso de confiança.

Os sentidos desapareciam. Um por um. A visão se amarelava. Os sons ficavam cada vez mais difusos, sem lógica. Apenas barulho, em intensidades que não correspondiam ao que de fato estava sendo emitido. Mais amarelo. Piscava. O suor era intenso. Parecia estar perdendo litros de água por minuto. O corpo não mais se sustentava, nem sequer sentado. O desespero chega ao máximo, sem que eu possa falar, ou me mover. Nem sequer soltar um ruído. 

Nada de cheiros. Nada de nada. Perdera a vista. Ficara sem ouvir nada, exceto os sons da mente. Sons que começavam a parecer diferentes daqueles captados pelos sentidos - seria uma transição. Interessante mas desesperador! Oh crueldade da natureza sábia e automática! Oh idiotice da mente racional! Oh...

Desmaio: um ensaio da transição vida orgânica, material,
 e vida livre, espiritual
Prestes a perder tudo, comecei a ouvir coisas agradáveis e ver nitidamente coisas interessantes - das quais agora não me lembro. É como se eu estivesse a viver num plano mais alto. Uma vida muito mais agradável. Os "sentidos", durante esse estado de falência orgânica - mas não espiritual! - pareciam estar captando tudo de agradável ao redor. Era muito bom...muito muito bom mesmo! Por um momento parece que se passaram horas de uma existência agradável. Nem sequer memória do que acontecera há pouco. Algo difícil de explicar. Estava me deleitando na paz e tranquilidade de um ambiente que não sabia descrever. Era real? Parecia real. Tudo tão tangível. O desmaio...tudo...toda minha vida antes, meus 32 anos...devem ter sido esquecidas. Tão agradável a sensação.

E fui flutuando...

Num dado momento comecei a sair daquele mundo. Como se estivesse escorrendo por um ralo. E assim que comecei a sair de lá - onde quer que seja - a sensação de cansaço e tontura e suor voltaram. Sentia o suor frio, a vista e audição ruins (mas retomando) e os movimentos frouxos, aos poucos se desenvolvendo. Pessoas ao redor. Oh...pensei. Fora tudo um momento breve. Uma senhora perguntou se eu estava bem. Disse que sim. Ela disse que seu sobrinho tinha o mesmo problema (desmaios). Fiquei impressionado ao retornar. Fui me recuperando. Mas demorei mais de 4 horas para voltar a 100%.

Na casa do meu pai bebi muito, muito suco. Depois comi - mas com dificuldade. A comida facilmente secava minha boca. A tontura perdurou por horas. O corpo precisava de repouso. 

Assim deve ser a sensação de passar para outro plano de existência. A vida desmaterializada, temporariamente, até voltarmos novamente. Desespero na transição - tranquilidade quando plenamente terminado o processo. Pelo menos para quem vê que a existência nesse mundo é muito árdua no estágio atual. É de fato algo muito peculiar. Uma experiência diferente que dificilmente conseguimos captar e descrever com precisão. Mas a sensação marca a pessoa. 

Esse foi o 3º desmaio em minha vida - por esforço extremo ou me levantar de repente após horas deitado. Perde-se os sentidos e capacidade de atuar. A mente não é oxigenada. Resta o universo desconhecido, do espírito.


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