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domingo, 29 de dezembro de 2013

A Loucura não é (sempre) Louca


A cura da humanidade pode estar na loucura.
Já me falaram (ou pensaram) certa vez, sem me conhecer:

Você é louco!”

E eu, refletindo, calmamente, respondi (em pensamento):

Sou louco sim. Mas SOU FELIZ e NUNCA fiz mal a ninguém com minha “loucura”.

E me senti melhor, mais solto e livre e feliz.

E ao mesmo tempo tive pena (muita muita muita pena) da pessoa que proferiu (ou pensou) essa frase ferina e ácida, porque

Ele (ou ela) – infelizmente – não FAZ A MENOR ideia dos SONHOS e PLANOS e IDEAIS e IDEIAS que estão inculcados em minha mente, porque

Ele (ou ela) jamais disponibilizou uma fração infinitesimal de seu tempo para conhecer universos diferentes como o meu (ou o seu ou o de qualquer pessoa “diferente”), porque

Ele (ou ela) estava preso a uma rotina repetitiva e com aparente sentido de progresso, que eu não conseguia ver como tal, mas que ele (ou ela), no entanto, via como tal, porque

Ele (ou ela) foi “ensinado” forçosamente a seguir um rumo padronizado durante anos e décadas, porque

Ele (ou ela) viu os outros tendo “sucesso” ao seguir esse rumo padronizado e pensou “então basta seguir a receita que a humanidade me apresenta e serei feliz”, porque

Ele (ou ela) jamais teve a coragem (creio eu) de se libertar da inércia que impregna a alma da grande massa da humanidade deste globo, porque

Ele (ou ela) percebeu que se libertar dessa inércia seria muito doloroso e exigiria muito esforço, que não seria recompensado enquanto sua saúde estivesse em ordem e sua condição social estivesse “em cima” e tudo mais.


Portanto, o caminho mais fácil foi escolhido.

E eu, “louco”, sinto ter escolhido o caminho mais difícil. Da condenação, aparentemente.

Mas ALGUMA COISA LÁ DENTRO DE MEU SER diz que devo CONTINUAR.

Porque a Eternidade opera lentamente, mas com uma força colossal.
E apesar de sua força e grandeza, ela é muito DISCRETA.
E diz que devo confiar nela, ou melhor, em minha CONSCIÊNCIA – que estão intimamente relacionadas.


E eu, na minha “loucura”, aceito e sigo o conselho.


E eu, apesar de não ser inclinado para o jogo, estou fazendo a maior e mais arriscada das apostas, ao levar adiante minha “loucura”,

Minha teimosia questionadora,
Meus hábitos fora do padrão médio,
Minha vontade sobrenatural (para alguns) de seguir meu caminho e expor minhas ideias.

Por que?

Porque até hoje ninguém foi capaz de me convencer de que haja algo melhor, mais útil ou construtivo para ser feito.

Portanto...

Continuo escrevendo,
Continuo aprendendo,
Continuo estudando,
Continuo mudando,
Continuo me inconformando,
Continuo buscando um significado para tudo que me rodeia.

E (engraçado) não me canso.
Às vezes me sinto como um instrumento ecoando em descompasso com a orquestra da qual faço parte.

Mas quando estou prestes a me AJUSTAR ao coro, eis que me deparo com outro instrumento, ecoando em SINTONIA com os meus sons,

E aí REPENSO na mudança. Me sinto encorajado a seguir minha trilha original. Natural.

E quem sabe, um dia, num futuro não muito distante, eu (ou outro instrumento) possamos unir esse conjunto de instrumentos dissonantes e formar um coro harmonioso.

Talvez mais harmonioso que todos outros existentes.

E daí, se tal dia for possível e se concretizar, haja menos problemas nesse mundo.

E mais felicidade.

Quem sabe...

E isso tudo, só porque um dia uma pessoa um dia falou pra mim

Você é louco!”

E escrevendo esse texto hoje, eu agradeço pela sinceridade dessa pessoa.

Porque querendo dar um golpe, talvez esperando uma reação de mesma espécie, foi gerado um texto cheio de ideais e sentimentos.

Talvez isso seja aquilo que Pietro Ubaldi* tanto explica em suas obras, que é transformar o Mal em Bem.

Dessa forma talvez seja possível começarmos a construir um mundo melhor, com mais pontes e menos muros.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Um Herói de Nossos Tempos

Talvez nosso mundo necessite menos de organismos mundiais, desses que organizam fóruns e conferências, que servem muito às cadeias hoteleiras e às companhias aéreas e, no melhor dos casos, não reúne ninguém e transforma em decisões...”

José “Pepe” Mujica

José "Pepe" Mujica discursando na ONU.
Nunca imaginei que houvesse alguém assim hoje em dia, ocupando um cargo de poder.

Abri uma revista para ler algumas matérias. Uma delas era sobre o (crescimento do) ateísmo nos últimos anos no Brasil. Várias personalidades eram destacadas. Dentre elas um cara chamado José Mujica, o “Presidente mais Pobre do Mundo”. Do Uruguai.

Peguei o trecho que falava sobre ele e comecei a ler. E os fatos começaram a causar verdadeira perplexidade seguida de admiração: o presidente-agricultor não tem conta bancária nem dívidas; seu patrimônio e o de sua esposa somam US$ 212 mil e suas posses consistem em três terrenos, três tratores e dois carros de 1987 – dentre eles um fusca azul, o seu carro, avaliado em US$ 1.000*. Não mora em palácios, e sim em seu sítio, Rincón Del Cerro, onde sempre viveu. E isso é só uma parte da história

Dos US$ 12.500 que recebe de salário, fica com apenas US$ 1.250 e doa os 90% restantes para ONGs que constroem casas populares. E pelo perfil judicioso e modo de discursar de Mujica **, eu tenho segurança de que esses US$ 11.250 mensais vão exatamente para as pessoas que ele deseja ajudar. Dessa forma, fazendo jus à máxima mais alta de Cristo (“Fora da Caridade não há Salvação”), José Mujica pode ser considerado um dos pouquíssimos cristãos – no verdadeiro sentido da palavra – ocupando um cargo de poder em nossos tempos conturbados. Mesmo sendo ateu. Porque, afinal de contas, isso não quer dizer nada. Mujica acabou de comprovar isso.

