Nunca me planejo para escrever um texto. Nem defino quando farei isso. Já comentei sobre a dinâmica do processo interno que me leva a esboçar conceitos [1]. É algo simples e complexo ao mesmo tempo. Simples porque não exige uma dolorosa sistematização ou estudo de um tema que minha vontade não sente atração; e complexo porque um método (aparentemente) desorganizado, partindo apenas de conceitos fundamentais, - tão básicos que qualquer ser humano seja capaz de se interessar - leva à elaboração de ensaios, críticas e poesias que tangenciam todas esferas do saber e sentimento humano, orientando uma infinidade de protagonistas harmonicamente em torno de um eixo diretor central. Eixo orientado num sentido para um único e indefinível destino: o infinito.
Há algumas semanas apresentei uma visão do processo evolutivo do ser humano tendo como ponto de partida o ato de leitura [2], usando-o como exemplo para definir como se dá esse processo nos - em seu aspecto mais amplo e substancial. Para sintetizar tudo me veio à mente duas pirâmides que se interfaceiam em sua base. E projetei-as num espaço bidimensional, obtendo dois triângulos*. Com isso entro com os conceitos de expansão inconsciente e seletividade consciente.
A finalidade era demonstrar que nós (eu, você, seu vizinho, colega de trabalho, parceiro, parceira, pai, mãe, filho, etc), de forma geral, adotamos duas posturas (fases) rumo à sapiência máxima: a primeira é o desenvolvimento do intelecto, pautado pela busca incessante do conhecimento e elaboração de conexões entre fenômenos e acontecimentos. O foco é no mundo externo; a segunda consiste num mergulho interior, pautado na descoberta de uma natureza substancial e íntima do ser. Nela o conhecimento é meio para o aperfeiçoamento do ser, que por sua vez passa a sentir um princípio diretor (antes irresistivelmente inconsciente, depois seguramente consciente), e caminha em direção a ele focando mais a qualidade do que a quantidade. O foco é o mundo interno.
Quando me refiro à qualidade não faço referência àquela qualidade que os "mais refinados" ou "diplomados", ou "vividos", ou "sofisticados" possuem e gostam de exibir - nos momentos seguros, para o público "adequado". A qualidade concebida aqui é aquela na qual se prioriza o Ser em detrimento do Ter.
Enquanto a qualidade do mundo é um Ter ou Agir mais elaborado que os outros Teres e Agires,
a qualidade concebida aqui é um Ser mais auto-realizado do que era antes, e portanto menos dependente dos Teres ou Agires - "sofisticados" ou não.
Dito isso podemos continuar.
A pessoa que leu (ou releu) o texto em questão [2] deve sentir a importância do transformismo no processo evolutivo individual. É essa consciência que levará a pessoa a reconhecer ter chegado ao zênite do intelecto - ou ter previsto que existe um limite para o desenvolvimento do mesmo. E logo, a partir de um ponto, deve começar a desenvolver uma nova "inteligência", localizada em outro plano, que no nosso mundo pouco se assemelha com a primeira: trata-se da intuição ou consciência. Essa noção é tratada em outro momento, aqui neste espaço [3].
O indivíduo que leu e sentiu a realidade manifestada nas três referências poderá compreender melhor o raciocínio prestes a ser esboçado aqui.
Uma boa dose de vivência profunda (dor) e uma postura filosófica também ajudarão. Quem possuir isso está apto a corrigir, questionar, melhorar, ou tudo isso, o esboço prestes a ser apresentado.
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A título de facilitar a compreensão optei por dividir este ensaio em três partes.
1. A primeira faz uma revisão de conceitos e introduz o porquê do tema, além de explicar os
fundamentos do diagrama-mor, base de todos os outros;
2. A segunda percorre cada caso, explicando e exemplificando, de forma a encaixar o abstração vista
aqui nas particularidades da vida de cada pessoa, independentemente de sexo, crença, ideologia, classe social, desejos, orientação sexual, grau de instrução, idade, saúde ou qualquer outra característica que
nos diferencia pela forma;
3. A terceira apresenta possibilidades de extensões, e incentiva idéias para tornar essa visão útil para a
realidade que nos cerca, podendo servir de base para projetos e estudos em áreas de conhecimento
como a pedagogia, a psicanálise, a filosofia, as ciências sociais, a economia e talvez até as ciências
naturais.
Dessa forma a leitura ficará menos entediante e a assimilação mais efetiva. Faço uso de várias figuras que sintetizam os conceitos, sendo a base de todas figuras (Fig.1) o esboço já apresentado anteriormente [2].
