sexta-feira, 29 de julho de 2022

Monismo Substancial (parte 2)

No ensaio anterior foi definido o monismo substancial, identificando-o com o 'monismo de caráter dual' de Peter B. Todd. Foi visto que esse monismo parte do monismo neutro, porém é diferente deste porque consegue integrar o dualismo em seu seio - sem no entanto deixar de colocar o aspecto unitário como aquele dominante em nosso universo. Dessa forma foi possível afirmar as verdades relativas de todas outras visões de mundo, ideologias, teorias científicas e religiões - e excluir os resíduos que negam a Verdade e o Absoluto. Ou seja, foi nos apresentada uma arquitetura (framework, em inglês) capaz de inserir todos os relativos dentro de si - logo, algo que inclui tudo, matéria, energia, vida, psiquismo, espírito...até Deus. Trata-se de algo que pode orientar a ciência em sua busca por uma explicação satisfatória de toda fenomenologia universal, unir as mais distintas religiões e doutrinas, coordenar as correntes filosóficas, irmanar os povos, as culturas, os indivíduos. 

Fig.1: O vórtice absorve e expele para o ambiente. Seja matéria, energia ou informação, há uma troca constante. 
As individuações só se dão por causa desse movimento de absorção-expulsão. É o que caracteriza todos
os fenômenos. Vórtices. Movimentos vorticosos. Motos fenomênicos...

A partir dessa cosmovisão, há muito a ser feito. Uma busca infinita num mundo finito.

O próximo passo é adentrarmos mais à fundo no conceito, observando evidências em nosso mundo e através das últimas perquirições da ciência, abandonando temporariamente o seu aspecto teológico e filosófico. Faremos isso baseado nas pesquisas e interpretações dos mais renomados físicos, biólogos, cosmólogos e demais personalidades do campo da ciência, do início do século XX à segunda década do século XXI. Isto é, traremos os fatos e as construções do campo racional, baseado na mais pura lógica e observações, com o intuito de demonstrar que tudo que vem sendo feito aqui, há quase dez anos - uma década! - não é mera divagação e/ou desabafo de um ser, mas um conjunto de afirmações profundas sobre os princípios gerais de funcionamento do universo. Trata-se de um domínio que, uma vez aberta uma brecha, nos permitirá conduzir nossas vidas de modo orientado (verdadeiramente orientado, não aparentemente).

Por quê?

Porque a reencarnação será percebida como fenômeno concreto; a informação, campo de atuação da consciência, será estreitamente jungida ao nosso universo quadridimensional de espaço-tempo; a consciência será percebida como uma dimensão superior, que em sua forma pura, é intrínseca, não-vibracional; a moral terá o mesmo valor que a inteligência, sendo cada competência (inteligência e bondade) uma asa que deve ter sua contraparte para que possamos alçar o voo evolutivo. 

Comecemos essa jornada citando um trecho de um paper escrito por Peter B. Todd no "Australian Journal of Parapsychology, ISSN: 1445-2308 Volume 17, Number 2, pp. 147-169".

"In evolutionary panentheism, mind and matter exist in a relationship of complementarity where neither is reducible to the other, while God is immanent in nature although also transcending of it. Thus the universe and the divine are not ontologically equivalent."

(grifos meus)

"No panenteísmo evolucionário, mente e matéria existem numa relação de complementariedade, na qual nem uma nem outra é redutível à sua contraparte, ao passo que Deus é imanente na natureza, apesar de também transcendê-la. Portanto, o universo e o divino não são ontologicamente equivalentes."

Livre tradução (grifos meus)

Fig.2: Peter B. Todd. Falecido recentemente. Já viveu o auge do físico (era fisiculturista). Depois estudou muito à fundo o
universo psíquico através de trabalho com pessoas com câncer. 

Mente e matéria seriam complementares e co-existem sempre, em todos lugares, a todo momento, de vários modos, para que a Realidade possa se manifestar e o nosso Universo (nós incluso) possa evoluir. E Deus estaria presente em toda natureza, desde o início do tempo até ao seu término, animando as coisas e os seres a partir de um impulso íntimo. mas Deus, ao mesmo tempo, estaria além de toda relatividade, não sujeito ao transformismo evolutivo, ou seja, no domínio total 'localizado' no Infinito e Eterno, Reino do Absoluto. 

Resumindo: 

1°) Deus É transcendente e imanente. 

2°) Matéria e Espírito seriam manifestações extremas de uma substância única.

Continuemos nossa pesca (de evidências) no terreno científico.

As Edward Kelly notes, in the book Beyond Physicalism, which he co-edited with Adam Crabtree and Paul Marshall (Kelly, Crabtree, & Marshall, 2015), the “physicalist consensus … rests upon an outdated conception of nature, deriving from Galileo, Descartes, Newton, and Laplace, that began its career by deliberately banishing conscious human minds from its purview!” (Kelly, 2015, p. 32).

TODD, Peter B.  (grifos meus)

Conforme Edward Kelly destaca, no livro Beyond Physicalism, co-editado com Adam Crabtree e Paul Marshall(Kelly, Crabtree, & Marshall, 2015), o “consenso fisicalista… se apoia numa concepção defasada da natureza, derivada de Galileu, Descartes, Newton e Laplace, que começaram suas carreiras banindo deliberadamente a mente consciente humana de suas análises! (Kelly, 2015, p. 32).

