quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Mecânica do Milagre

"Quem é senhor de seu destino?"

Assim grita a voz silenciosa do cosmos, no íntimo de cada um. Pouquíssimos a escutam. Alguns, ao escutarem, se fazem perplexos e sentem-se desnudados diante de tal pergunta. Uma questão aparentemente insolúvel, porém fundamental.

A mão não se estende pedindo. Ela se estende buscando
iluminação. A intenção pura é o maior poder que existe.
O mundo não compreende...
A vida se apresenta diante de nós com suas leis férreas. Uma vez determinada nossa trajetória-mor,  por nós mesmos ou pelas forças do sistema que nos rege, parece-nos impossível alterar o curso dos acontecimentos sem que nos coloquemos numa região de altíssimo risco, cujo resultado fatalmente nos conduzirá a um estado de fragmentação material, colimando numa exclusão social e econômica, além de abalos psicológicos profundos. Eis os motivos centrais que levam a imensa maioria da humanidade a aceitar as condições que lhe são impostas pelas forças do mundo, sem ao menos se perguntar o porquê de tudo isso e se existe alguma possibilidade de escape - mesmo que em outro plano. Nos deparamos com a triste impossibilidade de alterarmos nossa rota e com isso moldamos nossa mente para nos habituarmos a tal destino. Muitas vezes contra nossa íntima natureza. Abortamos planos, murchamos expectativas, nulificamos possibilidades...

Somente quem vivenciou um fenômeno supra-normal à fundo pode tentar descrevê-lo. Quem nunca amou não pode escrever ou falar sobre o amor; quem não praticou não pode explicar como se faz no concreto; quem não sofreu não pode falar das vantagens de sofrer; quem não ousou não fica aberto a novas formas de vida. Dessa forma, os únicos relatos cujas palavras são carregadas de força transformadora, capazes de ressoar nos milênios e nos espaços, sendo absorvidos no íntimo de almas sedentas pela superação, são aqueles que são um transbordamento da vivência íntima e intensa de uma alma desesperada por compreensão dos porquês dos destinos. Nos encontramos diante dos últimos problemas do Ser. 

Abbé Pierre, Sacerdote francês. Criou o
Movimento Emaús, associação que salva
milhões de privações diversas. Seus
conceitos de Deus estavam acima das
formalidades humanas.
O Evangelho é por excelência um dos livros sacros da humanidade. Juntamente com o Bhagavad Gita e o Tao Te Ching, temos a quintessência dos ensinamentos morais, sempre atuais, com interpretações cada vez mais coerentes com a realidade material-racional que nos permeia. Cada conceito traduzido em palavras já constitui uma degradação. O processo de pensar num ideal requer que você o degrade, trazendo algo do plano intuitivo-sintético (3ª dimensão conceptual) para o plano racional-analítico (2ª dimensão conceptual); depois, ao passarmos para palavras, sistematizando-o, há ainda uma outra distorção que, por menor que seja, irá rebaixar o alto conceito. Apesar disso, não há outro modo de trazer e difundir os conceitos mais fantásticos. Conceitos que amparam a humanidade, servem de guia, inspiram e orientam nos momentos mais tenebrosos. A Ciência faz esforços tremendos em descobrir novas leis, ampliá-las, atualizar outras e criar novos métodos e ferramentas para experimentações e teorizações. No entanto, falta-lhe uma coisa, sem a qual ela jamais dará um passo substancial à frente: o método inspirativo

Descobrir por vias interiores será a nova forma de criar ideias mais elevadas. Nosso mundo clama por um jeito completamente diverso de se conceber a vida, as relações, de se trabalhar e pesquisar. No íntimo, o ser humano é incapaz de negar tal anseio. É um desespero existencial cada vez mais irrefreável. Qualquer um que sustente e incorpore em sua vida esse anelo estará criando uma terreno sólido pela frente. O mundo não o suportará por vontade própria. Mas outras forças, existentes mas ignoradas pela imensa maioria da humanidade, irão garantir que este mundo sirva de meio para lhe garantir todas as necessidades materiais - e afetivas. A partir daí engrenagens metafísicas são acionadas, cujo poder engloba todos os poderes do mundo, indo muito além. Não fazem uso da força nem do ruído; nem do número; nem do dinheiro. Apenas guiam pelo pensamento. Estamos diante das forças mais poderosas que alguém pode conceber. Colocar-se contra elas é uma violação da Lei que acarretará num destino penoso, em que toda dívida deverá ser saldada, até o último cêntimo. Por outro lado, colocar-se obediente a elas colocará a criatura sob o amparo da Lei - tanto maior será este amparo quanto maior obediência, vontade e sinceridade o Ser demonstrar. Estamos diante do fenômeno mais fascinante e intrigante da humanidade: a mecânica dos milagres.