A respeito do salário que resta, o presidente afirma:

Este dinheiro me basta, e tem que bastar porque há outros uruguaios que vivem com bem menos”***

Não existe segredo em sua atitude. Apenas conscientização. Uma noção profunda de que o excedente não irá melhorar sua qualidade de vida. E que muitas pessoas muito capazes – que não tiveram a devida oportunidade – podem gerar mais para a sociedade graças a essas doações.

A espécie como tal deveria ter um governo para a humanidade que superasse o individualismo e primasse por recriar cabeças políticas que acudam ao caminho da ciência, e não apenas aos interesses imediatos que nos governam e nos afogam.”

Nessa frase Mujica demonstra a importância de pensarmos a longo prazo como indivíduos e como corpo coletivo. Os interesses imediatos que nos governam e afogam são os modernos cultos à tecnologia, ao corpo, aos prazeres imediatos e visíveis, ao dinheiro fácil, às “amizades” fáceis, aos relacionamentos fáceis,...A tudo fácil e sem necessidade de pensar e lidar com o diferente e refletir e isso tudo junto.
Talvez os anos tenham trazido sabedoria a Mujica. Mesmo assim, é impressionante. Sua vida simples parece demonstrar o tipo biológico do futuro. É como uma visão de um outro mundo. Um mundo melhor. Um mundo feliz. É um ser que, dada a oportunidade de TER muito mais, preferiu SER muito mais, dando o muito mais para os que realmente precisam. Isso é algo muito próximo – se não exatamente - ao ser evoluído, que Pietro Ubaldi descreve em suas obras.

Ao se colocar em evidência com esse tipo de vida, Mujica mostra ao mundo o caminho da sustentabilidade e do equilíbrio. Fazendo uso judicioso do poder, arquitetou um plano de trazer uma mensagem ao mundo. Através do exemplo de vida.

Sim. Ele (Mujica) participou de grupos terroristas. E foi preso por 14 anos. Mas Nelson Mandela também. Yasser Arafat também. E a contribuição deles foi grande em promover a paz e aproximação dos povos no mundo.

Santo Agostinho teve uma vida desregrada antes de se dedicar à castidade e simplicidade. Assim como São Francisco de Assis. Nem por isso seus feitos posteriores foram diminuídos.

O Uruguai tem adotado a sua própria via. A Via Uruguaia. Encabeçada pelo seu novo presidente, que parece saber muito de inovação. Dentre as atitudes inovadoras temos: a estatização da produção das drogas e o controle de seu consumo; a legalização do aborto e dos casamentos homossexuais.

Enquanto a maior parte do mundo segue reproduzindo fórmulas que não mais se adequam a uma nova sociedade, o Uruguai tenta outro caminho. Podem surgir problemas? Sim. Como todas novas empreitadas (quantos cientistas famosos não tiveram de fazer e refazer seus experimentos e teorias para chegarem ao resultado esperado). Mas é mister que sejam trilhadas vias alternativas. É o futuro. É o progresso.

Este é nosso dilema. Não nos entretenhamos apenas remendando consequências. Pensemos na causa profundas, na civilização do esbanjamento, na civilização do usa-tira que rouba tempo mal gasto de vida humana, esbanjando questões inúteis. Pensem que a vida humana é um milagre. Que estamos vivos por um milagre e nada vale mais que a vida. E que nosso dever biológico, acima de todas as coisas, é respeitar a vida e impulsioná-la, cuidá-la, procriá-la e entender que a espécie é nosso "nós".

Palavras de um ser humano à frente de seu tempo, que não precisa de títulos, religião, dinheiro e poder para ser grande. Porque ele em si já o é.

Referências
* http://epocanegocios.globo.com/Inspiracao/Vida/noticia/2012/11/presidente-mais-pobre-do

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Le Concert

Existe uma grande desvantagem e uma grande vantagem em ter um gosto cinematográfico diferente da média. A grande desvantagem é que você dificilmente poderá assistir um filme no cinema que atenda suas expectativas – a não ser que você more numa cidade como São Paulo ou Rio de Janeiro, e tenha tempo (e dinheiro) para frequentar cinemas onde a diversidade abunde e os temas sejam enriquecedores para a sua alma. Agora, a grande vantagem é a seguinte: quando nos deparamos com um filme fantástico, de qualidade, somos capazes de sentir a grandiosidade dele e saimos da sala emocionados e mais ricos em experiência e repensando a vida e tudo mais. É um prazer que muitos ainda não conseguem ter. E é esse prazer que eu senti quando saí do auditório do SESC após ter visto o filme “O Concerto” (Le Concert) do já consagrado diretor romeno Radu Mihaileanu*.

"Le Concert" (2009)
A trama é bem simples. Um já aposentado maestro da orquestra do teatro Bolshoi, Andrey Simonovich Filipov, cuja carreira pública foi interrompida precocemente, – sua mente era muito aberta para o regime autoritário vigente... – vê a oporunidade de reviver seus dias de glória quando acidentalmente intercepta uma carta endereçada ao novo dono da Orquestra.

Assim que o zelador (que triste destino...) Filipov lê a carta vinda diretamente do “Théatre du Chatelet” de Paris, sua mente começa a maquinar um plano de proporções Homéricas sem precedentes em sua vida. Um plano que fará ele e sua antiga orquestra constituída de músicos judeus e ciganos (os melhores no 'métier', também desempregados ou com sub-empregos) voltarem a sentir o prazer de tocar para o público. E para um retorno triunfal, nada mais adequado do que o Concerto de Violino de Tchaikovsky em Ré maior.

