domingo, 30 de março de 2014

Trecho do livro "O Elogio ao Ócio"*, de Bertrand Russell**, páginas 29 a 31 (parte 5)

Parte 5
Devido à total ausência de controle central sobre a produção, produzimos uma imensa quantidade de coisas de que não precisamos. Mantemos ociosa uma parcela considerável da população trabalhadora, que se torna dispensável justamente porque se impõe o sobretrabalho à outra parcela. Quando esse método se revela inadequado, fazemos a guerra: colocamos um monte de gente para fabricar explosivos e outro tanto para explodi-los, tal como crianças que acabaram de descobrir os fogos de artifício. Combinando todos esses mecanismos, somos capazes, ainda que que com alguma dificuldade de manter viva a noção de que uma grande quantidade de trabalho manual é o quinhão inevitável do homem comum.



Movimentar a matéria em quantidades necessárias à nossa existência não é, decididamente, um dos objetivos da vida humana. Se fosse, teríamos de considerar qualquer operador de britadeira superior a Shakespeare. Fomos enganados nessa questão por dois motivos. Um é a necessidade de manter os pobres aplacados, o que levou os ricos a pregarem, durante milhares de anos, a dignidade do trabalho, enquanto tratavam de se manter indignos a respeito do mesmo assunto. O outro são os novos prazeres do maquinismo, que nos delicia com as espantosas transformações que podemos produzir na superfície da Terra. Nenhum desses motivos exerce um especial fascínio sobre o verdadeiro trabalhador. Se lhe perguntarmos qual é a melhor parte de sua vida, ele dificilmente responderá: 'É o trabalho manual, que sinto como a realização da mais nobre das tarefas humanas, e também porque fico feliz em pensar na capacidade que tem o homem de transformar o planeta. É verdade que meu corpo precisa de horas de descanso, que procuro preencher da melhor forma, mas meu maior prazer é ver raiar o dia para poder voltar ao trabalho, que é a fonte da minha felicidade.' Nunca ouvi nada do gênero saindo da boca de nenhum trabalhador. Eles encaram o trabalho como deve ser encarado, uma forma de ganhar a vida, e é do lazer que retiram, aí sim, a felicidade que a vida lhes permite desfrutar.”





Interpretação


Devido à total ausência de controle central sobre a produção, produzimos uma imensa quantidade de coisas de que não precisamos. Mantemos ociosa uma parcela considerável da população trabalhadora, que se torna dispensável justamente porque se impõe o sobretrabalho à outra parcela.”



Nunca se controlou tanto. Nunca tivemos tão pouco controle sobre nossos reais desejos. É cúmulo do paradoxo. Produto do exagero em monitorar cada atividade humana. Produto do vício dos “líderes” (não sei do quê) em atrelar toda atividade humana a um ganho econômico sem se preocupar com a aplicação desse ganho – a não ser gerar mais ganho econômico...ad infinitum.


O desemprego cresce porque a automatização cresce e a jornada permanece constante - e medieval, conforme V. Safatle já salientou num de seus artigos na Folha.


Russell exemplificou muito bem o que ocorreu e o que poderia ter ocorrido ao longo das décadas que se seguiram à mecanização:


Imaginemos uma fábrica de alfinetes composta de operárias. Vamos supor que essa fábrica, ou conjunto de fábricas sob mesma direção, seja capaz de suprir a demanda de alfinetes para o mundo inteiro – o que é plausível, dado que não se trata de um bem candidato a sofrer aumento vertiginoso de demanda.


Instalam-se máquinas capazes de aumentar o ritmo de produção, de modo que com o mesmo número de operárias – que, digamos, trabalhavam 8 horas por dia – sejam produzidos o dobro de alfinetes. Pois bem...o detalhe é que, já que a produção original (anterior), manual, já era capaz de suprir a demanda mundial de alfinetes, se o ritmo de trabalho for mantido com essas máquinas será gerado um EXCEDENTE de produção que a nada acrescentará para a qualidade de vida da humanidade.