Tradução livre (grifos meus)

Percebam: não se trata de desclassificar os feitos da mente racional-analítica nos últimos três séculos. Não se trata de jogar no lixo a mecânica newtoniana e suas derivações nos mais diversos campos do conhecimento; nem o método científico; nem a observação e a objetividade; nem nada do tipo. Trata-se de ressaltar que os métodos consolidados se revelam incapazes de fornecer novas explicações do mundo. 

Frente às novas descobertas da Mecânica Quântica (o observador afeta o observado, ou a consciência interfere na realidade física...e vice-versa, como já se sabe), toda a realidade deve ser re-descoberta. Para isso é necessário incorporar uma nova dimensão às pesquisas científicas: a consciência, cuja 'morada é um domínio não-local e atemporal. E com isso serão carreados todos os objetos direta ou indiretamente relacionados a ela: livre-arbítrio, Deus, o Absoluto, o campo Akáshico, a informação, reencarnação, evolução, ressurreição, Queda do Espírito, etc. A ciência se transforma. Logo, seus métodos mudam radicalmente.

Da objetividade sensória passa-se à subjetividade íntima. Do pensamento sequencial passa-se à visão direta. Do estudo exaustivo, complexo e gélido passa-se à vivência intensa, singela e transformadora. É sem dúvida a maior revolução pela qual a nossa espécie irá passar. Não há nada igual na História humana. 

Wolfgang Pauli, um dos expoentes da Física Quântica, trocou ideias com Carl G. Jung, um dos expoentes da Psicologia Analítica, durante muito tempo trocaram 

Pauli, having collaborated with Jung, thus enriching archetypal psychology with insights from quantum physics, argued for a relationship of complementarity between mind and matter, as well as a worldview which embraced both rational understanding and the mystical experience of unity or holism.

TODD, Peter B.  (grifos meus)

Pauli, tendo colaborado com Jung, e portanto enriquecendo a psicologia dos arquétipos com vislumbres da mecânica quântica, clamou por uma relação de complementariedade entre mente e matéria, assim como uma visão de mundo que albergasse tanto a compreensão racional e a experiência mística de unidade ou holismo. 

Tradução livre  (grifos meus)

Estamos apontando a fala de um cientista célebre do século XX que nos deu o Princípio de exclusão, que estabelece que nenhuma partícula pode existir no mesmo estado quântico. Pois bem, essa mente brilhante 'clama' por uma visão de mundo capaz de incluir tanto o aspecto racional-analítico, constituído de sistematizações e estudos, quanto o intuitivo-sintético, norteada por visões e vivência

Quanto mais se vive mais se sofre. Quanto mais se sofre, mais se persiste nos caminhos errados - num primeiro momento. Isso leva ao cansaço. Repetições levam a um despertar ligeiro. A partir daí se sofre conscientemente. Quanto mais se sofre desse modo, mais se sente a necessidade de compreender a realidade. E assim inicia se a busca pelo conhecimento - e depois, a vivência deste conhecimento. 

Compreender não é entender.

Entender tem a ver com saber o funcionamento de leis de superfície. Tem a ver com estudo, memorização, aprendizado de superfície. É acúmulo de informações e erudição. É reproduzir sofisticadamente e argumentar até vencer.

Compreender tem a ver com ter ciência do porquê as coisas serem como são, e o mecanismo íntimo de funcionamento das coisas. Tem a ver com vivenciar todas as leis (superiores e inferiores, das espirituais às físicas) com todas fibras de seu ser. É conhecimento e atitude. É criar incessantemente e convencer através do exemplo. 

O assunto é simples, porém profundo. Vamos continuar.

Entre 1932 e 1958 Pauli e Jung colaboraram estreitamente no sentido de integrar de modo forte o fenômeno físico com o psíquico. Ou seja, o alvo de ambos era o "problema psicofísico". O interessante é que essa relação jamais teria se iniciado se o jovem Wolfgang não tivesse sido abandonado pela mulher (apenas um ano após o casamento!), uma cantora de cabaré. E foi ficar com um químico - o que o deixou muito perplexo, considerando que ele, um físico dedicado a desvendar os mistérios do mundo subatômico, era um 'objeto' de relação muito mais interessante - dentro do campo dos profissionais da ciência. Não, ele não se conformou. Se a mulher tivesse o abandonado por um lutador de boxe ou coisa do tipo, teria sido compreensível, e talvez até pouco doloroso. 

Fig.3: Wolfgang Pauli e Carl Gustav Jung. Expoentes da Física e da Psicanálise.
Os especialistas da matéria e da Mente se reunindo em busca da essência de tudo e de todos.

Vamos voltar ao que interessa.

Pauli estava fascinado com esse novo mundo quântico, em que toda a física clássica ruía diante das incertezas do comportamento da matéria. O que parecia determinístico em escala humana, com incontável número de elementos, passou a ser imprevisível, não-sistematizável, não equacionável, ou seja, parecia não haver uma lei que determinasse o comportamento da matéria a partir de uma escala muito pequena. Como o reducionismo científico partia do pressuposto que os blocos fundamentais formavam a realidade sensória, isso era claramente um soco no estômago na ciência materialista, reducionista, mecanicista, local e temporal. Foi dado o impulso inicial para o desenvolvimento de um movimento profundo que irá abalar as bases da humanidade. Isso está muito além da ciência - ferramenta de busca humana.  

