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quarta-feira, 26 de junho de 2019

O Retorno do Impossível

Minha vida sempre esteve focada em duas questões: reforma íntima e transformação coletiva. Mas a dualidade que impera no Anti-Sistema (AS), isto é, neste universo, sempre me deixou em conflito interno: ou uma, ou outra. Querer um dos pólos implicava em abdicar do outro - inclusive tornar-se inimigo do mesmo. Era o que o mundo aparentemente afirmava, de modo indireto na maioria das vezes.

Esse dilema só seria resolvido quando me encontro com o monismo de Pietro Ubaldi. 

Por que o (monismo) "dele" e não o de outro? 

Como se sabe, a doutrina da unidade, que vê a diversidade caminhando para a unidade - e a unidade se manifestando em diversidades - é tão antiga quanto a civilização. Akenáton [1], o Faraó monista, já tinha essa visão. Orígenes [2], o grande pensador cristão, já se dava conta de que tudo tenderia a voltar a Deus: O AS seria reabsorvido pelo S. Isso implica na redenção de tudo e todos que existem, inclusive satanás. Pois a Obra de Deus deve ter a vitória final, sem a qual Deus não seria Senhor absoluto de tudo. Espinoza foi o último dos maiores pensadores monistas de todos os tempos (considerando que Ubaldi ainda não é reconhecido como tal):

"Para Espinoza, substância não possui causa fora de si, ela é causa de si mesma, ou seja, uma causa sui. Ela é singular a ponto de não poder ser concebida por outra coisa que não ela mesma. Por ser causa de si, a substância é totalmente independente, livre de qualquer outra coisa, pois sua existência basta-se em si mesma. Ou seja, a substância, para que o entendimento possa formar seu conceito, não precisa do conceito de outra coisa. A substância é absolutamente infinita, pois se não o fosse, precisaria ser limitada por outra substância da mesma natureza." [3]
(grifos meus)

E desse grande portador da chama da doutrina da unidade, chegamos ao místico da Umbria, que definiu, sistematizou e exemplificou de forma ímpar esse nível de consciência unitário.

A compreensão da vida envolve muito mais do que estudo formal.
Ela abraça a dimensão da experiência e afloração do sentimento -
que aliado à cognição possibilita a ascensão.
Photo by William Christen on Unsplash
Lendo seus livros começa-se o contato. Estudando compreende-se as relações. E sentindo a força das suas palavras, tem-se a visão clara do fenômeno evolutivo, da queda e da salvação das criaturas decaídas (nós e tudo que existe). Para compreender a Obra é preciso ter sofrido e compreendido o significado da dor. É preciso ter sentido o infinito se manifestar através dos finitos (milagre), de uma forma delicada e sutil, porém com resultados concretos e precisão cirúrgica. Assim pude começar a relacionar as contradições que vinham atormentando a minha vida - desde os vinte anos. 

No livro Cristo muito se fala a respeito da Justiça Social do Evangelho. Último livro do apóstolo de Cristo - ditado por ele à sua filha - a conclusão nos leva a perceber a necessidade urgente de aplicarmos em grau mínimo os princípios de justiça social do Cristo. Não é possível ignorar o fato de que elevar o grau de bem-estar de todos (em seu sentido mais abrangente) implica na aquisição de uma consciência de coletividade que perceba que existem limites materiais além dos quais devemos vislumbrar outros planos de existência, pautados por valores mais altos, visando conquistas mais abstratas, intangíveis, no campo da sensibilidade psíquico-nervosa.  

“Cada um de vós que não renunciar a tudo o que possui, não pode ser meu discípulo” 
(Jesus Cristo)

É claro que isso não significa tornarmo-nos paupérrimos, sendo privados de alimento, moradia, roupas, transporte, saúde, educação, cultura e outros meios para desenvolvermos nossas potencialidades. Renunciar a tudo significa não ter a quantidade como centro de preocupação da vida. Significa usar as coisas do mundo como meios para outras coisas, mais elevadas - sejam essas coisas habilidades sociais/comunicativas, conhecimentos, ferramentas, métodos, títulos, dinheiro, poder, posição social, fama ou atributos físicos. 

“Não acumuleis tesouros na terra, onde a ferrugem e o caruncho os consomem e os ladrões os desenterram e os roubam; mas, pelo contrário, acumulai tesouros no Céu”
(Jesus Cristo)

Eu traduziria isso como: "Não deposite confiança nas coisas perecíveis, tornando-os fins supremos de vossa vida. Eles irão findar cedo ou tarde - e trair-te se te apegares demasiadamente a cada um deles."

Cristo lançou as bases do monismo. A forma mental
humana interpretou seus ensinamentos da forma que
pôde. Tivemos de continuar no monoteísmo, que
ainda é dualista. Mas isso será superado.
É preciso perceber as palavras do Evangelho considerando a evolução da mente, o refinamento da sensibilidade e as conquistas da civilização:

"Mas é necessário compreender que, nos tempos de Cristo, a estrutura social era muito mais simples, de modo que estas aproximações entre extremos tão afastados, ligando religião com distribuição e administração da riqueza, eram mais fáceis. Hoje, estes dois extremos estão por demais sujeitos, cada um a uma sua técnica específica, para que se possam misturar. Os dois campos se tocam, mas não se podem sobrepor e confundir. Levando isso em conta, o Evangelho há de ser entendido, e não tomado ao pé da letra, dado que hoje os problemas tratados por ele no campo econômico apresentam-se numa forma definida com mais exatidão e caracterizados por uma complexidade então desconhecida."
Cristo - Pietro Ubaldi (grifos meus)

Essas observações muito bem colocadas nos remetem à questão dos sistemas político-econômicos. O primeiro ponto é que não podemos divorciar economia de política, pois existe uma relação fundamental entre essas duas ciências humanas - e suas práticas. 

Qualquer um hoje em dia percebe que o poder econômico, em sua forma financeira, controla o sistema político. As decisões dos governos - sejam de esquerda ou direita - são limitadas por normas de austeridade. Reformas são conduzidas pensando-se em balancear a contabilidade. A saúde, a educação, a cultura, a biodiversidade, a qualidade dos alimentos e das relações humanas ficam em segundo plano. Porque foi nos inculcado na mente - via grande meios de comunicação - de que resolver a questão financeira levará a solução de todos outros problemas. Esse é o mantra neoliberal, que atualmente domina o mundo e corrói relações. 

Cada vez mais pessoas percebem a natureza do capitalismo [4]: crescer indefinidamente, cada vez mais, usando artifícios cada vez mais sofisticados. Esse sistema pode ter sido bom para dar um impulso inicial no desenvolvimento do bem-estar geral, através da aplicação da ciência e dando uma relativa liberdade. Relativa porque apenas limitada às possibilidades de aumentar a circulação de bens e mercadorias. Não à toa os ingleses defendiam o fim da escravidão: ela atrapalhava o comércio de seus produtos manufaturados:

"Para conclusão de seu projeto de industrialização a modificação das relações de trabalho e de mercado consumidor eram essenciais. Assim, dava-se maior importância à ampliação de mercados e da produtividade. O trabalho escravo e o monopólio – práticas comuns da exploração colonial – pareciam ultrapassados ao novo modelo, fomentado a partir da industrialização." [5] 

Todo progresso humano se deu por interesses econômicos. Até um ponto não há problema nisso - é nossa natureza atual. Mas estamos num período de inflexão: esses interesses econômicos (financeirizados) adquiriram proporções dantescas. A quantidade de produtos químicos, a potência de destruição veicular e de armas, o mau uso de quantidades enormes de informação, entre outras modernidades, tem o poder de causar mal tremendo em escala, que pode se propagar por gerações e comprometer formas de vida e alterar o clima de forma drástica. Hoje compromete-se muito mais o futuro do que no passado.

