Criar algo além de suas possibilidades presentes implica em atingir um grau de desprendimento de diversas distrações do mundo. Envolve um mergulho conceptual e de paixão em regiões bloqueadas pelo mundo. Regiões com pouquíssimos desbravadores - e nenhum apoio ou compreensão do mundo.
Nosso presente deixou de sê-lo devido a uma miríade de preocupações com o futuro próximo. E um aprisionamento aos acontecimentos passados, que ecoam variadas vezes e de variadas formas em nossa mente, sem aparente prazo de validade. De modo que nossas ações e atitudes do momento sempre sofrem distúrbios desse futuro preocupante e passado amargo.
Momentos de reflexão são preciosíssimos. Deveríamos vê-los como normal. A construção de uma verdadeira civilização depende disto. |
Pensar em características externas nos prende ao externo, que passa a dominar como conduzimos nossa vida. Por ânsia de sintonização exterior nos esvaziamos da substância interior, capaz de encorajar nossos planos mais elevados de ascensão. Há automatismos diversos que conduzem nossa mente racional, que por mais desenvolvida que seja, em seu plano sempre estará refém dessa inteligência inferior, mais forte porque mais consolidada. Dezenas, centenas, milhares de existências na quais certos vícios se consolidaram, algumas virtudes de firmaram, alguns pensamentos foram superados, e sentimentos floresceram. Combater esse eu interior (subconsciente) no único campo em que podemos atuar com livre-arbítrio (consciente) é uma luta desigual e desesperadora. Combate-se um inimigo oculto, difícil de ser destacado de todas suas atitudes e ações. O filtramento do eu para identificação das causas de seus mais profundos sentimentos e reações às dores da vida é tarefa que por vezes demanda períodos longos, de anos ou decênios - para muitos uma vida inteira. Há ainda aqueles que nada descobrem de seu eu interior, vivendo e reagindo conforme lhe foi impresso pela sua história individual - e pelas normas e convenções do meio. Estamos diante de desafio titânico, que levam os mais fortes no mundo ao desespero completo, e justamente por causa disso estruturam o mundo de modo a ninguém ser capaz de eduzir esse eu interior, colocando-o à tona para saber o que fazer.
Estado de fluxo (minfulness) é um período no qual o tempo (psíquico) interior se desalinha do tempo exterior, gerando uma libertação capaz de potenciar criações inesperadas para o indivíduo. A libertação de um paradigma, de uma convenção estabelecida, a superação de um atavismo, acaba permitindo que se opere com outros tipos de estruturas mentais (arquétipos), de tal modo que começamos a criar novas. Essas irão alterar nosso comportamento, que consequentemente trarão novos resultados (eventos) em nossas vidas. Quem observa exteriormente, na superfície dos acontecimentos momentâneos que iludem e revoltam, vê nos efeitos algo miraculoso. Miraculoso porque sem explicação fácil, aparente. Porque não se vê de fato.
Perceber o quadro geral dá uma sensação de paz interior ao viver o dia a dia. |
Existem preços a se pagar para a conquista desse estado em sua vida. No entanto quem percebe o telefinalismo da evolução não se abala pelas tempestades na superfície do oceano. Este, em sua abissal profundidade, contém riquezas incontáveis e belezas inigualáveis, que somente os mergulhadores destemidos do espírito poderão acessar - e conquistar. Para esse mergulho nenhuma erudição, intelecto ou aquisição material serão suficientes. Deve-se partir de um plano superior, em que a síntese é esboçada através da intuição.
Ser menos lembrado em momentos específicos pode ser desanimador. Por outro lado ser menos incomodado quando conflitos se armam é garantia de paz. Paz esta que permite um trabalho contínuo de criação e vivência ímpar. Quanto mais se vê, mais se percebe que esse "negócio" é lucro, pois a perda do mundo é pequeníssima comparada ao ganho interior. E assim possibilitam-se novas construções.
Pouquíssimos seres param para refletir o porquê de um indivíduo agir de certo modo. As conclusões se baseiam na forma - de falar, de mover, de gesticular, de observar - e no quão intenso e dinâmico este é para certos assuntos (raros), e ao mesmo tempo indiferente para muitos outros. Nunca se para para pensar que pode haver um porquê desse abrupto pico de intensidade e dinamismo ao tratar de certos temas, que podem ser variados, mas levantam, cada qual a seu modo, por vezes, um aspecto essencial da vida, que encanta e agrada a todos, no fundo. Esse ser acaba distorcendo a personalidade já em maturação intermediária para que sejam evitados certos conflitos e interpretações equivocadas de sua pessoa. Á medida que o tempo passa o ser acaba adquirindo maestria nisso, e acaba se tornando um mestre do mapeamento de personalidades. Acaba por identificar em poucos instantes quais são os ritmos, o que estimula cada um e os grupos, até que ponto se pode caminhar na íngreme escada do sentimento e do conceito. Assim ele consegue, de certa forma, evitar se revelar. Pois o que lhe interessa só irá chamar atenção se servir de algo prazeroso para os outros. Algo que possa até fazer o outro melhorar, mas sem jamais incomodar. Há certas estruturas do subconsciente que não podem ser incomodadas, pois não querem e farão de tudo para prevalecer. Seria a destruição do indivíduo, que pouco preparado para a grande batalha (interior, Lúcifer versus Lógos), sabiamente recusa ir além de certo ponto. E está corretíssimo! Inconscientemente percebe a natureza que no momento atual é insuperável. Aquele, tendo passado por isso, percebe e respeita, trabalhando silenciosamente.
