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segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Direitos Humanos e Deveres Divinos

Há séculos a humanidade se digladia entre questões elementares. Os pares de opostos que se combatem parecem não ter fim: criacionismo-evolucionismo, espírito-matéria, queda-salvação, amor-ódio, análise-síntese, conservação-progresso, direitos-deveres. Esse conflito se torna tanto mais intenso quanto mais as partes anseiam por superações. Trata-se de novas formas de viver, de se expressar, de conceber a vida, de sentir, de fazer. Por vezes o desespero fala mais alto e o ser sofre uma queda sem limites. Outras, há espaço para uma descoberta íntima. Essa é uma jornada. Uma jornada longa (muito longa) por domínios tão vastos que não são maiores do que um grão de mostarda.

Fig.1: Fé (sintonização) é imperceptível à mente e aos sentidos humanos. 
Por isso é pequena como um grão de mostarda. 

Um dualismo muito forte de nossos tempos, que remete à reforma íntima, é justamente o de direitos-deveres. Somos incapazes de compreender e coordenar ambos. Pendemos para um lado ou outro da balança, incorporando todos vocábulos e teorias e rituais do pólo que elegemos como o certo. Parece ser uma característica do ser decaído. Isso venho observando a todo momento: nas aulas, dos diálogos de colegas, nas pessoas nas ruas, nos pensamentos difundidos desmedidamente pela rede. E quando é feita uma tentativa de mostrar que esse comportamento possui limitações, ninguém quer aceitar. 

A mente trabalha a partir do contraste. O dualismo, nesse sentido, é muito propício como elemento basilar de desenvolvimento das capacidades intelectuais. E muitas coisas boas são desenvolvidas a partir disso. Mas a partir de certo ponto - em que esse modo de operação começa a se tornar absoluto - tudo começa a emperrar. Nada mais funciona do jeito que queremos. Minimamente. Há muito esforço para pouco resultado - às vezes, resultados contrários ao que desejamos.

(qualquer semelhança com nossas vidas e nosso mundo é mera coincidência)

Mas a história nos revela: as grandes criações sempre foram embaladas por um elemento genético que está para além da compreensão da mente. Nas grandes obras de todos os campos, o impulso inicial sempre se deu no campo da intuição. Uma região situada no superconcebível. O processo exaustivo de pensamento pode servir de condição para acionar as engrenagens intuitivas - a verdadeira causa das grandes descobertas, criações, formas de vida. Mas esse processo laborioso (da racionalização, da esquematização, dos métodos da sistematização) serve apenas como algo que desgasta e deprime. E com isso cava um sulco na alma. Ficamos cada vez mais desesperados, decepcionados com um pensar que não leva a lugar nenhum. Tendemos a adotar caminhos diversos. Mais derrotas. Mais decepções. Começamos a repetir ideias e métodos, com ligeiras alterações, julgando com isso ter a possibilidade de chegar à solução de um problema nunca dantes enfrentado. Mas descobrimos - após um tempo, que pode ser horas ou semanas ou meses ou anos ou décadas - que só andamos em círculo.

Quando o desespero é total e a vontade de solucionar é questão de vida ou morte. Quando os métodos conhecidos são insuficientes. Quando o comprometimento é total e o resto não interessa. Aí - e somente aí - há uma real possibilidade de verdadeira descoberta. 

A intuição surge como a conquista de um processo de maturação bem conduzido.

Estamos aqui falando de perseverança nos caminhos e métodos do mundo aliada a uma vontade de superar (=transcender) este mesmo mundo. A junção desses dois termos (perseverança horizontal e aspiração vertical) coloca o indivíduo em xeque tão mais rápido quanto mais intenso o ritmo do ser em busca. E isso pode atingir níveis insuportáveis. É preciso arrefecer o espírito ardente de alguma forma. E um pouco de loucura é uma boa alternativa - um pouco, não em demasia, para não perder o a orientação suprema e o controle. Como a do Galante Sr. Deeds!

