quarta-feira, 27 de abril de 2016

Noam Chomsky sobre Pobreza e Desigualdade na América do Norte

O vídeo abaixo é uma das últimas palestras de Noam Chomsky realizadas por vídeo para a Universidade de Concord.



Ele levanta questões pouquíssimo pensadas em nossa sociedade - especialmente nos estratos mais abastados...o que a meu ver constitui uma vergonha. E se nem sequer pensamos a respeito de algo crucial, imagine colocar em pauta nas conversas. Percebe-se assim que mais condições materiais não implica em mais consciência. Que mais instrução não resulta em mais orientação. Que conforto excessivo só traz desconforto à curto e a longo prazo (o primeiro para o povo, o segundo para o próprio). Que o mundo nos oferece várias distrações para manter uma ideologia aceita e um sistema (embasado nela) operando. Cada vez mais incisivo. Passando para o "natural" o que tínhamos como forçado. Gerando riqueza mal distribuída e mal aplicada. Gerando dinheiro fictício, desacoplado do mundo físico, que no entanto drena energias, saúde, tempo e recursos dos povos deste planeta. Um câncer que se difunde eficazmente graças ao seu anonimato. Que opera no nosso subconsciente, se aproveitando de nossos instintos mais basais para conduzir nossas decisões mentais.

O que Chomsky fala sobre os EUA vale para o mundo. A grande questão é: se o povo norte-americano não começar a agir efetivamente para mudar o estado das coisas, pressionando o governo, revendo conceitos inculcados em sua mente, superando suas deficiências seculares, dificilmente o mundo poderá fazer algo para frear essa onda corrosiva chamada neoliberalismo.

Não...não se trata de um joguinho esquerda x direita. Se trata sobretudo de responder às seguintes perguntas: para onde estamos indo? o que vêm acontecendo? por que as coisas não melhoram? por que tantos se esforçam e só vêem a degradação de sua vida? por que a miséria humana se torna cada vez mais visível ? (tanto a interior, espiritual, quanto a exterior, material).

Vou dar um exemplo de questões pouco pensadas: o que era comumente um pensamento ponderado, aceito socialmente e culturalmente, algo compreendido pela mente racional, como instituir um serviço de saúde público, universal e de qualidade, hoje (nos EUA especialmente) é visto como algo demoníaco, um retrocesso, uma coisa de "vagabundo", que é "desperdício" pelos agentes públicos que deveriam representar anseios da população. Esses agentes foram seduzidos e/ou capturados por forças que operam segundo uma lógica de acúmulo ilimitado. Tudo justifica a lógica do comércio ilimitado, dos lucros exponencialmente crescentes e do desmembramento da consciência coletiva.

Eu realmente espero que o mundo, nós, tenhamos discernimento para tomar as rédeas e frear esses instintos interiores e exteriores que vêm causando miséria e desagregação crescente nos últimos 40 anos.

É óbvio: exploração, injustiça e dor sempre fizeram parte da humanidade. O que diferencia o neoliberalismo dos impérios e ideologias anteriores é sua característica de anonimato. E o fato dele ser uma forma mental que facilmente penetra nosso íntimo (nossa psique), sabe operar dentro dela (da mente), excitando instintos de consumo, de ganância e de gozo. Para que assim possamos agir no plano de trabalho, social e de idéias exatamente como ele deseja: sempre nos segregando, buscando explicações superficiais para problemas agudos.

Ideologia é um finito humano. Ela exerce controle. No entanto, apesar de todas mazelas, elas sempre trouxeram um ideal e desenvolveram algo dentro de nós. Elas permitiram a fixação de conceitos como o de Espiritualidade Moral (Igreja) e o de Justiça Social (Comunismo), mesmo que implementados de forma gananciosa e autoritária. Também o conceito de Liberdade individual (Capitalismo) foi um grande progresso. No entanto, do capitalismo de estado que vigorou de 1930 a 1975 (EUA) e 1945 a 1975 (Europa)*, brota o capitalismo voraz que transforma o Estado num agente que representa interesses difusos e particulares: o neoliberalismo. Eis o ponto histórico onde começa a crise que assola o mundo hoje.

O neoliberalismo opera segundo um paradigma. De nada adianta mudarmos governantes, partidos e mesmo formas de governos (ditadura, parlamentarismo, presidencialismo ou mesmo anarquismo) se não alterarmos a forma de concebermos as relações. Relações entre eu e o meio-ambiente; relações entre eu e o outro; relações entre sociedade, estado e economia; relações entre eu e meus familiares; relações entre eu e minha memória (passado) e meus objetivos (futuro).

Precisamos acima de tudo passar a dialogar com questões inquietantes e rever conceitos tidos (impostos) como ultrapassados. Precisamos fazer um esforço titânico em compreender o que Buda quis dizer com O Caminho do Meio. Precisamos (desesperadamente!) encontrar o nosso Equilíbrio, que é Universal, e portanto será o Equilíbrio de tudo e de todos - podendo se dar de variadas formas, mas sempre substancialmente idêntico.

Precisamos compreender que existe um Absoluto que deve guiar os nossos relativos. 
Que este Absoluto admite os relativos, mas está além de nossas finalidades e aquém de nossas premissas.

Mas o relativo impôs o seu império e não admite uma Verdade Absoluta. Uma meta final...Porque na história sempre tivemos casos de abusos desse discurso. No entanto, sem esse Absoluto estamos indo rumo ao abismo...

O que nos resta então?
Resta-nos saber rever o conceito de Absoluto. Perceber um Absoluto humano mais próximo do Absoluto Divino. Algo suficientemente próximo que possamos adotá-lo e criar um glorioso campo magnético que induza milhões a trabalharem pelo ideal de Unificação e Inclusão. Aí iniciará o Reino que Cristo profetiza.

Tudo isso, se formos ver em sua essência, é uma afronta à ideologia neoliberal, que mercantiliza tudo e todos em prol de uma suposta felicidade.

Estamos diante do maior drama a ser enfrentado pela humanidade.

Adquirimos a capacidade de nos autodestruir.
Conseguimos gerar tanta riqueza material e ao mesmo tempo expandimos a miséria de bilhões e o excesso de centenas.
Desenvolvemos tanta ciência e tecnologia, capazes de gerar conforto e compreensão para todos, e no entanto muitos são vítimas dessas criações humanas...

Ou acordamos em número suficiente,
Ou despencamos em número sufocante.


Esse texto não é para o meu bem.
Esse texto é para o bem da humanidade.

Mas como eu vejo o meu bem como o bem da humanidade, e o bem da humanidade como o meu bem, tanto faz se é para mim ou para o conjunto, porque eu me sinto a cada dia mais integrado a essa grande aldeia chamada Humanidade.



* Um pequeno delay talvez tenha se dado na França de François Mitterand, onde de 1981 a 1995, enquanto na Europa e no mundo surgiam governantes subservientes às doutrinas de livre mercado e privatização, manteve-se uma política de Estado visando a garantia de direitos sociais e trabalhistas em meio a um crescimento econômico saudável.





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