Teilhard de Chardin. Padre paleontólogo
que percebeu no monismo a mais
profunda aproximação de Deus. Sofreu
por causa disso, sendo incompreendido
pelo mundo. 
Somente nos damos conta do fenômeno após ele ter se realizado. Olha-se para trás e começa a se ver o quão grande foi o abismo que superamos. Todas as leis conhecidas do mundo não explicam de forma convincente o que se deu. E o mundo, nu e impotente diante de tais mistérios, diz: "foi sorte!". Diz que as probabilidades eram baixíssimas, quase nulas, praticamente nulas, mas se aconteceu, foi sorte - se para benefício - ou azar - para malefício. O mundo não explica, apenas exclama, e assim permanece incapaz de avançar no conhecimento de novas leis, mais poderosas que todas as que se conhecem até o momento. Leis que superam aquelas da materialidade e da vida; leis que superam as pobres tentativas humanas de estabelecer um corpo jurídico eficaz; leis do campo moral. 

O Ser que reconhece a impossibilidade de ter realizado o feito sozinho dá o primeiro passo que um dia deverá ser dado em proporções massivas, de coletividade, para o efetivo progresso das civilizações. Abre-se a mente para a existência de forças vindas de regiões do imponderável. O Ser é invadido de espanto à princípio. Depois, preenchido de gratidão. Mais tarde poderá começar a conduzir sua vida de modo diverso, mais quieto, mais concentrado, mais orientado...É uma obrigação passar ao mundo as palavras sendo ditas há milênios pelo Gita, pelo Tao, pelo Evangelho e outras escrituras sagradas. O Evangelho não é um belo escrito irrealizável na vida cotidiana. Ele contém os preceitos que, se seguidos com toda a intensidade, sem nenhuma expectativa, irão acionar forças tão poderosas que o mundo, tão cego ao Alto, tão concentrado nas miudezas da eficiência material, monetária e seus afazeres alienantes (em sua maioria), irá classificá-las como conto-de-fadas. Como coisa inexistente. Sonho de utópicos. Sonhos perigosos. 

O homem moderno considera louco aquele que leva a sério os ensinamentos sagrados. Para a mentalidade hodierna, trata-se de escritos completamente desacoplados da vida concreta. Nem sequer se crê que a longa marcha da humanidade é caminhar para esse ideal. Mas o desdobrar da "realidade" inexoravelmente nos conduzirá a uma forma de vida muito mais próxima ao que todos veem como ideal. O mundo passa justamente por essa fase destrutiva para se purificar, eliminando todas imbecilidades que estão impedindo o trabalho do espírito. Deus imanente se manifesta cada vez mais concretamente. Através de espíritos iluminados da atualidade (Abbé Pierre, Gandhi, Ubaldi, Rohden, Madre Tereza, T. de Chardin,...) ele se faz mais compreensível pela ciência, mais aceito pelos sinceros, mais atraente para os céticos, menos temível para os negadores. É uma concepção tão fantástica que deverá abrir fendas que iluminarão caminhos desconhecidos de uma humanidade futura, renovada por um grande batismo de dor. Batismo que apenas estraçalha a forma - para revelar a substância. 