Figura 1: diagrama original. A idéia partiu daqui. |
Este segundo caminho irá variar em forma à medida que explico as possíveis situações. Ele representa as possibilidades evolutivas características a cada ser.
É importante ressaltar o seguinte: cada "pirâmide" deve ser aplicada a um indivíduo, pois o progresso do ser é individual - só você pode fazer algo efetivamente por você. os outros podem ajudar, mostrando o caminho e dando dicas. mas a conquista, a travessia, é única e exclusivamente sua.
Cada processo evolutivo (azul e laranja) tem sua dinâmica própria.
O que ambas (e todas) jornadas tem em comum é o fato de partirem da ignorância inocente e terem como destino (realizável ou não***) a sabedoria cósmica.
Esses percursos, ao invés de serem considerados numa trajetória individual absoluta, podem ser considerados em termos relativos. Ou seja, a sapiência máxima pode ser encarada como o máximo grau de sabedoria adquirida em vida. Ou seja, mede-se sapiência relativa e intelectualidade (expansão máxima) relativa. Os possíveis empecilhos ao fazer essa projeção são: podem haver pessoas que sequer atingiram o zênite da intelectualidade, e portanto sua avaliação será incompleta.
Quero ressaltar: 1) que os diagramas são universais, aplicáveis a todos seres passíveis de conscientização (nós humanos e outras humanidades), e 2) que eles devem ser vistos sob um prisma telefinalístico e individual, não servindo de base para comparações entre seres - finalidade contraproducente para nosso estágio evolutivo, altamente egoístico, incluindo aquele do autor.
Figura 2: desenvolvimento da idéia. |
Outro ponto em comum é que ambas possuem duas fases: expansiva-contrativa. Consequentemente, existe um zênite também.
E finalmente: ambas (todas) são guiadas por um eixo-diretor central, que conecta diretamente pontos de chegada e partida.
Essas invariâncias representam absolutos, e portanto são a espinha dorsal que guia nossas vidas. Logo, são ideais, perfeitos e invariáveis para nós.
O ponto de partida é a ignorância e inocência. Pode ser vista como o período em que estávamos nas cavernas e mal nos diferenciávamos dos mamíferos. Era a época do animal-homem. Já o ponto final é a nossa meta longínqua. É a auto-realização. A utopia individual. A paz.
As fases se referem à natureza de cada processo. Ou melhor, o tipo de mentalidade que impera em cada um. Na expansiva ganhamos em conhecimento, aumentando o saber intelectual, a erudição, o raciocínio racional-analítico. Em suma, alargamos nosso campo, mas com isso dispendemos energia para administrar todo esse saber. Nessa fase não temos ainda noção do eixo diretor que está nos guiando - majestosamente - apesar de sentirmos uma necessidade de orientação global. Esse eixo puxa os extremos e nos faz perceber que o mais do nosso mundo é o menos do mundo futuro, e o menos desse mundo é o mais no mundo futuro. Inicia-se a segunda fase, na qual o foco será o caminhar para frente, sintetizando todo o saber adquirido. Mais vivência, menos discurso. Mais aplicação, menos teoria. Mais eficiência, menos desperdício.
O ideal seria partirmos do início e caminharmos diretamente ao final, numa linha reta, sem expansões - e consequentes contrações. Mas a natureza involuída inicial torna essa possibilidade irrealizável, e portanto essa reta representaria o ideal absoluto de evolução: nenhum desgaste, toda velocidade.
Você já deve ter visto (ou ouvido falar de) pessoas com pouco estudo e que vivem em meios menos favorecidos possuidoras de uma concepção de mundo muito à frente da média "educada" (professores universitários, dirigentes empresariais, sacerdotes ou pessoas "estudadas" como nós). Mesmo sem usar jargões específicos ou mesmo palavras do nosso universo "relativamente culto", elas conduzem suas vidas de maneira sábia - ou muito mais sabiamente do que muitos "à frente". Pois bem, essas pessoas aparentemente não necessitaram passar por um processo de instrução escolar intenso e sistemático para assimilarem as verdades essenciais da vida. Ou pelo menos não precisaram ir tão longe quanto alguns para chegarem às mesmas conclusões - ou algumas melhores ainda. Esses seres atingiram o (seu) zênite intelectual antes de outros, e iniciaram um processo de evolução em outro campo, pois perceberam que aquilo que realmente conta é SER bom - o resto vem como consequência na medida do necessário. Na figura, eles iniciaram a segunda fase (B) enquanto outros estão na primeira e longe de iniciarem a sua própria (B).