Os preparativos começam a envolver cada vez mais gente. Antigos colegas recebem telefonemas do famoso maestro. Os colegas vão se revendo. O plano se espalha e começa a tomar forma. E com a orquestra oficial ocupada com outros assuntos por um tempo, não há tempo a perder. Falta apenas a peça final. E ela está em Paris.

A famosa violinista Anne-Marie Jacquet (Mélanie Laurent) nunca tocou o Concerto de Violino em Ré maior de Tchaikosky por um medo inexplicável – que será revelado oportunamente no filme. Mas tem um ardente desejo de tocá-lo. Com a Orquestra do Bolshoi. Sob a regência de Filipov. Tudo converge para um espetáculo sem precedentes e a partir desse ponto humor, emoção, sentimentos e técnica se misturam para arquitetar o maior espetáculo sonoro das últimas décadas. Em Paris. Em Berlim. Em Londres. Em todo o mundo.

A estruturação do filme é perfeita. Uma espiral ascendente permeada de problemas e dificuldades é vista. E nunca se sabe se o tão esperado concerto dará certo. Preconceitos, medos e fantasmas do passado conspiram para o sucesso do plano de Filipov. Mas no decorrer da história o espectador percebe a causa de tamanha determinação do ex-maestro. Seus motivos vão além de sua profissão. Ele quer ter uma segunda chance. E...não vou me estender no assunto (recomendo que veja o filme. É MUITO BOM).

Assistir “O Concerto” é uma emoção ímpar. Se trata de um filme multicultural. O espectador poderá ouvir a língua russa, o inglês e o francês; se verá diante dos hábitos, maestrias, vícios e charmes de diversas culturas: hebraica, cigana, francesa, russa,...; conhecerá os diversos tipos de pessoas. Resumindo, terá a oportunidade de ver um mosaico em forma de película.

Poucas vezes na minha vida posso dizer que saí de uma projeção me sentindo elétrico e emocionado. Feliz. Estava emocionado com um final tão bem feito que repensei a cena final e os detalhes dezenas de vezes. Era fantástico. É fantástico. E sempre será fantástico.

Esse filme, além de divertir, induz ao questionamento das instituições e mostra o eterno desejo humano de fazermos aquilo que mais desejamos. Foi a melhor introdução que uma pessoa poderia ter a um dos concertos mais famosos de todos os tempos.

O Concerto” é a prova concreta de que diversão, sentimento e crítica podem caminhar de mãos dadas. 

Ficha completa

Trailer

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Sobre Conceitos e Preconceitos

Ao longo da minha vida curta e intensa, sempre vi e passei por diversas dificuldades. Problemas de diferentes tipos e ordens já sondaram meu jardim espiritual. Percebi que muitos deles ocorrem com certa frequência. Na vida de todos, claro. E que eles surgem na forma de dilemas. E um dos (dilemas) mais cruéis emanam da sociedade. Isto é, são impostos por ela. E caem na sua cabeça como uma bigorna de 1 tonelada. Impiedosamente.

Uma pessoa pode gostar de outra do mesmo sexo.
Certo ou errado, muita gente assim faz muito menos mal
do que pessoas "certas", que seguem o 'establishment'.
A maior chaga da humanidade é o preconceito que muitos tem em relação a certas atitudes e modos de pensar. Se uma pessoa tem ideias diferentes a respeito de alguém mal visto pela opinião comum, os problemas começam a surgir para essa pessoa. E eles (os problemas) são ampliados se essa pessoa, além de ter essas ideias diferenciadas, começa a agir de modo a fazer jus a elas, seguindo sua consciência.

Devo estar muito abstrato, certo?
Vou exemplificar um caso prático.

Imagine que você tem um grupo de amigos(as). Eles e elas são legais, simpáticos, te preenchem e te animam cada vez que os vê. E vocês conversam e riem e trocam ideias e tudo mais.

Com o passar do tempo, você passa a conhecer novas pessoas – ou deseja conhecer, o que é natural. Mas essas pessoas...esse grande grupo, que representa grande parte do mundo, tem uma ideia preconceituosa em relação a esses seus colegas. Não gostam de vê-lo com eles. Te ignoram e consequentemente não te aceitam porque você os aceita. Por que? Eles próprios não sabem dizer. Ou melhor...suas justificativas são infundadas. Exemplo: “os caras com que você anda são muito 'estranhos'”....ou “essas pessoas não se arrumam direito”, ou “esses aí são loucos”, ou “esses caras afastam os outros”...e por aí vai. Tudo nessa linha. Nesse ponto a pessoa começa a sofrer uma espécie de pressão, imposta pela maioria dominante, que tem uma verdade dominante – mas frouxa e infundada, repito. Um PRÉ-CONCEITO. Ou seja, um conceito formado sem verdadeiro conhecimento da realidade dos outros. E passa a impô-lo como uma verdade absoluta, rejeitando qualquer tentativa de contato enquanto a pessoa não se adequar ao esteriótipo aceito por esse grupo. Dilema estabelecido.

Amizade colorida.  :)
A pessoa passa a se perguntar, “o que eu faço?”. E para “evoluir”, abdica de seu grupo (a minoria...numérica) para tentar uma nova empreitada no universo sedutor, “legal”, “normal”, “na moda”, “inteligente” e adjetivos do tipo. Resultado: amizades são desintegradas por forças externas.

E ao se relacionar com pessoas desse novo mundo o sujeito não percebe que a qualquer momento esse novo mundo pode rejeitá-lo, por um motivo qualquer. E aí ele não terá nem seus velhos amigos nem seu novo mundo nem nada. Mas a maioria das pessoas segue esse caminho.