Mas voltemos à mecânica do fenômeno. O que é necessário para que se cumpra tal acontecimento? - fantástico para o mundo, natural para Deus e seu emissário-mor, Cristo. 
  1. O primeiro requisito é não agir esperando realizar um feito do tipo. É uma dupla violação, porque primeiro não somos nós que realizamos; e segundo porque a expectativa de fazê-lo demonstra que queremos executar algo, muitas vezes sem nenhuma finalidade;
  2. Deve-se atingir um nível de sofrimento tão profundo que o ser seja obrigado a voltar-se para si mesmo, aceitando humildemente o estado das coisas, mas ao mesmo tempo derrubando uma por uma, com a própria lógica do mundo, as regras que lhe foram impostas;
  3. Após os dois passos, deve-se ainda começar uma atuação guiada não pela mente, mas pelo sentimento elevado, que pode ir em completo desacordo com o modo de agir racional. A única maneira de manter a consciência limpa fazendo isso é a íntima e inexpugnável certeza de que você está fazendo isso pelo bem de seu espírito, que pode ser muito mais útil para seu ser e a coletividade de outras formas. Independentemente das reações e empecilhos do mundo, sua atitude se manterá;
  4. Após ser golpeado duramente, manter um estado de paz inabalável, sincero à sua consciência e aceitando o que ocorreu. Se era tão inaceitável aquela realidade, então qualquer destino se lhe apresentará como uma nova possibilidade, por mais pavoroso que possa parecer o vazio existencial e a exclusão;
  5. Continuar vivendo a vida dentro de suas possibilidades, fazendo uma reflexão profunda sobre o golpe, suas implicações. Dialogando com o interior continuamente, se desnudando diante da realidade do mundo, buscando compreender a finalidade do ocorrido e da sua vida.
Pietro Ubaldi. Indefinível. Portador do
mais elevado conceito de monismo até hoje
(muitos começam a falar de monismo ubaldiano).
Sua visão e vida começam a ser objeto de
interesse de muitos ansiosos por uma renovação.
É importante destacar que o Alto apenas age para aqueles que tem merecimento. Deve-se antes largar as garantias do mundo para que as engrenagens do imponderável comecem a ser acionadas. A atuação é lenta em nosso relativo - mas para Deus o tempo inexiste, pois Ele se encontra acima das barreiras de espaço-tempo, dominando-as por completo - como nós dominamos uma formiguinha com nossos dedos. De fato, foi assim que se deu para o autor. Força e Fé são imprescindíveis. Força inesgotável, Fé inabalável.

O processo de atuação durou 1 ano exato - outro fato interessante. Desde o golpe fatal até a salvação final. Nesse ínterim o autor vivenciou um período de profunda reflexão, trabalho mental contínuo, reposicionamento de conceitos, aprofundamento de ideias. Um misto de alívio e horror constituíam sua psique. Era o período de incertezas extremas. A transição. Nada foi pedido do Alto, jamais. Jamais, jamais, jamais. Apenas buscou-se compreender os fatos. Um colóquio com o Deus imanente. 

As maiores realizações nascem de uma vontade íntima de superação. Um desespero ardente por fazer de forma melhor, adequado às suas habilidades. Uma ousadia fora do comum, que não agride, que encanta, que abraça os fatos do mundo com elegância, mas ao mesmo tempo não os incorpora por completo, deixando uma fenda aberta para o infinito e eterno. É a sede de ser preenchido de forma diversa nesse "pequeno espaço", guardando-o, que faz toda a diferença - e pode levar as pessoas à salvação. Primeiramente uma pequena salvação - como a do autor. Futuramente como A Salvação.

Força e Fé.

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Ensaio sobre Espaço, Tempo e Consciência - e seus desdobramentos

O tempo é percebido de forma distinta por cada um de nós. E mesmo para um mesmo indivíduo, o desdobrar dos momentos pode ser vivenciado conforme o tipo de experiência (atividade) que ele estiver realizando. E essa percepção, a meu ver, diz muito a respeito do grau de consciência em que cada um se encontra.

A percepção do tempo se altera à medida que somos capazes de pensá-lo. E também de senti-lo. É notório constatar que, quando estamos com imersão total numa atividade, todas percepções relacionadas a medições de tempo parecem desaparecer em nosso interior. Quando isso ocorre a mente fica livre de pensamentos relacionados ao tempo - quanto tempo tenho, qual o prazo, que horas é o almoço, o que farei amanhã, como pude fazer aquilo ontem, etc. A liberdade de pensamento não mais fica restrita ao tempo - apesar de nosso organismo físico estar obedecendo às suas leis. Isso amplia a atuação no mundo concreto.

Vejamos um exemplo que o Cinema nos traz.

No filme Gattaca (1997) a história se passa num futuro próximo, no qual é possível projetar geneticamente os descendentes. Nesse filme haviam dois irmãos, um deles geneticamente otimizado (projetado), outro não (natural). Ambos tinham o costume de realizar competições no mar: o que nadasse mais longe mar adentro venceria a competição. É claro que o irmão geneticamente selecionado sempre ganhava essas competições.

Gattaca (1997) - alguns esboços do monumental sistema
apresentado e sistematizado em A Grande Síntese.
No entanto, lá pelo fim do filme, quando ambos nadam, num dia chuvoso e trovejante, ocorre o inesperado: o irmão "inapto" vence por ampla margem. Nada muito além do esperado - pelo irmão e por ele mesmo. "O que ocorreu?", o outro pergunta. "Como você venceu? Qual foi o truque?" se indaga o irmão selecionado. E o outro simplesmente responde: "Eu nunca pensei na volta." Transcender paradigmas...