(o vídeo acima mostra como a perfeição 
existe em meio a tanta complexidade. 
dá para ter uma vaga ideia do que é o S (Sistema),
descrito por Ubaldi em seus livros)

A degradação do meio ambiente e a desigualdade social são incompatíveis com o nível de desenvolvimento almejado pela ONU [6]. A população é grande e é bombardeada com informações que a fazem desejar um padrão de vida incompatível com os limites planetários. A Pegada Ecológica está em 1,5. Ou seja, hoje consumimos 50% a mais (anualmente) do que a Terra pode gerar no mesmo período. Esse índice é superior a 1 desde a década de 70 [7]. Se soubermos mensurar os estoques de cada item (dos seis que compõem a pegada), teremos uma ideia de quando chegaremos ao limite. O recurso limitante são os combustíveis fósseis, base de nosso sistema econômico e modo de vida. 

Os problemas centrais de nossa civilização se resumem à questão ambiental e social.

Quanto ao meio ambiente, temos os problemas de aquecimento global, biodiversidade, uso de terras, redução de áreas de florestas, acidificação dos oceanos, degradação da camada de ozônio e fontes energéticas não-renováveis. Todos esses vetores se relacionam, direta ou indiretamente. 

No âmbito social os maiores problemas estão na esfera redistributiva (tributação). Ela se relaciona direta ou indiretamente às políticas de gastos sociais e de infraestrutura. Esses investimentos aumentam a eficiência do sistema econômico, que fornecendo subsídios à saúde, educação, transporte e segurança,dá às famílias a oportunidade de consumir outros bens como alimento, cultura e viagens. Esses princípios são, à fundo socialistas. Os recursos fundamentas à vida tem acesso facilitado (saúde, educação, moradia, segurança, transporte, previdência, etc.) ao passo que bens de consumo são disponibilizados ao setor privado, que pode dentro de limites - que consideram o bem-estar geral, a longo prazo, do planeta e da humanidade - comercializá-los:


"In a true democratic socialist economic system, consumer goods such as clothing, food, perfume, and jewelry remain in the private sector, while capital goods and basic raw materials are owned, at least in part, by public interest." [9]

("Num sistema econômico verdadeiramente socialista, bens de consumo como vestimenta, alimento, perfumaria e jóias permanecem no âmbito do setor privado, ao passo que bens de capital e matéria prima ficam na esfera, pelo menos em boa parte, da esfera pública.")

Sobre bens de consumo e bens de capital (ou industriais), segue link explicativo:
https://www.investopedia.com/ask/answers/050415/how-are-industrial-goods-different-consumer-goods.asp

Eu venho adquirindo o hábito de fazer afirmações cada vez mais cuidadosas sobre certas coisas. A verdade é que não sabemos exatamente sobre nada. Não sabemos o que é matéria nem o que é espírito - tente defini-los à fundo e você verá que estamos longe da última realidade. Da mesma forma, na política, estamos muito longe de compreender a natureza de diversos sistemas político-econômicos tais como o capitalismo e o socialismo. É preciso ir à raíz dos termos. Saber sua definição precisa, o contexto histórico em que as teorias surgiram (o porquê) e os motivos que levam tanta gente a adorar ou abominar determinadas palavras e ideias. Sendo assim recomendo ao leitor uma pesquisa refinada sobre palavras como conservadorismo, liberalismo, capitalismo, socialismo, comunismo, fascismo, entre muitos outros.

A Doutora em Economia Política Sabrina Fernandes, em um de seus vídeos no canal Tese Onze, está formando um glossário de palavras relacionadas à sua área de atuação. Sendo assim podemos compreender melhor o que é o socialismo - e se de fato ele existiu nesses termos em nossa História.


Acredito que a relação entre: (a) consumo conspícuo; (b) consumo; (c) classe e; (d) socialismo também deve ser esclarecida - e aí recorro também à especialista no tema: 



O conceito de propriedade também é importante. Ubaldi nos diz exaustivamente em sua Obra que no nível humano atual é preciso haver o direito à propriedade. Mas ao mesmo tempo ele esclarece que essa propriedade deve ter função social. Se ela não cumpre essa função, está em descompasso com as forças da vida e a tendência é que ela saia das mãos daquele que não cumpre sua função.

O que é função social?

Todos que possuem uma casa e a utilizam para desenvolver sua vida, se alimentando, cozinhando, estudando, cuidando da higiene, dormindo, fazendo seus trabalhos, convivendo, adquirindo cultura, se divertindo, etc. está garantindo que sua propriedade cumpra essa função.

Se alguém possui muito dinheiro e é dono de uma grande fábrica, e com todo dinheiro das vendas ele: remunera seus funcionários de forma justa, cuida da manutenção, investe em pesquisa e nas pessoas, distribui os lucros de forma justa, produz algo útil ao bem-estar das pessoas sem atropelas princípios ecológicos, entre outros detalhes, essa pessoa garante que sua propriedade exerce função social.

Como se vê, é possível possuir muito e ser merecedor desse muito. Mas não podemos fazer mau uso dos recursos. Eles devem, de alguma forma, servir ao progresso da civilização, seja na forma de empregos dignos, salários satisfatórios, investimentos (sociais, infraestrutura ou pesquisa) ou caridade.

Guilherme Boulos nos dá uma ideia do que é de fato um movimento social. Na entrevista abaixo (de mais de 1 hora) temos a oportunidade de ver como é por dentro um acampamento do MTST, e porque esse tipo de associação existe.


(aqui podemos ter a oportunidade de compreender melhor
a realidade de quem não tem teto. muitas desmistificações.)

O problema ocorre quando a propriedade não cumpre essa função. A partir daí vemos a ineficiência, o egoísmo em ação. Propriedades que nada produzem. Não ocupadas por ninguém. Ou que servem a interesses que drenam a capacidade econômica de uma comunidade, nada produzindo de bens e serviços - e servindo de intermediários de operações financeiras, com altas taxas de juros (existem vários tipos, como de comércio, cheque especial, cartão de crédito, etc.). Esse tipo de propriedade não serve à sociedade e portanto está prejudicando-a. Os movimentos sociais como o MST e o MTST ocupam propriedades improdutivas e ilegais, que não cumprem função social.

Esse conceitos devem ser trabalhados nas mentes. Julgamos sem conhecimento de causa. 

Nos apoiamos no que mais é dito e mais é cômodo acreditar, e assim o ser humano serve de ferramenta do diabo.

