Quando alguém torna um texto seu, com
seus mais íntimos pensamentos, público, geralmente se trata de uma
atitude pouco recomendável. Quantas vezes observei pessoas lançarem
longos tratados sob mantos de moralidade sem no entanto revelarem
nada mais do que problemas pessoais mal resolvidos (por sua própria
culpa inclusive). Isso no entanto, não constitui um problema tão
grave se tratando de um ser humano cuja ocupação não lhe exponha
sob os holofotes da mídia (atores, jornalistas, políticos, etc). No
entanto, a partir do ponto em que uma pessoa influente deixe seus
instintos dominarem seus atos e estes sejam revelados ao público, o
dano é tremendamente maior. Cisão sem explicação. Separatismo e
choques. Vetorizarão dos males que pessoas tentam superar;
enxugamento das conexões profundas sendo estabelecidas a nível
individual e coletivo.
Falo sobre essa armadilha porque o
tema exposto aqui talvez seja tão polêmico quanto àquele tratado
em meu ensaio “Por que eu acredito em Deus”. Mas da mesma forma
que ressaltei o meu desejo de demonstrar que não se trata de uma
imposição, reproduzo a mesma vontade desde o início deste novo
ensaio. Este, sem dúvida, está intimamente relacionado àquele, e
pretendo, através da lógica e da razão, demonstrar que a ciência
se aproxima cada vez mais da fronteira do que denominamos (ainda)
imponderável.
Partindo de uma vontade esclarecedora
– e portanto unificadora – decidi colocar no início do título
“Por que”, de forma a deixar claro que desejo justificar de forma
racional, apelando à razão e bom senso do leitor sem preconceitos,
cujo desejo é antes de tudo conhecer a verdade, independentemente se
esta lhe agrada ou não.
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Problemas: estabilidade econômica, patogênese do câncer, reencarnação. |
Muitas pessoas buscam argumentos
bíblicos para refutar ou comprovar a teoria da reencarnação,
dependendo de qual lado estão. Isso é fazer uso da ciência de Deus
(Teologia) para satisfazer uma vontade egocêntrica centrada
unicamente em si ou seu grupo (egoísmo). No entanto, a partir do
momento em que combinamos a visão teológica com a científica, e
colocamos uma pitada de espírito filosófico, o fenômeno começa a
ficar mais claro e os conceitos tendem à convergência.
O V Concílio Ecumênico de
Constantinopla (553 d.C), foi polêmico por condenar a preexistência
do espírito e a Apocatástase (restauração de todas as coisas).
Isso se deu, de acordo com documentos históricos [1], à mulher do
imperador romano Justiniano, a imperatriz Teodora. Essa mulher, de
acordo com suas frequentes consultas a médiuns, ficou sabendo que
foi uma prostituta em outra vida, e suas ex-colegas, por saberem
disso e difundirem tão vergonhosas particularidades à léu,
causavam grande revolta na imperatriz. Logo, para acabar com essa
história, mandou eliminar todas as prostitutas da região de
Constantinopla.
Com esse ato Teodora ganhou fama de
assassina pelo povo, que era reencarnacionista e afirmou que ela
seria assassinada 500 vezes em vidas futuras (o número de mulheres
mortas por sua ordem).
Com isso a mulher de Justiniano passou
a odiar a teoria da reencarnação e resolveu iniciar uma cruzada sem
tréguas contra ela – a ideia era mais desagradável que os dizeres
de suas colegas. Como se tratava de uma mulher influente, convenceu o
marido a perseguir quem a concebeu ,Orígenes [2], um sábio da
teologia e filosofia que viveu três séculos antes e estabeleceu os
fundamentos da reencarnação.
Assim Teodora e Justiniano
desestruturaram a doutrina da preexistência, levando como
consequência à destruição da teoria da reencarnação.
No ano de 543 d.C Justiniano publicou
um édito em que expunha e condenava as principais ideias de
Orígenes, sendo uma delas a preexistência (CHAVES, 2002,
p.185-186).
Eis em linhas gerais o contexto
histórico no qual foi abolida a teoria reencarnacionista na Igreja.