Quais as implicações disso?
Bom, enquanto o azul se expande, estudando mais o universo exterior, o laranja se contrai, se preocupando com o universo interior. O segundo se desgasta menos em sua jornada porque o tempo e energia e pensamento e emoções que gasta com o universo externo é menor do que o primeiro, sobrando energia para intensificar sua ascese mística.
No entanto não tenho o intuito de desqualificar o estudo. Digo apenas que os caminhos para a sapiência - e consequente felicidade do ser e seu entorno...os outros seres - vão além da mente sensitiva-intelectual. Os métodos intuitivos-sintéticos são atualmente menos sistematizáveis e portanto analisáveis. A mente do presente é incapaz de aceitar o que não consegue conceber. A mente do futuro saberá por vivência. Caminhará orientada e consciente. Não negará o hoje mas superá-lo-á graciosamente.
O eixo diretor é o que liga a imanência de Deus (nosso interior) com Sua transcendência (o centro de tudo, nossa finalidade). É um eixo energético que puxa, ora amorosamente, ora violentamente, nós seres decaídos em busca da perfeição perdida.
Conforme será visto, existem vantagens e desvantagens em expandir a intelectualidade antes de se iniciar a espiritualidade.
Podemos considerar a largura horizontal (o conhecimento, x) como a matéria-prima para evolução interior (vertical) e a posição vertical (espiritualidade, y) como o grau de conscientização. Isso significa que a consciência já se inicia na fase 1. No entanto, ela não é suficientemente forte para guiar a si mesma, e portanto o Ser sofre mais influências do mundo externo por desconhecer o seu Eu interno (potência divina) do que é capaz de guiar a si mesmo.
Como essa incapacidade inicial (y=0) é natural pode-se afirmar que é necessária; e igualmente é natural (e necessário) a expansão lateral inicial (x crescente). Eis o porquê da impossibilidade lógica de ascendermos em linha reta.
Reparem que x parte da nulidade, chega ao zênite e volta a nulidade. Isso não significa que toda essa jornada foi em vão, pois o que importa é ter recuperado a sapiência cósmica, representado pelo maior valor de y. O intelectual serve o espiritual. Apenas a partir de um patamar tomamos consciência disso e passamos a dar valor real às coisas efetivamente importantes.
Minha crença é que as formas de vida infra-humanas possuem uma ascensão destituída de evolução psíquica-nervosa como a humana, sem expansões-contrações, e portanto sendo caracterizadas por um ponto localizado na parte inferior de nosso diagrama.
É claro que em termos de evolução darwiniana (orgânica) os animais e plantas evolvem. Ou seja, o mundo sensório pode se tornar mais refinado, mas essas criaturas são destituídas de livre-arbítrio.
Todas essas idéias, se corretas, não justifica nenhum mal-trato a outras formas de vida. Querer se impor aos outros (humanos ou infra-humanos) apenas para satisfazer o ego ou instintos baixos não é sábio.
No próximo texto pretendo iniciar a exemplificação e detalhamento dos casos que irei apresentar.
(continua)
Referências:
[1] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com.br/2014/09/impulsos-virtuosos.html
[2] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com.br/2014/11/um-ciclo-duas-fases-piramide-expansiva.html
[3] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com.br/2015/03/nocao-de-transformismo.html
Observações:
* Utilizei uma imagem 2D para evitar complicações e assim apresentar a idéia da forma mais atraente
e clara possível. Futuramente talvez me venha um motivo que leve a utilizar um diagrama 3D.
** Degradé é uma gradação de cores, na qual o que é intenso vai se enfraquecendo...frescura de
linguagem da minha parte... ;)
*** Huberto Rohden ressalta o caso da imortalidade. "O ser humano é imortalizável mas não é
necessariamente imortal". Isso significa que somos capazes de tornarmos nossa alma imortal, mas
para isso devemos atingir alto grau de consciência antes que nosso corpo astral (entre o orgânico e o espírito) se desgaste. Isto é, o nosso corpo orgânico se desfaz mas o corpo energético (mente)
novamente forma outro (orgânico); ao longo de milhares e milhares de anos esse processo continua,
mas o corpo energético também se degrada - a uma taxa muito mais lenta que o orgânico. Logo, este
segundo corpo deve formar o último (espiritual, este sim imortal) se deseja se imortalizar. Para mais detalhes recomendo o estudo das obras de Rohden. E muita vivência.
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