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quinta-feira, 13 de junho de 2019

Patologia e Sublimação

A doença é vista como sinal de fraqueza do organismo físico. É sentida como algo 100% maléfico. Deletéria. Sem sentido. Uma grande infelicidade para quem é assolado pelos vírus inúmeros que compõem nosso rico ambiente microscópico aéreo. Mas ela não é um mal, mas a reação a um agente que se instalou no organismo. 

Quando vamos travar uma batalha pela superação. Quando nos propomos a iniciar um projeto de vida completamente novo, que nos possibilite um aprendizado sem igual, - a aquisição de uma nova perspectiva do todo e a assimilação de novas habilidades - a tarefa é árdua. A cada passo um obstáculo. Tentativas externas de nos desviar do caminho. De várias formas. E para vencer essas barreiras é preciso dispor de energias e canalizá-las, de tempos em tempos, para superar esses males pontuais que nos assolam - muitas vezes de maneira desesperadora, nos momentos em que mais precisamos usar nossa energia, tempo, vontade e criatividade em ocupações mais elevadas e úteis.

O sol mostra seu esplendor antes de sair de cena.
É nos momentos que precedem a morte que o sublime
se revela. No dia seguinte o astro renasce. Um ciclo que
se repete ao longo do processo evolutivo.
As células de defesa começam sua tarefa assim que algo anormal é detectado. Os macrófagos capturam as substâncias estranhas encontradas no interior do organismo e alertam o sistema imunitário sobre a invasão. Os linfócitos T (glóbulos brancos) emitem outro sinal ao organismo, para enfatizar e especificar, recebidos pelos linfócitos B (também glóbulos brancos), que começam a agir. Assim anticorpos são produzidos. De vários tipos. Trata-se de substâncias específicas que irão englobar os agentes estranhos, destruindo-os dentro de um período de tempo natural ao organismo. 

O sistema imunológico, após o ataque, produz células capazes de memorizar o anticorpo utilizado. Um banco de dados vai sendo criado ao longo do tempo, à medida que o histórico de ataques e defesas, numa grande batalha microscópica, à nível biológico, se avoluma, criando uma memória celular automática. "Células de memória" é o nome dado a esses minúsculos organismos com função específica. Assim, da próxima vez, se houver um caso semelhante, com os mesmos agentes invasores, o organismo - já experienciado pelas dores e fadigas - saberá lidar de forma mais eficiente e rápida ao ataque. Chega-se à conclusão de que ser atacado é bom porque fortalece o organismo. 

Essa memória celular pode estar relacionada com o psiquismo de determinado indivíduo. A vontade e o dinamismo orientado podem ser fatores que - de alguma forma inexplicável ainda - dão orientação e potência a esse processo regenerador, levando a uma cura mais rápida e tornando o organismo mais resiliente e menos temeroso às doenças. A partir dessa ótica podemos começar a estabelecer uma relação profunda (sem explicação científica ainda) entre patologia e sublimação.

Sublimação, como se sabe, é o fenômeno em que matéria no estado sólido se torna gasosa, o que conhecemos como mudança de estado. A substância é a mesma, mas sua forma de manifestação muda, e com isso algumas propriedades. Isso nos mostra que a alteração de propriedades de fluídos (por exemplo) não significa que ele deixou de ser o que é. Sua natureza permanece a mesma, isto é, sua constituição química, com as ligações inter-atômicas que caraterizam e dão coesão à estrutura molecular, revelando um tipo de composto químico.

Tomar um chá quente seguido de um repouso
integral. É preciso ter um organismo já
robustecido pelas dores. A questão não é
deixar de "pegar" a doença. O ponto é
absorver a doença melhor e mais rapidamente.
O mesmo termo também é usado em termos místicos, quando se discorre sobre o fenômeno de purificação interior de um ser humano. Ou seja, no momento em que é superado por definitivo um aspecto de nossas natureza, dizemos que ocorreu um processo de sublimação. Ou seja, o ser se tornou mais imaterial - em sua maneira de perceber os fenômenos, em termos de agilidade ao lidar com tudo, em termos de suavidade ao perceber os detalhes que escapam aos olhos comuns, e mesmo à Inteligência Artificial. 

O místico é, por excelência, um ser que superou definitivamente os instintos que nós, humanos, temos ainda arraigados, em menor ou maior grau. Instintos, hábitos e vícios que nos prendem às coisas do mundo, tornando-nos distraídos e fracos. Desorientados e com pouca potência de atuação perante os temas realmente importantes. Para quem deseja saber mais sobre o fenômeno recomendo (como quase sempre) a formidável obra ubaldiana [2], farol da humanidade futura. 

Fui atacado por intensa gripe há alguns meses. 

O ciclo da gripe dura entre 7 a 10 dias. Nas primeiras 72 horas o infectado sofre com febre. Depois, os sintomas respiratórios se tornam mais evidentes e devem perdurar por mais alguns dias [3]. Meu ciclo completo nasceu, se desenvolveu e findou em 48 horas. Sendo que 24 horas depois o meu organismo já estava de 80 a 90% recuperado. 

O que ocorreu?

