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sexta-feira, 1 de setembro de 2017

É Chegado o Tempo das Ciências Humanas? (II)

Há mais de dois anos escrevi um ensaio intitulado "É chegado o tempo das ciências humanas?". Trata de um sentimento calcado no pressentimento. Um vislumbre do porvir. Porvir presente em estado latente. Indiferente às indiferenças daqueles que vivem no plano da superficialidade dos fatos e pressões das obrigações; Indiferente às afirmações limitadas e incertas. Afirmações que negam o inexplicável presente - que deseja ardentemente se fazer explicável, exemplificável e transparente futuro. Bastando para isso a nossa vontade ardente se casar com a nossa sinceridade carente, com a bênção de nossa consciência latente. Só isso, tudo isso.

O que quero dizer com "é chegado o tempo..."? Domínio? Predomínio? Culto? Quem acompanha essa jornada de 4 anos, já com 300 ensaios, nascida num período de explosão coletiva, sabe que a leitura literal das palavras não diz. O que diz é o sentimento comum, universal, acionado (ou não) pela disposição das palavras. Estas nada mais que um meio para despertar o Eu em cada um. Nada mais, nada menos.

Reparem o trajeto da humanidade - nossa História e Pré-História. O que impulsionou inconscientemente as descobertas, os inventos, os atos? As crenças. As filosofias. E conscientemente? A ciência e a técnica. Mas a Ciência nasce da Filosofia. E por muito tempo ela fica estacionada na superfície (Séc. V a XV), dando lugar ao império da Igreja. Após isso, deslancha a Revolução científica, seguida pela técnica que culmina na indústria. Até aí desenvolvem-se as ciências físicas e suas aplicações; a química e suas aplicações; a biologia; a medicina; os formalismos da lógica e da matemática. O Iluminismo prepara terreno para uma nova forma de economia, de sistema político e de utilização das tecnologias.

No final do Séc. XIX despontam a Sociologia e a Psicologia. É óbvio que o estudo do comportamento humano surja defasado do estudo do comportamento da natureza - apesar de nós também sermos naturais e estarmos imersos num mundo físico, dinâmico e orgânico. 

O livre-arbítrio de um átomo é tão reduzido que se traduz em férreo determinismo. Ele obedece com perfeição leis que desconhece. À medida que subimos na escala evolutiva, observamos relíquias do mundo físico (matéria), depois dinâmico (energia) até finalmente chegarmos à vida em sua forma mais elementar (vegetais). Elementar mas essencial, pois ela faz perfeitamente e inconscientemente o que um dia faremos de forma espontânea e consciente: captar energia diretamente da luz (em outro ensaio explicarei melhor). Subimos e vemos o movimento e instintos de fome e sexo (animal). Até mesmo um certo sentimento rudimentar, de identificação com o dono, de memorização, de aprendizagem. Mas um psiquismo baixíssimo, incapaz de refletir sua própria finalidade. Subindo mais fareja-se o biótipo em que a razão eclode desordenadamente: o homem.

Nós somos capazes de estudar tudo abaixo de nós e suas dimensões características: matéria (espaço), energia (tempo). E tudo que se manifesta exclusivamente em nós: vida (consciência). E além, nos planos da super-consciência, em que a intuição coordena o raciocínio, que domina os instintos, que se reduzem ao mínimo indispensável para manter o progresso numa marcha segura e crescente. Essa capacidade surge em nós. E iniciamos por sistematizar aquilo mais embaixo. De modo geral estamos subindo na assimilação consciente dos planos evolutivos, sendo cada vez mais evidente que a cada ascensão devemos não apenas assimilar aquilo que recém-conquistamos, como usá-lo para sutilizar todas as qualidades inferiores, tornando-as mais aptas. Espiritualização da matéria. 

Não são apenas as escalas de tempo que mudam. Nem de espaço. Entram elementos novos. A linguagem. O modo de descrever. O subjetivismo. A mudança frequente. Todos essas novidades são recentes, logo, de pouco uso até então. Estamos em fase de compreensão de fenômenos mais complexos, que se fazem mais visíveis devido aos últimos avanços da ciência e tecnologia, e à forma de organização social. Os ciclos descoberta-assimilação-experimentação-difusão das ciências naturais são muito mais breves do que aqueles das ciências humanas. Primeiro por entrarmos com entidades dotadas de amplo livre-arbítrio - ao menos em relação aos fenômenos físicos e químicos; segundo, como consequência, pelo aumento da complexidade das interações, tornando o desenvolvimento de uma ciência supra-natural, humana - mas que também engloba aspectos do natural, porém com menor peso - um processo lento e incerto em larga medida. Logo, não é razoável tratar experiências econômicas, políticas e culturais como coisas que tendem (devem) a se arranjarem tal qual minérios, bactérias, planetas, dispositivos.