E Jung. Carl Jung estava igualmente maravilhado. Só que com o mundo mental. A psique. A metafísica. Um domínio intangível, porém com repercussões profundas, que abalam as atitudes humanas e levam pessoas a fazerem coisas concretíssimas. Assim como Pauli, Jung estava fazendo uma revolução no seu campo. E à medida que os dois avançavam em seus objetos de estudo, mais próximo eles ficavam...

A relação se iniciou sem planejamento por parte de nenhum dos dois: Pauli chegou até Jung como um paciente. Um paciente quebrado, arrasado, deprimido, destruído. Um paciente muito, muito, mas muito mal. Que não entendia a lógica do mundo. E seu médico seria a pessoa ideal para lidar com tudo isso. 

Nascido em 1875 na cidade de Kesswil, Suiça, Carl Jung passou uma infância regada de conexões religiosas. Tudo indicava que ele seguiria o sacerdócio. Porém, sua inclinação acabou pendendo para a medicina e psiquiatria. Isso no entanto não significa que sua carreira e sua obra não teriam significado transcendente. A influência religiosa serviu de base para seu espírito já antenado imprimir um aspecto mais profundo em sua profissão, permitindo-lhe dar contribuições fantásticas no campo da psicanálise. 

Não irei me aprofundar no trabalho entre os dois aqui. Mas vocês podem se aprofundar aqui

O que gostaria de terminar falando é sobre o John Polkinghorne. Esse homem atuou tanto no campo da Teologia quanto da Ciência. Professor de física matemática na Universidade de Cambridge de 1968 a 1979, quando abandonou a cátedra para estudar para o sacerdócio, que acabou conquistando em 1982, tornando-se sacerdote da Igreja Anglicana. O homem chegou muito próximo da cosmovisão ubaldiana. Ao mesmo tempo, apesar de não ter visto o panorama mais geral de que tenho notícia, ele fez observações muito interessantes a respeito de nossa existência, de Deus e da re-organização de nosso universo.

"Regarding our eternal life as embodied beings, Polkinghorne shows that we are not mind and body. We are a unitary entity with both mind and body being essential aspects. That means, contrary to a belief in a bodiless spiritual existence, our destiny is a future with a resurrected body. Jesus’ resurrected body is a model of the properties all resurrected beings will demonstrate. As to how our personal identities survive death, he equates our essence to information patterns or code which are stored in the mind of God awaiting the final time of the restoration. This is not a re-creation, but restoration of the created cosmos. As we store data and programming in the cloud and can move these from device to device, so the resurrection serves as a “hardware upgrade,” with our existing bodies — like Jesus’ which bore the unhealed wounds of crucifixion — upgraded to a physical body suitable for living in a restored creation."

Fonte: BARON, G.R. (grifos meus)

Parece que nossa consciência armazena as informações essenciais de nossas passagens terrenas na 'mente' de Deus, que pode ser o Campo Akáshico tão estudado por Ervin LászlóPolkinghorne destaca que a ressurreição se dá no final do processo evolutivo. E que após nos tornarmos o nosso máximo (Espíritos Puros), teremos restaurado nosso estado original. Trata-se de restauração, não de recriação. Esta já foi feita no seio do Absoluto (Sistema). A restauração se dá no ponto culminante de nossa existência nesse universo (Anti-Sistema), quando 'saímos' dele e adentramos o Reino de Deus (Sistema).

Fig.4: Polkinghorne, sacerdote e cientista. Conhecedor das complexidades da matéria e das profundidades do Espírito. 
Buscou integrar ambos em busca da substância.

Ubaldi e Polkinghorne usam terminologia diferentes. Vão por caminhos um pouco distintos. Mas fazendo uma leitura profunda, percebemos que estão dizendo a mesma coisa. 

E esse inglês, interessantíssimo e muito determinado em sua busca, conseguiu encaixar o conceito de 'informação ativa' de David Bohm e aplicá-la à imanência de Deus - ou envolvimento ativo no cosmos em processo de regeneração. E mais: destaca que acaso (cegueira do ser, ignorância) e necessidade (impulso para ascender, fragmento do conhecimento originário) estão na base dessa imanência. 

Polkinghorne takes David Bohm’s “active information” concept and applies it to the question of God’s immanence or active involvement in the cosmos. Chance and necessity have been identified as the foundation of all that is and that happens. Chance, we now see, plays a part in quantum activity as well as in all complex systems through chaos theory. The assumption of physicalist science is that the indeterminate is fully random. Is it? Must it be? How would one know if actions were fully random or influenced in some small way, but with immense consequences?

Fonte: BARON, G.R. (grifos meus) 

Fig.5: David Bohm. Físico brilhante, Filósofo profundo e estudioso da Consciência. 
Homem em busca da relação entre Ciência e Espiritualidade.

As incertezas não são de origem integralmente aleatória. As incertezas ocorrem nas bordas (=escalas extremas de tempo e espaço). A Mecânica Quântica e a Cosmologia Relativística lidam com essas incertezas (de formas diferentes). Na escala humana, no mundo da Física Clássica, não há mistérios, complexidades. Ao adentrarmo-nos na essência das coisas nos deparamos com a indeterminação. É no reino subatômico que a luta entre Sistema e Anti-Sistema é mais acirrada. Mas a indeterminação apenas se manifesta nos extremos porque há duas forças em jogo (S e AS), impossibilitando ordem total. Mas a tendência é o progredir para a ordem. É desintegrar-se, é morrer, é extinguir-se num plano inferior - para renascer num superior, mais sutil, belo, livre e portanto independente. Isso é maravilhoso e deve encantar o ser humano mais evoluído. Ser humano pronto para habitar um mundo mais desenvolvido.

