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quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Engenharias na UFABC - modelo do futuro

Quando entrei na faculdade em 2004 os cursos de Engenharia da UFABC estavam engatinhando. Eu nem sequer tinha consciência de sua existência. Mal sabia eu que, paralelamente ao modelo de ensino consagrado ao longo das décadas, que eu estava cursando, existia um outro completamente diferente se iniciando aqui no Brasil.

Me lembro dos anos de faculdade. Desde o início eu não estava contente com o modo de ensino. Especialmente de minha faculdade de engenharia mecânica, que era EXTREMAMENTE focada em disciplinas técnicas, com carga horária pesada. Isso impossibilitava ao aluno cursar disciplinas de outras faculdades e institutos, mesmo se ele fizesse mais créditos, pois havia uma reserva de vagas para cada disciplina, que era planejada de acordo com os programas de cada curso.

Logotipo da UFABC.
As poucas disciplinas diferentes que pude cursar estavam na grade obrigatória e aparentemente eram pouco valorizadas pela maioria dos docentes da faculdade de engenharia mecânica. Somente estavam lá para cumprir uma espécie de compromisso forçado. Para manter uma certa aparência de interdisciplinaridade. Pelo menos é o que me parecia. Eram matérias tidas como secundárias - ou nem isso. Para preencher cota. E (mais desalentador ainda) nas reuniões com a coordenação, anuais, que envolviam docentes e alunos, quando se tocava nesse assunto de diversificação da grade curricular, a coordenação não parecia levar o caso a sério. Além de verem isso como "manobra" de um grupo (dito preguiçoso) de alunos para aumentar sua média geral através da matrícula em disciplinas de língua estrangeira. Uma visão muito infantil e obtusa de gente que ocupa cargos importantes.

Toda essa experiência me deixou profundamente desgastado em certos períodos da faculdade, que em alguns semestres chegavam a ter 8 ou 9 disciplinas de engenharia, sufocando o aluno bom ou ruim. Era contra o bom senso. Contra a vida. Contra a saúde. E alguns professores simplesmente descarregavam a matéria nas salas de aula, ignorando o fato de que existiam outras disciplinas que estavam sendo cursadas simultaneamente. E que havia uma vida fora do meio acadêmico como: participar de eventos culturais, sair com os amigos, viajar até sua casa, pagar contas, tocar instrumentos musicais, ler, fazer compras, fazer outros cursos (fora e dentro da universidade), estagiar, viajar, se exercitar, estudar o conteúdo apresentado em sala, entre outras coisas. E ignorar esse fato acaba repelindo as pessoas da área.

É muito raro vermos uma pessoa que consegue passar pelo ensino básico, vestibular, cursar uma faculdade de engenharia, se formar, trabalhar com engenharia pela vida toda e sentir que valeu a pena. Raríssimo. Porque cada etapa desse processo é permeado de políticas de desestímulo - conscientes ou inconscientes - por parte de alguns professores, administradores e sociedade.

Conteúdo mal apresentado, horas excessivas de explicações desnecessárias, abordagens de assuntos sem se preocupar com a conexão destes com o resto do mundo: essas são as principais deficiências que encontrei no ensino de engenharia - que fiz. É muito desolador uma pessoa desejosa de crescer e ampliar seu horizonte se deparar com uma estrutura obtusa que se recusa a enxergar a realidade.

Conceito de Transdisciplinaridade.
O bom senso dos dirigentes de hoje se traduzirá nos livros de História como uma repulsa a enxergar as mutações da sociedade, e consequentemente do corpo discente (alunos), os verdadeiros edificadores de um novo mundo. Um mundo melhor, diga-se de passagem.

Existem iniciativas semelhantes ao redor do mundo. Há muitos anos esse tipo de estrutura curricular é implementado nas universidades norte-americanas (e o resultado é visível). Um engenheiro pode ser classificado como tal e ter passado metade de suas horas assistindo e participando de aulas de ciências sociais, filosofia, biologia, música, economia e letras. E me parece que a universidade não deixou de formar um engenheiro, e conseguiu - além disso - formar um ser humano pronto para dialogar com si mesmo e com a sociedade, buscando o melhor de si.

