(dirigido por Rachid
Bouchareb)
Os filmes de guerra podem ser divididos em vários
subgêneros muito distintos. No de guerra, há o tipo mais difundido,
cujo objetivo é simplesmente entreter o público com tiros, tramas e
explosões; outros visam fazer uma análise mais visceral da
realidade, se baseando em cartas, imagens de arquivo ou estudos
históricos, buscando ser fiel à realidade; há também os
Anti-Guerra, geralmente verdadeiras obras-primas, como “Glória
Feita de Sangue”, de Kirk Douglas*, e “A Grande Ilusão”, de Jean Renoir [1], impecáveis. A nova
co-produção franco-argelina-marroquina-belga “Dias de Glória”
(“Indigènes” em francês) pode ser considerada uma mescla dos
dois últimos.
O diretor Rachid Bouchareb – que também assina o roteiro ao lado de Olivier Lorelle – não desejava trazer inovações técnicas no modo de filmar. Ele apenas queria contar bem uma história, objetivo que alcançou sem nenhuma dificuldade. Mas o verdadeiro mérito dele foi contar uma história de heroísmo baseada em fatos verídicos que o governo francês parece ter esquecido ou ignora: o recrutamento de 130 mil soldados das colônias que serviram de ponta-de-lança para combater os nazistas durante a 2a Guerra Mundial.
Abdelkader (Samir Bouajila), Saïd (Jammel Debbouze), Messaoud (Roschdy Zem) e Yassir (Samy Naceri), são jovens oriundos da Argélia e Marrocos que desejam fazer algo pelo mundo livre. Por serem colônias de uma nação inimiga do nazismo e acreditarem nos ideais da liberdade, os quatro sentem aquele típico dever cívico em fazer alguma coisa pelo mundo e se alistam no exército francês.
O drama de uma geração de argelinos e marroquinos sintetizado no cotidiano de quatro homens. Eis um lado da história pouco conhecido mas muito significativo. |
Inicialmente, a nova vida dos soldados das Colônias parece
ser igual àquela dos soldados franceses. Ambos lutam por uma causa
comum, arriscam suas vidas, tem os mesmos equipamentos e são
auxiliados por instrutores experientes. Porém, com o passar do
tempo, observa-se que nem tudo é igual. No combate todos são
iguais. Na hora da recompensa pelo serviço os europeus parecem ter
vantagem, recebendo mais promoções, cargos importantes, prioridades
nos alimentos...Sem contar o reconhecimento, claramente demostrado na
cena final do filme, quando os argelinos, pouco numerosos, defendem
uma vila até o último homem, para que o batalhão –constituído
de fraceses, que ficaram pra trás – cheguem em segurança.
O grande mérito do filme é colocar em xeque um sistema injusto que visa obter serviços colossais a preço de bananas, mostrando o dia-a-dia dos soldados das colônias em todas etapas do processo de libertação.
O grande mérito do filme é colocar em xeque um sistema injusto que visa obter serviços colossais a preço de bananas, mostrando o dia-a-dia dos soldados das colônias em todas etapas do processo de libertação.
Numa primeira parte o espectador se depara com o front italiano. Depois, na fronteira franco-alemã, a luta na casa do inimigo. Nesse ponto o filme atinge o clímax.
Os combates finais são os mais memoráveis e revelam a competência e heroísmo dos argelinos e marroquinos. Os quatro protagonistas, sozinhos e encurralados num pequeno vilarejo, enfrentam um batalhão alemão enquanto o reforço não chega – obviamente o espectador habituado aos filmes hollywoodianos pode se decepcionar pelo fato dos quatro sozinhos não vencerem a luta, como num típico filme de Chuck Norris.
O desfecho mostra a (triste) realidade de aparências em que vivemos, com o completo descaso dos governos europeus. Neste caso o francês. Porém, no final do combate, quando Abdelkander, o único sobrevivente, sai das ruínas e se junta aos soldados franceses para continuar a marcha, os habitantes da vila o aplaudem, num gesto de reconhecimento tímido mas profundamente sincero.
Dias de Glória é uma aula de História aprofundada,
que demonstra acontecimentos reais e trabalha muito com seres humanos
enganados por promessas duvidosas.
É cinema que vale a pena. É crítica, verdade, reflexão.
Referências
* Apesar de dirigido por Kubrick, esse filme foi idealizado, desejado e produzido por Kirk Douglas, que inclusive auxiliou na elaboração do roteiro - alma de um filme.
[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean_Renoir
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