É no momento em que a inspiração divina - dentro de cada ser - passa a predominar sobre todo o repertório humano é que as forças do universo começam a agir a favor da criatura. Criatura que se esforça e caminha com as próprias pernas, por mais que isso exija esforço - às vezes muito além do comum; criatura que não possui medo de avançar elegantemente em reinos desconhecidos, banhados de mistério, cercados de preconceitos; criatura que compreende as íntimas forças que governam a evolução de todo o universo, desde os fenômenos mais difusos às civilizações mais avançadas; criatura que vê a realidade, e por vê-la claramente, opera de uma forma muito diversa; criatura que erra muito para aprender muito mais; que sofre para apreender a essência da realidade e assim incorporar em sua alma os princípios do universo. Assim se conquista a própria dimensão.
Estamos aqui expondo um fenômeno muito acima do nível da normalidade. Uma verdade que parece distante do quotidiano de nossos afazeres (sofridos, desgastantes e aparentemente infrutíferos). Mas que no entanto governa cada aspecto de nossas vidas - de tudo! Pois são as coisas mais abstratas - mais sutis, mais discretas, mais simples - que possuem a maior concretude.
Nada é mais sublime do que iniciar uma jornada de sublimação. Se destruir no nível humano para se recriar no nível super-humano. Uma nova vida. Um novo nascimento. Um re-nascimento. Em vida e espírito. Isso significa ressignificar todo o passado e contemplar a beleza da natureza - humana e infra-humana - para assim podermos antever o futuro e nos projetarmos no desconhecido do presente. Essa é a vida que vale a pena ser vivida. E podemos fazer isso em qualquer posição, por mais árduo que pareça.
O destino individual não ocorre ao acaso ou por forças que estão além de nosso alcance: ele é forjado ao longo de anos, décadas e existências. Um cronograma que perpassa vidas e é fixado baseado numa meta para além de objetivos sensórios e aparentes. Um objetivo que transcende tudo. Para que assim possamos dar o máximo de nós e assim atingir (pelos parâmetros humanos, racionais, da Terra) o inatingível.
O inimaginável é uma construção humana que deve ser superada pelas vias interiores, superando as limitações dimensionais de uma mente racional. Essa mente anseia por um logos (a Razão Còsmica, que é a intuição) que a conduza. Sem ele, as conquistas são efêmeras e infrutíferas. Geram mais caos e desentendimento do que ordem e progresso a partir de certo ponto. Ponto que já foi ultrapassado por nós, há um bom tempo.
Voltemos ao destino.
O destino é uma construção do ser. Tanto mais efetivo e glorioso serão os efeitos últimos da vida - vivida de modo alinhada com os princípios do universo - quanto mais desapegada for ela das ilusões quotidianas. É uma construção que envolve uma série de realimentações, e como lidamos com elas, e como usamos elas a favor de nossa majestosa construção: a reconstrução do espírito.
Imputamos ao acaso infortúnios ou prazeres, mas na verdade fomos nós quem criamos as condições para que várias coisas aconteçam em nossas vidas. Mas para perceber isso é necessário ter em mente de que não se trata de uma lei de superfície, do tipo ação-reação direta, linear, instantânea, através do mesmo agente que sofreu/gozou de algo que fizemos. É a lei de causa-efeito em seu aspecto profundo, que perpassa as vezes uma existência corporal. Uma lei em que a recompensa via salvação - ou retificação via dor - se dá de forma sutil. Através de outras pessoas ou grupos; em outro ritmo, de outro modo, em momentos e locais inesperados. Nossa pequena mente racional tem dificuldade em estabelecer essas relações porque elas vão além da capacidade de representação.
É preciso ascender a outro plano de consciência para enxergar a realidade em nosso nível de consciência. Ponto. O infinito do espaço-tempo só se torna finito perante a magnitude de uma consciência amadurecida, que vê as limitações do espaço-tempo na dimensão subsequente, que a domina. Essa dimensão é a consciência, característica da fase espírito. Perceber isso em todos os aspectos da vida lhe dá um poder inimaginável. Lhe preenche de uma coragem insuperável; de uma ousadia que é criativa. E assim a pessoa se abre para a fonte de um outro universo. Universo não-local, em que o conhecimento é obtido através de outras vias.