Nesse aspecto começamos a perceber a relação entre Justiça Social e os ensinamentos de Cristo.

“Trust none of what you hear, some of what you read, and half of what you see.”  
—  Nassim Taleb
("Não confie no que você ouve, confie um pouco no que você lê, confie em metade do que você lê ")

Tudo está sujeito a desenvolvimentos. Este texto aqui inclusive! O próprio Ubaldi, que trouxe a visão mais abrangente, profunda e detalhada da fenomenologia evolutiva, da dor, de nossa origem e nosso fim, abraçando todas formas de saber e manifestação para se exprimir, disse que ainda restam paradoxos a serem explicados, e devem surgir seres que irão absorver todas essas teorias, compreendê-las e ir além.

Estamos muito longes de compreender a Realidade - a Física quântica e a Cosmologia nos mostram isso a cada dia.

É por isso que devemos manter a mente aberta a muitas ideias e rever com cuidado a História - sujeita a muitas interpretações.

Referências
[1] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com/2017/11/o-farao-monista.html
[2] https://pt.wikipedia.org/wiki/Or%C3%ADgenes
[3] https://pt.wikipedia.org/wiki/Baruch_Espinoza
[4] https://www.monbiot.com/2019/04/30/the-problem-is-capitalism/
[5] https://www.infoescola.com/historia/abolicao-da-escravidao-pela-inglaterra/
[6] https://www.google.com/search?q=metas+da+ONU&oq=metas+da+ONU&aqs=chrome..69i57j0l5.2020j0j7&sourceid=chrome&ie=UTF-8
[7] https://www.google.com/search?q=pegada+ecol%C3%B3gica&oq=pegada+ecol%C3%B3gica&aqs=chrome..69i57j69i60l2j69i61l2.2214j0j4&sourceid=chrome&ie=UTF-8
[8] https://www.theverge.com/2019/3/10/18258134/alexandria-ocasio-cortez-automation-sxsw-2019
[9] https://medium.com/utopiapress/the-end-of-capitalism-7f791f44bce1

quinta-feira, 13 de junho de 2019

Patologia e Sublimação

A doença é vista como sinal de fraqueza do organismo físico. É sentida como algo 100% maléfico. Deletéria. Sem sentido. Uma grande infelicidade para quem é assolado pelos vírus inúmeros que compõem nosso rico ambiente microscópico aéreo. Mas ela não é um mal, mas a reação a um agente que se instalou no organismo. 

Quando vamos travar uma batalha pela superação. Quando nos propomos a iniciar um projeto de vida completamente novo, que nos possibilite um aprendizado sem igual, - a aquisição de uma nova perspectiva do todo e a assimilação de novas habilidades - a tarefa é árdua. A cada passo um obstáculo. Tentativas externas de nos desviar do caminho. De várias formas. E para vencer essas barreiras é preciso dispor de energias e canalizá-las, de tempos em tempos, para superar esses males pontuais que nos assolam - muitas vezes de maneira desesperadora, nos momentos em que mais precisamos usar nossa energia, tempo, vontade e criatividade em ocupações mais elevadas e úteis.

O sol mostra seu esplendor antes de sair de cena.
É nos momentos que precedem a morte que o sublime
se revela. No dia seguinte o astro renasce. Um ciclo que
se repete ao longo do processo evolutivo.
As células de defesa começam sua tarefa assim que algo anormal é detectado. Os macrófagos capturam as substâncias estranhas encontradas no interior do organismo e alertam o sistema imunitário sobre a invasão. Os linfócitos T (glóbulos brancos) emitem outro sinal ao organismo, para enfatizar e especificar, recebidos pelos linfócitos B (também glóbulos brancos), que começam a agir. Assim anticorpos são produzidos. De vários tipos. Trata-se de substâncias específicas que irão englobar os agentes estranhos, destruindo-os dentro de um período de tempo natural ao organismo. 

O sistema imunológico, após o ataque, produz células capazes de memorizar o anticorpo utilizado. Um banco de dados vai sendo criado ao longo do tempo, à medida que o histórico de ataques e defesas, numa grande batalha microscópica, à nível biológico, se avoluma, criando uma memória celular automática. "Células de memória" é o nome dado a esses minúsculos organismos com função específica. Assim, da próxima vez, se houver um caso semelhante, com os mesmos agentes invasores, o organismo - já experienciado pelas dores e fadigas - saberá lidar de forma mais eficiente e rápida ao ataque. Chega-se à conclusão de que ser atacado é bom porque fortalece o organismo. 

Essa memória celular pode estar relacionada com o psiquismo de determinado indivíduo. A vontade e o dinamismo orientado podem ser fatores que - de alguma forma inexplicável ainda - dão orientação e potência a esse processo regenerador, levando a uma cura mais rápida e tornando o organismo mais resiliente e menos temeroso às doenças. A partir dessa ótica podemos começar a estabelecer uma relação profunda (sem explicação científica ainda) entre patologia e sublimação.

Sublimação, como se sabe, é o fenômeno em que matéria no estado sólido se torna gasosa, o que conhecemos como mudança de estado. A substância é a mesma, mas sua forma de manifestação muda, e com isso algumas propriedades. Isso nos mostra que a alteração de propriedades de fluídos (por exemplo) não significa que ele deixou de ser o que é. Sua natureza permanece a mesma, isto é, sua constituição química, com as ligações inter-atômicas que caraterizam e dão coesão à estrutura molecular, revelando um tipo de composto químico.

Tomar um chá quente seguido de um repouso
integral. É preciso ter um organismo já
robustecido pelas dores. A questão não é
deixar de "pegar" a doença. O ponto é
absorver a doença melhor e mais rapidamente.
O mesmo termo também é usado em termos místicos, quando se discorre sobre o fenômeno de purificação interior de um ser humano. Ou seja, no momento em que é superado por definitivo um aspecto de nossas natureza, dizemos que ocorreu um processo de sublimação. Ou seja, o ser se tornou mais imaterial - em sua maneira de perceber os fenômenos, em termos de agilidade ao lidar com tudo, em termos de suavidade ao perceber os detalhes que escapam aos olhos comuns, e mesmo à Inteligência Artificial. 

O místico é, por excelência, um ser que superou definitivamente os instintos que nós, humanos, temos ainda arraigados, em menor ou maior grau. Instintos, hábitos e vícios que nos prendem às coisas do mundo, tornando-nos distraídos e fracos. Desorientados e com pouca potência de atuação perante os temas realmente importantes. Para quem deseja saber mais sobre o fenômeno recomendo (como quase sempre) a formidável obra ubaldiana [2], farol da humanidade futura. 

Fui atacado por intensa gripe há alguns meses. 

O ciclo da gripe dura entre 7 a 10 dias. Nas primeiras 72 horas o infectado sofre com febre. Depois, os sintomas respiratórios se tornam mais evidentes e devem perdurar por mais alguns dias [3]. Meu ciclo completo nasceu, se desenvolveu e findou em 48 horas. Sendo que 24 horas depois o meu organismo já estava de 80 a 90% recuperado. 

O que ocorreu?

