É difícil encontrar uma pessoa que
não abuse da comida, da bebida, da velocidade, do sexo (no caso dos
dois últimos, é mais comum e intenso no Carnaval), dos elogios –
em muitos casos (não todos), mais feitos para cumprir uma
formalidade e portanto manter sua imagem – e dos gastos em bens
materiais, necessários por um curto período de tempo, pouco úteis
por um médio período, e desnecessários e onerosos no longo prazo.
No entanto, é possível encontrar gente menos focada no que o mundo
vê como motivo final da existência: o consumo desenfreado.
A culpa desses excessos não pode
recair completamente sobre as pessoas que os cometem. Trata-se de uma
REAÇÃO a um outro tipo de excesso, que a maioria das pessoas não é
capaz controlar: o excesso (de tensão, de tempo, de demanda de
energia) da vida laboral, e a conseqüente ausência de oportunidades
para o ser descobrir outras habilidades e ambientes e ideias e
sentimentos.
É esperado que, quando puxamos uma
mola para um extremo – ou seja, tiramos ela do seu estado natural,
de equilíbrio – ao soltarmos ela, a mesma tende a ir para o outro
extremo, e após isso voltar para o extremo inicial, para o qual foi
puxada inicialmente, e vice-versa. Indefinidamente. Um movimento de
vai e volta cuja duração vai depender de uma grandeza chamada
“amortecimento”, que é responsável por diminuir a amplitude do
movimento a cada vai-e-volta executado pela mola. Pois bem, o
Princípio dessa Lei do mundo Físico vale também para o mundo
Humano.
Se somos forçados a uma situação
de enclausuramento, por exemplo, como reação, ao sermos liberados
para agirmos conforme nossa vontade, tenderemos a buscar (e
valorizar) ambientes abertos. E da mesma forma, após passarmos muito
tempo expostos, ao ar livre ou ambientes públicos, temos a vontade
natural de nos recolhermos a título de podermos exercer nossos
gostos individuais com concentração, seja em nosso quarto, nosso
escritório, no banheiro, cozinha, porão ou sótão.
O problema de forçarmos em demasia
uma particularidade inerente à nossa vida é que tendemos a
saturá-la. Ou seja, por mais tempo que passemos fazendo essa
atividade – por mais importante e necessária que seja – a partir
de um ponto atinge-se um limite. Esse limite não é claramente
definido e seu valor pode variar infinitamente de pessoa para pessoa.
Ainda mais porque esse limite (apesar de existir para tudo e todos)
pode ser variado em natureza dependendo da pessoa*. No entanto, um
modo muito fácil de perceber qual é esse limite é através do
SENTIMENTO.
O nosso corpo somático é um alarme
eficaz contra os excessos que cometemos ou se cometem contra nossa
pessoa. Quando não estamos conseguindo executar a mesma atividade
com a mesma eficiência isso pode ser um indício de que estamos
executando-a por um tempo demasiado grande ou numa posição (ou
ambiente) demasiado desconfortável para sua execução. Logo, o
corpo começa a demonstrar cansaço de seus sensores (vista cansada,
dor na coluna, nos membros, câimbra, dor de cabeça, sede, fome,
etc). Um outro possível motivo de não estarmos suficientemente
engajados nessa atividade se refere à falta de motivação – sendo
esta uma causa espiritual.
Mas, enfim, o que fazer para evitar
os excessos de fim de ano e suas conseqüências?
A primeira coisa é nos darmos conta
de que estamos num CICLO VICIOSO. E esse reconhecimento é muito
importante. Porque se ignorarmos a realidade, não nos sentiremos
estimulados a escaparmos desse campo gravitacional nefasto, que ora
nos induz a um excesso, ora a outro. E sendo os picos e os vales
MUITO acima (e abaixo) dos seus respectivos pontos de saturação,
nossa vida tende a ser caracterizada por um tremendo desperdício de
TEMPO e ENERGIA, que leva a crises emocionais e desorienta nossa
mente. A grande maioria, ainda pouco amadurecida para se desligar do
mundo à sua volta e se voltar para si, inicia um processo gradual de
podagem de gostos e sonhos e idéias. É muito menos desgastante e o
retorno do meio é rapidamente percebido. Cria-se a ilusão de que
esse é o modo de lidar com a vida. E depois de muitos anos apagando
nossas mais íntimas aspirações nos tornam um ser prisioneiro de
uma forma mental que julgamos ser a nossa. Será?
O segundo passo é – após
reconhecer a situação – criar uma atividade ou um costume
DIFERENTE. E implementá-lo no dia a dia. Pode ser o ato de caminhar
no parque, de jogar um jogo de tabuleiro, de ler um livro, estudar
algo, ouvir uma música, conversar com alguém, escrever um texto,
desenhar, pintar, viajar, etc, etc, etc. UMA atividade apenas. E é
imprescindível que essa atividade seja diferente daquelas praticadas
pela pessoa. Dessa forma, abre-se uma brecha que permita à pessoa
ver o mundo e sentir as coisas de um modo diferente. E
consequentemente essa brecha pode levar a pessoa a iniciar um
processo de DESACELERAÇÃO numa direção e/ou MUDANÇA DE
TRAJETÓRIA. Isto é, a nova percepção da vida leva a pessoa –
agora com sensores diferentes e mais apurados – a se conscientizar
espiritualmente e acionar seus ATUADORES, imprimindo forças nunca
antes aplicadas a seu ser a título de alterar sua trajetória de
vida e assim desvendar novos caminhos e eleger novos horizontes –
mais espirituais do que materiais.
O terceiro e último passo é, após
o início da mudança de trajetória, realimentá-la e iniciar um
processo de mudança constante. Dessa forma será construída uma
espiral ascendente, na qual a elevação representa a evolução e as
voltas a natureza cíclica dos problemas, crescimentos e resoluções.
É muito importante que, após
elegermos uma atividade, sejamos capazes de desenvolvê-la com prazer
e permitir que ela revele outras atividades correlacionadas. Isso não
é nada mais que EXPANSÃO a partir de um ponto, o qual irá gerar
outros pontos, que gerarão outros. Pontos que possibilitem a
escalada na evolução. E assim sucessivamente.
Com essas ideias creio que seja
possível iniciarmos uma verdadeira mudança em nossas vidas,
aumentando o nosso “amortecimento” para os golpes desnecessários
que geramos e recebemos da sociedade, e buscando os patamares ideais
em cada campo da vida.
* Nesse último caso me refiro ao
limite natural da pessoa, e não da ideia que a mesma tenha a
respeito de quanto deve ser.
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