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sexta-feira, 5 de outubro de 2018

A Lei dos Grandes Números

As grandes obras sempre nos convidam a uma segunda (terceira, quarta,...) releitura e estudo. Uma primeira abordagem é incapaz de esgotar todas as possibilidades quando se trata de uma obra advinda da inspiração. Dessa forma cria-se um liame que garante a continuidade da relação leitor-obra. Ou, melhor colocando, entre pesquisador da alma e conceito.

Estou relendo o volume "Problemas do Futuro", de Ubaldi. Ao repassar os capítulos me relembro das frases - e do impacto que me causaram cinco ou seis anos atrás, época do primeiro contato com a Obra. É uma concatenação que ganha um ar sistematizador à medida que absorvemos o significado do que foi colocado lá. Trata-se de ler com uma outra orientação. Um sentimento mais apurado, que não foca apenas nos detalhes da análise e no rigor da letra, mas sente o ímpeto de unificação guiado por uma visão magistral e vasta. É assim que o autor atinge o seu objetivo. Não pensa em ganhar ou agradar público - apenas segue seu destino, edificado muito antes, em existências pretéritas. É um ato tão natural que nem sequer passa pela cabeça a ideia de recompensa. Isso aponta para causas profundas e potentes.

A evolução da ciência e da tecnologia possibilita fazer uma
ciência mais profunda, que apresenta novos mundos. Essa
ampliação científica pode (e deve) ser utilizada pela filosofia
e teologia para evoluírem conjuntamente - com a ciência.
Somente assim a humanidade (nós) iremos ascender. 
Um dos (muitos) temas científicos tangenciados e desenvolvidos a partir de uma vertente conceptual-mística é a Lei dos Grandes Números. Do que trata essa lei?

"lei dos grandes números (LGN) é um teorema fundamental da teoria da probabilidade, que descreve o resultado da realização da mesma experiência repetidas vezes. De acordo com a LGN, a média aritmética dos resultados da realização da mesma experiência repetidas vezes tende a se aproximar do valor esperado à medida que mais tentativas se sucederem. Em outras palavras, quanto mais tentativas são realizadas, mais a probabilidade da média aritmética dos resultados observados irá se aproximar da probabilidade real.[1]" [1]

A LGN garante resultados estáveis a longo prazo - e para grandes quantidades. Nesse caso interpreta-se "estável" como aproximação a um valor, que acaba se consolidando à medida que aumenta-se o número de observações de um fenômeno. Esse conceito da probabilidade permite-nos construir uma ponte entre, por exemplo, a Termodinâmica Clássica e a Termodinâmica Estatística. É o liame que possibilita a justificação do modelo macro pelo micro - e vice-versa.

Gráfico que revela a lei dos grandes números. Quanto maior
a repetição (no tempo) ou ampliação (no espaço),
mais próximo de uma assíntota, que pode representar uma
visão ou valor. Fonte: [2].
Quando dizemos que a pressão que um gás preso num recipiente exerce sobre as paredes do mesmo, estamos considerando-a constante e igual em todos os pontos. Mas se formos observar a nível microscópico, perceber-se-à a falibilidade da afirmação: em micro-áreas haverão pressões diversas. Estamos falando de grandezas moleculares, da ordem de 10E-9 metros (ou seja, mil vezes menor do que 1 milésimo de milímetro). Nossa percepção não capta isso. Nem por visão, nem por tato. Logo, é natural que a vertente clássica tenha sido a primeira aproximação da realidade. Mas com o progresso científico e tecnológico surgiram novos instrumentos capazes de medir coisas antes não-mensuráveis - logo inexistentes. Além disso, existe o anseio por saber o porquê das leis consolidadas. Com o novo, essas leis continuam leis e consolidadas - mas apenas para uma escala específica.

Da mesma forma podemos começar a observar o fenômeno humano a partir dessa lei. Só que ao invés de falarmos em escala, me parece mais adequado usar o termo "plano" (evolutivo).

