sexta-feira, 15 de outubro de 2021

Parábola do Filho Pródigo, Evolucionismo e a Nova Cosmologia

Allan Kardec fez uma compilação brilhante sobre ensinamentos de um conjunto de espíritos de grau de consciência acima da média. Ele foi um codificador. Isto é, tomou conhecimento do fenômeno de manifestação de espíritos desencarnados, através de estudo minucioso e sério, e com esse conhecimento construiu uma obra de seis volumes estabelecendo a base da doutrina espírita. 

O livro-base é sem dúvida O Livro dos Espíritos (LE). Se trata de um volume com 1019 perguntas feitas pelo pedagogo francês, com respostas de um conjunto de espíritos desencarnados - e comentários pertinentes, esclarecendo ou tornando menos ambíguas algumas respostas. Nesse livros há vários ensinamentos importantes a respeito de diversos tópicos, dentre os quais podemos elencar os principais: Deus, criação, elementos do Universo, princípio vital, a natureza dos espíritos, pluralidade das existências e leis morais.

Vale aqui destacar que apesar de se tratar de uma obra fenomenal, com o esclarecimento de vários pontos e solução de diversos paradoxos das religiões criacionistas-monoteístas, em vários pontos são deixadas lacunas. Há várias passagens explicadas parcialmente ou com respostas do tipo "não o sabemos". Isso no entanto não diminuí a grandeza da obra de Kardec, mas aponta para o aspecto evolucionista da doutrina - que todo seguidor fiel deveria abraçar. 

Como o próprio Kardex afirma, deve-se sempre abraçar uma verdade maior, deixando de lado a verdade menos abrangente. Isso caracterizaria o aspecto evolucionista, dando ao espiritismo o status de espiritualismo evolucionista-monoteísta

O fato de eu classificar a doutrina como monoteísta significa que ela não afirma a plenos pulmões o monismo, isto é, um Deus que é o Criador e a Criação. Um Deus além das dimensões, nem grande nem pequeno, nem sujeito ao transformismo deste Universo (apesar de atuar nele incessantemente através de sua imanência benévola). 

Mas como Gilson Freire sabiamente aponta em seu trabalho, o espiritismo contém germes de um monismo. 

Há passagens no LE que revelam a abertura da doutrina para uma realidade mais vasta. Como se todo o trabalho elaborado pela alma iluminada de Kardec fosse uma preparação de terreno para algo profundo...muito profundo...

Fig.1: Ás vezes vivemos no melhor dos mundos e não percebemos isso. Porque nossa perfeição não é
igual à de Deus (caso contrário seriamos iguais a Ele, acabando com Sua Grandeza e Seu Domínio).
Possuímos a mesma natureza (substância divina) de Deus - mas não a mesma potência (conhecimento das coisas).

De 1850 a 1950 a humanidade (e também o planeta) passou por uma transformação profunda. Foram plantadas as bases de uma nova civilização através de progressos no campo da Ciência e da Espiritualidade. Grandes pensadores, cientistas e artistas surgem, inovando em seus campos. Paralelamente, surge muita coisa vazia, sem conteúdo, além de eventos catastróficos. Mas é em meio aos gritos e pontapés de um mundo barulhento e superficial que operam as almas que preparam o terreno para uma nova civilização, criando as bases conceituais, existenciais, organizacionais, científicas e filosóficas para o mundo dar um passo gigante rumo à libertação.

Foram cem anos de revoluções. Surge a Relatividade Geral e a Mecânica Quântica. Com elas forma-se uma teoria cosmogônica inteiramente nova: a do Big-Bang. Tudo isso é comprovado nas décadas seguintes à formulação de George Gamow. Adicionalmente, Watson e Crick descobrem o DNA, o mecanismo operacional da vida. A computação nasce através das contribuições de Turing e Von Neumann. Na psicologia, Freud e (especialmente) Jung lançam bases para a melhor compreensão da personalidade. 

Em meio a tantos progressos e tantas destruições, as doutrinas espiritualistas-evolucionista se enfraquecem. Pois se revelam incapazes de explicar várias novas descobertas satisfatoriamente. Os paradoxos que já eram percebidos pelos esclarecidos se tornam evidentes. Quem sente o infinito começa a ficar sedento por algo capaz de orientar em meio a tantas descobertas e tantos acontecimentos. São poucos...pouquíssimos. Mas necessitam de um alimento mais substancial.