"The ability of God to act within the reliable laws put in place without resort to miracle can be seen in the contingent facts of the history of the cosmos and life, but also in our individual experiences. It is credible, then, to pray to a God who acts in this world, and still be a strong believer in what science has demonstrated to be true."

Fonte: BARON, G.R. (grifos meus) 

Deus age em nosso mundo sem necessidade de desrespeitar as leis conhecidas pelo nosso (parco) conhecimento. Ele atua no íntimo, como diz Ubaldi. Ele jaz nas profundezas. Está velado ao ignorante egoísta. É revelado ao conhecedor bondoso. É uma força contínua, sutil e ativa que opera incessantemente pela regeneração de tudo e de todos. Alinhando-se a essa força, nos tornamos invencíveis. Nossa jornada se torna mais significativa (reforça a si mesma) e significante (influencia outros).

Antes de terminar este (já longo) ensaio, gostaria de falar sobre o unus mundus.

"The Unus Mundus, as we have seen in all versions of it we reviewed, is outside of space and time. Called “pregeometry,” “prespacetime,” “holomovement,” and “the Absolute” it is of necessity neither held within space or time."

Fonte: BARON, G.R. (grifos meus) 

O Unus Mundus está 'fora' do espaço e do tempo. Pode ser denominado por pré-geometria, pré-espaço-tempo, holomovimento e Absoluto. Todas essas definições de encaixam perfeitamente na do Sistema de Pietro Ubaldi. 

Podemos associar a 'mente' com que os estudiosos trabalham como um aspecto da fase 'energia' (ver A Grande Síntese), já que no ensaio de Baron ele considera o Espírito como distinto da mente. Ele chega inclusive a aventar a possibilidade de haver o spiriton ('partícula' do Espírito). Algo que o Gilson Freire (se não me engano), em seu último livro A Física do Espírito, também faz. 

Fig.6: Gilson Freire. Médico homeopata e estudioso da obra de Pietro Ubaldi. 
Deu contribuições significativas ao monismo substancial.

E ainda há ainda a questão da necessidade de adicionar dimensões extras ao nosso estudo para a compreensão do universo.

Mas isso ficará para um próximo ensaio.

Até lá.


Referências

BARON, Gerald B. Dual Aspect Monism: "Amphibians", the soul and immortality. Link: <https://medium.com/top-down-or-bottom-up/dual-aspect-monism-amphibians-the-soul-and-immortality-581ba2689ac1>.

BARON, Gerald B. Personal reflections on the concept of dual aspect monism. Link: <https://medium.com/top-down-or-bottom-up/personal-reflections-on-the-concept-of-dual-aspect-monism-95500891b97c>

TODD, Peter B. Dual-Aspect Monism, Mind-Matter Complementarity, Self-Continuity and Evolutionary Panentheism.  "Australian Journal of Parapsychology, ISSN: 1445-2308 Volume 17, Number 2, pp. 147-169".

segunda-feira, 18 de julho de 2022

Monismo Substancial (parte 1)

O mundo pode ser explicado a partir de vários sistemas de crenças e valores. Cada explicação está vinculada a uma cultura - a história de um povo, seu ambiente, sua linguagem, sua memória, o que um povo é capaz de conceber.  Pela perspectiva científica, há várias teorias que tratam de aspectos particulares do universo. Essas teorias se interfaceiam a partir da necessidade que sentimos de compreender as causas mais profundas dos fenômenos. E assim surgem os esboços de unificação no campo da ciência.

Fig.1: Não é preciso desviar de seu caminho, abandonar sua especialidade ou abdicar de suas inclinações (boas). 
Basta preencher de substância tudo que você faz. Fonte: Hernan Pauccara (Pexels).

O pensamento é tão antigo quanto a História. Desde que iniciou-se a busca racional - isto é, usando a mente e suas qualidades de dedução e análise - pela essência da nossa realidade estamos numa busca incessante (e intensa) por uma explicação satisfatória que seja capaz de integrar as multiplicidades - e dar orientação suprema (telefinalismo) a tudo que ocorre conosco e à nossa volta. A filosofia (= amor à sabedoria) nasceu com esse propósito: buscar a causa não-causada; descobrir e compreender o substrato que se manifesta no mundo sensório; ir além das aparências. Tudo isso para levarmos uma vida plena, orientada, isto é, de significado. 

Como eu disse, grandes verdades já foram praticadas / proferidas desde tempos imemoriais. Todas culturas pré-históricas tinham seus mitos cosmogônicos. Suas práticas e formas de organização social refletiam essa visão que tinham do nosso mundo. E isso ocorre até hoje - e sempre será assim. Nossos modelos mentais (causa profunda) se expressam através de nosso modo de fazer as coisas e nossas obras (efeitos concretos). De forma que podemos traçar uma relação que concatena o pensamento puro, mais abstrato, com os eventos que ocorrem em nossa vida, mais concreto - seja como indivíduos, seja como coletividade. Então percebemos que, em nosso universo (o Anti-Sistema, AS), a gênese dos fenômenos (fenomenogonia) ocorre no plano extra-físico. 

Podemos negar à vontade o que foi dito acima. Mas quanto mais observa-se a vida; os acontecimentos; o desenvolvimento das civilizações; o desenvolvimento de sistemas (tecnológicos ou sociais); dos povos; de uma vida; de uma teoria ou corrente de pensamento; de uma religião; de uma relação amorosa; de uma ideia; de qualquer fenômeno, mais se tem certeza de que esse é o princípio geral de funcionamento do Universo.