E aí os industriais tem duas opções, segundo Bertrand Russell:


  1. Diminui-se a jornada de trabalho para 4 horas diárias, mantendo a produção original (suficiente), os lucros, e permitindo que as mulheres tenham a diferença de tempo restante para cuidar de seus filhos, estudar, ter mais lazer, passar mais tempo com o marido e etc, possibilitando o desenvolvimento – a longo prazo – de novas habilidades.
OU


  1. Mantêm-se a jornada de 8 horas, ocasionando numa super-produção de alfinetes, que INUNDARÁ o mercado mundial (resíduos) e gerará gastos da empresa devido a “falta de mercado para os alfinetes”. Logo a empresa se verá na necessidade imperiosa de IMPOR a “necessidade” de alfinetes para outros grupos humanos. E se não for capaz disso, se verá em crise – já que apenas metade do que produzem é vendido – e demitirá parte das funcionárias para diminuir as perdas, levando as funcionárias restantes a trabalharem MAIS. Isso ocasionará DESEMPREGO (e fome, com todas consequências nefastas) para as excluídas e DEGRADAÇÃO física, mental e moral para as “sortudas” que mantiveram seus postos.


Uma dessas alternativas é sensata. A outra, insensata.


A humanidade – pelo menos quem a comanda e consente com essa atitude – sempre optou pela alternativa insensata.



Movimentar a matéria em quantidades necessárias à nossa existência não é, decididamente, um dos objetivos da vida humana.”


Não acredito que a vida se resume a criar tecnologia – por mais sofisticada que seja – pelo simples ato de nos autovangloriarmos. A simples existência não é suficiente. Essa não é uma afirmativa gananciosa. Muito pelo contrário. Ela revela que o ser humano aspira a uma ocupação, uma vivência, uma experiência, que vá além da matéria.


Apesar de Russell se declarar agnóstico e não crer em Leis divinas, essa frase demonstra um espiritualismo profundo, revelando um ser consciente de que a vida humanda tem objetivos mais elevados do que qualquer coisa que a maioria dos habitantes desse mundo possam imaginar ou aspirar no momento. Esses pensamentos são o carro-chefe que possibilitam que a Utopia de hoje seja a Realidade de amanhã.



Um é a necessidade de manter os pobres aplacados, o que levou os ricos a pregarem, durante milhares de anos, a dignidade do trabalho, enquanto tratavam de se manter indignos a respeito do mesmo assunto.”


A máxima de Jesus se encaixa perfeitamente: “Faça mais, fale menos.”



O outro são os novos prazeres do maquinismo, que nos delicia com as espantosas transformações que podemos produzir na superfície da Terra. Nenhum desses motivos exerce um especial fascínio sobre o verdadeiro trabalhador. Se lhe perguntarmos qual é a melhor parte de sua vida, ele dificilmente responderá: 'É o trabalho manual, que sinto como a realização da mais nobre das tarefas humanas, e também porque fico feliz em pensar na capacidade que tem o homem de transformar o planeta.”


Muitas pessoas oriundas de áreas distantes da realidade de um trabalhador braçal – RH de empresas, por exemplo – gostam de falar na “beleza” e “emoção” em executar um trabalho tão digno. O problema é que essas mesmas pessoas jamais se sujeitaram (ou se sujeitariam) a trabalhar – digamos – um semestre nas condições de um metalúrgico, com o ritmo, a vigilância, a ameaça de desemprego, as dores físicas pocasionadas pelas altas temperaturas e movimentos repetitivos e os salários que mal podem pagar uma refeição, uma escola, um plano de saúde e o aluguel para o mesmo e sua família – tudo em prol da produtividade, do bem da empresa, do bem da humanidade...que ironicamente inclui os metalúrgicos e bilhões de pessoas vivendo em condições semelhantes...


Eles encaram o trabalho como deve ser encarado, uma forma de ganhar a vida, e é do lazer que retiram, aí sim, a felicidade que a vida lhes permite desfrutar.”



Isso resume tudo.


Não se trata de fazer apologia a “vagabundagem”. Apenas uma mente neolítica seria capaz de enxergar isso numa frase do tipo. A questão é “um pouco” mais profunda – e REAL.


