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quinta-feira, 22 de março de 2018

O Determinismo do Livre-Arbítrio Humano

O ser humano pende entre duas realidades, ora oscilando para uma, ora para outra, a depender do meio em que se encontre, de sua formação cultural ou de seu subconsciente (camadas de experiências de existências pretéritas).

Existem aqueles que creem no livre-arbítrio mas são incapazes de explicar o próprio comportamento instintivo - às vezes considerado consciente - que se executa repetidas vezes, de forma previsível, alegando que seus atos são livremente tomados. Outros, ao perceber a humanidade escravizada pelos seus instintos, creem ter descoberto a verdade absoluta ao afirmar que o ser humano é escravo de seus instintos, que na sofisticação do mundo moderno brotam na forma de desejos. Mas suas teorias não explicam o porquê dos gênios, dos santos e dos heróis que vem ao mundo e deixam um rastro profundo que abala conceitos e devasta velharias. Dessa forma observamos a personalidade cegamente crente na liberdade, e outra deficientemente certa no determinismo. Ambas captam fragmentos de uma realidade maior.

A vida faz tudo automaticamente, de modo perfeito. Seus
processos já se consolidaram, tornando-se instintos sábios.
O ser humano ainda está em construção: daí a sua
imperfeição. Transcender é a questão.
Sigmund Freud foi um dos primeiros a adentrar na psique humana de forma sistemática, explicando que o consciente humano é conduzido, em sua totalidade, pelo inconsciente. Inconsciente que, por ser mais basilar do que os produtos intelectuais e emocionais da mente, foi classificado como subconsciente. E ele nos brindou com um conceito realmente revelador, que as ciências humanas começam a trabalhar de forma mais utilitária nesse século. No entanto ele se equivocou num ponto: o subconsciente dita em larga medida a nossa vida - não na totalidade.

É normal que, estando situado num determinado nível evolutivo, a pessoa enxergue com clareza tudo que lhe é característico. Mas aquilo que ainda não foi vivenciado não pode ser considerado como uma realidade que influencia nossa vida. Estamos momentaneamente presos ao nosso grau de consciência, que estabelece as fronteiras de nossa percepção (sentidos) e compreensão (mente). Essa prisão é progressiva com a evolução, que aumenta a experiência do ser. Este, através da dor, tira conclusões que jamais poderia obter através da ciência e da cultura - apesar dessa dupla auxiliar no desenvolvimento interior se bem utilizada. 

O ser humano se resume a trabalho e a sexo segundo o psicanalista austríaco. São duas das três leis descritas por Ubaldi que a humanidade segue: da fome e do amor. E apesar das estatísticas comprovarem com toda sua maciça força de dados isso, existem exceções. Por quê?, pergunta o utópico. E eis que o homem moderno, situado no nível médio, responde reforçando a regra extraída das observações da série histórica e dos atos de seus semelhantes. Mas a dúvida persiste e intriga ainda alguns. Estes terão de buscar as respostas em outras regiões.

Jung, Ubaldi e Freud. Um ergueu os princípios, outro
ampliou-os e o místico usou-os para revelar algo
muito além do sensível e compreensível. 
À medida que a humanidade progride sofistica-se a 1º lei e parte-se para a 2ª. Com mais progresso sofistica-se esta última e continua-se a reforçar a primeira. Uma alimenta a outra num ciclo que cresce ferozmente. Cresce sem fim. Cresce e gera choques. Porque a ânsia pela expansão individual não tarda a secar as fontes que a satisfazem, e com isso começa a disputa pela atenção, pelas terras, pelos recursos, pela energia, pela supremacia ideológica e pelo bem-estar. Mas de um labirinto sem saída não se pode escapar a não ser erguendo uma linha vertical. Essa linha é a 3ª lei. A lei da evolução.