1°) Concebe-se algo como puro pensamento. Um princípio. Uma lei. Uma visão;

2°) Desenvolve-se esse pensamento, que cria vontade que acaba mobilizando recursos, gerando planos e ações;

3°) Esse ato acaba se materializando numa obra. Um destino. Uma consequência - sendo esta boa ou má.

Três momentos. Três fases de um mesmo movimento: pensamento - vontade - obra. 

Assim se deu a nossa criação original como Espíritos puros, num universo perfeito: o Sistema, S. E assim ocorrem as criações em nosso universo imperfeito - e por isso em perpétua evolução. Uma criação às avessas, mas ainda assim essencial para a redenção da criatura. Uma criação que só pode se dar a partir da derivação da criação original (que representa tudo).

Compreenda: não é possível escapar do Campo Divino (o S), pois ele é o Todo. Nada há fora Dele. Logo, qualquer tentativa de negá-lo é feita como um emborcamento do modelo (perfeito). Isso foi o que ocorreu com a Queda do Espírito.

Retornemos ao mundo mais concreto...

A busca da Religião, da Filosofia, da Arte e da Ciência é uma só: a Verdade. Cada campo realiza essa busca de um modo particular. Todos estão certos quando a busca é guiada por uma boa intenção (bondade) aliada a um pensamento profundo (inteligência). Todos estão errados quando a busca é feita de má fé (maldade) aliada a uma inteligência luciférica (inteligência) ou quando essa busca tem boa intenção, porém não há competência (pensamento) envolvido.

Não basta ser bom sem pensar. Não basta ser inteligente sem possuir moral. É imperativo desenvolver e fundir inteligência com bondade. Somente assim as portas do conhecimento ser-lhe-ão abertas. Assim conhecerás a Verdade - e essa Verdade te libertará. 

Libertará de que?

De você mesmo! Das amarras dos prazos; de seus medos e traumas; das limitações da mente; das falsas esperanças; das ilusões; das coisas que caducam. De tudo que é secundário, ou seja, apenas ferramenta que devemos administrar - inclusive os saberes do mundo. 

Então temos diante de nós uma visão que vai se tornando cada vez mais lógica (ou coerente), mais interessante (filosoficamente), mais importante (cientificamente) e, em seu último estágio, maravilhosa (espiritualmente). Porque ela oferece a arquitetura que vêm sendo divulgada de modo confuso ao longo das eras. Como um esboço turvo e apagado de uma bela silhueta. Trata-se de algo comum a toda humanidade e a todos seres que habitam esse universo. Universal no verdadeiro sentido da palavra. Trata-se de um esboço da fenomenologia universal. 

Essa arquitetura é o que podemos denominar, nas palavras de Gilson Freire, de Monismo Substancial. 

Não se trata de uma nova religião ou corrente filosófica. Não é mais uma criação humana que busca prosélitos. Não é algo que se contrapõe ao que já temos aí. Não se trata tampouco de uma teoria científica (no sentido que temos do termo), porém de uma visão profunda que se manifesta numa ideia geral que irá conduzir a ciência a um novo patamar, gerando assim uma teoria verdadeiramente esclarecedora de tudo e todos. Se trata de uma arquitetura que, se desenvolvida, deve resolver os graves problemas de nossa espécie - preparando-nos, ao longo de milênios e milênios de assimilação, para a recepção de verdades ainda mais elevadas. 

Para quem é estudioso ou não sabe, vamos definir um pouco melhor do que se trata. 

Podemos conceber a realidade de duas formas: como monismo ou dualismo. 

O dualismo vê mente e corpo (matéria) como entidades separadas, que se relacionam, mas que não tem um mesmo princípio comum. As religiões ocidentais se apoiam nessa visão de mundo quando apontam para um Deus transcendente que no entanto não está estreitamente jungido à criação. O modo de agirmos no mundo também atesta essa realidade, uma vez que sempre nos colocamos contrários a tudo que desagrada nosso ego - ou favoráveis aquilo que o agrada. Percebemos a realidade através de contrastes (pense no jogo de luz e sombras, na apreciação musical através de vibrações que causam ondas sonoras ou na relatividade quando estudamos movimento de corpos). 

O monismo pode ser subdividido em três tipos:

Há o monismo materialista (ou físico), que atesta que a realidade sensória é a base de tudo, inclusive gerando a consciência;

Há o monismo idealista, que atesta que a matéria é um produto da consciência;

Há o monismo neutro, que afirma que nem matéria nem mente são a essência da realidade, mais uma substância.

Fig.2: Diferenciações entre monismo e dualismo. Daí se parte para o monismo substancial.

O que Sua Voz fez, através de Pietro Ubaldi, foi revelar à fundo esse último tipo de monismo. Isso foi feito no livro A Grande Síntese. 

Na verdade temos que definir muito bem e andar com cuidado aqui - pois muita gente pode ficar confusa ou interpretar erroneamente as coisas. É preciso estar muito concentrado, livre de qualquer pré-conceito e disposto a compreender a essência das coisas. Mergulhar na Realidade. 

O monismo substancial explica de forma coerente, lógica, harmônica e poética o que os filósofos mundanos não conseguiram fazer ao definir o monismo neutro. Ele supera os pseudo-monismos (puramente espiritual ou puramente material) e circunscreve o dualismo numa férrea lógica superior. 