Pietro Ubaldi desenvolveu sua obra na parte central do século XX: de 1931 a 1971. Foram produzidos 24 volumes que resolvem em grande parte os grandes problemas - não apenas da humanidade, mas de toda a fenomenologia universal. Esse marco inicial foi dado no Natal de 1931, quando o apóstolo de Cristo começa a receber as Grandes Mensagens. Mensagens sublimes que falam direto ao coração. E logo em seguida, para arrastar o mundo frio e cético da ciência e da objetividade, lança A Grande Síntese (AGS), volume monumental escrito nos verões de 1932 a 1935 em Colle Umberto, na Tenuta Santo Antônio. Estavam lançadas as bases de uma obra sem igual, que dá as diretrizes gerais para a solução dos problemas da espécie.

Em 1951, com o lançamento de Deus e Universo, fecha-se o ciclo explicado por Sua Voz em 1932 (AGS). Trata-se da Grande Equação da Substância em seu aspecto cíclico. Com isso fica explicado o fenômeno evolutivo (semiciclo gama >> beta >> alfa) e involutivo (alfa >> beta >> gama) de nosso Universo.

Agora podemos compreender melhor o papel de Kardec e Ubaldi na construção de um conhecimento pleno a respeito dos fenômenos. Não apenas seu transformismo profundo, mas sua gênese (fenomenogonia).

Fig.2: O trabalho de Ubaldi complementa o de Kardec. Enquanto este dá o pontapé inicial para a 
compreensão do Todo, o primeiro parte daí e constrói um edifício conceptual capaz de explicar 
os fenômenos mais díspares.

A Parábola do Filho Pródigo fica mais clara quando percebemos os dois semiciclos de nosso Universo. Com Ubaldi o Cristianismo revive num nível mais alto e a Ciência ganha significado divino - que encanta o ser humano comum, leigo. 

Fomos 'criados' simples e ignorantes (átomo) se considerarmos o ponto de partida este universo material. Mas somos 'criados' à imagem e semelhança de Deus (anjos) se considerarmos o Seu Reino (universo imaterial, além do espaço, do tempo e da relatividade). 

No Absoluto (Sistema = Reino de Deus = Céu) nada verdadeiramente nasce - nem morre. Pois tudo que nasce um dia morre. E o espírito é eterno e infinito, além de todas as escalas humanas e deste universo. Apenas no relativo (Anti-Sistema = Universo material = Terra) as coisas nascem e morrem: civilizações, ideias, teorias, criaturas, planetas, estrelas, galáxias, máquinas, relações.

Vamos entrar com um pouco da Nova Cosmologia para sustentar as afirmativas incisivas.

As três primeiras décadas do século passado consolidaram uma nova ciência. Essa ciência ainda está se desdobrando, com avanços apoiados nela. Ela construiu uma nova história do Universo. Um cosmos em transformação perpétua cuja criação coincide com a gênese do espaço e do tempo, da matéria e da energia. E - mais importante - muitos começam a perceber suas implicações filosóficas e teológicas dessa nova teoria.

A Teoria do Big-Bang se firma a partir da década de 1950. A partir dela muitos físicos teóricos tentam buscar a causa que deu início ao processo evolutivo do cosmos. No entanto, quanto mais se aproxima da singularidade (instante t=0), mais impotente se torna a nossa ciência. Um ponto infinitamente pequeno, de densidade infinita, em que a temperatura é inimaginável e nenhuma lei física aparentemente funciona. Ou seja, as próprias evidências atestam que as leis de nosso Universo tem seus limites. A partir de um ponto elas não são válidas. 

Quem 'criou' essas leis? Por quê?

Fig.3: Uma origem (das leis, do movimento e da forma), que inicia um transformismo, 
que aponta para um destino final. A origem é um mistério para a mente racional e seu produto 
mais elevado, a Ciência. O destino é assombroso para o nível de consciência atual, refém do
contexto, da forma e das aparências. Mas para quem vislumbra o infinito nas coisas, tudo está resolvido.