É claro que em muitos casos a pessoa se dá relativamente bem e se entrosa em outros grupos e assim por diante. Mas a razão dessas mudanças...desses pulos...parecem sempre ser norteada por motivos VAZIOS. Motivos que não são da própria pessoa. Motivos que foram impressos em sua mente ao longo dos anos. Pela sociedade. Pela família. Pelos grupos. Pela mídia. E até por pessoas que se dizem amigas. E a pessoa estará periodicamente descartando gente REALMENTE legal, por motivos de FORMA – e raramente de CONTEÚDO. É uma espiral de perdição, na minha opinião. Pois os prazeres são efêmeros e a certeza de infelicidade futura, certa.

Já vi muito disso em minha vida. É claro que sob uma ótica material, que deve influenciar a mente de 98 a 99% dos seres (humanos) desse planeta, essa receita que muitos seguem é eficaz. E, para as pessoas, é a solução dos problemas: quem corta laços “inúteis” acaba por ter ascensão profissional, arranja uma namorada (ou namorado) bela e inteligente e rica e com status social (e adjetivos do tipo), é aceito por outros grupos. E etc. É uma receita tão eficiente que até gente tida como profundamente conhecedora da vida a segue e a propaga, julgando que faz algo bom.

Pessoas se prendem às formas e criam motivos
para se divertirem. Causa possível: falta do que fazer.
Remédio: estudem, aprendam, escutem, passeiem,...
Sem dúvida neste mundo (inóspito), se alguém deseje ter sucesso a curto prazo, esse é o caminho mais adequado. Mas eu sempre me perguntei, desde minha adolescência: será que esse é O caminho (da felicidade)?

Eu confesso que sou cada vez mais incapaz de me influenciar por opiniões externas. É claro que analiso elas, com rigor e cuidado, em minhas reflexões.

Apesar de todos golpes ao longo da vida, continuo na minha teimosia de me aprofundar naquilo que julgo ser a maneira correta de agir. Cristã. No verdadeiro sentido da palavra. E – sem dúvida – sofro com isso. Hoje menos do que ontem (acho que estou me blindando contra certos tipos de projéteis, sabe...me desmaterializando). Se gosto de alguém gosto. E ponto. Não deixo o mundo me influenciar. As belezuras e os ricos e os poderosos e os influentes e os “legais” e pessoas do tipo podem me dizer que tenho de deixar ele ou ela ou tal ideia ou tal modo de vida. Mas a palavra (e atitude final) é minha. Me preocupo mais em não trair minha consciência do que beneficiar meu prazer (será realmente?) e imagem. Talvez eu seja louco. Mas nesse caso serei um louco que reflete. Já é alguma coisa, certo?

Para me aprofundar numa amizade sigo intuições básicas. Tento observar se essa pessoa é boa e educada e se interessa por melhorar e tenta compreender a mim e a ela mesma e aos outros e se apaixona pelos fenômenos e pelos sentimentos. É tão simples que chego a me achar muito simplório. Mas talvez aí esteja a chave para o progresso desse milênio.

Vejo um mundo de pessoas cuidadosas demais. Cuidadosas no sentido de não fazerem nada fora do padrão. E nessa atitude (ou falta dela) são podadas INCONTÁVEIS possibilidades de enriquecimento espiritual.

Acho que vale a pena refletir sobre esse assunto...

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Sputnik: um evento do tamanho do mundo

4 de Outubro de 1957.

Unidade de Testes de Foguetes da União Soviética.
(mais conhecido como Cosmódromo de Baikonur)

Um foguete – o Foguete Sputnik – de dois estágios, 19 metros de altura e 137 toneladas de massa (com combustível), movido a oxigênio líquido e querosene foi lançado*.

O sistema de controle do Foguete Sputnik foi ajustado para uma órbita elíptica com perigeu de 223 km e apogeu de 1.450 km, com período de 101,5 minutos. Esses parâmetros foram calculados por Georgi Grechko*.

Agora eu, aqui em casa, nascido quase 28 anos depois desse evento memorável, me ponho a imaginar quão envolvente deve ter sido o lançamento desse foguete, que colocou em órbita um aparato feito pela nossa espécie. Um aparato...um satélite. Cheio de tecnologia. Cuja função era transmitir sinais de rádio capturáveis por qualquer radioamador. Ele enviava bips (bip bip bip...). Uma nova Era começava a florescer.

Sputinik: o primeiro satélite artificial.
O Sputnik provou que era possível colocar um artefato em órbita, e que este artefato era capaz de cumprir uma missão. Ou seja, ser útil para nós aqui em baixo.

Você sabe como É COMPLICADO colocar um satélite em órbita???
E mantê-lo lá em cima, operando, em condições ALTAMENTE HOSTIS? Sim, hostis: extremos de temperatura (-200 a 300 graus...ou coisa assim); velocidades da ordem de 28.000 km/h (daria pra chegar na China em meia hora); nenhuma atmosfera; nenhuma parada para reparos. Só o Espaço. Todo Universo mais perto. E o impacto com alguma partícula seria o fim. E um desvio de trajetória poderia acabar com sua missão. E a falha das baterias impossibilitaria os bips. E milhares de outros detalhes importantes. Experimente esses extremos de temperatura e velocidades. Experimente criar uma máquina capaz de resistir a eles e transmitir informações. Experimente calcular uma trajetória elíptica desse tipo teoricamente, no papel, considerando as massas, as trajetórias, os arrastos aerodinâmicos, a variação de massa, o impacto da separação dos estágios, a variação da força gravitacional, a geometria, os ângulos, a estabilização depois de sair da atmosfera. E etc. Experimente.

Então o que eu quero dizer é que esse foi um evento MUITO IMPACTANTE sim. A ponto de merecer uma dedicatória aqui. Especialmente porque eu realmente acho legal toda essas coisas de Espaço e foguetes e satélites e Universo e vontade sobre-humana.

