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segunda-feira, 4 de março de 2019

Os pardais não acompanham as águias

Não há possibilidade de acompanhar alguém (na vida) quando a natureza dos seres são muito diversas. Isso é uma impossibilidade que não é capaz de ser disfarçada por muito tempo. Cedo ou tarde a essência dos personagens vêm à tona e demonstra a realidade dos mesmos. O consciente percebe essa diferença - e o porquê dela - antes dos outros.

A águia voa sozinha. Lá não se pode contar com ajuda dos
outros. Lá é possível vivenciar e contemplar. O preço é
evidente e claro. As conquistas devem ser descobertas...
Quando a diferenciação evolutiva é tremenda, o convívio só se dá em condições muito raras, relacionadas à questões materiais, do mundo, que envolvem burocracias infindáveis e rituais insossos. Para o evoluído isso é tremendamente doloroso. Porque ele sente em sua alma um ardor. Esse queimar só é arrefecido com uma estratégia efetiva que o leve a uma região de tranquilidade, na qual possa se dedicar de corpo e alma à sua criação. Mesmo que isso implique em dificuldades materiais, emocionais e intelectuais momentâneas. Porque ele sente que existe algo mais valioso, nos recônditos de sua alma. Em seu imo cintilam pensamentos abstratos. Velozes e virtuosos, vindos da intuição. E ao seu lado, sentimentos sublimes, difíceis de exprimir pela linguagem comum, seja ela oral, escrita, visual, gestual ou até mesmo musical. Assim o ser se vê diante de um dilema: não quer o que o mundo lhe apresenta e valoriza, rejeitando categoricamente; e ansiando por algo tido como inexistente, no campo da utopia - ao qual ninguém se dedica em buscar. 

O mundo abandona aqueles que estão empenhados em superações evolutivas. Nos mais diversos graus, percebe-se que as forças da horizontalidade telúrica vazam à medida que se empenha no decolar vertical das supremas conquistas interiores, adentrando-se no campo místico das sensações sublimes. 

O pardal é bonzinho. Ele é simples mas não anseia
ir além de sua faixa - mesmo que as dificuldades
lhe ameacem.
O canto dos pássaros e o desabrochar das flores passam a ser fonte de inspirações musicais, literárias, científicas e de atitudes - novas. Os movimentos dos astros e dos elementos próximos passam a ser laboratórios de estudos. Estudo de outra ordem. Intuitivos e sintéticos. Estudos que transcendem o que conhecemos como tal, ocupando o tempo livre e gerando uma sensação de repouso e energia. A concentração é máxima. A divergência, mínima. A mente apaga as preocupações automaticamente, sem esforço e com elegância ímpar. Todos pensamentos referentes ao mundo se esvaem no oceano infinito das possibilidades do espírito, que engloba as pequenezas da vida dos sentidos e do intelecto, diluindo-os num turbilhão ascensional vulcânico. O passado ganha um novo tom e é visto como dinâmico. Ganha-se a capacidade de projetar-se no futuro. Percebe-se mais, apesar de - segundo o mundo e o 'bom-senso' - as circunstâncias serem desfavoráveis. 

É importante que as pessoas comecem a perceber como se dá o funcionamento de nosso universo. Estamos diante de um cosmos orgânico, que após as últimas descobertas da ciência (1ª metade do séc. XX), é não apenas exterior, mas interior. 

A Física quântica nos apontou para a imaterialidade governando a materialidade. E que esta última é apenas uma sensação capturada pelos nossos sentidos e instrumentos, causada por um movimento incessante (energia) que em condições muito específicas se encapsula numa trajetória fechada e se apresenta como algo tangível (matéria), seja em estado sólido, líquido ou gasoso. A não-localidade é um 'espaço' que está nos interstícios do espaço. É uma malha que engloba tudo e todos, não-passível de individualização. 

Niels Bohr disse que se alguém afirmar que entendeu Física quântica então de fato essa pessoa não a entendeu. Traduzindo: se você atesta que, com sua inteligência racional, consegue compreender na integridade um fenômeno cuja natureza demanda a mobilização de uma inteligência além daquela que conhecemos (intuição), estás se iludindo. 

Não é possível compreender um fenômeno que não opera na malha relativa espaço-tempo usando uma mente que se apóia nessa mesma malha. Um raciocínio sequencial e comparativo não é capaz de abarcar um desenvolvimento que rompe os limites estabelecidos pela ciência experimental. O comunicar instantâneo (quântico) das partículas, deixa a luz, com sua estupenda velocidade, na pré-história. Trata-se de humildade. Mas o que fazer quando o que temos à disposição para compreender não é suficiente?