A Ciência não o sabe. Mas é aceito pela comunidade científica que a teoria possui uma solidez muito grande. Quem afirma é um astrofísico da USP, cujo podcast (curto, de 5 min.) pode ser ouvido aqui [1].

"A noção de que o Universo surgiu numa espécie de grande explosão, sendo originalmente muito quente e denso em algum tempo finito no passado e, desde então, tem se resfriado e continua em expansão atualmente é conhecida como big-bang. Mais do que uma simples ideia, a principal explicação para a origem de tudo que conhecemos é uma teoria muito bem fundamentada em evidências científicas e observação. Sabe-se inclusive, com uma margem mínima de erro, que a idade do Universo é de 13,9 bilhões de anos."
Fonte: [1] (grifos meus)

Observação: sendo o erro máximo dos cálculos de aproximadamente 1%, é razoável estarmos abertos a idades do Universo que variem entre 13,7 e 13,9 bilhões de anos.

O que (e quem) garante(m) essa solidez?

Penzias e Wilson. Eles fizeram observações que comprovam a teoria. O que foi feito por esses dois sujeitos foi, a partir das condições iniciais (teorizadas), captar o 'eco' da expansão inicial, conhecido como radiação cósmica de fundo em microondas

Fig.4: Mapa de 2013 da radiação cósmica de fundo deixada no Big Bang, 
tomada pela nave espacial Planck da ESA, capturou a luz mais antiga do universo. 
Esta informação ajuda os astrônomos a determinar a idade do universo [2].
Crédito: ESA e a colaboração da Planck.

No começo havia um caldo especial composto de quarks e elétrons. Posteriormente, nêutrons, prótons e elétrons - que não conseguiam formar átomos devido às condições de ambiente, com temperatura elevadíssima que impedia a formação da matéria. Até o instante t=1s, a nucleossíntese foi efetivada: a junção entre prótons e nêutrons, via força nuclear forte (com alcance de até 10E-13 metros). No entanto, durante muito tempo, a energia dos fótons (devido às altas temperaturas) impedia a união entre os núcleos e os elétrons. 

A expansão do espaço-tempo trouxe uma diminuição de temperatura, e consequentemente de energia associada aos fótons. Estes não foram mais capazes de impedir a junção de núcleo e elétrons (força eletromagnética). E assim nasce a matéria (t ~380 mil anos), sendo sua primeira forma o átomo de Hidrogênio. 

Essa sopa inicial não era visível, pois a luz não podia atuar dentro dela (os fótons estavam ocupados impedindo a relação entre núcleo e elétrons). Mas assim que a união formou os átomos (equilíbrio de cargas), os fótons, sem nada para 'fazer', ficaram livres para se espalhar pelos quatro cantos do universo.

Essa luz inicial (pós-brilho) é denominada de radiação cósmica de fundo em microondas, e foi prevista pela primeira vez por Ralph Alpher e um grupo de cientistas, em 1948. E foi encontrada por Arno Penzias e Robert Wilson, ambos da famosa Bell Telephone Labs, em Nova Jersey. Essa dupla estava construindo um receptor de rádio em 1964 e obtendo temperaturas superiores às esperadas segundo a NASA. Eles pensaram que a anomalia era devido a pombos e seus excrementos. Então fizeram uma limpeza geral em sua antena - inclusive matando pombos, pelo que parece. Mas o problema persistiu. Daí em diante ficou óbvio que se tratava de algo real, concreto. E que esses eram os registos da 'pré-história' do Universo.

A Radiação Cósmica de Fundo dá várias pistas aos astrônomos. Por exemplo, qual a composição do Universo. Os cosmólogos acreditam que a maioria da matéria e energia do cosmos não pode ser percebida através dos nossos instrumentos. Essa parcela despercebida é denominada matéria escura e energia escura (aprox. 95% de tudo que existe).

A expansão do espaço (=do Universo) se deu muito rapidamente no início - e continua até hoje, e continuará até o seu término. E essa expansão inicial se deu a velocidades maiores do que a da luz. Isso não viola o limite de velocidade de Einstein, pois esse limite está restrito a coisas dentro do universo (não ele em si).

