Estamos vivendo uma vida cada vez mais movimentada, incerta - e portanto imprevisível, que nos leva a não considerar planos de longo prazo ou pensamentos profundos que se relacionam a isso - e sem orientação. E este talvez seja o aspecto mais crítico de nossos tempos.
Por que tanto corres, se não sabes par 'onde' vais? Quo vadis? (para aonde vais?)
Vejo à minha volta, nas ruas e no ambiente de trabalho, pessoas correndo freneticamente. Se preocupando com os deveres que lhes são impostos. Pessoas que fazem as atividades apenas por coerção (pressão exterior), sem um pingo de convicção naquilo que executam - e portanto, sem interesse, sem paixão. A criatividade para melhorar o modo como as coisas são feitas desaparece para aqueles que estão cansados de tudo isso. O inconsciente coletivo - especialmente as pessoas mais simples em termos de posição social e estudo, porém com uma centelha de intuição - anseia por algo diferente, que chacoalhe, que abale seus conceitos de uma forma muito provocativa, por algo maravilhoso. Por um ato de coragem inteligente. Coragem atraente. Coragem que se transforma e alce o ser a outros ambientes, outras tentativas, outras conexões, outras formas de perceber...
Nosso grande desafio é um só: maturação interior. O resto são desdobramentos (consequências) que se ramificam numa árvore imensa de problemas.
A questão da alteração do clima (aquecimento global, acidificação dos oceanos, perda de biodiversidade, perda de área arável, etc.), a escassez de recursos essenciais para nossa civilização (petróleo, gás natural, carvão mineral, areia, cobre, cobalto, lítio, água potável, alimentos, etc.) e outros que dependem direta ou indiretamente deles (energia eólica, fotovoltaica, das marés, nuclear, etc.), é uma questão sistêmica. O modo de organização coletiva. Nossa hierarquia. Nossas prioridades. Nossa concatenação entre desenvolvimento humano e natureza infra-humana.
Não é possível resolver (=eliminar) as consequências de um fenômeno (ou processo) irreversível. Isto é, um movimento que aumente o nível de degradação energética do conjunto. O sentido é único. O que é possível fazer é, a partir do ponto em que nos encontramos, começar a decrescer em termos econômicos (=materiais) para, logo em seguida, forjar uma nova forma de viver. Ou seja: desacoplar a evolução da humanidade com qualquer coisa que esteja ancorada nas quantidades.
Mas tudo isso - nossa situação caótica presente - vem da forma mental. É ela que sustenta o paradigma, que nada mais é do que o padrão estabelecido coletivamente. Padrão aceito por tudo e todos, sendo a bússola para atingir-se qualquer objetivo. É um objetivo geral que encampa os objetivos específicos - que devem estar enquadrados nessa grande ordem. O nosso problema é que não fomos capazes de perceber claramente, ainda, que esse objetivo supremo (a premissa), já não serve mais à nossa realidade.
A configuração social e econômica, aliada às tecnologias, aos sistemas de organização global e às interações cada vez mais diversificadas e fluídas de cada indivíduo, apontam para uma nova forma de conceber a vida. Uma sensibilidade muito mais pronunciada, que seja capaz de extrair ideias, inspiração e riquezas a partir de um simples gesto, ou paisagem, ou observação. Uma ousadia de amplitude vasta, para seguir o ritmo da paixão que vibra em cada alma desesperada. Desesperada com as repetições cíclicas, que devem adquirir abertura para o ser não morrer de desespero numa vida sem sentido - se tornando um morto-vivo...corpo inerte que repete e restringe suas liberdades, agindo de acordo com o contexto.
Agindo de acordo com nossa constituição genética, nossos títulos e saberes, e nosso meio (físico, social e cultural), nos entregamos às circunstâncias. Nos entregando às circunstâncias, deixamos de descobrir aquilo que realmente somos e não conseguimos crescer.
Quem é você?
Você não é um nome, um título, um endereço, uma profissão, um número, um corpo ou coisas do tipo. Você é manifestação de um transformismo incessante que deseja encontrar um novo ponto de apoio que permita a expressão de seu ser (=essência). Ser único, singular, diferenciado e ansioso por coordenar essas capacidades ímpares num sistema adequado a albergar as diferenças criativas e dinâmicas.
Para tudo isso ocorrer, precisamos mudar o sistema presente - ou melhor, sua lógica.
Para mudar essa lógica, precisamos estabelecer novos princípios.
Para estabelecê-los, mister se faz enxergar a realidade integralmente.
Para enxergar a realidade integralmente, é preciso evoluir.
E evoluir é expandir a consciência - e com isso elevar a forma mental.
Meu amigo, perceba que a transição de um modo de viver para outro não pode ser solucionada pela simples desaceleração ou aceleração no mesmo plano de vida. É preciso ascender a outro plano de vida. Novos princípios, novos paradigmas, nova civilização...
No fundo, você sabe: as coisas não podem continuar assim. O corpo não aguenta. O emocional está la embaixo, enquanto a capacidade de pensar se confunde com um automatismo bitolado que destrói o melhor de nós em prol de desempenho (acadêmico, sexual, profissional, etc.).