Como se vê, para os opositores fervorosos, trata-se de um caso
semelhante à história dos cinco macacos e do cacho de bananas.
Quanto ao aspecto científico, lógico
e racional, me apoio na obra “Problemas Atuais”, de Ubaldi.
A primeira contestação que sonda as
mentes céticas se refere aos efeitos visíveis. Deseja-se uma prova
científica de tal fenômeno, de modo a comprovar a pré-existência
da alma e sua continuidade. A essa contestação podemos citar as
qualidades inatas de certos indivíduos que, desde a mais tenra
idade, apresentam aptidões fora do comum, que só podem ocorrer com
milhares de horas de estudo e treino contínuo. No entanto, admitida
essa necessidade, observamos crianças de 4 anos tocarem piano melhor
do que pessoas que passaram a vida inteira se dedicando a música –
e fazendo isso bem [4].
Apresentando estes casos excepcionais
a mente racional (com razão) continuará demonstrando muitas dúvidas
sobre a teoria da reencarnação, e ao mesmo tempo apresentará
diversas explicações concretas para tal fenômeno. Responderão que
se trata de uma vantagem genética que aumenta a taxa de assimilação
(em uma ou várias atividades). Aumenta, mas não exclui a
necessidade. É plausível. No entanto, o fato disso ser uma verdade
– ou a possibilidade de sê-la – não significa que se tenha
chegado às causas primeiras que expliquem essas habilidades. Ou
melhor, essa fenomenal taxa de aprendizado da ordem de centenas ou
milhares de vezes.
Quantas vezes a humanidade, através
da ciência, estabeleceu como verdade absoluta algo até o momento
que se demonstrava incompleto. Lembremos da teoria da gravitação de
Newton expandida por Einstein; ou o modelo da Terra; ou as
(alternadas) receitas médicas para uma vida saudável; e por aí
vai. Verdades relativas.
Mas a questão é: se existe uma Lei
diretora no Universo, e portanto uma justiça, como é possível que
esta dê a um habilidades excepcionais enquanto outros se mantêm na
média? Para o caso daqueles que creem nesse pensamento diretor, isso
é inaceitável e deve-se recorrer a uma teoria que satisfaça à
razão, à lógica e ao sentimento. Nesse caso a teopria
reencarnatória é a única capaz de concatenar logicamente essas
dúvidas.
Quem acredita que tudo é caos – e
portanto inexiste uma justiça universal – “resolve” o problema
facilmente, atribuindo ao acaso tal 'acidente' da Natureza, seja ele
benéfico ou maléfico. No entanto, observemos atentamente o
comportamento deste cético, com uma mente puramente racional e
prática, que aparenetmente resolveu tudo num passe de mágica.
Muitas pessoas que declaram não crer
numa Lei universal o fazem – a meu ver – por motivos práticos.
Permeadas de medo de se lançarem num oceano de dúvidas que
conduzirá a reflexões profundas e incômodos, é mais vantajoso (e
esperto, neste mundo) se ater aos problemas imediatos e resolvê-los
magistralmente – garantindo sucesso e segurança momentânea – do
que se lançar em investigações que consomem tempo, energia e são
incertas. Chegam a pseudo-conclusões. Os motivos são justificados:
quantas vezes observou-se pessoas falarem do imponderável de forma
demagógica, tentando impor teorias sem nenhuma base lógica e com o
unico intuito de converter mentes. No entanto, o fato de grupos
fazerem o uso da idéia para se autopromoverem não a desqualifica.
Outro ponto: pessoas céticas e que
afirmam não existir Deus chegaram a essa conclusão baseado em
experiências individuais (vivência) ou coletivas (estudo da
História). No entanto essas mesmas pessoas que negam uma Justíça
divina, afirmando que tudo é caos no universo, tem um senso moral do
que é certo ou errado. Ou melhor, princípios que julgam universais
e são involáveis na sua consciência. Muitos dizem que os espertos,
com uma pitada de sorte, ganham o mundo, mas ao mesmo tempo essas
pessoas, diante de situações em que poderiam se dar bem à custa
dos outros, se veem incapazes de passar em cima do outro. Por quê?