Enquanto isso, do outro lado do mundo, os EUA e sua população viram o evento como algo pavoroso. Exceto aqueles que viam o verdadeira significado daquilo tudo: progresso da ciência. O uso de tecnologia de ponta para gerar bem estar a todos.

É claro que Nikita Kruschev e seu partido estavam muito mais preocupados em propagar o evento com a finalidade de mostrar ao mundo que esse lançamento significava o sucesso do seu povo e seu regime e tudo mais. Não se tratava disso. O que realmente importava eram os frutos que esse sucesso científico traria para a área espacial.

No final das contas o Sputnik – aliado ao voo de Yuri Gagárin – estimulou os EUA a iniciarem o seu programa espacial, criando a NASA (Agência Espacial Norte-Americana) e investindo nas tecnologias espaciais. Muitas descobertas foram repassadas para a sociedade. E essa é a maior função dessa área: melhorar nossa qualidade de vida.

E também fascinar mentes humanas.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Que Tipo de Evolução esperar do III Milênio?

Sabe aqueles filmes de viagem no tempo? Da década de 80, como De Volta Para o Futuro? Aquilo sempre me interessou do ponto de vista do que fomos e iremos nos tornar. Como indivíduos e como sociedade. Só que, pelo que me lembro, as únicas mudanças legais pra mim eram aquelas associadas à tecnologia. Mas, com o passar dos anos, percebi que as mudanças mais interessantes - ou, melhor dizendo, legais - eram aquelas não associadas a carros voadores ou skates flutuantes ou super-eletrodomésticos. As mudanças realmente interessantes eram aquelas DENTRO de NÓS e ENTRE NÓS.

Desde o advento da Revolução Industrial progresso de vida - a melhoria, o futuro, o melhor,... adjetivos do tipo - é associado a progresso tecnológico. Claro, nos milênios precedentes a humanidade teve pouca evolução tecnológica. Muito menos moral. E quando a indústria chegou, o choque foi muito grande. Choque bom para poucos e ruim para muitos. Mas um choque.

As invenções ao longo dos séculos XIX e XX foram muitas. Trens, carros, iluminação elétrica, aviões, foguetes, satélites, eletrodomésticos, eletro-eletrônicos, câmera fotográfica e filmadora, remédios, materiais, computação, teorias, clonagem, energias (petróleo, nuclear, eólica, solar,...) e etc. Sem contar os avanços nas Artes proporcionados pela indústria, como o Cinema.

Apesar de todos avanços tecnológicos que devem se dar nesse século - já adentrando em sua adolescência - o salto nesse campo não será tão impactante quanto aquele que houve nos dois (séculos) que o precederam. E muitos já tem essa noção.

Livro de Pietro Ubaldi, que fala sobre
a nova civilização, ainda em processo
de gestação.
Estudiosos dos meios de comunicação, de ciências sociais e filósofos percebem que nos próximos anos a verdadeira evolução da Civilização será no sentido do auto-conhecimento. O ser humano passará a desenvolver seu senso criativo e sua moral, que até agora estava em estado latente - ou se manifestando timidamente. O CARÁTER começará a ganhar peso na escolha de nossos relacionamentos. O bem-estar espiritual - das coisas intangíveis - será colocado à frente do bem-estar material. Este continuará existindo, mas terá peso (cada vez) menor. Isso deve ocorrer à medida que as gerações forem ganhando percepção de que existe um ponto de saturação nos ganhos materiais, e de que a luta por um mundo de segurança material, de ESTABILIDADE, é imprescindível para que as pessoas possam buscar desenvolver outros vetores de suas capacidades sem correr risco de passar fome ou dores ou doenças e coisas do tipo.

É claro que me refiro a uma estabilidade que garanta o mínimo do ponto de vista de dignidade humana. Porque, por menos que uma pessoa gere, essa pessoa não merece passar privações agudas. Especialmente num mundo que produz muito além do necessário para a subsistência de todos e todas. Além disso, numa sociedade que se diz Cristã, a responsabilidade em garantir a todos o mínimo é fundamental. Caso contrário, tudo será mais encenação do que ação.

O Século XXI apresenta várias possibilidades. Os precursores desses novos tempos já afirmavam tudo que falei - de forma infinitamente melhor, claro - em seus trabalhos ao longo do Século XX. Como tinham visão esses caras! Até hoje é impressionante.

Um novo ciclo está prestes a iniciar, e quem insistir em ficar de fora corre o risco de sofrer dor desnecessária.

As pessoas que desejam seguir a senda do progresso já fazem sua busca. Busca esta individual no momento. Pois nosso mundo, em grande parte, - especialmente por parte daqueles que o controlam - não enxerga ou não aceita esse caminho evolutivo. O único para nos aproximarmos do criador. Essa é uma das causas que geram muitas dúvidas por parte daqueles que já descobriram esse caminho. É duro viver de modo melhor num mundo que vê isso com maus olhos. As atitudes do ser orientado ao espírito devem ser discretas para não se colocar em evidência e ser mordidos pelos lobos materialistas deste mundo. Não há outro meio de se manter vivo e usufruir dos benefícios básicos.

O desenvolvimento dos próximos séculos será mais Moral do que Tecnológico. A Inteligência terá uma aplicação mais fraterna e portanto mais eficaz para melhorar o estado de bem-estar individual e coletivo. Isso trará o verdadeiro aumento de eficiência. Aumento de eficiência nas RELAÇÕES HUMANAS. Na COMPREENSÃO. Na ACEITAÇÃO. As idéias serão debatidas sem preconceitos e desenvolvidas ao máximo.