De nada adianta saturar alguém com detalhes específicos se essa pessoa dificilmente terá oportunidade de atuar em todas essas áreas. Esse vomitar de conteúdo só causará mais repulsão e desmotivação por parte do aluno - e perda de tempo, energia e imagem para o professor. O modo de operação da maioria das faculdades de engenharia atualmente é se aprofundar MUITO em quatro ou cinco áreas específicas (ex: termofluídos; mecânica das máquinas; controle; energia; materiais), e depois deixa-se o aluno fazer ou não uso delas. Isso não me parece racional. Muito menos saudável. Mas é o modelo imposto.

Não existe democracia nos governos e nem nas salas de aula. E
la só está nas propagandas.

Por quê não diversificar a grade curricular e permitir a formação de um ser humano pluridisciplinar? Especializado sim, mas com menos ênfase.

Minha proposta é muito simples. Mas antes de apresentá-la, preciso demonstrar que o ritmo psicológico do SER humano está em desacordo com aquele ritmo imposto pelas escolas, sociedade, família e universidade.

Muitos são os casos de pessoas que, após se graduarem ou especializarem numa área, buscam (desesperadamente) fazer algo COMPLETAMENTE diferente na sua vida profissional. Trabalham um tempo (às vezes muito) e abandonam tudo em busca de um sentido para suas existências. Não necessariamente porque detestam seu “métier”, e sim porque foram saturados de conteúdo desconectado com outras áreas e sua própria vida. O resultado é um só: desgaste precoce. Eles não buscam se “desviar” do caminho, e sim VOLTAR ao caminho natural.

A maioria das escolas e universidades não formam seres humanos orientados para atuar num mundo cada vez mais interconectado e diverso, que exige soluções criativas e mente aberta. Elas formam gente que deve ter uma mente (e vida) departamentalizada e portanto com pouco TEMPO LIVRE e ENERGIA para o exercício de atividades CRIATIVAS. Porque a grande maioria das corporações (as grandes sobretudo) operam dessa forma. E sendo assim, elas ditam – via propaganda e se infiltrando nas cadeiras dos poderes legislativo, executivo e judiciário – como o sistema deve operar. Desde a sua base: a infância do ser. E pode-se observar que esse modelo não atende mais aos anseios da sociedade, que deseja o progresso mas não sabe como caminhar em direção a ele. Abra o jornal e observe. É tudo consequência de uma má formação. Desde o início.

Bom, para resolver esse problema me parece que a primeira coisa a fazer é convencer as pessoas imersas nesse modelo (arcaico) a “escutarem” seus sentimentos. Ao ler qualquer texto que proponha uma reflexão – como esse – devemos refletir sobre o nosso modo de vida e tentar buscar soluções ,e trazer esse assunto à tona sempre que possível. Mas apenas as mentes preparadas estarão abertas à discussão. Portanto – e infelizmente – RARAMENTE poderemos abrir nossas mentes para pessoas em cargos de poder. Eles já estão muito imersos e portanto condicionados a esse modelo. E corremos o risco de que usem nossas ideias para nos prejudicar, distorcendo-as e nos taxando de subversivos e coisas do tipo. Isso é triste, pois – em tese – a sabedoria deveria ser proporcional ao poder do cargo ocupado em nossa sociedade.

Outro ponto: naturalmente, com o tempo, creio que veremos os maiores progressos sendo gerados por mentes com visão holística do mundo. Essas pessoas provavelmente serão mais espiritualizadas. Isto é, terão uma orientação para riquezas intangíveis como, por exemplo: conversas, convívio, natureza, estudos, contemplação, etc. E consequentemente serão pessoas agradáveis de se ter ao lado, pois elas, além de dominar os conhecimentos e métodos materiais consolidados, acreditam em algo mais elevado e se interconectam com o ambiente e o mundo mais facilmente. As pessoas e os seres são mais transparentes para esse tipo de pessoa. Sua visão é mais global. Tudo que vem ocorrendo reforça essa visão.

O ser humano, tendo liberdade para buscar o conhecimento e a sabedoria, será mais feliz. Haverão menos desistências dos cursos. Formaremos melhores profissionais. Engenheiros não serão bitolados; Médicos estarão mais em contato com os pacientes; Cientistas terão mentes abertas para o imaterial; e etc.

Eu falo tudo isso porque eu vivi tudo isso e venho sentindo uma necessidade cada vez mais urgente de redirecionar minha vida para algo mais saudável e criativo. E ajudar outras pessoas a se encontrarem (eis porque venho me fascinando com o tema de Eduação ultimamente).

Convido aqueles que aguentaram ler até aqui a se ajudarem e ajudarem os outros nessa jornada por uma formação mais humana.

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