Existe a ação de um freio mental que atesta uma falta de crença em
suas teorias. Sua consciência lhes diz que há algo de errado
naquilo. Apesar da negação de uma ordem universal, as atitudes
atestam possibilidades.
A teoria da reencarnação, como o
próprio nome diz, é uma idéia que aponta para uma possibilidade
lógica, ainda não detectada por nossos instrumentos.
Einstein, quando elaborou sua teoria
da relatividade, não provou nada experimentalmente. No entanto,
todos seus diagramas e formulações e linha de raciocínio, se não
podiam ser aceitas de prontidão, igualmente não podiam ser negadas.
E eis que, décadas após, com a conquista do espaço próximo, a
humanidade colocou sua teoria à prova e a confirmou.
Á falta de sensores adequados só
podemos nos declarar impotentes para as novas idéias. A negação é
um ato de preconceito ou falta de espírito empreendedor, a meu ver,
que deve ser superado por uma humanidade cada vez mais desejosa de
ascender nas esferas morais, afeitvas, culturais e espirituais.
As teorias precedem às descobertas,
mesmo que o mundo dê evidências a todo momento das mesmas – mas
as pessoas se recusem a ver uma Lei naquilo. Estudando a História da
ciência isso é cristalino.
Descobrimos alguns dos porquês. Mas
existem os porquês dos porquês, que exigem novas concepções.
A humanidade tem o instinto atávico
de negar o novo por ter assimilado por demasiado tempo o antigo.
Verdades que eram adaptadas à forma mental antiga, com sua
sensibilidade intelectual e moral aquèm dos padrões presentes
(ainda baixos perante o divino), não resolvem os problemas atuais.
Problemas cada vez mais demandantes e presentes. Problemas que nossas
ciências, nossas religiões, nossas filosofias e nossa própria vida
social e afetiva, encontram.
Para finalizar este ensaio ouso lançar
uma idéia ousada além da conta.
Acredito que, sendo verdade ou não, a
crença na Teoria da Reencarnação fará a humanidade conquistar uma
posição nunca antes atingida. No campo afetivo, no trabalho, nos
estudos, em tudo.
Por quê? Porque quando colocamos em
nossa mente – mesmo que nos autoenganando – de que INEXISTEM
LIMITES temporais para nossos planos, nosso FOCO será na ESSÊNCIA
de nossas atividades.
A conquista de uma moça que amamos
será feita através de um processo lento, gradual, firme e
laborioso, com paciência e sem nervosismo e imposições, que pode
nos levar a conquistar o inconquistável.
Um trabalho será feito com imersão
total, sem medirmos os ganhos num prazo próximo. E com isso talvez
atinjamos metas nunca antes imaginadas.
Quando não pensamos (conscientemente)
em superfluidades como prazos tendemos a nos fundir apaixonadamente
com aquilo que fazemos, e nesse mesmo prazo apertado conseguimos
possivelmente realizar feitos incríveis. E mesmo que não, o efeito
ao longo de anos, décadas e – para quem crê – vidas, é
sentido. Incorpora-se no ser novas características. O difícil passa
a ser natural. E assim podemos passar a trabalhar em planos mais
vastos.
O filme Gattaca [5] tem uma cena que
me encantou, no qual o irmão geneticamente inferior (Ethan Hawke),
que sempre apostava um nado com o irmão, num percurso de ida e volta
até a costa – e perdia – uma vez ganha de lavada do mesmo. O
segredo? “Eu nunca pensei na volta.” A mente vence a genética. O
espírito vence a matéria. A capacidade de superar a forma mental
convencional suplanta qualquer superioridade genética.
Eis que o maior dos poderes se revela
impalpável.
"O
erro não se torna verdade por multiplicar-se na crença de muitos,
nem a verdade de torna erro por ninguém a ver...".
Gandhi
Referências
[3] “Problemas Atuais”, A Teoria
da Reencarnação (1a Parte). Pietro Ubaldi.