Era lógico que, nadando mar adentro até um ponto, alguém saiba que o tanto que se avançar para dentro deverá ser o mesmo tanto que deverá ser recuado para retornar à praia. Trata-se de um cálculo de segurança, natural a todo ser humano racional. No entanto, essa racionalidade - muito importante para nossa sobrevivência e desenvolvimento - se torna restrita a partir do ponto em que você se vê diante da necessidade de, num dado momento de sua vida, ir além das suas capacidades humanas. para captar um novo conceito, criar um novo sistema ou construir uma nova máquina. Para superar isso foi necessário esquecer a mente da segurança sistematizadora e abraçar o sentimento libertador da intuição. Intuição esta que não nega a mente, mas apenas supera-a em certos momentos críticos. 

A partir do momento em que a dimensão espaço-tempo deixa de dominar o campo psíquico por completo, as barreiras das restrições mentais esvanecem e os caminhos para a realização dos objetivos utópicos começam a se delinear. Eis que na materialidade do mundo avança-se um pouco mais, contra todas expectativas do cálculo, da genética, das projeções. E assim a razão se espanta e inicia a sondar o fenômeno. "O que ocorreu?", "Como?", "O que não considerei no meu modelo?". E assim se vê forçada a reconstruir seus métodos até ao ponto de refazer hipóteses e até mesmo questionar seus fundamentos. Os axiomas são abalados e adentra-se no imponderável. A Ciência chega às portas do Espírito. As Humanidades se incorporam de forma cada vez mais sólida na Ciência. A concepção de dilata. A Filosofia se renova, excluindo seus excessivos sistemas, teorias e formalismos. A Religião se desnuda e encontra um laboratório que a conecta à vida das pessoas. Força e fé.

Espaço e tempo, antes considerados dimensões desacopladas, se fundem com a Teoria da Relatividade (Einstein) no século XX. As implicações são muito mais metafísicas do que físicas. O mundo começa a perceber o que significa de fato a curvatura do espaço-tempo. A dimensão "tempo" deixa de ser absoluta, revelando ser apenas um aspecto de nosso universo decaído. Aspecto que dita o ritmo de transformismo da matéria e dos seres, no qual tudo que existe nasce e morre: lógica econômicas, sistemas políticos, ideias, idiomas, pessoas, animais, plantas, planetas, estrelas, galáxias,...

A partir do momento que se atinge a intuição plena, libertamo-nos das barreiras espaço-temporais. A síntese é realizada não na base da sequência, e sim na da simultaneidade. Tempo é a dimensão característica da substância na forma energia; assim como espaço é a dimensão característica da substância na forma matéria. A consciência é a dimensão psíquica da substância na forma espírito. Nessa dimensão inicia-se o processo de superar aquelas precedentes (espaço-tempo). Por exemplo: podemos conceber mentalmente passado, presente e futuro, prevendo e recordando ações no tempo. Ou seja, superamos o tempo com a mente. Podemos abraçar o universo conceptualmente - mas não materialmente. Estamos limitados apenas pelas barreiras das dimensões que julgamos existirem permanentemente e serem únicas. 

"Assim como são infinitas as fases evolutivas, também são infinitas as respectivas dimensões. Eis como nosso olhar pode superar o tempo e o espaço, que são apenas duas dimensões contíguas dentre as infinitas dimensões sucessivas."
A Grande Síntese - Cap. 36. Gênese do Espaço e do Tempo

É necessário destacar a existência de dois tempos: o do devenir fenomênico (absoluto) e o sequencial (relativo).

A Figura 4 do texto de 25/08 ("Emborcamento do Rumo Natural") mostra o desenvolvimento das dimensões numa forma simplificada. Nele, vemos a gênese e conclusão da dimensão "tempo". No entanto, o devenir vai do abismo no infinito negativo à plenitude do infinito positivo, sendo portanto algo diferente daquilo que estamos habituados a denominar como tempo. É imensurável para nossa concepção, mas permeia todas dimensões. Logo, o "tempo" no diagrama deve ser lido de forma diversa, mais ampla, não-mensurável. Como uma progressão.