Observar a história com uma visão unitária nos dá ideia das ondas evolutivas. Sempre que surge um avanço num sentido, logo após brota um outro, apontando noutra direção. Ambos parecem se contradizer, mas não se tratam de vetores opostos - e sim com leve diferenciação angular que, se combinados corretamente, geram uma nova seta que aponta de forma mais orientada para o nosso destino. Essa seta é de maior magnitude. Sendo assim, é capaz de incorporar mais contradições, o que implica na capacidade de lidar com fenômenos mais complexos e situações (humanas) mais 'inexplicáveis'. Assim cresce-se por dentro. Começa-se a adentrar no terreno da transubstanciação, tão bem descrito por Pietro Ubaldi em sua obra Ascese Mística.

Esse não é um ensaio com vistas a consolar. Com esse escopo já temos uma vasta doutrina, com corpo formidável de médiuns (espiritismo). O fundamento aqui é evolutivo: chegar a uma compreensão mais madura dos acontecimentos da vida, em seus fatos e comportamentos, para percebermos à fundo a estrutura de nossos sistemas (de valores, de crenças e coletivos) e a mentalidade que os perpetua (modelo mental). Isso é o escopo no monismo. Trata-se de um novo grau de consciência, subsequente ao monoteísmo dualista, do qual o evolucionismo espiritualista é a plataforma que dá condições para atingi-lo. 

Gilson Teixeira Freire apresenta a Arquitetura Monista de
forma magistral. Ele demonstra de forma cristalina o rumo
natural a ser adotado pela humanidade.
Gilson Freire nos descreveu de maneira fantástica a marcha evolutiva do espírito - que atualmente, aqui, habita corpos humanos - em sua obra Arquitetura Cósmica. Ao final ele nos apresenta um diagrama que sintetiza a visão tão bem sistematizada e vivida por Ubaldi - mas igualmente concebida por outros pensadores da antiguidade, como Orígenes: um sincretismo criacionista-evolucionista, combinando os evolucionismos darwinista e espiritualista ao criacionismo judaico-cristão. Tem-se assim a visão mais avançada (até o momento): (i) da nossa origem; (ii) do processo evolutivo (extra-físico e físico); (iii) e do nosso destino final. É imprescindível que a humanidade comece a entrar em contato com esses conceitos e vivê-los em seu íntimo. Como já foi dito alhures, a ciência está a um passo de atestar a realidade do espírito - e de colocar DEUS como premissa definitiva e central em todas as suas pesquisas. Muitos apenas não desejam usar as palavras exatas - apesar de suas descrições estarem 100% alinhadas com a certeza de haver um princípio único, fora do campo espaço-tempo-intelecto, que gerou tudo. 

Aqueles que estão imersos nesse oceano infinito não se contentam mais com as coisas deste mundo. Na melhor das hipóteses farão uso de tudo (tudo!) para chegarem um pouco mais próximos da sensação de Deus. Todas pesquisas, estudos, trabalhos em grupo, conversas, alimentação, escrita, palestras, aulas, atos de amor, observações, etc. passam a ser meios para se atingir um maior grau de consciência. Porque passa-se a perceber que aí reside o segredo da imortalidade. O mistério já revelado outrora, por grandes iluminados e sagazes pensadores; por apaixonados artistas e incisivos estadistas. Essas são as águias, que voam um voo estratosférico e ilimitado. Os pardais os abandonam e rejeitam. Seu número é grande e portanto eles ditam a verdade. O voo da águia é solitário e árduo. Logo, quem está nessa atmosfera rarefeita deve se sintonizar mais com o destino (forças do Alto) do que com seus companheiros próximos (mundo, pardais), pois de baixo não se pode obter a ajuda-mor para a ascensão. Fé passa a ser uma imposição íntima, atingida por livre convicção. Aí começa a verdadeira aventura...
"Quem quiser, pois, salvar a sua vida perdê-la-á;
mas quem perder a sua vida por minha causa e
pelo Evangelho salva-la-á!" (Marcos, 8:35).
Eu já fiz a minha escolha. Faça você a sua...
O medo de transcender o casulo da (pequena) segurança e inércia nos deixa em constante desespero, meros joguetes nas mãos da Lei. Ao passo que compreendendo-a em sua infinitude e eternidade, passamos a abandonar as pequenas preocupações e nos lançar, orientadamente, nos abismos do mistério - que tanta vertigem causam aos mundanos. 

A escolha do caminho é essa: ou optamos por permanecer na segurança e contar com a sociabilidade - ou nos lançamos ao desconhecido, ficando cada vez mais solitários, mas ao mesmo tempo tendo conquistas cada vez mais efetivas...

Isso é mostrado filme Matrix, quando Morpheus dá a Neo a opção de tomar a pílula vermelha ou a pílula azul.

Como se vê, todas as obras humanas falam de Deus, apontam para Deus, desejam Deus...

É só uma questão de sensibilidade...

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