Quem inicia essa jornada (de iniciar esse contato com outro plano da realidade, mais profundo, mais causador), sente uma força enorme ao estar diante de desafios que outrora eram temerosos. O ser começa a abandonar as armas do mundo. Seus atos são preenchidos com o espírito santo. A couraça do mundo (leis, normas, registros, recursos,...) é diminuída. Diminuída até um nível em que possa ser viabilizada uma agilidade espiritual. Isso significa um discurso que relaciona integralmente e continuamente os fenômenos, as vidas, as concatenações históricas, os pensamentos e os sentimentos. Isso significa atividades quotidianas que se retroalimentam de forma a criar sinergia. Tudo é permeado pela dimensão mais alta, a espiritual. De repente você possui a liberdade de falar de Deus e Universo; da Ciência e da Religião; da vida pessoal e da vida profissional; de arte e de técnica; de sentimento e pensamento; de nossos tempos e de outros tempos. No momento adequado, da forma adequada, é claro. E, mais impressionante: isso tudo dá mais potência ao trabalho que visa aumentar o grau de especialização (num nicho) e diferenciação (do ser). Assim quem está próximo a um ser cujos atos são divinizados por essa substância divina (o espírito santo) começam a se sentir afetados por esse comportamento destemido. Quem assiste é abalado profundamente com essa interação. Ele é tocado numa 'região' que julgava não existir. E aí que começamos a estabelecer a relação entre reforma íntima e revolução sistêmica.
Quem atingiu esse ponto não chegou nesse patamar completamente destacado da normalidade de graça: houve uma lenta construção da personalidade, através de várias experiências - na maioria dolorosas - que foram sendo ordenadas, assimiladas, filtradas, contextualizadas. De repente quem muito se acostuma com a dor se acostuma também a operar com ela e a partir dela. De repente o combustível espiritual pode ser regenerado - e isso depende apenas da vontade do ser.
Nesse ponto a vida começa a ganhar significado. SIGNIFICADO.
Nada pode parar um movimento que foi forjado usando como 'matéria-prima' base super-humana, super-racional, para além dos interesses terrenos e das glórias efêmeras. Nesse instante a criatura marcha menos no mundo para ascender mais do universo interior - pois é este que plenifica o primeiro. Qualidade é essencial - quantidade é secundária. Logos guiando Lúcifer. Ou seja, a intuição (ou consciência) guiando a razão (ou intelecto).
Atingindo a visão cósmica a jornada se torna uma eterna beatitude. Orientação e força guiam o pequeno ser que caminha pela superfície árida de um planeta prestes a sofrer choques cataclísmicos para que possa despertar para a realidade mais profunda.
Nos tornamos maestros locais que deve conduzir uma orquestra que não sabe que musica tocar - nem como tocar.
Ensinemos esses músicos maravilhosos a tocar seus instrumentos divinos!
Mostremos a eles a partitura que lhes possibilitará tocar a sinfonia do Universo, da evolução, de nossa origem e destino - e sobretudo, do Amor. Uma sinfonia de ascensão que conduz à redenção, através de incontáveis existências. Uma sinfonia alinhada com a Lei única que se manifesta através de várias leis e princípios, em todos níveis, todos momentos e todos locais desse imenso caldo de espaço-tempo. Um universo local regido por outro universo, não-local.
O universo sensível, relativo e em transformação, guiado em seu íntimo pelo universo eterno, absoluto e perfeito.
Se a orquestra está perdida, devemos começar a tocar sem pensar no conjunto. Se esse ato for causado por inspiração - preenchido do espírito santo - nós iremos ativar a maior reação em cadeia que a humanidade jamais conseguirá fazer. Não pela fissão de elementos radioativos para gerar guerras (imbecis) ou energia (para consumo em futilidades). Mas pelo acionamento indireto de engrenagens sutis que regem o íntimo do ser.
Nós mostramos o caminho - mas o outro que deve percorrê-lo com as próprias pernas.
Uma maravilhosa cena de um maravilhoso filme (Le Concert) revela esse aspecto.
É isso.
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