O mais interessante é perceber que a gravitação - uma das quatro forças fundamentais - está intimamente relacionada à matéria, uma vez que é a primeira forma dinâmica (tipo de energia = onda) que surge no cosmos. As ondas gravitacionais, por estarem muito próximas da matéria em termos de origem, são muito difíceis de serem detectadas. Ela é o tipo de energia (gravífica) que serve de base para todas as outras - assim como o Hidrogênio o é para toda a série estequiogenética.

"Como o hidrogênio é o tipo do protozoário monocelular da química inorgânica e o carbono o da química orgânica, assim, a gravitação é a protoforça típica do universo dinâmico."
AGS, Cap. 38

E quando estamos lidando com a gravitação, precisamos compreendê-la no seu sentido mais vasto. Newton iniciou esse estudo. Einstein continuou. E Ubaldi, através de Sua Voz (AGS), forneceu seu significado substancial.

"A primeira gênese de β , a gravitação, aparece, portanto, como forma originária de energia, matriz da qual nascerão, como filhas, todas as outras formas, por meio de distinção e diferenciação no processo evolutivo. Particularizemos. Entendo aqui, como gravitação, não a pequena gravitação de Newton, caso particular ao vosso planeta; mas uma gravitação de sentido mais amplo, que resulta do equilíbrio das forças inversas de atração e repulsão, opostas e complementares (lei de dualidade, que veremos agora); uma gravitação filha direta do movimento, isto é, energia gravífica, filha da energia cinética." 
AGS, Cap. 38 (grifos meus)

Equilíbrio de forças que viabiliza a coesão da matéria e o movimento dos objetos. É a lei de dualidade (princípio universal). Ela é a expressão do movimento no plano energético. Por isso está intimamente relacionada com a dimensão 'tempo'.

Não iremos continuar essa história nem essas descrições. Elas são interessantíssimas se vistas sob o prisma monista. O importante aqui é perceber as relações entre os fenômenos. As derivações e diferenciações. O esquema geral do cosmos. De sua construção. Ou melhor...reconstrução.

Fig.5: Desenvolvimento do nosso Universo. Os períodos não estão em escala. 
Parte-se do caos, da ignorância, para se chegar à vida e com esta à manifestação de uma consciência
de alto grau. E daí, parte-se para a desmaterialização...(o fim?).
Mas será que somos filhos do caos e da matéria? Ou existe uma outra explicação? Uma outra teoria?

Com os fatos apresentados, é possível concluir que nosso Universo é movimento perpétuo. Sua origem está além das manifestações contidas em seu seio - por mais evoluídas que sejam essas manifestações. E ele caminha para seu fim (Lei da Entropia e Radioatividade). Mas ele, sendo manifestação, é apenas um aspecto momentâneo do Absoluto. Uma variação da eternidade. Em que criaturas mais ou menos evoluídas digladiam incessantemente. 

Para completar todos esses avanços da Ciência, mister se faz superar a própria Ciência, espiritualizando-a, conforme já foi dito algures [3]. E por isso a obra de Ubaldi é fundamental. Ela fornece um esquema geral que descreve, em linhas gerais, o íntimo do fenômeno evolutivo (A Grande Síntese) e a nossa origem e destino, causa de nossas dores (Deus e Universo + O Sistema).

Fig.6: Pode-se fugir das grandes questões. 
Mas se não buscarmos compreendê-las, elas sempre irão nos dominar...

A Parábola do Filho Pródigo é a síntese do processo da queda (big-crush), com a criação do caos (big-bang) e de toda a odisséia evolutiva (transformismo incessante), até o retorno ao Pai - cujo Reino não é deste mundo...

Cristo disse tudo de forma simples.

Para quem desejar se aprofundar, uma palestra do Maurício Crispim é esclarecedora:

3 comentários:

  1. Parabéns pelos excelentes textos sobre monismo Leonardo! Acompanho seu blog e é uma satisfação ver irmãos de jornada trazendo conceitos fundamentais pra todos despertarmos!

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  2. Por favor, qual é o vídeo do dr.Mauricio.Gostaria de assistir!!!
    Sou nula em física e química, mas sua linguagem é simples, por isso meus sinceros parabéns!

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  3. Meus queridos, gratidão.
    O vídeo pode ser visualizado no link abaixo:
    https://www.youtube.com/watch?v=-bkLeEzc4k4

    Abraços fraternos.

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