Por mais utópico que essa visão possa parecer, ela se torna cada dia mais palatável às pessoas. Boa parte da humanidade, mesmo que ainda não aceite esse lento desenrolar dos fatos, sente no fundo de sua alma que existe algo de verdadeiro e lógico em todas essas previsões. Os sentimentos e idéias mais profundas se encontram em todos seres. Até nos mais brutos e endurecidos. Em estado latente. Esperando o momento certo para começar a germinar. E o estímulo adequado. Porque é o único caminho para a evolução.

É essa a mensagem que Pietro Ubaldi em todas suas obras, procura difundir. E é dever de todos que começam a sentir e compreender os novos fenômenos se manifestar. A difusão é o único caminho de gerar instabilidade virtuosa.

A luta do momento é a das idéias. É o resgate das Utopias vindas precocemente de um passado não tão remoto. Só que de forma branda, reformulada, melhor compreendida. Será dada uma interpretação sábia. Graças às experiências dos últimos dois séculos é possível evitar dor no futuro.

O progresso dos próximos anos não virá nem com a força física nem com a econômica. Esta, apesar de ser o mecanismo da moda para repressão do Progresso, deve ter seus efeitos minimizados cada vez mais com o passar das décadas e séculos.

Será a força das IDÉIAS e dos SENTIMENTOS o motor de desenvolvimento humano.

Esse é o progresso que devemos esperar daqui pra frente. Quem se adaptar aos novos tempos tende a ter uma vida mais equilibrada, que conduzirá a uma evolução intelecto-moral. Quem se recusar a essa adaptação, se prendendo aos bens materiais tende a prolongar o sofrimento, e sua vida será uma espiral de desordem.

Portanto, é fundamental a compreensão das nuâncias e o estudo. Este deve permear – consciente ou inconscientemente – tudo que fazemos. 

sábado, 14 de dezembro de 2013

A Conquista de Aqaba: a importância da ousadia inteligente

Do meu ponto de vista, todo filme realmente digno de entrar para a História deve ter em sua temática temas universais. Ou seja, para ser lembrado – devido ao fato de se apoiar numa ideia, num sentimento, numa concepção de mundo que sempre sondou, sonda e sondará a mente de seres humanos – um filme (ou uma pessoa, ou um grupo) deve trazer em si algo que vá além do lugar-comum. O mesmo vale para grandes feitos.

Em “Lawrence da Arábia” [*], dirigido por David Lean, um dos episódios mais marcantes é a conquista de uma cidade chamada Aqaba (al-ʿAqabah) pelas tribos árabes, lideradas por T.E. Lawrence. Trata-se de uma cidade costeira no extremo sul da Jordânia que na época fazia parte do Império Turco-Otomano[**]. Essa cidade tinha uma particularidade militar que a tornava estratégica para quem a detinha: ela era litorânea e seu golfo era estreito, e o único meio de atingi-la (conquistá-la) por terra na época era atravessando o Deserto do Nefud pelo leste[***], já que todo resto era de domínio turco, e estes possuíam canhões de 14 polegadas, concedidos pelos seus aliados alemães, apontados para o litoral (estreito). No entanto, o Nefud tinha uma extensão de mais de 700 quilômetros, tornando uma viagem de travessia de alto risco. Ou seja, se tratava de uma fortaleza inexpugnável. Pelo menos à primeira vista.

Auda Ibu Thay (Anthony Quinn), T.E. Lawrence (Peter O'Toole),
e Xerife Ali (Omar Sharif).
Lawrence, quando foi enviado para o Oriente Médio, tinha a simples e monótona função de apenas “avaliar a situação”. Essa tarefa lhe fora incumbida por seus superiores hierárquicos, apenas para mantê-lo ocupado – ou seja, cumprir estatísticas. No entanto, uma mente estudiosa e inquieta jamais iria se conformar com o lugar-comum. E ninguém aparentemente tinha consciência disso.

Quando o jovem oficial inglês tem uma ideia que possa resolver o problema árabe – e sobretudo britânico... – ele é visto como louco e insensato. “They have 14 inch guns in Aqaba!” (Eles tem canhões de 14 polegadas em Aqaba!), diz seu colega Sherife Ali (Omar Sharif no filme) ao ouvir a loucura idealizada pelo inglês. No entanto, a vontade do inglês suplanta todos medos e incertezas e é levada à frente. E dá certo.

Um dos maiores motores de crescimento humano é a OUSADIA. Mas não apenas ela. Ousadia sem raciocínio não vale muita coisa – é um ato de loucura sem sentido que deve ser evitado. A ousadia que estimula mentes e move o mundo e causa admiração é a ousadia INTELIGENTE. Esta foi a ousadia de Lawrence ao pensar na conquista de Aqaba.

Se trata de uma questão bem simples: explorar brechas para atingir um objetivo maior. Ninguém seria louco de tentar invadir uma pequena cidade pelo mar quando haviam canhões alemães potentes prontos para aniquilar qualquer frota que ousasse entrar no (estreito!) beco litorâneo de Aqaba. Nem Sua Majestade, (os britânicos), com sua formidável e numerosa e profissional e poderosa marinha, ousariam isso. Restava um deserto extenso e árido e inóspito – que ninguém igualmente queria encarar.

Reunião das tribos árabes antes da grande empreitada.
Quando se pensa numa travessia de 700 quilômetros numa região desse tipo os riscos são dos mais intensos e variados – além de imprevisíveis. O racionamento de água, o calor desumano, o cansaço físico, o alimento, as tempestades, os problemas de orientação, os conflitos...Tudo pode causar o colapso. Logo – e sabendo disso muito bem – os turcos estavam tranquilos em saber que seus canhões não eram capazes de serem apontados para sua retaguarda. Ninguém viria por terra, pensava-se. Não só os turcos, como os árabes e os ingleses acreditavam nisso, reforçando ainda mais a confiança dos primeiros. E é dessa brecha que Lawrence tomou proveito.