Superar é ir além sem negar as conquistas pretéritas.

Circunscrever é admitir porém enquadrar numa ordem superior, desconhecida àquele circunscrito.

Muito bem. Interiorize esse conceitos. Estamos em profundezas que a maioria está inapta a vasculhar - mas que influencia toda a vida, até os atos mais banais. Mas em breve uma legião de pessoas irá despertar. Basta que o mundo continue seu caminho de destruição para que as forças de reconstrução comecem a atuar. É o despertar da consciência. É o plantio das bases de uma nova civilização. 

Não se equivoquem: o espírito é elevadíssimo, é sincero, é livre, é infinito - a matéria é baixíssima, é ilusória, é escrava, é finita. Mas ao mesmo tempo, a matéria é o espírito em sua forma mais baixa - e o espírito é a matéria na sua forma mais alta. Eles são individuações diferentes, aparentemente contraditórias, de uma única substância: a substância Divina. 

Nesse intermeio temos a energia, que se traduz no aspecto dinâmica de nosso universo. Ela é espírito (pensamento) coagulado - ou matéria liberta do determinismo das leis mais baixas. Podemos, para começar, associar o espírito à dimensão consciência; a energia à dimensão tempo; e a matéria à dimensão espaço.

Essas três grandes individuações se ramificam em outras individuações. Por exemplo, a série estequiogenética (elementos químicos, matéria) possui 92 elementos naturais divididos em sete famílias.  O mesmo ocorre com as formas dinâmicas (energia), em que há energia gravífica, de raios X, gama, de luz visível, de eletricidade, de som, etc. E na biologia vemos a divisão em sete filos, cada qual com suas classes, gêneros, espécies. E no grau de consciência também temos subdivisões - que a ciência ainda está descobrindo. 

Temos então, no Monismo Substancial, a base para uma Teoria Unificada do Conhecimento. 

Eu bem que gostaria de estar equivocado. Mas quanto mais busco expor essa visão, sujeitando-a a ataques e críticas, mais ela se reforça em minha alma. E encontro comprovações por todos lugares - inclusive nas pessoas mais sérias. Abaixo uma entrevista a Peter B. Todd, psicoterapeuta com orientação Jungiana, autor do livro A Individuação de Deus: Integrando Ciência e Religião, realizada por Jeffrey Mishlove (dura 46 min., basta acionar legendas em português).

A conversa é muito interessante porque se alinha perfeitamente com o que foi revelado no livro A Grande Síntese por Sua Voz. O homem moderno está chegando aos poucos, através da razão, àquilo que foi revelado a Ubaldi pelas vias da intuição. Dessa forma síntese e análise começam a trabalhar em conjunto: uma traçando o panorama geral através de palavras potentes e substanciais (síntese), e outra caminhando pelo pensamento sequencial, apoiado no pensamento, com uso de confirmações e sistematizações ponderadas e bem costuradas (análise). 

A evolução é fundamental para compreendermos nossa relação com o Criador. 

E Deus é essencial para descobrirmos a dinâmica mais profunda do fenômeno evolutivo. 

Esse ensaio foi uma breve introdução ao MONISMO SUBSTANCIAL.

E porque ele deverá transformar a humanidade, elevando-a para um novo patamar consciencial. 

É isso.

domingo, 10 de julho de 2022

Símbolo e expressão de uma Era

Acabo de concluir a série Titanic: blood and steel (Titanic: Sangue e Aço, em tradução literal). Série de doze episódios que varrem a concepção e construção do maior navio de passageiros de sua época e classe. Um gigante de mais de 45 mil toneladas, com dimensões que beiram o inimaginável para sua época. Época da segunda explosão do grande processo conhecido como Revolução Industrial, em que o carvão, o aço, o petróleo, a eletricidade e as comunicações à distância se tornaram os suprassumos do início do século XX.

A trama se passa entre os anos 1909, início de sua construção, e (abril de) 1912, sua partida do porto de Belfast. O foco da série é o desenvolvimento do navio. Sua gênese, seu processo de construção e a vida das pessoas envolvidas. Nessa série não vemos um produto acabado e aparentemente perfeito (como os homens de negócios gostam de mostrar as coisas que desejam vender), mas um contexto real, tenso e cheio de questões envolvidas. Questões que superam os limites da técnica. Além disso, sente-se o conflito titânico entre o primor técnico - que clama pela segurança e preservação de vidas - e a ânsia pelos lucros - que impõe a fantasia e o corte de custos para satisfazer os imperativos do crescimento econômico, paradigma de nossa civilização. Um confronto que, em seu aspecto mais profundo, revela a batalha entre Sistema e Anti-Sistema. 

Uma co-produção entre Irlanda e Itália. Nada mais apropriado e lógico: o navio foi construído em Belfast (Irlanda), com mão de obra irlandesa (católicos e protestantes) e italiana, em sua maioria. A questão trabalhista é muito forte e bem estacada no filme. É evidente o conflito entre classes sociais, opiniões políticas e visões de mundo. 

No filme católicos e protestantes são como água e óleo. O conflito é tenso. Domina no topo da pirâmide social a minoria protestante. Há junto a isso a questão da independência que irá levar à rebelião de 1916. 