O tempo sequencial do nosso universo relativo é capturável pelos nossos sentidos. O devenir fenomênico que engloba nosso universo - e vai muito aquém e além - não é capturável (ainda) pelos nossos sentidos. Também não é compreendido. Logo, a mente hodierna considera esses conceitos como tergiversações filosóficas divertidas sem nenhum implicação na vida cotidiana. No entanto, - e isso será constatado futuramente - será no momento em que todos nossos sistemas ruírem e nosso desespero beirar o abismo da inexistência que mais afoitamente nos voltaremos para esses conceitos, únicos que contém as chaves para as libertadoras dimensões superiores. Muitos sábios vêm trazendo esses conceitos, de forma cada vez mais elaborada (Baghavad Gita de Krishna, Tao Te Ching de Lao Tsé, Evangelho de Cristo, Pascal, Spinoza, Rohden, Bergson, T. de Chardin, Ubaldi,...), adaptada aos nossos tempos, necessidades e desafios.

"Nas fases inferiores, o tempo só existe em sentido mais amplo, entendido como ritmo do devenir, propriedade de todos os fenômenos, e não como consciência do transformismo, propriedade das forças. Facilmente compreendeis a revolução que trazem esses conceitos em vossa ordem habitual de ideias."
A Grande Síntese - Cap. 37. Consciência e Superconsciência. Sucessão dos Sistemas Tridimensionais.

Leia-se "fases inferiores" como aquelas precedentes à existência do tempo. É de fato muito difícil compreender isso, uma vez que antecedência nos remete diretamente à ideia de tempo - nosso tempo sequencial.

"Ao deslocar-se no tempo, o fenômeno adquire em β uma consciência própria, linear, a primeira dimensão conceptual."
A Grande Síntese - idem

O movimento é o que os nossos sentidos captam na dimensão tempo. O volume se desloca com o desdobramento da substância em sua forma β (energia) . 

"Em α, estamos na fase subumana e humana de consciência mais completa, onde temos a segunda dimensão conceptual, correspondente à superfície no sistema espacial. Assim como da linha se passa à superfície, com deslocamentos em novas direções extra-lineares, também a consciência humana, por deslocamentos semelhantes, invade o devenir de outros fenômenos, diferencia-se deles, aprende a dizer “eu” e a perceber a própria individualidade distinta das outras, dobra-se sobre o ambiente, projeta-se para fora (a nova dimensão), observa e julga. Essa projeção para fora, característica da segunda dimensão, é alcançada por meio dos sentidos, que, na primeira dimensão, eram desconhecidos."
A Grande Síntese - idem

No tempo a matéria é animada. Posteriormente a vida emerge. Uma forma de energia degradada (eletricidade) entra em contato com elementos químicos específicos (H,N,C,O). Condições atmosféricas especiais farão surgir os primeiros seres unicelulares. A partir daí a vida de desdobra cada vez mais - assim como a matéria e a energia o fizeram.

O tempo corroído pelo seu próprio desenvolvimento.
A racionalidade extinta pela sua própria expansão.
Mas conquistaremos novas dimensões.
A intuição nos levará ao monismo vivenciado.
Com a consciência o ser humano concebe o devenir dos outros fenômenos. Supera o tempo conceptualmente, no pensamento. Mas ainda não completamente, pois seu corpo físico está sujeito às leis da energia e matéria - ambas sujeitas ao tempo. É nesse nível que nós aprendemos a nos diferenciar e consequentemente observar a nós mesmos e aos outros (exteriormente). É a gênese do intelecto luciférico, cuja marcha solitária dá sinais de desgaste. Uma marcha colocada a todo vapor a partir do século XVI. Uma marcha restrita a sua própria lógica, solitária. Negadora de qualquer fenômeno acima, subjugadora de qualquer fenômeno abaixo. E assim o século XX nos brinda com o monismo ubaldiano, acompanhado de outras almas que plantaram as sementes da nova humanidade. Resta ao século XXI iniciar a assimilação e implementação dos conceitos...