Esse evento já foi descrito alhures [4]. Considerando esse "machine learning" biológico, a nível de sistema imunológico, podemos perceber que houve uma evolução na forma de abordar a gripe: ontem sofri uma constipação de mesmo tipo. Tudo indica que o vírus da gripe estava instalado: início de uma febre acima dos 38 ºC, dor muscular e cansaço tremendo, somada a uma leve dor de cabeça a indisposição para fazer qualquer atividade. Os sintomas começaram a se manifestar 16 horas - início das duas últimas aulas do dia. Chegando em casa (18h15) jantei e tomei um chá de camomila. Passei as próximas três horas em silêncio absoluto no sofá, descansando, ora numa posição ora noutra. Depois fiquei assistindo alguns documentários (um de Inteligência Artificial [5], e outro TED Talk com Yanis Yaroufakis, ex-ministro das finanças da Grécia, [6]). Fui dormir com as vias nasais congestionadas e muito cansaço.

Ao longo da noite passei por uma onda de calor intensa. Sudorese extrema. Quando despertei, me senti tonto, quase desmaiando. Deitei no sofá e retomei meu centro. Fiquei assim de 20 a 30 minutos. Não sabia se o sintomia iria persistir, mas descansei, fechando os olhos e não pensando em nada. Esqueci o fluir do tempo e as obrigações (muito mais manias cotidianas do que trabalho efetivo). Levantei novamente e fui tomar café da manhã. Dois pedaços de pão italiano e meio copo de leite morno com uma pitada de todinho. Depois, salada de frutas. Minha esposa já estava desperta - e um pouco preocupada. Eu falei que não iria tomar nenhum medicamento.

Uma boa alimentação: equilibrada,
suficiente, nutritiva. Além disso, viver num
ambiente físico e cultural adequado à
sua natureza. Todas essas coisas auxiliam
na sublimação. 
Passada meia hora passei o fio dental, escovei os dentes com muita calma, e permaneci um pouco de pé. Contemplei a eternidade antes de mergulhar no turbilhão do tempo que arrasta a todos (e tudo) sem piedade. Liguei o computador e comecei a fazer algumas atividades. Me sentia normal, sem problemas. Fora curado.

O intervalo de tempo desde o início da manifestação até o término não passou de 18 horas. 

Nesse exato momento (16h15 do dia seguinte) só existem resíduos. Um pouco de obstrução das vias nasais. Nada mais.

O fenômeno parece ter ciclos cada vez mais breves. O organismo, como todos, continua sujeito aos mesmos riscos do que os outros. Mas parece lidar de uma forma cada vez mais eficaz, férrea e ordenada.

1º caso de gripe, 14/08/2018 (48h)
2º caso de gripe, 11/06/2019 (18h)

Estarei diante de um fenômeno raro? Tudo indica que o caso vai contra a força das estatísticas, que reúne inúmeros casos e possui uma faixa de máximo e mínimo admissível.

Leio neste momento uma informação que atesta isso:

"Os efeitos da gripe são muito mais graves e duram muito mais tempo do que os da constipação. A maior parte das pessoas recupera completamente ao fim de uma ou duas semanas, embora algumas possam desenvolver complicações com risco de vida, como a pneumonia. Por este motivo, a gripe pode ser fatal, especialmente entre os grupos mais debilitados, como as as crianças, os idosos ou pessoas com doenças crónicas.[49] " [Wikipedia, https://pt.wikipedia.org/wiki/Gripe#Mecanismo]
(grifos meus)

Sinto em meu íntimo um dinamismo que encontra dificuldade em se manifestar de maneira ordenada e construtiva - mesmo para edificar concepções abstratas. Isso pode ser reflexo - ou auxiliar - no comportamento celular, a nível orgânico. Nível que já atingiu o comportamento de perfeição, automático. Tudo praticamente estabelecido. O que me parece passível de otimização é justamente esse refinamento celular, que consegue agir de maneira mais rápida, com pequenos diferenciais energéticos celulares que são - com uma pitada de acúmulo e ordenação da memória - capazes (ao que me parece) de combater num período curto de tempo agentes invasores. 

Esses momentos curtos de incômodo intenso trazem grande tristeza para o autor, que fica privado de desenvolver seus trabalhos - até em pensamento. Mas após o ciclo sente-se uma renovação completa do organismo. O processo parece ser tão mais intenso quanto mais curto. Como se houvesse uma lei que deva garantir uma relação especial entre duração do ciclo e ferocidade dos combates celulares. Alta potência para uma breve e intensa experiência.

Tudo se resume a descanso prolongado e profundo, moderação na alimentação e uso de meios naturais (chás, alimentos leves). Nada artificial trará solução. Haverá na melhor das hipóteses um alívio.

Dessa forma resta a dúvida: o que ocorreu é normal? existem casos semelhantes? há uma explicação que a medicina conheça?

De pouco em pouco passa-se a adquirir uma visão mais profunda dos acontecimentos da vida. Percebe-se um significado bem definido, oculto no íntimo dos acontecimentos, que é cada vez mais sentido por aqueles que muito foram macerados e souberam viver sua dor cara a cara, usando-a como espelho para se auto-reformar.

Estabelece-se assim um elo muito profundo entre patologia e sublimação.

Referências:

terça-feira, 11 de junho de 2019

Dois tipos de Consciência

À medida que as experiências da vida se repetem e avolumam, o ser consciente vai sofrendo e - ao mesmo tempo - reordenando sua forma de perceber as coisas. Novas ideias vão surgindo. Os impulsos que viabilizam a criação de novos projetos, eventos e iniciativas se dão de forma mais pronunciada e intensa. Essas assimilações vão sendo trabalhadas de forma muito diferente no consciente dessa criatura, que se recusa a recorrer às reações convencionais e "soluções" que o mundo apresenta. Trata-se de desenvolver a sensibilidade psíquico-nervosa e deixar de lado a ânsia por buscar uma atuação eficaz, que agrade o mundo e permita uma socialização agradável a todos. 

O desprezo humano não tem limites. Assim como a falta de sensibilidade. As pessoas tendem a construir uma visão de mundo e das pessoas baseada naquilo que mais esteja em ressonância com seus instintos (subconsciente). O que mais os atinge na superfície é o que irá conduzir a vida dessas pessoas. Imensa maioria da humanidade. Movida por sensações e barulhos. Por lógicas restritas, simples e práticas. Capazes de serem assimiladas sem um esforço mental. Sem a necessidade de passar por uma contemplação. Sem a necessidade (árdua) de passar por uma experiência desagradável para perceber melhor como funciona de fato a realidade. 