Estamos no início de 1909 e o magnata J.P. Morgan requisita um novo navio para uma de suas empresas de transporte (a White Star). Os britânicos, por sua experiência naval, ficam a cargo disso. E para isso serão usados trabalhadores de várias nacionalidades - e materiais de várias regiões. O estaleiro encarregado do desafio de produzir o maior navio de sua época (e classe) é a Harland and Wolff, dirigida por William James Pirrie (Derek Jacobi). Um jovem engenheiro, com doutorado na área de  materiais, chamado Mark Muir (antes Mark Malone, conforme será revelado), interpretado por Kevin Zegers, se lança ao desafio de contribuir para o projeto à medida que o navio é construído. Trata-se de um desafio do ponto de vista da engenharia: ninguém sabia sobre os riscos de navegação de uma estrutura flutuante tão grande. As dimensões aumentam e com isso adentra-se em terreno inexplorado, cheio de incertezas e (com elas) problemas. 

A série se passa em Belfast e trata do período de construção do navio. Estamos no momento de concepção e elaboração do produto. Ou seja, do pensamento (Espírito, ou Princípio Absoluto) que acaba mobilizando vontade(s), isto é, dinamismo, métodos e processos (energia, ou Pai, Verbo criador) para materializar a obra colossal - que é o Titanic (matéria, ou Filho, Criação final). É muito interessante estabelecer essa analogia entre as coisas do mundo e as grandes visões das revelações, pois nos dá uma ideia do quão fascinantes podem ser as coisas de nossas vidas. Basta para isso termos uma visão profunda da fenomenologia universal. Além disso, há também a relação entre as abordagens do antes (causa, gênese, problemas na construção) e do depois (efeito, manifestação, operação e obra vistosa).

O filme de 1997 de James Cameron trata da breve e intensa vida do navio, com alguns personagens marcantes que transmitem aspectos sobre a natureza humana e a incessante busca pela realização dos ideais. Já a série foca em todo o significado do navio, como por exemplo: das condições cheias de atritos para sua construção; da vida árdua das pessoas que o construíram; da cisão política e religiosa do ambiente; do conflito entre a engenharia, com seu primor técnico e preocupação pelas vidas, e os imperativos financeiros, impiedosos diante de qualquer norma ou princípio que vá contra sua voracidade pelos lucros e pelas aparências; do encontro de almas afins num mundo conturbado cheio de incertezas, jogo de forças e astúcias; e dos destinos das pessoas. 

A trilha sonora de Maurizio De Angelis transmite a força da empreitada e a paixão pela superação técnica. O sentimento aflora nas cenas que delimitam marcos, como por exemplo o lançamento do casco, a estrutura principal do navio, nas águas do porto de Belfast.


À medida que assistimos os episódios, nos envolvemos com a rotina dos funcionários da empresa, com o quotidiano dos trabalhadores (pagos por rebite), muitos irlandeses e italianos, e com o contexto local. Na série o conflito trabalhista é muito evidente e bem tratado, assim como a intensa divisão entre pessoas de mesma classe social por questões religiosas. É nesse turbilhão de obrigações, dilemas e sonhos, que Mark conhece Sofia Silvestri - uma imigrante italiana, funcionária dos escritórios responsável por tarefas administrativas, interpretada por Alessandra Mastronardi.

Uma relação que se inicia como uma simples encontros formais entre um engenheiro que estuda as propriedades mecânicas do aço usado na construção e uma moça que é convidada a fazer desenho das microestruturas da peça. E que vai ganhando novos ares à medida que os diálogos (sobre coisas do  trabalho) entre os dois vão ganhando um significado mais profundo. Como eu digo (pois percebo), é quando nós transmitimos nossa visão às coisas que você fazemos que a comunicação real ocorre e a vida acontece. Quem vê em profundidade percebe isso de forma muito clara. 

Um aspecto muito interessante da série é que ela revela que nem tudo é preto ou branco. Existem personagens que não são exatamente o reflexo perfeito de seu meio, classe social, grau de estudo e credo. É a complexidade humana sendo transmitida através da arte. Lord Pirrie não pensa como os outros magnatas, vendo seus trabalhadores como inimigos indignos de terem condições mais decentes - e voz. Ao mesmo tempo ele também fraqueja diante de seus valores quando se adequa aos métodos do mundo em prol de um 'bem maior'. Algo que decepciona seu sobrinho, o contador Thomas Andrews, e Mark.

Vemos como a cisão dualística impede o pleno progresso das coisas muito claramente à medida que o passado de Mark é descoberto pelos membros da empresa. Há muitas reviravoltas. Mas o mais interessante é perceber como a Lei acaba agindo de modos muitos sutis e certeiros através de ferramentas humanas (que a desconhecem por completo). Mas sobre isso nada será revelado aqui - é preciso assistir a série com a lente monista. 

É isso.

quarta-feira, 6 de julho de 2022

Importante, Interessante e Maravilhoso

Quando expressamos qualquer coisa estamos dizendo algo de profundo - mesmo aquilo que saia de nossas bocas pareça estar diametralmente oposto àquilo que originalmente foi gerado pela nossa alma. É a incapacidade de se relacionar de modo fidedigno ao sentimento. Ao Espírito.  

Fig.1: Via Láctea. Nosso 'universo', de acordo com Sua Voz. Isto é, aquele que nos é mais próximo.
Um desenvolvimento em espiral. No centro, uma fornalha atômica, criadora de mundos materiais. 
À medida que as estrelas, com suas coortes de planetas, orbitam esse núcleo ao longo de milhões de anos, 
desenvolvimentos se dão. As possibilidades fazem surgir a vida, que em seu caminhar, através da vontade,
expressa um psiquismo que diz: Eu sou. Eu vejo. Eu quero chegar lá.