Chorar ao ver a manifestação da vida. Isso ocorre não por loucura ou fraqueza, mas por capacidade de sensibilização. Quem souber controlar essa faculdade será mestre de sua vida. |
Assim, de uma forma ou de outra, vivemos num mundo de atuação, na qual deve-se mascarar, em maior ou menor grau, quem se é, para que o bem possa trabalhar eficientemente e o mal possa julgar estar no controle. Mas quem manda em mim, em você, em todos nós são as forças da vida que clamam: "Evolução ou perdição!" E quando passamos a operar em prol das leis da vida, integrando o aspecto econômico ao humano, e este ao ecológico, a eficiência aumenta. Conseguimos mais concentração e o nosso tempo livre, de solidão, é respeitado pelo próximo, que inconscientemente vê nele não um isolamento egoísta, mas uma construção altruísta, buscada para gerar conceitos, sentir o distante não-distante, se alegrar com o mais simples, de incrível complexidade para nossas mentes. Assim brotam apresentações, textos, falas, ideias, conceitos, energias latentes, disposição, projetos e novos comportamentos. Trabalha-se na estrutura da personalidade. Isso só é possível quando se percebe que há mais do que a inteligência humana. Nesse ponto Sua Voz, captada por P. Ubaldi, esclarece:
"Deixareis de lado, para uso da vida prática, vossa psique exterior e de superfície, a razão, pois só com a psique interior, que está na profundeza de vosso ser, podereis compreender a realidade mais verdadeira, que se encontra na profundeza das coisas. Esta é a única estrada que conduz ao conhecimento do Absoluto. Só entre semelhantes é possível a comunicação; para compreender o mistério que existe nas coisas, deveis saber descer no mistério que está em vós."
"Purificai-vos moralmente e refinai a sensibilidade do instrumento de pesquisa que sois vós, e só então podereis ver."
A.G.S. Cap. II - Intuição
(grifos meus)
"Se vossa consciência já não vos faz mais admirar qualquer nova possibilidade, como podeis negar a priori uma forma de existência diferente daquela do vosso corpo físico? Deveis pelo menos alimentar a dúvida a respeito da sobrevivência que vosso eu interno vos sugere a cada momento e que inconscientemente, por instinto, sonhais em todas as vossas aspirações e obras. Como podeis acreditar que vossa pequenina Terra, a qual vedes navegar pelo espaço como um grãozinho de areia no infinito, contenha a única forma possível de vida no universo? Como podeis acreditar que vossa vida de dores e alegrias fictícias e contraditórias possa representar toda a vida de um ser?"
A.G.S. Cap. III - As Provas
(grifos meus)
Na metamorfose da borboleta vemos a emergência. Eduzir: ser eduzido; ser trazido à luz; se revelar. A ciência da complexidade percebe isso. Cristo o afirmou em palavras simples e vivência suprema. |
Crer numa inteligência superior implica no vislumbre de outros planos de inteligência, acima da razão, capazes de realizar sínteses supremas e resolver problemas que todo intelecto do mundo é incapaz. Significa perceber que existe uma interconexão profunda entre não apenas os ramos do saber, os grupos de indivíduos, as nações, as religiões e as filosofias, mas sobretudo entre os acontecimentos de nossas vidas, por mais caóticos que possam aparentar. Há lógica por trás de tudo, especialmente o sentimento do amor.
"O coração tem razões que a própria razão desconhece."
Blaise Pascal, matemático, físico, inventor, filósofo e teólogo francês. Santo e Gênio.
Conseguir atingir cada vez mais frequentemente, por maiores períodos de tempo, o estado de fluxo, garantirá ao indivíduo a conquista definitiva de si mesmo, que possibilitará criações inimagináveis. A construção de um destino se dá com a fidelidade à sua natureza íntima, que no fundo se irmana com a natureza íntima de todas as criaturas do universo, sempre dispostas a darem algo para sua jornada ascensional, seja na forma do belo canto de um passarinho, no sorriso de uma criança, na melodia inesquecível de um músico, na criação cinematográfica de um cineasta, no conceitos e paixões de um místico.
O presente só serve se nos desprendemos das barreiras do tempo, obliterando as preocupações com o futuro e as lamentações do passado com a paixão pela descoberta, pela pesquisa, pelo aprendizado e pela vivência. Cristo coroa esse ensinamento quando afirma categoricamente que a morte é apenas condição para renascer de forma mais plena, elevada. A borboleta, inconscientemente, sabe disso, pois passa por esse processo de morte antes de reviver plenamente, com toda liberdade. Nós humanos, temos de aprendê-lo também - só que conscientemente.
Essa será a maior conquista da civilização depois do Estado e da Ciência.
A conquista da Consciência.
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Músicas recomendadas (para despertar o pensamento e a paixão):
1. The Imitation Game Suite (FSO)
2. Tchaikovsky's Violin Concerto - Janine Jansen
3. Rachmaninov Piano Concerto - Helène Grimaud
4. Chocolat (FSO, 2016)
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