O olhar do ser consciente possui uma potência
indescritível, capaz de silenciar canhões e difamações.
Photo by Alexandru Zdrobău on Unsplash
O autor vive num mundo muito estranho à sua natureza íntima. Quando começa a desenvolver suas ideias se vê sozinho, sem auxílio. Seus projetos de materializar planos que estão em sua mente encontram pouca recepção. Deve fazer tudo por conta própria. Deve criar o seu mundo. Isso vêm ocorrendo de forma progressiva e orientada. A vontade de se libertar das superfluidades do ambiente é tão intensa que acaba-se forjando textos, cursos, projetos e planos para o futuro, de modo a criar um ambiente que lhe seja propício. Um ambiente em que seja livre para discorrer sobre os assuntos que lhe são mais caros. Para viver de acordo com outras leis. Isso lhe permite continuar vivendo nesse inferno terrestre, onde o semelhante pouquíssimo se interessa por grandes delineamentos, por análises profundas e em expor sua intenção. Piadas predominam. Conversas sérias e sinceras são como a biodiversidade: diminuem. Talvez em alguns locais hajam bolsões em que esteja despertando uma consciência de profundidade capaz de dar alguma esperança àqueles que se encontram isolados. Mas o fato é: quanto mais alguém se aprofunda no fenômeno da vida, da evolução e da vivência, mais deve caminhar por conta própria - ninguém se encontra em seu plano para compreendê-lo. Nesse momento observo uma das frases de Ubaldi que tenho colada à minha parede:

"Aquele que se lança através de certos caminhos deve perder o apoio da compreensão humana. Deve, num certo ponto de seu caminho, encontrar-se só, porque ninguém está em seu plano."
Ascese Mística - Pietro Ubaldi

No espaço público tem-se pouca oportunidade de encontrar bolsões de reflexão (teoria) e vivência (prática). O que mais interessa não são as práticas com objetos, mas viver na pele teorias do universo moral e espiritual. O laboratório da vida é aquele que mais oferece possibilidades de aprendizado. Isso foi o que Ubaldi confirmou e transcreveu - e o que o autor está percebendo. 

Ontem foi um dia em que houve a possibilidade de viver um pouco mais abertamente durante a aula. Um diálogo muito interessante com um aluno surgiu. Partindo da automação e digitalização, alçou-se voo para questões muito além, traçando implicações e possibilidades. Os colegas, ao redor, olhavam e achavam engraçado tudo aquilo. 

Quando um ser tem em seu íntimo uma vontade ardente de resolver os problemas fundamentais da vida, e manifesta isso de forma enérgica e criativa quando pode, com outro, o mundo tende a se ater à forma e deixar de lado o conteúdo. A intensidade da fala, o tom, os vocábulos, a empolgação, a vontade irresistível de desdobrar linhas de pensamento e esboçar possibilidades de vida acabam sendo filtrados pela mente do involuído. Resta apenas um ser esquisito, estranho e engraçado até. Alguns classificariam como imbecil. Enquanto isso temos um mundo em que a temperatura média global deve atingir algo em torno de 2ºC acima da original (1850); com a maior concentração de renda da história (ver relatórios da Oxfam); com perda de biodiversidade alarmante; em que muitos não tem perspectiva, cultura ou alimento. Um mundo com menos acesso à medicina de qualidade e menor vontade de estudar e investigar a realidade profunda que nos governa. 

É importante se associar intimamente com as pessoas mais
aptas à nossa evolução. Isso implica em se unir a pessoas
que transmitam uma tranquilidade para você desenvolver seu
modo se ser. Laura_Santana - Couple
A Física quântica aponta para a imortalidade da consciência, tornando-a causa do organismo físico; a Astronomia retoma os vocábulos dos criacionistas; a Inteligência Artificial aponta para uma reorganização social e clama pela necessidade da ética e da filosofia; os relacionamentos líquidos (alguns gasosos) demoram para criar novos estilos de relacionamentos sólidos; as religiões se combatem e ainda não percebem o fio condutor que pode irmaná-las todas; a mídia e as tecnologias serviram muito mais à alienação do que ao avanço do ser. Há tantas coisas tão interessantes que não são abordadas com a devida paixão e seriedade, que aquele que já percebeu o telefinalismo só pode caminhar por conta e emitir vibrações através de sua atitude e dedicação. 

Não se trata de ter repugnância nem senso de arrogância. Trata-se de não encontrar ressonância. Isso abala aqueles que tem em seu imo um desejo irresistível de se unir à consciência de seu irmão, em profundidade, forjando novas formas de vida e traçando novas estradas. O outro deseja interagir como qualquer um. Mas a sua interação é de superfície. De sensações. De piadas. Com prazeres efêmeros - sem esforços exigentes. Não é uma interação de profundidade, que visa desgastar a vida exterior para criar-se uma nova vida interior. Cansa-se, mas com um sentido animador. Atrita-se, mas com uma finalidade superior. Ousa-se, mas com uma orientação inteligente. É uma interação que incomoda o mundo. Interação investigativa, crítica, apaixonada, destemida. Uma forma de intercambiar experiências baseada em avanços pronunciados rumo à compreensão do fenômeno evolutivo. 

À medida que se retoma conceitos antigos e se repetem experiências, sempre há algo de diferente. O autor se lança, aos poucos, na experiência de ensinar assuntos diferentes, para públicos distintos, em épocas de mudança. Sua forma de falar evolui e sua sinceridade á cada vez mais natural e destemida. Sofre, mas sente uma conquista que não pode descrever. Olha para o lado e seus colegas possuem uma vida relativamente tranquila - que inveja! muitos diriam. E abandonariam o método da psicologia de profundidade. Mas nessa tranquilidade jaz uma coisa mórbida. Algo que trava o ser, mantendo sua mente fechada a novas ideias e num ciclo de experiências que se repetem além da conta. Hábitos que se enraizaram. Conservadorismo excessivo. Estabilidade num nível baixo. Essa forma de viver é muito limitada para quem deseja transcender o mundo. Para solucionar as questões fundamentais há de se livrar dos métodos do mundo - recusar os prazeres e aceitar o desprezo do mesmo, que não compreendendo essa busca decida jogar o ser ao lado, ignorando-o e desprezando-o quando chegam os momentos das piadas. 

Muitos usam o lado esquerdo. Outros usam o lado direito.
Quantos usam ambos, simultaneamente?
Quantos usam da melhor forma?
Queremos chegar à intuição consciente ou não?
There is Unlimited Power Between Your Ears — 
Photo by ElisaRiva
Há um quê de belo num sofrimento imbuído de significado. Há uma pitada de eternidade naqueles que persistem sem pensar na sua reputação. A única regra é não violar direitos humanos. Um salto de fé implica em não medir consequências para se comprovar uma verdade que está se remexendo no íntimo. Usar a vida para perceber a realidade da Lei de Deus. 

Um novo curso vêm à mente. Dessa vez irá ocorrer um avanço mais ousado, no terreno do monismo. Torná-lo oficial de forma a repassar às pessoas uma nova visão de Deus e do Universo. Paralelamente um convite para organizar um evento relacionado à arte que o ser mais gosta: o cinema. A mente fervilha de ideias. Os dedos não conseguem se conter, transcrevendo as visões que se projetam em horas de desespero e incompreensão. 

O mundo, ao ignorar, dá novas ideias. Corretamente interpretado, o autor percebe que as reações mundanas são um aviso para ele, de fato, cuidar de sua vida. Só que essa "vida" é uma vida universal, presente em todas criaturas e que embala todos os fenômenos rumo a uma meta suprema: o Sistema (S), ou Reino de Deus.

Assim, o meio serve como um termômetro que avisa que não deseja ser incomodado com questões de profundidade. A superfície é mais visível, barulhenta e prazerosa. 