Raríssimos são os seres que dão prioridade máxima para a terceira lei. Evoluir às custas do conforto material, da segurança da propriedade, da estabilidade dos relacionamentos, das conexões sociais, é uma estrada permeada de dificuldades. Farpas e secas acompanham o viajante que opta por transcender a realidade presente, dominada pelos sentidos. Mas é nesse caminho que começa a verdadeira liberdade. A edificação do livre-arbítrio, que permite que se conduza a própria vida de forma mais orientada, evitando dores, - por vezes apocalípticas - é algo que exige do viajante uma perspectiva completamente diversa da vida. Não se mede mais benefícios imediatos, e sim de prazos longos, que extrapolam os limites estreitos da própria existência física. Constrói-se no imponderável, adquirindo experiências profundas que vão diretamente para o interior. Passa-se dos sentidos aos nervos, destes ao cérebro, desta à mente, e daí por diante adentra-se em regiões inacessíveis aos instrumentos de medição. A ciência se cala e os homens de puro coração de comovem. Este terreno é reservado aos pioneiros. Cristo, Paulo de Tarso, Ubaldi, Rohden, Pascal, Espinoza, Schweitzer, Chardin, Gandhi, São Francisco, São Vicente de Paula, Abade Pierre, Sócrates, e um seleto grupo. Muito além do imaginado pelo mais (espiritualmente) ambicioso dentre nós, seguidores das duas leis iniciais, pobres seres no início da jornada ascensional.

Á medida que a consciência se dilata, o
livre-arbítrio passa a ser conquista. Nossa
vida passa a ser mais orientada. Da força à
astúcia e desta à justiça.
Nosso livre-arbítrio existe e é determinado pelo grau de consciência adquirido. Quanto menos conscientes da realidade do mundo, menos liberdade temos. Agimos seguindo nossos instintos e julgamos ter liberdade de escolha. Liberdade de curtíssimo prazo, que logo traz efeitos determinísticos e desagradáveis. No íntimo somos apenas escravos de nosso subconsciente ao agirmos de forma a satisfazer interesses locais e imediatos. O porão em que as experiências multimilenares se consolidaram é quem dita nesse caso.

Ascender é difícil e ninguém opta por essa trajetória. Mas é a que traz glórias futuras, nem que estas estejam situadas em outras existências - e geralmente estão. Para iniciar e sustentar esse caminho é necessário ter perspectiva super-humana. Trata-se de uma intuição suficientemente forte, que chama o ser para regiões desconhecidas. Pede-se um salto de fé num abismo onde se vê a certeza da queda e do fim. Quando a fé vence o temor racional as possibilidades começam a brotar. 

Jung caminhou além de Freud, dando explicações mais coesas do ser humano. E Ubaldi incorporou ambos e foi (muito) além, apontando para o superconsciente: aquilo que nos permite a ascensão, capturando o que vem do Alto para trabalhar em nossa mente consciente, que começa a interpretar e compreender, e assim assimila conceitos muito mais potentes, que abraçam a triste realidade em que vivemos e supera-a. A partir daí a liberdade cresce e começa-se a perceber os próprios atos do cotidiano. Percebe-se os automatismos dos outros e (mais importante!) os seus próprios. Nos vemos desnudados diante de observações que rasgam as aparências e capturam o íntimo, encarando a essência. Nos envergonhamos de nós mesmos e clamamos pela superação. Agora que adquirimos a visão só resta a ascensão. Voltar atrás não é possível. Inicia-se a batalha interior.

Percepção profunda gera um aquietamento crescente. Espanta-se com a nova conquista. O mundo não compreende. Crê se tratar de um problema. Poderia ser, como a imensa maioria dos casos de silêncio, que acabam sendo consequência de ou medo, ou ódio ou arrogância. No nosso caso inexistem essas três causas. E quem percebe se vê diante do inexplicável...

Julgamos ser livres quando somos escravos dos sentidos e da mente. Quem é realmente livre obedece a princípios superiores, usando seus recursos - parcos ou abundantes - para evoluir. Paradoxal verdade que resolve todas as questões humanas. Dessa forma chegamos a algo que deve ser "lido" pelas vias interiores, do espírito, e não através da cultura e intelecto, que são letra morta. O determinismo seguido fielmente por Deus é infinitamente mais livre do que nossa liberdade determinística. Rohden rega sua obra com esses conceitos. São verdades capazes de resolver nossos últimos problemas, bastando para isso nos abrirmos para uma nova perspectiva.

Esses escritos são fragmentos de percepção adquiridos pelo autor após um período de dor interior. Apenas pela árdua experiência no mundo pode-se compreender como superá-lo.

E a ideia deve ser exposta assim que o ímpeto brotar. É de uma urgência tão grande que aponta para a natureza do fenômeno.

E assim convoca-se a humanidade para alçar voo intuitivo-sintético - pois o abismo se aproxima. Abismo que a mentalidade hodierna é incapaz de superar.

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