Ser inteligente não é ter boletim recheado de notas ou títulos diversificados em instituições renomadas. Não é obter excelência dentro dos padrões impostos - mas superá-los e inventar novas formas de vida. Inteligência é saber superar uma situação inesperada de modo inesperado (e ter coragem para isso!). É saber se recriar constantemente através das dores. É tentar de forma cada vez mais ousada e criativa. É se deixar levar pelo fluxo evolutivo que paira sob nossas almas nesses tempos tão conturbados. É viver sem medo, sabendo que nós somos imortais porque somos individualidades movidas por uma substância indestrutível.
É preciso falar diante de nossos semelhantes preenchidos de espírito santo. O discurso ganha uma força titânica. A racionalidade é conduzida pela intuição. A bondade, aliada ao pensamento, ganha um novo ar, que se manifesta no modo de encarar as coisas e de se expressar e de buscar conhecimento. Cada vez se filtra mais e melhor. Síntese. A qualidade passa a predominar sobre a quantidade. E assim como metamorfoseamos a nossa personalidade, devemos fazer o mesmo com a coletividade.
A transição planetária é um fenômeno evolutivo. Logo, natural. Não devemos fugir dela. Nossa preocupação não deve estar focada em sobreviver corporalmente ou em posição de poder a esse mundo em destruição (em seu aspecto formal) - mas garantir que continuemos a participar da evolução planetária. Ou seja, devemos nos melhorar o máximo possível agora, nessa existência, para podermos dar uma contribuição substancial num mundo de regeneração. Um mundo muito melhor comparado ao presente. A civilização do espírito.
O que quero dizer por civilização do espírito?
Uma sociedade que compreende e pratica (em alto grau) os valores multimilenares professados pelas escrituras sagradas. Uma sociedade em equilíbrio com a natureza e ciente das limitações de cada plano (material, energético, biológico e pensamento). Uma sociedade em paz consigo mesma, inclusiva, verdadeiramente integradora. Uma humanidade que pesquise cada vez mais os fenômenos intangíveis e se contente cada vez mais com o abstrato dos sentimentos sublimes e das ideias potentes do que com os aparatos externos criados para facilitar a vida corporal.
Uma civilização do espírito é uma civilização monista em sua filosofia de vida. Com uma religião científica e unitária, sem forma ou adorações ou rituais, que extraia o melhor de todas religiões que já existiram; com uma filosofia universal, capaz de filosofar à fundo sem cair na armadilha do eruditismo; com uma ciência espiritual, que superou (o que não significa destruiu) as limitações do reducionismo e da objetividade, adentrando no reino da subjetividade, da não-localidade, da continuidade,...do espírito.
E assim, ter-se-á uma civilização em que a Grande Equação da Substância será compreendida à fundo. E quem hoje sofre com a incompreensão será compreendido plenamente. Aqueles que estão sofrendo viverão com tranquilidade e sem preocupações. Aqueles que batalham pelo ideal criativamente e destemidamente serão recompensados com a oportunidade de trabalhar num mundo melhor. A pseudo-liberdade será mais liberdade real. Não seguir instintos e achar-se livre e esperto - mas compreender a Lei, se alinhar a Ela e assim segui-lá, tendo como recompensa uma alegria inefável de estar vivo.
Bem aventurados os puros de coração.
A intenção é o que melhora o ser - e não a busca eficiente por metas que permitam a ele gozar.
Bem aventurados os mansos.
A paciência diante dos absurdos é a arma mais poderosa para viver em paz, com saúde e ter boas relações.
Bem aventurados os misericordiosos.
Se desprender do que não interessa acaba nos levando a dar aos outros aquilo que ainda é visto como importante (mas de fato não o é).
Bem aventurados os que têm fome e sede de justiça.
Se indignar com os absurdos. Não se tranquilizar perante as práticas sentido é um anseio bom porque nos impulsiona a ousar novas formas de vida. Criatividade e ousadia.
Bem aventurados os pacificadores.
Evitar o conflito mais destrutivo para diminuir a necessidade da dor (ação da Lei) no processo evolutivo.
Bem aventurados os que sofrem perseguições por causa da justiça.
Quem sofre é porque quer transcender. Quer melhorar a si mesmo e - como transbordamento de sua plenitude de vivência - transformar o seu entorno. Novas relações. Relações mais profundas, belas, duráveis...sustentáveis.
Bem aventurados os pobres pelo espírito.
Precisamos saber a nossa posição e agir em prol de um mundo melhor, de uma manifestação da divindade, através de nossa condição. Ser simples, sintéticos, claros e ousados. Integrar. Transformar
Bem aventurados os tristes.
A tristeza é bela quando resultado de uma comoção por um aspecto do infinito que se manifesta através das multiplicidades cadeias do finito sensório. É a tristeza da admiração, que se impressiona até a medula e nos torna mais orientados no caminhar e mais cirúrgicos no falar. Nossos atos ficam mais preenchidos de espírito santo. Ser triste não é ser deprimido ou deprimente; não é chorar e reclamar. Ser triste é se maravilhar com a beleza que iremos nos tornar ("Sois deuses!") e com isso expressar o mais alto nível de nossa humanidade.
Vós sois a luz do mundo.
Somos maravilhosos todos. Cada um de nós possui um potencial infinito. Por que não descobrimos ele? Por que não usamos ele em todas as nossas atividades quotidianas?
Um pontapé inicial para uma nova civilização pode estar na vida e nas ideias de David Bohm. Um cientista que ousou ir além de seu campo. Um ser ímpar e cuja vivência e contribuições se alinham muito com a visão do Prof. Pietro Ubaldi.