Estamos vivendo um momento muito especial. A humanidade está passando por um período de transição global. Não se trata de novas tecnologias ou revolução 4.0 ou tempos líquidos (Baumann) ou a corrosão das democracias ou pandemias ou etc. Esses são apenas os sintomas. As últimas consequências. O fim de uma longa cadeia de uma série de eventos concatenados, cuja origem se situa na forma mental dos indivíduos. Esses eventos que pipocam de modo alucinante, cada vez mais barulhentos - que apimentam as relações vazias e congelam os dinamismos vitais da atividade inspirativa. Esses eventos que dão tom aos comportamentos, que expressam os modos de se relacionar (com pessoas, animais, ideias ou objetos), são sintomas de nossos tempos conturbados e frenéticos.

A civilização agoniza enquanto raspa o fundo da outrora rica panela de alimento que um modo de pensar lhe trouxe. A Revolução Científica pariu o Iluminismo, que por sua vez desembocou em grandes revoluções no campo econômico e político, causando um rearranjo da sociedade tão profundo que a capacidade de alterar o planeta se tornou evidente. E preocupante.

Um modo de pensar que extirpou a capacidade de sentir. Uma objetividade tão sistematizada que jogou no calabouço do esquecimento a subjetividade das visões. Uma análise fria e cortante, que trouxe várias explicações acerca de distintos fenômenos, possibilitando o advento de máquinas fantásticas. Máquinas que fazem máquinas e que até executam tarefas sofisticadas. E com isso muito conforto. Mas mal distribuído e sem sentido. Um conforto que não aponta para nada além de si mesmo, gerando uma doença chamada confortite. E assim ficamos num ciclo sem fim de gozos e buscas materiais. E quanto mais insistimos em repetições sem transformações, mais desesperados ficamos; mais intolerantes para a miséria que nos cerca (que vem de nós...nossa forma mental); mais vazios de conteúdo. Muita execução e pouco pensamento. Nenhuma contemplação por abandono da visão. 

As circunstâncias expressam de modo muito incisivo e sutil uma necessidade. A necessidade de integrarmos em nossos afazeres quotidianos - pessoais e profissionais - uma visão suprema do cosmos. Ciência, Filosofia, Religião e Arte se reunindo e intercambiando suas conquistas mais intensamente. 

Fig.2: O dualismo deve ser circunscrito por um estreito monismo unificador e sábio (logo, benevolente).
Tudo é bipolar nesse universo. Eliminar um deles - ou buscar filtrá-los, para assim realizar uma fusão? Eis a questão.
Vivencio, logo existo. Vislumbro, logo sou.

A visão das revelações (Religião) orientando as análises e sistematizações do pensamento indutivo (Ciência). As especulações do pensamento dedutivo (Filosofia) dando dinamismo à busca do significado., que se expressa através das inspirações (Arte). Há muito a se corrigir e muito mais a se fazer. Mas se trata de um fazer profundo, orientado, permeado de significado. Os atos devem ser preenchidos de substância divina. Mas os princípios (listados logo abaixo) jamais podem ser colocados em dúvida - caso contrário, o caos reina e o desespero domina.

"Duvidem de tudo", ouvi um professor certa vez dizer a seus alunos. E isso resume o absoluto de nossos tempos: relativizamos tudo. Mas nos esquecemos de que é preciso uma meta suprema situada num 'ponto' que não está sujeito a transformações. Um 'ponto' fora do espaço-tempo. Um 'ponto' que não é questão de opinião nem de medição cautelosa para adentrar no terreno da análise objetiva e das burocracias engessantes, seguras e sem vida. Esse 'ponto' é o Absoluto que reside no imo de cada criatura do Universo. É o único refúgio. É o Porto Seguro daqueles que chegaram ao abismo do desespero. 

Do Absoluto derramam os Princípios que são imutáveis: 

1. O Amor;

2. A Indestrutibilidade da substância;

3. Os Movimentos Fenomênicos;

4. O instinto de Evolução;

5. O aspecto Unitário;

6. A presença da Dualidade;

7. A estrutura Trinária dos fenômenos;

Entre outros.

Esses princípios não podem estar sujeitos à dúvida. Porque eles encantam, inspiram e orientam o ser humanos em sua busca pela melhoria de sua condição. Sem eles o resto não é feito. Se sim, não é feito com resultados profícuos. São cascas sem nada de vital por dentro. Sementes vistosas por fora mas mortas por dentro. Criações natimortas. Pseudocriações. 

Tudo que fazemos deve ser importante, interessante e maravilhoso. 

Importante do ponto de vista científico;

Interessante sob a perspectiva filosófica;

Maravilhoso pela contemplação espiritual.

Cada gesto que esboçamos (inclusive em pensamento) fica registrado na eternidade. E um ato de bondade cândido e refletido vale mais do que uma descoberta científica ou inovação tecnológica. O intelecto intenso e frio é tão ou mais nocivo do que a bondade destituída de pensamento. A superatividade de nossas ricas e singulares polaridades impede nosso avanço na vida, culminando em atrofia do Espírito. Este é quem cria verdadeiramente e 'acumula' para a eternidade. Ele pulsa naqueles que já descobriram um plano de vida superior - e com ele leis superiores e, por consequência natural, um modo de vida mais rico. Rico no sentido interior, de conquistas internas - e orientações concretas. 

As linhas gerais já foram traçadas.

Resta nos assimilá-las pela compreensão da mente e pela vivência da vida.