"Em +x aparece a terceira manifestação da dimensão conceptual, que completa o sistema, correspondendo ao volume. A consciência, que não tem dimensão na matéria (o volume é a dimensão espacial completa, mas, diante do sistema sucessivo, é uma não-dimensão, o ponto), assume no campo das forças a dimensão linear; alcança no campo da vida a dimensão superfície; adquire no campo absolutamente abstrato do puro espírito a dimensão de volume. As limitações de vosso concebível me impedem de prosseguir até aos sistemas sucessivos, cada vez mais espirituais e rarefeitos, que se estendem ao infinito. Em vez disso, expliquemos as características da segunda dimensão (consciência) em relação às da terceira (superconsciência)."
A Grande Síntese 

Sua Voz (entidade do Alto captada por Ubaldi em sua mediunidade ultrafânica) faz uma analogia entre as três dimensões materiais (linha, superfície, volume) e as três sucessivas dimensões conceptuais (tempo, consciência, super-consciência). Quando afirma-se que o tempo é uma não-dimensão no sistema espacial (ponto) significa que a trindade espacial é incapaz de identificar o início da próxima. Trata-se de evolução de dimensões por tríades, formando um acorde [1]. 

Segue-se no livro a diferenciação entre consciência (razão) e super-consciência (intuição):
  
"Da mesma forma que a superfície absorve a linha, a consciência absorve o tempo e o domina; enquanto as forças precisam do tempo, o pensamento o supera. Na passagem da fase β à fase α, a dimensão tempo tende a se desvanecer, pois, embora subsistindo, é tanta a sua aceleração de ritmo (onda), que vos pareceria quase sumir na nova dimensão. Com efeito, quanto mais baixa e material, tanto mais lenta e semelhante a β é a consciência; quanto mais concreto o pensamento, mais denso é o ritmo e mais vagarosa a onda. O pensamento implica tempo somente enquanto e na medida em que ainda é energia. Quanto mais cerebral, racional e analítico, tanto menos abstrato, intuitivo e sintético é o pensamento. Neste segundo sistema tridimensional, assistis a uma aceleração contínua de ritmo. Nessa aceleração, o tempo é gradualmente absorvido. Por sua vez, a superconsciência domina e absorve a consciência, tal como o volume o fez com a superfície."
A Grande Síntese 

O ritmo se acelera significa que a intensidade com a qual eu me envolvo num processo de construção (conceptual, que pode envolver materialidade, mas conduzida pelo psiquismo) atinge um grau de abstração tão elevado que as faculdades da mente ligadas ao cerebralismo puro são incapazes de acompanhar os conceitos sendo absorvidos. Sendo assim o tempo não consegue acessar (influenciar) essa zona com o peso habitual. Zona em que a mente adentra-se em grande porcentagem. Essas inúmeras gradações num contínuo permeiam a região que é denominada pelos psicanalistas de consciente (razão) - relativa a cada ser humano. O início da travessia marca o início da consciência. O fim dela é sua superação completa, na super-consciência. Nesse (longo) intervalo - a Jornada Multimilenar da humanidade terrestre - vamos sempre aprendendo a subir na consciência, conseguindo fazer uso em pequeníssimas doses da fase seguinte (intuição). Essa travessia foi vislumbrada [2] e sistematizada-exemplificada [3] em ensaios anteriores.

Dessa forma, explica-se como é possível iniciar a conquista da eternidade (superação do tempo) com nossos recursos limitados. Recursos que contêm em germe as dimensões superiores. Basta para isso desdobrar aquilo já presente no íntimo.

No íntimo...

Observações
[1] na música, o acorde é um conjunto de três ou mais notas que se ouve como se estivessem soando simultaneamente. assim como o volume (espaço) contém simultaneamente as dimensões superfície e linha, além de si mesmo.
[2] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com.br/2014/11/um-ciclo-duas-fases-piramide-expansiva.html
[3] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com.br/2015/03/sistematizacao-do-processo-evolutivo.html
   





sexta-feira, 1 de setembro de 2017

É Chegado o Tempo das Ciências Humanas? (II)

Há mais de dois anos escrevi um ensaio intitulado "É chegado o tempo das ciências humanas?". Trata de um sentimento calcado no pressentimento. Um vislumbre do porvir. Porvir presente em estado latente. Indiferente às indiferenças daqueles que vivem no plano da superficialidade dos fatos e pressões das obrigações; Indiferente às afirmações limitadas e incertas. Afirmações que negam o inexplicável presente - que deseja ardentemente se fazer explicável, exemplificável e transparente futuro. Bastando para isso a nossa vontade ardente se casar com a nossa sinceridade carente, com a bênção de nossa consciência latente. Só isso, tudo isso.

O que quero dizer com "é chegado o tempo..."? Domínio? Predomínio? Culto? Quem acompanha essa jornada de 4 anos, já com 300 ensaios, nascida num período de explosão coletiva, sabe que a leitura literal das palavras não diz. O que diz é o sentimento comum, universal, acionado (ou não) pela disposição das palavras. Estas nada mais que um meio para despertar o Eu em cada um. Nada mais, nada menos.