O “e se...” sempre foi importante na nossa História. É algo que nos faz re-pensar e re-avaliar situações e pré-conceitos. É um questionamento proveniente da filosofia, mas que não deve ser de posse exclusiva dessa. É um ato de filosofar que tende a permear todas pessoas – independente de sua área do conhecimento – que tenham desejo de criar algo a mais em seu campo. Essa foi a gênese do grande feito de Aqaba. E de todos grandes feitos da humanidade.

É importante destacar que ações ousadas e inovadoras podem ocorrer em vários campos e por motivos diversos. Algumas são taxados de benéficas (para a sociedade); outras, como maléficas (também para a sociedade). Mas será que essa taxação está correta? (quem no fundo propaga esse critério de classificação?). Será que essa classificação de correto/incorreto que é “nossa” não é impressa em nossa mente de forma inconsciente por meio de uma conjuntura político-econômica-social? Ao longo de anos, décadas e séculos...Ao longo de gerações, que só aprenderam a analisar os fatos sob UM único prisma; ao longo de gerações, que são exímias analisadoras SUPERFICIAIS de efeitos, propondo soluções “eficientes” e “imediatas” para os maiores problemas que sondam a sociedade contemporânea (mas que no entanto ignoram causas profundas, desconhecidas para o grossa da humanidade atual). Esses são pontos relevantes que devem ser POSTOS EM PAUTA nos dias atuais (jamais escondidos, como é de costume).

Deve haver confronto de ideias a título de se chegar a um modo de vida mais elevado – para tudo e todos. Sim, CONFRONTO. Confronto CONSTRUTIVO. Confronto, BEM-INTENCIONADO. Confronto que parte de intenções e pensamentos HONESTOS. Mesmo que à primeira vista, e para bilhões de pessoas – inclusive aquelas ditas eruditas, cultas, estudadas e etc – esse confronto se assemelhe a uma tentativa de desordem ou uma utopia. Deve-se tomar muito cuidado com isso, porque seguindo o lugar-comum nossa espécie não parece estar sendo capaz de resolver os problemas cada vez mais perturbadores e crescentes. Problemas cada vez mais intensos em nossas mentes e próximos aos nossos refúgios de sossego.

É muito difícil nadar contra a corrente de pensamentos que impera nesse planeta. Mas é algo que deve ser exercitado cada vez mais – mas lembre-se: de nada vale ser do contra simplesmente por ser “do contra”. isso deve ser consequência (e não causa) de uma ideia formada ao longo dos anos, visando atingir progresso do conjunto.

Devemos nos re-avaliar constantemente e pacientemente.

Eu venho fazendo isso. E ainda estou longe de chegar ao fim absoluto – será que ele existe?...espero que não... =)

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Aposentadoria em Mutação

Há cem anos a expectativa de vida de uma pessoa orbitava por volta dos 40 anos. Isto é, para a maioria das pessoas, que trabalhavam excessivamente e exaustivamente em atividades físicas de execução. Hoje, apesar do cenário dessas pessoas ter se tornado mais mental e menos sofrido, a prevalência da execução sobre a criação ainda é grande. Além disso, a expectativa de vida dobrou em média. O que significa que temos o dobro de horas. Horas que precisam ser preenchidas de alguma forma. Úteis, de preferência.

Na época do meu tataravô era normal o ano da aposentadoria coincidir com o ano da morte da pessoa. A criança (sim, a criança) começava sua vida laboral aos 12, 15 anos, e continuava ininterruptamente sua atividade até os 35, 40 anos, quando seu corpo estava exausto e não podia mais servir de ferramenta produtiva. E - pior de tudo - como essa pessoa se ESPECIALIZOU numa atividade puramente EXECUTIVA - que, alias, é uma infeliz coincidência, pois ela executa o físico e o espiritual do ser humano lentamente. executa no sentido de eliminar, degradar. Mas hoje pode-se constatar que houve um certo progresso.

Uma pessoa de nem pobre nem rica, mas que depende do trabalho, "produz" dos 30 aos 60 anos, mas provavelmente viverá até os 80. Ou seja, trata-se de vinte anos livres para ocupar da forma que se deseja. No entanto, esse caso genérico ainda não é tão comum se analisarmos algumas (numerosas) partes do globo. E também, não há garantia de uma vida plena em termos de saúde para uma boa parcela da população.

Quem vive em países que possuem uma jornada de trabalho relativamente civilizada, - como Alemanha, Holanda e Dinamarca, só pra citar três exemplos - onde a maioria dos indivíduos tem a possibilidade de cursar um bom ensino superior, ter uma semana de 30 a 35 horas (sem problemas nos transportes e com férias que chegam a 6 semanas por ano, como no caso da Dinamarca) e portanto ter uma vida pessoal decente. É claro que lá se aposenta mais tarde, mas a questão é que o indivíduo NÃO SE DESGASTA a uma taxa tão grande ao longo dos anos.

A postura em relação a benefícios sociais-previdenciários-trabalhistas dos países citados acima tende a permear a humanidade ao longo das décadas ou séculos. Isto é verdade se a nossa civilização não deseja entrar em colapso. Agora, um ponto que vale a pena ressaltar é o seguinte: os governos e corporações devem perceber que um novo modo de vida sócio-cultural está em gestação. Esse modo de vida vem sendo reprimido em grande parte dos meios cultuados pelo “estabilishment”. E, no entanto, – por ser uma tendência natural – as vozes continuam se manifestando. A favor de uma outra maneira de estruturarmos as relações econômicas e, consequentemente, sociais, afetivas e culturais.