Quando vemos uma população como um todo geramos uma imagem de cada indivíduo que a compõe. É a dita generalização. Se formos tratar todos, um por um, de um certo jeito baseado nessa generalização, teremos muitos casos de sucesso e outros de fracasso. Mas se devemos lidar com poucos ou um único indivíduo dessa população - e sem poder falhar na abordagem - é bom lembrar da LGN. Podemos estar abordando o indivíduo a partir da média, mas nada garante que ele esteja nela (ou mesmo próximo!). Inserindo o desvio padrão a questão fica ainda mais delicada.

Há, em qualquer coletivo humano, indivíduos extremamente diferenciados em um ou vários aspectos. Mesmo que esses (seres) estejam sujeitos parte às mesmas regras, valores e ambiente. Isso é evidente no mundo humano, no qual o psiquismo adquire potencialidade transformadora e as oscilações são impressionantes.

Há também a Lei do Equilíbrio. Um novo incremento de
elementos exige um novo rearranjo de forças - causado
pelos elementos constituintes de um sistema. 
As diferenças na natureza infra-humana se dão entre espécies diferentes, ou filos, classe, gênero, etc. Mas na mesma espécie inexiste um diferencial físico gritante. Nos humanos podemos afirmar o mesmo. No entanto, enquanto no animal o psiquismo tem diferenciações insignificantes, - nivelando todos psiquicamente - no ser humano percebe-se picos e vales. Personalidades profundamente diferentes em termos de intelecto, cultura, vontade, sensibilidade, visão de mundo e atitude. Essa oscilação psíquica-emocional intra-espécie não invalida a lei dos grandes números, mas dá uma característica particular no caso humano. Surge um novo fenômeno ao lançarmos a lente probabilística sobre a nossa espécie. Agora a lente da ciência estatística se depara com o fenômeno humano.

Pontos que se distanciam violentamente para um lado exigem que outros se distanciem para o pólo oposto, uma vez que existe uma outra lei a ser respeitada: a lei do equilíbrio. Se esse não é atingido por um nivelamento de todos em torno de uma faixa média, o escape de um grupo para um pólo exige imperiosamente que um segundo migre para o pólo oposto. Nesse caso surgem as possibilidades de transformação.

Mas a questão é que existem dois tipos de polarização (ou radicalização): na horizontalidade social da personalidade e na verticalidade íntima da alma.

Para diferenciá-las é preciso ler as atitudes ao invés de medir o ruído. Mas tão ruim quanto uma polarização de superfície é uma inércia de superfície causada por uma morbidez espiritual. Não basta "fazer seu dever" e ficar alheio às grandes causas - é preciso dar um salto de fé de tempos em tempos. Ou isso é feito por livre e espontânea vontade - ou faremos por força das circunstâncias.

É interessante perceber que descobertas e abrem caminhos para novas perguntas. E assim a realidade se torna cada vez mais imaterial. O concreto, abstrato. O peso dos estudos sintéticos passa a aumentar ligeiramente, ao passo que o analítico começa a sentir seu futuro papel:de coadjuvante. Mas este será um ator secundário mais potenciado - porque guiado por uma inteligência (intuição) superior, capaz de delinear as diretrizes universais da vida. Será feita uma fusão entre ecologia, sociedade e sistemas humanos.

Da mesma forma chego à visão das experiências pessoais. É preciso um grande número de repetições, de tentativas e assimilação dos fracassos (incluindo aí as dores e o enfrentamento das mesmas), para chegarmos no patamar que nos permita obter o melhor de nosso ser. Assim constrói-se a personalidade. Parar é estagnar numa região que não nos condiz. Isso causa dores que são "solucionadas" recorrendo-se a todas barbaridades de distrações, que passam pelas fofocas, pelas comidas, pelos prazeres sensoriais, pelos ruídos, pelos conflitos e cerebralismos desorientados.

A saída é pela vertical, que requer visão e coragem.

Poucos vêem.
Quem vê, teme.
Quem vê e já muito temeu, se cansou e se lançou ao vôo impetuoso, vulcanizando seus nervos - não mais plásticos e portanto moldáveis pelo meio, mas elásticos e adaptáveis a este.

Referências:
[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_dos_grandes_n%C3%BAmeros
[2] http://www.portalaction.com.br/probabilidades/convergencia-de-variaveis-aleatorias

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