Reparem o trajeto da humanidade - nossa História e Pré-História. O que impulsionou inconscientemente as descobertas, os inventos, os atos? As crenças. As filosofias. E conscientemente? A ciência e a técnica. Mas a Ciência nasce da Filosofia. E por muito tempo ela fica estacionada na superfície (Séc. V a XV), dando lugar ao império da Igreja. Após isso, deslancha a Revolução científica, seguida pela técnica que culmina na indústria. Até aí desenvolvem-se as ciências físicas e suas aplicações; a química e suas aplicações; a biologia; a medicina; os formalismos da lógica e da matemática. O Iluminismo prepara terreno para uma nova forma de economia, de sistema político e de utilização das tecnologias.

No final do Séc. XIX despontam a Sociologia e a Psicologia. É óbvio que o estudo do comportamento humano surja defasado do estudo do comportamento da natureza - apesar de nós também sermos naturais e estarmos imersos num mundo físico, dinâmico e orgânico. 

O livre-arbítrio de um átomo é tão reduzido que se traduz em férreo determinismo. Ele obedece com perfeição leis que desconhece. À medida que subimos na escala evolutiva, observamos relíquias do mundo físico (matéria), depois dinâmico (energia) até finalmente chegarmos à vida em sua forma mais elementar (vegetais). Elementar mas essencial, pois ela faz perfeitamente e inconscientemente o que um dia faremos de forma espontânea e consciente: captar energia diretamente da luz (em outro ensaio explicarei melhor). Subimos e vemos o movimento e instintos de fome e sexo (animal). Até mesmo um certo sentimento rudimentar, de identificação com o dono, de memorização, de aprendizagem. Mas um psiquismo baixíssimo, incapaz de refletir sua própria finalidade. Subindo mais fareja-se o biótipo em que a razão eclode desordenadamente: o homem.

Nós somos capazes de estudar tudo abaixo de nós e suas dimensões características: matéria (espaço), energia (tempo). E tudo que se manifesta exclusivamente em nós: vida (consciência). E além, nos planos da super-consciência, em que a intuição coordena o raciocínio, que domina os instintos, que se reduzem ao mínimo indispensável para manter o progresso numa marcha segura e crescente. Essa capacidade surge em nós. E iniciamos por sistematizar aquilo mais embaixo. De modo geral estamos subindo na assimilação consciente dos planos evolutivos, sendo cada vez mais evidente que a cada ascensão devemos não apenas assimilar aquilo que recém-conquistamos, como usá-lo para sutilizar todas as qualidades inferiores, tornando-as mais aptas. Espiritualização da matéria. 

Não são apenas as escalas de tempo que mudam. Nem de espaço. Entram elementos novos. A linguagem. O modo de descrever. O subjetivismo. A mudança frequente. Todos essas novidades são recentes, logo, de pouco uso até então. Estamos em fase de compreensão de fenômenos mais complexos, que se fazem mais visíveis devido aos últimos avanços da ciência e tecnologia, e à forma de organização social. Os ciclos descoberta-assimilação-experimentação-difusão das ciências naturais são muito mais breves do que aqueles das ciências humanas. Primeiro por entrarmos com entidades dotadas de amplo livre-arbítrio - ao menos em relação aos fenômenos físicos e químicos; segundo, como consequência, pelo aumento da complexidade das interações, tornando o desenvolvimento de uma ciência supra-natural, humana - mas que também engloba aspectos do natural, porém com menor peso - um processo lento e incerto em larga medida. Logo, não é razoável tratar experiências econômicas, políticas e culturais como coisas que tendem (devem) a se arranjarem tal qual minérios, bactérias, planetas, dispositivos.

A humanidade começa a aprofundar o conceito de democracia. Volta-se à questão da democracia direta, com todos seus desafios considerando as escalas atuais. O sistema econômico, com sua lógica, é expandido e tende a se transformar cada vez mais num apêndice de um sistema diretor, muito mais essencial à vida, intangível, poderoso, que atua silenciosamente através das pessoas, ao longo da história, moldando e orientando à seu modo, rumo a Deus. Eis que Georgescu-Roegen propõe a incorporação da economia à biologia (Bioeconomia), aplicando conceitos de entropia (2ª lei da termodinâmica) para explicar a insustentabilidade do crescimento indefinido, sem limites. A psicanálise após Carl Jung começa a trabalhar com a hipótese da existência (e preexistência) da alma para diagnosticar seus pacientes. O conceito de inconsciente, ao invés de se prender num subconsciente estático freudiano que comanda um consciente de aparências, - cuja única função é satisfazer de forma mais eficiente desejos desses instintos - se desdobra numa tríade dinâmica composta de subconsciente (instinto), consciente (razão) e superconsciente (intuição). Todas as sementes de um novo pensamento são lançadas no século XX - o último século do segundo milênio.