O sociólogo austríaco André Gorz fala sobre a extinção do trabalho da maneira como o conhecemos. Claro, ele não se refere a trabalho como a execução de uma atividade criativa ou útil, e sim a um trabalho institucionalizado, industrial, com catracas e crachás e cercas e muros e arames e controle e foco no tempo. Esse trabalho - se é que podemos denominá-lo por tal - será cada vez menos ofertado. Por que? Simplesmente porque a automatização nos livra cada vez mais de atividades monótonas. E o consumo - ah! consumo...sempre ele... - chegou a níveis tão altos, puxando a produção a níveis insustentáveis, que se tornará cada vez MAIS VISÍVEL a loucura na qual nos inserimos. Infelizmente existem diversos artifícios para maquiar essa insustentabilidade, como propagandas e sonhos de vida que não condizem com sua personalidade e aspirações reais.

Outro sociólogo italiano, Domenico De Masi, baseado em dados estatísticos, afirma em sua obra "O Ócio Criativo", que a quantidade de horas necessárias para manter a economia rodando cai de 3 a 4% ao ano. E existem duas soluções para isso, ambas bem simples. Mas apenas uma delas é sensata:

Primeira: demite-se 3 a 4% dos funcionários (ou mais) e mantém-se (ou aumenta-se) a carga horária dos que permaneceram empregados, roubando o pouco tempo que lhes resta ou...

(Segunda) reduz-se a jornada de trabalho de 3 a 4% ao ano, mantendo todo mundo empregado, e com mais tempo para se dedicar a outras vertentes da vida. Isso seria uma mudança gradual.

A nossa civilização, em sua insensatez, sempre optou pela primeira solução. Que, convenhamos, no fundo é uma pseudo-solução. Mas os sinais de desgaste são cada vez mais evidentes que chegará um momento crítico no qual a sensatez será finalmente levada em consideração.

Quando chegar o momento, teremos de reformular o conceito que temos de aposentadoria, criando novos mecanismos de inserção social e aprendendo a usar nosso tempo (cada vez mais) livre de forma inteligente. Aliás, creio no seguinte: não terá sentido mais falar-se em aposentadoria. Pois, com um ritmo de vida cada vez mais coerente com nossa natureza biológica, tenderemos a fazer mais do que gostamos na hora que quisermos e do nosso jeito. Como conseqüência, gostaremos cada vez mais de nossas atividades e tenderemos a ter mais saúde, nos mantendo em atividade até o fim de nossas vidas. Essa é uma possível conseqüência do aumento do tempo livre. Mas para atingir esse estado (ainda) utópico, o tema em questão precisa ser colocado em pauta pela sociedade e todas instituições relacionadas a ela – ou seja, todas.

Não há mais motivo para um tema tão importante para a evolução da nossa – e de todas espécies – ser ignorado porque um punhado de indivíduos engomados e com poder tem uma visão distorcida do que é progresso e do que e qualidade de vida. Aliás, gostaria de ressaltar que existem alguns líderes empresariais que já vem aplicando conceitos orientados para essa sociedade do futuro. E que, apesar de serem pequenos e suas políticas serem pouco propagadas pelos meios de comunicação, – que na maioria dos casos não estão interessados nesse progresso – esses dirigentes já plantaram sua semente, mostrando um modelo do futuro.

O aumento da maturidade individual, aliado a mais tempo, nos possibilitará ir mais longe. Na vida e na criação.

Não estou falando nada novo nem revolucionário. Keynes já tinha essa visão. Bertrand Russell também. De Masi, Gorz, Alain Tourraine, Toffler e cia igualmente. Até os artistas como Bukowski enxergavam isso. No caso deste, seus textos transmitiam a loucura que era o modo de operação da sociedade, e traduziam isso numa linguagem simples. Objetivamente, mostrando as coisas como eram, de forma nua e crua. Sem rodeios ou terminologias específicas.

Se tanta gente tão estudada em tantas áreas (e com tanto sentimento) tem um discurso semelhante, será que eu deveria estar com medo de dizer tudo isso aqui, abertamente?

Quem mata as pessoas de saúde é um sistema que não mais é capaz de atender as necessidades e aspirações do Ser Humano do Terceiro Milênio, desejoso de evoluir. Um sistema que deposita obrigações desnecessárias em mentes que abrigam sonhos e idéias e sentimentos e amor e coisas dessa natureza. Um sistema que mata aos poucos. O sistema joga bigornas pesadas em cima de cabeças sensíveis e capazes, dizendo: "Mantenha-a (bigorna), carregue-a! Se você quiser ter seu sustento para os próximos dias, esse é o ÚNICO caminho!" Pois eu - e cada vez mais gente - respondo: é sim, o único caminho...é o único caminho PARA A LOUCURA.

Do meu ponto de vista, num mundo evoluído não existe aposentadoria. Pelo menos não do jeito que a gente conhece. Existe apenas saúde e criação. Esta última conseqüência da primeira. Saúde mental e física.

É compreensível que a mudança seja lenta. O que é difícil de compreender é a existência de seres obtusos que fazem questão de puxar o trem da História para trás, evitando o progresso. Pensando egoisticamente. Mercadologicamente. Sem sentimento, sem racionalidade. Apenas com uma pseudo-racionalidade. Fundada em conceitos incompletos e departamentalizados, e portanto não aplicáveis a nossa Era. Mas esses seres estarão cada vez mais solitários e fracos se persistirem em sua teimosia. Se não nessa geração, talvez nas próximas.

Teremos de aprender a nos virar nesse novo universo que se abre para nós. Universo permeado de tempo livre e energia. Muitos tem medo disso. E é compreensível. Pois o ser humano sempre foi acostumado a trabalhar excessivamente ou a desperdiçar tempo e riqueza em atividades degradantes. Jamais houve uma cultura coletiva que prezasse pelo tempo livre extenso e construtivo. Mas esse parece ser o começo da solução para os problemas que permeiam nossa sociedade.

É recomendável começarmos a semear o terreno para a nova sociedade, cujos frutos desejamos colher nas próximas décadas e séculos.