Existe a possibilidade de se estar errado. Mas todas reações, por mais brutais e insensíveis que possam parecer, escondem em si um olhar de admiração profunda, que ninguém consegue descrever ou admitir. Alguns jamais irão fazê-lo, mas quando se olha à fundo no íntimo...nessas janelas da alma (olhos), frente à frente, sem medo, vendo a essência do outro...percebe-se que o seu caminho é rumo à ascensão. De forma mais pronunciada - e por isso mais sofrido, demandando um maior estofo espiritual. Sobre essa capacidade de olhar a essência dos outros (o poder do olhar) e paralisar as forças do ego, essa cena de Ben-Hur pode dar uma ideia sobre o que se trata:


Cristo teve uma vivência tão profunda que apenas agora estamos compreendendo do que realmente se trata. Enquanto não percebermos essas coisas e suas infinitas derivações, de nada adiantará continuar com as piadas e os artifícios: a evolução se dará dolorosamente. A escolha é nossa - assim como o esforço.

Quem vence a si mesmo é quem mais falha - porque se lança sem medo ao desafio da evolução. 

Abrir-se à possibilidade do engano é a maior força que alguém pode ter. São as constantes reconstruções decorrentes da vivência que regeneram a divindade perdida da criatura.

Vencer o mundo é superá-lo em suas dimensões. Cada vez mais me convenço disso.

A consciência de profundidade só estará tranquila quando as outras (de superfície) alcançarem-na. Retroceder jamais é uma opção. Deve-se persistir no caminho ascensional, cumprindo o dever de mostrar aos outros o que existe além e aquém da restrita superfície. Quem viveu o fenômeno do milagre não pode abandonar sua busca.

Busca infinita num mundo finito...

sábado, 8 de junho de 2019

1.2. Desenvolvimento econômico

Meios e fins da vida

Pensamento econômico

Indicadores de desenvolvimento - PIB

Indicadores de desenvolvimento - IDH

Indicadores de desenvolvimento - Coeficiente de Gini

Indicadores de desenvolvimento - FIB

quinta-feira, 6 de junho de 2019

Movimentos Fenomênicos

A trajetória dos movimentos fenomênicos, revelada por Sua Voz, é o primeiro passo para jungir as mais avançadas conclusões da ciência com as centenas (se não milhares) de crenças e mitos que sempre acompanharam os povos da humanidade. Através da magnífica prosa poética de A Grande Sìntese, ficou comprovado que a evolução, em seu sentido lato, é um processo cíclico, oscilante e ascensional

A galáxia de Andrômeda está a 2,5 milhões de anos-luz da
nossa Via Láctea. Ambas estão em rota de colisão. Dentro
de algumas centenas de milhões de anos isso deve ocorrer.
O que explica tamanha destruição a não ser o fato de nosso
universo ser o emborcamento de um outro (universo)
perfeito - o divino?
Em sua circularidade ele atesta uma periodicidade caraterística. Vemos isso no movimento dos astros; nas repetições de vícios, hábitos e formalidades cotidianas; na reprodução dos seres vivos; nas estações do ano; nas eras glaciais; no metabolismo celular; na oscilação de regimes políticos; nos resgates de ideias pela ciência - e de visões de mundo pela religião. A História possui em seu devenir uma série de repetições. Mas cada novo retorno de posição traz um diferencial sutil que o distingue do que ocorreu. Esse delta caracteriza a ascensão - ou abertura desse círculo. Constata-se que estamos inseridos num ritmo universal descrito graficamente por uma espiral. Uma forma que observamos por toda natureza viva e não-viva. Uma forma que permeia e descreve diversos fenômenos humanos, desde o indivíduo até a coletividade. Mas a teoria da queda adiciona um novo elemento a esse aspecto já conhecido por muitos antigos: a dualidade

Percebemos que nosso universo é regido por um confronto entre forças destrutivas, que desejam realizar sua "vontade", e um pensamento construtivo, que domina essas forças em seu íntimo, criando uma ordem apenas visível a longo prazo e com olhares profundos, capazes de vislumbrar outros planos de existência. Um pensamento que não constrange, mas coordena. Um pensamento que age na intimidade e (por isso) não se preocupa com prazos e resultados - porque está além do espaço-tempo. Assistimos assim a uma verdadeira batalha entre uma vontade de gerar caos e outra de ordenar tudo. A primeira é a vontade do Anti-Sistema (AS), gerado com a queda. A outra é o domínio do Sistema (S), que torna-se real à medida que estudamos os recônditos do mundo subatômico e os desconhecidos dos limites cósmicos. Nos dois extremos (mecânica quântica e relatividade) transparece a impotência das nossas fórmulas clássicas e de nossa tríade de paradigmas (objetividade, simplicidade e estabilidade) [1].

O AS clama por destruição. O S aponta para reorganização. Nesse embate entre Bem e Mal, extrai-se uma tendência. Essa tendência é evolução, progresso, melhoria, ascensão, libertação, conscientização, potência. Um ritmo de 3 para 2 (3:2), segundo o magnífico Pedro Orlando (1936-2014) [2]. A cada três degraus de ascensão, dois de retrocesso, completando um ciclo, que se dá em várias escalas, formas e locais. Do infinito negativo ao infinito positivo, a tendência é predominante.

Um olhar para o infinito. A postura diz tudo.
Ninguém compreende. O mundo apenas estranha.
Não tem palavras, não tem reação à altura...
Busca infinita num mundo finito...[3].
Assim percebemos uma espiral que oscila, dando uma característica de quebra. Assim a descrição está completa e se encaixa na fenomenologia universal. A lei que rege o universo físico-dinâmico-psíquico, em sua forma geral, pode ser usada como espinha dorsal para a compreensão dos fenômenos mais díspares.

Orlando explica com suas palavras os profundos conceitos captados por Ubaldi. O Universo é (simultaneamente) simples e complexo:

- Simples nos seus fundamentos conceituais.
- Complexo na sua organização.

Logo, para estudá-lo, devemos usar as ferramentas da mais avançada física-matemática aliadas às intuições da mais sincera teologia e filosofia. Uma complexidade organizada que aponta para uma simplicidade conceitual. A Lei das Unidades Coletivas atesta que
"Cada individualidade é composta de individualidades menores, que são agregados de individualidades ainda menores, até o infinito negativo; por sua vez, é elemento constitutivo de individualidades maiores, as quais são de outras ainda maiores, até o infinito positivo."
Essa lei, em seu aspecto dinâmico (energia), ganha o nome de Lei dos Ciclos Múltiplos e é definida (por Ubaldi) como:
"Cada ciclo é determinado pelo desenvolvimento de ciclos menores, que são a resultante do desenvolvimento de ciclos ainda menores, até o infinito negativo; por sua vez, é a determinante do desenvolvimento de ciclos maiores, que por sua vez o são de ciclos ainda maiores, até o infinito positivo."
Ciclos contidos um dentro do outro. No espaço, no tempo, no pensamento.