O conceito de monismo, trabalhado desde tempos imemoriais pelas maiores almas, é sintetizado de forma suprema por Ubaldi. Através de sua obra, Ciência e Religião se entrelaçam, co-orientam e auto-explicam. O panteísmo da imanência e o monoteísmo da  transcendência se fundem num monismo. O criacionismo que afirma a natureza de Deus se une ao evolucionismo que afirma e explica Sua lei. Plantam-se as bases para a Civilização do III Milênio.

Muitos acreditam que a filosofia já cumpriu seu papel. Dentre esses muitos se incluem filósofos dos mais variados tipos que, mesmo não demonstrando isso por afirmações, exemplificam por sua conduta individual engessada. No entanto, os verdadeiros filósofos - sejam eles de profissão, de essência ou ambos - sentem o porvir e asseguram que hoje, mais do que nunca, a Filosofia tem (e terá) um papel imprescindível para conduzir a humanidade rumo a uma transformação substancial como nunca se viu antes em nossos 6 milênios de civilização histórica. Não se trata aqui de inventar um novo sistema filosófico e alimentá-lo egoisticamente para que outros orbitem em torno dele. Trata-se de fundir o melhor de todos os sistemas filosóficos e trabalhar rumo à evolução suprema, sutilizando todas ideias, conceitos, debates, relações, análises e experiências coletivas. Uma filosofia cósmica que não se atêm a formalidades engessantes e percebe seu papel transformador. Uma filosofia não-dualística.

Com os progressos da tecnologia da informação, das redes sociais, das tecnologias múltiplas, do domínio da mídia e da falta de ideais supremos, a vida estagna e a humanidade corrói o alicerce que a sustenta: a Mãe Terra. Com todos seus recursos minerais; suas fontes de energia fósseis; suas espécies (fauna e flora), suas paisagens e climas e relevos e ciclos; com seu poder de atração gravitacional suficientemente forte e fraco para criar condições de vida. Saber o que fazer com o que se tem é imprescindível. A era da Fé cega terminou no século XV para dar lugar a era da Ciência e da Razão. O misticismo medieval, os santos que ardiam de paixão com sua visão, foram relegados ao esquecimento. A Teologia do tipo Igreja não fornece terreno fértil para a aquisição de novas habilidades. O antropocentrismo começa a se desdobrar e assim explode o materialismo. Renascimento; Iluminismo; Formação dos Estados Nacionais; Revolução Francesa; Revolução Industrial; Revolução Tecnológica. E eis que chegamos a um ponto nevrálgico. O sistema econômico que se considera vencedor eterno e absoluto começa a perder adeptos a cada dia. Só lhe resta o uso da astúcia (propaganda e distrações, seja em forma de consumo conspícuo ou trabalho alienado) e força (Estado de exceção, ameaças informais). Mas esse método tem prazo de validade.

O mal age de forma eficiente e rápida, vencendo no curto prazo. Ele tem pressa, pois está encerrado no espaço-tempo, sua dimensão característica, que tende a ser definitivamente superada pela super-consciência (intuição). O bem, por outro lado, age com paciência e aceita humilhações, pois sabe que a eternidade lhe pertence. Ele supera a dimensão espaço-tempo. Logo, engloba o mal, conduzindo-o para seus fins de forma imperceptível. Com Amor e Visão.

"Quem se humilhar será exaltado. Quem se exaltar será humilhado."
Jesus, o Cristo

Dois mil anos e apenas agora começamos a compreender as palavras proferidas pelo nazareno, nas longínquas terras palestinas. Palavras dos longínquos planos da hiper-consciência.

É chegado o tempo das ciências humanas; da educação ambiental; da cultura profunda e diversificada; da ciência orientada; da fé consciente e aberta às transformações internas e externas. É chegado o tempo da Nova Civilização do III Milênio.

Mas para parir essa Civilização teremos de suar, sangrar e até morrer - no mundo. Para que possamos viver num plano mais elevado - e portanto com maior liberdade. Liberdade consciente.