Fig.2: Bastidores do filme de Frank Capra (1936). Jean Arthur e Gary Cooper conversando.

É interessante ter citado esse filme tão belo. Porque ele vem justamente servir de ponto de apoio para tudo que eu vou desenvolver aqui, que é a questão dos direitos (de um ser humano e de tudo que existe) e dos deveres (que todo ser consciente tem para com tudo e todos).

Não se trata de uma questão de princípios mutuamente exclusivos (um OU outro), e sim de princípio intrinsecamente inclusivos (um E outro), colocados numa hierarquia progressiva de importância (dever acima do direito). Compreender isso é estar munido com estofo para desvendar os mais profundos mistérios do universo e do ser. 

No filme em questão (O Galante Sr. Deeds), vemos como um evento de grande impacto material (morte de um milionário) abala a vida de um indivíduo em todas suas dimensões (Longfellow Deeds, um homem simples de uma cidade do interior dos EUA, que herda 20 milhões de dólares do dia para a noite). Mas esse abalo, que na imensa maioria dos casos se dá num sentido, é muito peculiar para esse  simples cidadão do interior, que leva uma vida pacata, equilibrada, baseada em princípios universais e sem complicações desnecessárias. 

O Sr. Deeds é, num primeiro momento, uma pessoa (parcialmente) ingênua, simples, direta e vivendo (n)o seu ritmo. Está em estado de fluxo em muitos momentos, o que lhe garante capacidade de discernimento e determinação nos atos. A herança não lhe causa abalos. Isso choca os advogados e contadores e ajudantes destes, que começam a se sentirem incomodados com o fato - e logo depois, aliviados, pois creem se tratar de um idiota que poderá lhes dar muito lucro. No entanto, com o tempo percebem que esse não é o caso e logo começa uma relação muito peculiar. Um conflito entre um homem que está direcionado para um ideal (orientado por um dever intrínseco) e uma sociedade levada por interesses (direitos para mim quando convém, deveres para os outros quando convém também).

Através de uma série de desentendimentos, causados por má interpretações dos atos de um homem profundamente antenado com princípios superiores, o personagem principal é levado a um estado extremo, que culmina numa audiência com as autoridades da cidade. Esses desentendimentos tem como causa genética algo bem simples: a incapacidade das massas de compreenderem a psicologia de um homem que, vivendo de acordo com um plano de vida superior (que não nega e portanto não combate o inferior), realiza atos com o objetivo de efetivamente resolver problemas fundamentais. 

"Ansiamos pela verdade mas somos incapazes de vivê-la"

disse Judas Iscariotes nas cenas finais do filme "O Rei dos Reis" (1961), logo após ter traído Jesus, o Cristo, seu mestre até o momento que lhe era útil.

Essa fala traz um significado profundo. Diz tudo a respeito da humanidade em sua fase atual - e todas precedentes. Mas hoje em dia ela é mais gritante, pois os meios de comunicação, o conhecimento desenvolvido e a história acumulada não nos permite mais fazer uso de nossa violência de forma tão explicita e desmedida. Por isso foi preciso desenvolver a astúcia a fim de continuar a exploração (da natureza, do semelhante e...de si mesmo). Com isso surge a erudição sofisticada, a argumentação complexa, as incontáveis normas que levam a uma infindável burocracia, entre outros entraves ao desenvolvimento do ser. 

Voltando ao Sr. Deeds.

O filme é fantástico se visto a partir de um prisma (que eu denomino) monístico. Porque tudo ganha significado profundo. Nós nos vemos tanto no personagem principal (em momentos de descoberta da divindade em nós) quanto nos outros (aspectos mundanos nossos). E o interessante é notar que a  direitos e deveres se digladiam continuamente, conforme interesses terrenos, para todos personagens. Mas num deles, as coisas estão mais bem definidas: Longfellow Deeds. 