A evolução aponta que existe uma tendência em aglutinar unidades em grupos cada vez mais organizados e complexos, capazes de lidar com maiores contradições sem se desmembrar. A partir desse prisma podemos observar o ser humano, cujo organismo físico praticamente já atingiu seu máximo desenvolvimento. Começa-se a delinear os primeiros ensaios de um mundo psíquico, imaterial, que aponta para conquista de inteligências mais sutis. Trata-se de uma capacidade de vislumbrar uma realidade maior, percebendo relações e fins mais sustentáveis. Busca-se integrar os saberes e inseri-los no campo das experiências. As formalidades só valem quando se é preciso transmitir essa realidade mais densa para um público mais próximo.

É preciso observar o mundo com outras lentes. A da
objetividade não é mais suficiente. Não pode-se mais descartar
visão criacionista nem a hipótese da realidade do espírito.
A consciência é íntegra e imaterial, independente (em parte)
do organismo físico.
Ubaldi diz que o próprio conceito de relativo clama por outro, de absoluto, sem o qual o primeiro não tem sua razão de existir. Na vida todos traçamos metas - mesmo que estas sejam equivocadas ou muito limitadas. Hierarquizamos nossos objetivos. Até comparamos com o de outros. Premissas superficiais levam a resultados temporários e ilusórios, apesar de pequenos ganhos momentâneos. À medida que a finalidade se torna mais ousada, transcendendo planos existentes, arranhando o superconcebível, os métodos se tornam mais estranhos ao mundo. A maneira de conceber a vida e as relações muda para esse ser. Em sua jornada - em alguns casos missionária - a criatura se dá conta de que não pode contar com a compreensão do mundo. Se vê completamente abandonada pelas forças do mundo. Incompreendida, desprezada e (não raro) vilipendiada. Deve recorrer às suas parcas qualidades, que apenas ganharão força e resiliência com a sua abertura para o Alto. O diálogo com Deus é o combustível espiritual que preenche de significado as atitudes e pensamentos desse ser raro. Tão mais raro quanto mais insiste em resolver problemas insolúveis - ao menos em sua aparência.

O mundo recorre a métodos consolidados que não mais servem às aspirações emergentes. 

Giordano Bruno abriu caminho para a ciência progredir - morreu corporalmente para dar vazão ao fluxo do conhecimento científico.

Newton conjugou os conhecimentos de Galileu, Kepler e outros grandes nomes para formular uma descrição geral do universo. Descartes se alinha a isso e cria sua visão cartesiana. Ambos se aliam à concepção de mundo de Demócrito: o universo o infinito e eterno, uma grande máquina plena de matéria que pode ser descrita por nossa mente racional.

Einstein supera Newton, concatenando espaço com tempo, numa malha. Niels Bohr, De Broglie e Cia inauguram a Física quântica, revelando que o íntimo da matéria é um grande vazio (!). O que nossos sentidos capturam é ilusão. Coisas "reais" são criadas do "nada". Um campo de probabilidades, cheio de possibilidades.

Alexander Friedmann, um cosmólogo russo, derivando as equações de Campo de Einstein, atestando que o universo pode estar se expandindo, colocando em cheque o modelo de "universo estático" do pai da relatividade.


Georges Lemaître fornece as bases para a teoria do Big Bang. A ciência resgata os conceitos criacionistas. O nosso infinito é relativo, portanto limitado e com fim estabelecido. Atingir o infinito significa superar a finitude de nosso universo, entrando no reino do absoluto, em que inexiste passado, futuro e local. Os infinitos para menos e para o mais que percebemos nos limites do mundo subatômico (dimensões e massas reduzidíssimas) e no mundo sideral (grandes massas, velocidades, energias e distâncias) são fechados. Isto é, não é com nossos métodos e ferramentas que atingiremos a solução dos últimos problemas. Imperativo é criar uma mentalidade completamente nova. Amar o fenômeno, tornando-se parte dele.

Continuamos a nossa jornada
nos extremos. E percebemos
nossas limitações. Precisamos
nos transformar para continuar...
A união da alma do místico com os fenômenos da natureza forjam um tipo de inteligência que não pode ser avaliada pela lógica hodierna e pelos modelos da racionalidade imperante. 

A solução está na superação.

Daí em diante a grande questão dos físicos é relacionar as quatro forças fundamentais do universo (forte, fraca, eletromagnética e gravitacional) numa única formulação matemática. A Teoria das Cordas é um modelo físico-matemático que se propõe a auxiliar nessa unificação. Nela os blocos fundamentais não são mais partículas, mas objetos extensos unidimensionais, extremamente pequenos, perceptíveis aquém de uma escala subatômica. Cada modo de vibração dessas cordas geraria um campo, que acaba se plasmando numa substância. Eis a estequiogênsese! O problema é que, devido às dimensões e imaterialidade envolvida, a teoria não pode ser testada. Os experimentos da ciência atual são limitados pela materialidade real e mental das pessoas. Os físicos modernos são verdadeiros místicos da ciência dura, adentrando num campo desconhecido com linguagem teológica na descrição dos fenômenos e formulação das hipóteses.

Ciência e Religião estão prestes a se reencontrar...

Usando a mentalidade intelectual (raciocínio) o Universo foi criado do nada - portanto Deus é excluído das possibilidades.

Com  o despertar da consciência seremos capazes de adentrar de forma segura nesse "nada". E conseguindo controlar a intuição (intuição consciente), como Ubaldi fez em sua maturação interior (ascese), o "nada" se tornará o absoluto. E tudo aqui presente (relativo), que nasce e morre, que ilude e engana, será visto a partir de um prisma profundo e vasto, superando as limitações em todos os níveis.

Pedro Orlando esboça a evolução do psiquismo [4]:

Evolução do Psiquismo
ISensibilidade Vegetal
IIInstinto Animal
IIIIntuição Inconsciente
IVRaciocínio
VConsciência
VIIntuição Consciente ou Superconsciência
VIIConsciência Unitária

Assim como os elementos químicos, as formas de energia, as suas variações, os sons (oitavas da música), a classificação taxionômica da biologia, os filos do reino animal, entre outras, o psiquismo também pode ser subdividido em oitavas.

Já temos uma noção da intuição. Mas ela ainda é inconsciente. Muitos gênios, santos, pensadores e grandes líderes entram num estado que permite intuir coisas. Eles se colocam em estado receptivo - apesar de não controlarem e selecionarem de forma ordenada o que vem de outra região..

A ciência sistêmica aponta para a consolidação da consciência. Ela diz que precisamos nos unir. Colaboracionismo é o futuro. Para gerarmos uma inteligência coletiva, unitária e harmônica, devemos criar um novo organismo coletivo. A raça humana deve se unir e caminhar junta, resolvendo o problema econômico, social e energético - para que possa avançar em terrenos muito mais interessantes (espírito, amor, arte, etc.).

Carl G. Jung intuiu inconscientemente o que a consciência já sabe:

"A criação é ao mesmo tempo destruição e construção."

Ou seja, a criação no AS é uma ascensão em que forças do mesmo (destruição) se confrontam com forças de outro universo (S), perfeito e que possui a vitória final.

Se alguém parar para refletir sobre todos esses conceitos perceberá que se trata de algo fascinante e sério. Ou seja, que é deslumbrante à alma e essencial à mente moderna.