A humanidade começa a aprofundar o conceito de democracia. Volta-se à questão da democracia direta, com todos seus desafios considerando as escalas atuais. O sistema econômico, com sua lógica, é expandido e tende a se transformar cada vez mais num apêndice de um sistema diretor, muito mais essencial à vida, intangível, poderoso, que atua silenciosamente através das pessoas, ao longo da história, moldando e orientando à seu modo, rumo a Deus. Eis que Georgescu-Roegen propõe a incorporação da economia à biologia (Bioeconomia), aplicando conceitos de entropia (2ª lei da termodinâmica) para explicar a insustentabilidade do crescimento indefinido, sem limites. A psicanálise após Carl Jung começa a trabalhar com a hipótese da existência (e preexistência) da alma para diagnosticar seus pacientes. O conceito de inconsciente, ao invés de se prender num subconsciente estático freudiano que comanda um consciente de aparências, - cuja única função é satisfazer de forma mais eficiente desejos desses instintos - se desdobra numa tríade dinâmica composta de subconsciente (instinto), consciente (razão) e superconsciente (intuição). Todas as sementes de um novo pensamento são lançadas no século XX - o último século do segundo milênio.

O conceito de monismo, trabalhado desde tempos imemoriais pelas maiores almas, é sintetizado de forma suprema por Ubaldi. Através de sua obra, Ciência e Religião se entrelaçam, co-orientam e auto-explicam. O panteísmo da imanência e o monoteísmo da  transcendência se fundem num monismo. O criacionismo que afirma a natureza de Deus se une ao evolucionismo que afirma e explica Sua lei. Plantam-se as bases para a Civilização do III Milênio.

Muitos acreditam que a filosofia já cumpriu seu papel. Dentre esses muitos se incluem filósofos dos mais variados tipos que, mesmo não demonstrando isso por afirmações, exemplificam por sua conduta individual engessada. No entanto, os verdadeiros filósofos - sejam eles de profissão, de essência ou ambos - sentem o porvir e asseguram que hoje, mais do que nunca, a Filosofia tem (e terá) um papel imprescindível para conduzir a humanidade rumo a uma transformação substancial como nunca se viu antes em nossos 6 milênios de civilização histórica. Não se trata aqui de inventar um novo sistema filosófico e alimentá-lo egoisticamente para que outros orbitem em torno dele. Trata-se de fundir o melhor de todos os sistemas filosóficos e trabalhar rumo à evolução suprema, sutilizando todas ideias, conceitos, debates, relações, análises e experiências coletivas. Uma filosofia cósmica que não se atêm a formalidades engessantes e percebe seu papel transformador. Uma filosofia não-dualística.

Com os progressos da tecnologia da informação, das redes sociais, das tecnologias múltiplas, do domínio da mídia e da falta de ideais supremos, a vida estagna e a humanidade corrói o alicerce que a sustenta: a Mãe Terra. Com todos seus recursos minerais; suas fontes de energia fósseis; suas espécies (fauna e flora), suas paisagens e climas e relevos e ciclos; com seu poder de atração gravitacional suficientemente forte e fraco para criar condições de vida. Saber o que fazer com o que se tem é imprescindível. A era da Fé cega terminou no século XV para dar lugar a era da Ciência e da Razão. O misticismo medieval, os santos que ardiam de paixão com sua visão, foram relegados ao esquecimento. A Teologia do tipo Igreja não fornece terreno fértil para a aquisição de novas habilidades. O antropocentrismo começa a se desdobrar e assim explode o materialismo. Renascimento; Iluminismo; Formação dos Estados Nacionais; Revolução Francesa; Revolução Industrial; Revolução Tecnológica. E eis que chegamos a um ponto nevrálgico. O sistema econômico que se considera vencedor eterno e absoluto começa a perder adeptos a cada dia. Só lhe resta o uso da astúcia (propaganda e distrações, seja em forma de consumo conspícuo ou trabalho alienado) e força (Estado de exceção, ameaças informais). Mas esse método tem prazo de validade.

O mal age de forma eficiente e rápida, vencendo no curto prazo. Ele tem pressa, pois está encerrado no espaço-tempo, sua dimensão característica, que tende a ser definitivamente superada pela super-consciência (intuição). O bem, por outro lado, age com paciência e aceita humilhações, pois sabe que a eternidade lhe pertence. Ele supera a dimensão espaço-tempo. Logo, engloba o mal, conduzindo-o para seus fins de forma imperceptível. Com Amor e Visão.

"Quem se humilhar será exaltado. Quem se exaltar será humilhado."
Jesus, o Cristo

Dois mil anos e apenas agora começamos a compreender as palavras proferidas pelo nazareno, nas longínquas terras palestinas. Palavras dos longínquos planos da hiper-consciência.

É chegado o tempo das ciências humanas; da educação ambiental; da cultura profunda e diversificada; da ciência orientada; da fé consciente e aberta às transformações internas e externas. É chegado o tempo da Nova Civilização do III Milênio.

Mas para parir essa Civilização teremos de suar, sangrar e até morrer - no mundo. Para que possamos viver num plano mais elevado - e portanto com maior liberdade. Liberdade consciente. 

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