Esse evento já foi descrito alhures [4]. Considerando esse "machine learning" biológico, a nível de sistema imunológico, podemos perceber que houve uma evolução na forma de abordar a gripe: ontem sofri uma constipação de mesmo tipo. Tudo indica que o vírus da gripe estava instalado: início de uma febre acima dos 38 ºC, dor muscular e cansaço tremendo, somada a uma leve dor de cabeça a indisposição para fazer qualquer atividade. Os sintomas começaram a se manifestar 16 horas - início das duas últimas aulas do dia. Chegando em casa (18h15) jantei e tomei um chá de camomila. Passei as próximas três horas em silêncio absoluto no sofá, descansando, ora numa posição ora noutra. Depois fiquei assistindo alguns documentários (um de Inteligência Artificial [5], e outro TED Talk com Yanis Yaroufakis, ex-ministro das finanças da Grécia, [6]). Fui dormir com as vias nasais congestionadas e muito cansaço.

Ao longo da noite passei por uma onda de calor intensa. Sudorese extrema. Quando despertei, me senti tonto, quase desmaiando. Deitei no sofá e retomei meu centro. Fiquei assim de 20 a 30 minutos. Não sabia se o sintomia iria persistir, mas descansei, fechando os olhos e não pensando em nada. Esqueci o fluir do tempo e as obrigações (muito mais manias cotidianas do que trabalho efetivo). Levantei novamente e fui tomar café da manhã. Dois pedaços de pão italiano e meio copo de leite morno com uma pitada de todinho. Depois, salada de frutas. Minha esposa já estava desperta - e um pouco preocupada. Eu falei que não iria tomar nenhum medicamento.

Uma boa alimentação: equilibrada,
suficiente, nutritiva. Além disso, viver num
ambiente físico e cultural adequado à
sua natureza. Todas essas coisas auxiliam
na sublimação. 
Passada meia hora passei o fio dental, escovei os dentes com muita calma, e permaneci um pouco de pé. Contemplei a eternidade antes de mergulhar no turbilhão do tempo que arrasta a todos (e tudo) sem piedade. Liguei o computador e comecei a fazer algumas atividades. Me sentia normal, sem problemas. Fora curado.

O intervalo de tempo desde o início da manifestação até o término não passou de 18 horas. 

Nesse exato momento (16h15 do dia seguinte) só existem resíduos. Um pouco de obstrução das vias nasais. Nada mais.

O fenômeno parece ter ciclos cada vez mais breves. O organismo, como todos, continua sujeito aos mesmos riscos do que os outros. Mas parece lidar de uma forma cada vez mais eficaz, férrea e ordenada.

1º caso de gripe, 14/08/2018 (48h)
2º caso de gripe, 11/06/2019 (18h)

Estarei diante de um fenômeno raro? Tudo indica que o caso vai contra a força das estatísticas, que reúne inúmeros casos e possui uma faixa de máximo e mínimo admissível.

Leio neste momento uma informação que atesta isso:

"Os efeitos da gripe são muito mais graves e duram muito mais tempo do que os da constipação. A maior parte das pessoas recupera completamente ao fim de uma ou duas semanas, embora algumas possam desenvolver complicações com risco de vida, como a pneumonia. Por este motivo, a gripe pode ser fatal, especialmente entre os grupos mais debilitados, como as as crianças, os idosos ou pessoas com doenças crónicas.[49] " [Wikipedia, https://pt.wikipedia.org/wiki/Gripe#Mecanismo]
(grifos meus)

Sinto em meu íntimo um dinamismo que encontra dificuldade em se manifestar de maneira ordenada e construtiva - mesmo para edificar concepções abstratas. Isso pode ser reflexo - ou auxiliar - no comportamento celular, a nível orgânico. Nível que já atingiu o comportamento de perfeição, automático. Tudo praticamente estabelecido. O que me parece passível de otimização é justamente esse refinamento celular, que consegue agir de maneira mais rápida, com pequenos diferenciais energéticos celulares que são - com uma pitada de acúmulo e ordenação da memória - capazes (ao que me parece) de combater num período curto de tempo agentes invasores. 

Esses momentos curtos de incômodo intenso trazem grande tristeza para o autor, que fica privado de desenvolver seus trabalhos - até em pensamento. Mas após o ciclo sente-se uma renovação completa do organismo. O processo parece ser tão mais intenso quanto mais curto. Como se houvesse uma lei que deva garantir uma relação especial entre duração do ciclo e ferocidade dos combates celulares. Alta potência para uma breve e intensa experiência.

Tudo se resume a descanso prolongado e profundo, moderação na alimentação e uso de meios naturais (chás, alimentos leves). Nada artificial trará solução. Haverá na melhor das hipóteses um alívio.

Dessa forma resta a dúvida: o que ocorreu é normal? existem casos semelhantes? há uma explicação que a medicina conheça?

De pouco em pouco passa-se a adquirir uma visão mais profunda dos acontecimentos da vida. Percebe-se um significado bem definido, oculto no íntimo dos acontecimentos, que é cada vez mais sentido por aqueles que muito foram macerados e souberam viver sua dor cara a cara, usando-a como espelho para se auto-reformar.

Estabelece-se assim um elo muito profundo entre patologia e sublimação.

Referências:

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