Quanto mais o mundo ignora e persegue o ser que busca ascender, mais este encontra formas de se auto-impulsionar rumo ao S.

Quanto mais alto na escala evolutiva, mais irresistível é o ímpeto de ascensão.

Nada impede o ser.

O exemplo máximo (conhecido) é Cristo, que com seu exemplo mostrou o passo final para se reintegrar ao S. O AS, percebendo que iria perder um elemento, fez de tudo para mantê-lo preso no finito e relativo, oferecendo todas as benesses do mundo.

Compreenda-o quem o puder...

Referências
[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Pensamento_sist%C3%AAmico
[2] http://monismo.net/coment26.html
[3] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com/2015/07/busca-infinita-num-mundo-finito.html
[4] http://monismo.net/coment19.html
[5] http://monismo.net/Construtivo_ou_Destrutivo.html

terça-feira, 4 de junho de 2019

Werk ohne Autor

O último filme do diretor Florian Henckel Von Donnersmarck, "Nunca deixe de lembrar" (Werk ohne Autor) [1], comprova que estamos diante de um verdadeiro cineasta, que ainda poderá nos brindar com muitos filmes profundos, que abordem o aspecto intuitivo, humano e evolutivo das pessoas. Tudo a partir de um determinado contexto histórico, com personagens próximos a nós espectadores. Que compartilham os mesmos anseios e dramas, expectativas e asperezas, glórias e derrotas, que nós, pessoas comuns - mas com um olhar profundo sobre o significado dos acontecimentos, seus desdobramentos e possibilidades.

Não se pode assistir a um filme cuja proposta seja explicitar características humanas do subconsciente e superconsciente com um olhar calcado na racionalidade. É necessário sentir de uma forma orientada o que está sendo passado através de cenas, gestos, olhares, música e - acima de tudo - desencadear de eventos. Aparentemente desconexos. Sutilmente orquestrados. Sublimemente organizados. 

Kurt e sua tia, que levou o sobrinho para visitar um museu
de arte.  Almas desde o início em ressonância. 
O cineasta de "A Vida dos Outros" [2] dessa vez foca em duas histórias, a partir de membros de duas famílias, que se chocam e se distanciam periodicamente no devenir dos acontecimentos brutais da História. Os personagens se revelam à medida que o tempo se desdobra, trazendo acontecimentos que afetam. Cada qual tem a sua natureza íntima e constrói sua mentalidade (valores, planos e ideias) a partir do que é. 

De um lado temos um médico alemão que supostamente não age em prol de nenhum ideal. Ele vê o mundo como uma realidade triste na qual cada um deve buscar de adequar ao meio. Aos infelizes e fracos, dor e miséria - aos astutos e fortes, as posições confortáveis e o domínio sobre o restante. O custo do domínio é deixar de sonhar e cooperar com o grupo que estiver no poder. A ética é relativa e ditada pelo grupo que controla a vida das pessoas.

Do outro lado temos um rapaz que possui aptidões para a arte. Será um pintor. Seu foco é mais na vida do que nos esquemas. Possui uma visão mais intuitiva. É impregnado de sensibilidade. Sua tia lhe serviu de inspiração. Mulher aparentemente sem juízo, com uma percepção diferente. O pai (do menino), médico que não é capaz de encontrar emprego por não se filiar ao partido (nazista), acaba num último momento por aderir ao regime. Mas logo a Alemanha é derrotada e todos que estavam inscritos acabam sendo excluídos do mercado de trabalho...

O professor de arte, durante uma aula, manifestando
sua visão da política.
A maior contribuição desse jovem estará relacionada à vida de pessoas próximas. Sua arte é sua vida - e talvez por isso, sua vida será retratada através de sua arte.

O médico tem uma filha. A tia do menino é considerada louca, e por isso é deixada infértil. O nazismo tinha como meta criar uma raça de seres humanos "puros", não admitindo qualquer tipo de possível deformidade mental ou física (a espiritual não contava...). Quem chancela o processo é o médico. Mas o incisivo ato não basta: deve-se eliminar gente desse tipo. Os doentes, segundo a ideologia corrente, eram uma despesa para a sociedade, que nada teria em troca. Assim o menino fica afastado de sua tia pelo resto da vida.

O rapaz cresce e se torna jovem. Decide cursar faculdade de arte. Sua especialidade será a pintura. O país está se recuperando da guerra. Seu pai não encontra emprego por ter se filiado (de última hora) ao partido. Só lhe oferecem empregos de pouca qualificação. O homem não resiste e rouba a própria vida. 

Kurt (o jovem pintor) se enamora de Elie Seeband, filha do médico que viabilizou o processo de eliminação de sua tia "doente". Esse médico, Prof. Carl Seeband (que exige ser chamado pelo título de professor), é frio, metódico, adaptável a diferentes regimes (nazismo, comunismo soviético, liberalismo,...), sem um norte moral. Apenas quer exercer sua prática médica e viver de acordo com sua mentalidade. E isso implica em tentar separar sua filha de um artista - que seria alguém indigno de passar os genes para gerações seguintes.

A arte de Kurt revela o que aconteceu no íntimo.
Quem ele é está impresso nos quadros, cuja forma
aponta para um passado rico de experiências.
A gênese das verdadeiras criações ocorrem num plano inacessível à mentalidade comum. É preciso entrar em sintonia com regiões ignotas - a partir de sentimentos profundos, sinceros - e encontrar um meio de transmiti-las. Saber interpretar os acontecimentos da vida ajuda. Pode demorar um pouco. Pode necessitar do estímulo de um bom professor (da escola de arte). Alguém cuja vida também foi impactada por uma experiência profunda. Elementos catalisadores. Nada mais. Coisas que acontecem "por acaso" e viabilizam o cumprimento de um destino.

Werk ohne Autor significa "obra sem autor". Que obra? A arte do jovem Kurt? Os quadros que o projetaram mundo afora? Ou o fato de ter conseguido ter um filho com Elie, mesmo após o pai ter feito uma cirurgia na filha visando inviabilizar sua reprodução? Ou o terrível extermínio de pessoas que não cumpriam com os requisitos do III Reich? Uma obra sem autor porque ninguém quer assumir responsabilidade (apesar de alguns concordarem e muitos assentirem...).

Talvez a obra sem autor seja a magnífica história, com seus personagens ímpares, representando a batalha multimilenar entre os aspectos da positividade (um ideal que sofre para se realizar) e da negatividade (um real que não quer evoluir). Uma batalha encarnada em personagens comuns, de nosso mundo, que viveram épocas de grande tensão - e através dos choques e eventos despertaram sua natureza íntima.

A obra pode ser uma realização viabilizada por forças desconhecidas. Intangíveis em termos sensórios. Inconcebíveis para a razão. Porém reais e inexoráveis em seus efeitos concretos.

Links:
[1] https://www.youtube.com/watch?v=LPEK3Y0cfVU
[2] https://www.youtube.com/watch?v=spdO_XPD58M
[3] http://dalenogare.com/2019/02/werk-ohne-autor-nunca-deixe-de-lembrar-2018/