O dever de realizar uma justiça que vai além da capacidade de compreensão consciente das pessoas é como um tambor que bate forte na cabeça de Deeds. Aliás, ele parece sentir em todo seu ser (físico, energético, sensações, sentimentos e vontade) a necessidade de continuar agindo a seu modo, sem distorcer seus princípios mas sempre disposto a moldar seu comportamento exterior. É interessante como essa batalha interior se dá através da interação com um mundo que ainda não quer enxergar as maravilhas de um modo de vida superior.

A quem já estiver preparado, deixo (abaixo) o filme, disponível gratuitamente na plataforma YouTube:


Como professor de uma instituição nascente (IFSP) tenho a oportunidade única de realizar uma missão de vida. Atuo com saberes específicos (ciência e engenharia) e pedagogia (ensino, aprendizagem, comunicação); tenho oportunidade de criar cursos voltados a questões importantes (pensamento sistêmico, energia e desenvolvimento, ecologia e sustentabilidade, modelagem e simulação, monismo, etc.) e usar eventos para difundir uma visão de mundo pouco compreendida mas vital para a ascensão da humanidade. Em suma: a oportunidade de cumprir meu dever (=missão de vida) é ideal. Buscada por um ser que foi se construindo ao longo de longos anos. 

Apesar de ser ignorado por muitos, desvalorizado por quem deveria valorizar, julgado por quem deveria antes assimilar o que está sendo feito, há muitas possibilidades. Pois as forças do AS que dormitam nas almas adormecidas não são capazes de atuar (=impedir) além de sua zona de consciência - ao passo que quem é embalado pelas forças do S sempre conseguirá se renovar, reinventando-se após cada golpe, cada impedimento, cada obstáculo, cada decepção. Esse reto agir garante a vitória final das forças que querem a evolução da humanidade e do planeta como um todo. 

Reclamemos ao direito de cumprirmos nossos deveres!

Nada mais, nada menos. 

É triste constatar que o modus operandi da imensa maioria ainda está voltado para o trato das pessoas como objetos. Tudo isso disfarçado com inúmeras comemorações, papos superficiais, festinhas, sorrisos, desvios discretos de temas centrais e toda parafernália psiquica típica do astuto.

Querer realizar um trabalho de ordem elevada, que use os elementos do mundo, dos saberes aí disponíveis, das riquíssimas histórias individuais, da arte, das teorias e dos pensamentos mais díspares, parece constituir uma ofensa a muitos. 

E quem mais será responsabilizado são aqueles que detêm o poder de fazer algo. 

Ai de quem possui os meios e as condições (poder = responsabilidade) e se deixa levar pelas bur(r)ocracias do (anti-)sistema, pelos maus elementos - que aliciam massas a partir de premissas superficiais e infundadas. 

Direitos são uma conquista que, se não usada de modo adequado, pode abrir portas para uma nova idade das trevas. Porque os deveres são um imperativo categórico que conduz a alma humana (e todo universo) rumo a uma forma de organização cada vez mais sistêmica. Que sublima o ser, tornando-o mais efetivo em suas ações, orientado em sua busca, afiado em seu pensamento e refinado em seu sentimento.  

Deveres são uma característica bela que embala os seres mais alinhados à Lei Suprema (que coordena todas as outras leis). É um motor íntimo, 'situado' no imponderável do ser, inconcebível para aqueles que vivem apenas nas coisas do mundo, pelas coisas do mundo.

O único direito que eu reclamo é aquele de cumprir o meu dever cósmico.

Se os homens não compreendem, eu sei que Deus compreende.

Não há como exigir direitos sem cumprir um dever íntimo. Assim como todo cumprimento desse dever (íntimo, ou seja, apontado para o Alto) exige a garantia de direitos.

É o Chefe (o único Chefe, o Chefe de verdade) que irá permitir (ou não) a realização dos meus potenciais divinos neste mundo que anseia por superações - mas ainda não o sabe plenamente. 

Você igualmente deve reclamar por esse direito - pois é o único que verdadeiramente temos.

Os demais serão consequência.

É isso. 

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