A concepção de trabalho quem (ainda) grande parte da humanidade (supostamente) esclarecida tem, é aquela do século XIX. Ou seja: passar infindáveis horas por dia, por infindáveis anos, diante de uma máquina ou tela ou mesma EXECUTANDO uma atividade REPETITIVA, sem possibilidades de CRIAÇÃO. Isso não é, a meu ver, o significado de Trabalho.


Você trabalha quando executa qualquer atividade útil. Isso pode ser feito quando você está deitado numa rede pensando; ou vê um filme alternativo; ou estuda algo diferente daquilo que você se formou; ou faz um serviço comunitário; ou conversa com um colega sobre sociedade, espiritualidade, música, amor, relações, família, ciência, Deus, vida, envelhecimento, sentido das coisas, etc; ou vai no teatro; ou assiste um show ou concerto; ou escreve um texto; ou vivencia sua família; ou faz atividade física; ou conhece gente nova; ou faz amor; ou etc. Todas são atividades essenciais ao ser humano.


A maioria de nós não está preparada para dar o próximo passo rumo a um novo mundo. Temos pavor do que fazer com o tempo livre porque nunca tivemos ele de fato.


As classes abastadas, mesmo possuindo-o, fizeram uso inconsequente do mesmo, submentendo seus semelhantes a um regime cruel (até hoje). Claro, existem raras exceções (os sábios que eu tanto admiro e alguns outros que ainda desconheço). Mas são muito poucos.


O mundo menos cruel de hoje só foi realizável porque muitos se dedicaram a propagar a verdade e ir a fundo em questões essenciais.



Vamos continuar o trabalho dessas pessoas e construir um mundo melhor para todos.



Trecho do livro "O Elogio ao Ócio"*, de Bertrand Russell**, páginas 29 a 31 (parte 4)


 Parte 4

Devido à total ausência de controle central sobre a produção, produzimos uma imensa quantidade de coisas de que não precisamos. Mantemos ociosa uma parcela considerável da população trabalhadora, que se torna dispensável justamente porque se impõe o sobretrabalho à outra parcela. Quando esse método se revela inadequado, fazemos a guerra: colocamos um monte de gente para fabricar explosivos e outro tanto para explodi-los, tal como crianças que acabaram de descobrir os fogos de artifício. Combinando todos esses mecanismos, somos capazes, ainda que que com alguma dificuldade de manter viva a noção de que uma grande quantidade de trabalho manual é o quinhão inevitável do homem comum.



Movimentar a matéria em quantidades necessárias à nossa existência não é, decididamente, um dos objetivos da vida humana. Se fosse, teríamos de considerar qualquer operador de britadeira superior a Shakespeare. Fomos enganados nessa questão por dois motivos. Um é a necessidade de manter os pobres aplacados, o que levou os ricos a pregarem, durante milhares de anos, a dignidade do trabalho, enquanto tratavam de se manter indignos a respeito do mesmo assunto. O outro são os novos prazeres do maquinismo, que nos delicia com as espantosas transformações que podemos produzir na superfície da Terra. Nenhum desses motivos exerce um especial fascínio sobre o verdadeiro trabalhador. Se lhe perguntarmos qual é a melhor parte de sua vida, ele dificilmente responderá: 'É o trabalho manual, que sinto como a realização da mais nobre das tarefas humanas, e também porque fico feliz em pensar na capacidade que tem o homem de transformar o planeta. É verdade que meu corpo precisa de horas de descanso, que procuro preencher da melhor forma, mas meu maior prazer é ver raiar o dia para poder voltar ao trabalho, que é a fonte da minha felicidade.' Nunca ouvi nada do gênero saindo da boca de nenhum trabalhador. Eles encaram o trabalho como deve ser encarado, uma forma de ganhar a vida, e é do lazer que retiram, aí sim, a felicidade que a vida lhes permite desfrutar.”


Interpretação
 
Devido à total ausência de controle central sobre a produção, produzimos uma imensa quantidade de coisas de que não precisamos.”
 
Acredito que entrando num shopping ou visitando os centros decadentes de muitas cidades (atingidas pelo consumismo) a frase encaixe perfeitamente - sem mais comentários.

Movimentar a matéria em quantidades necessárias à nossa existência não é, decididamente, um dos objetivos da vida humana.”

Alguém acredita que a finalidade da existência é pura, simplesmete (e apenas) ter moradia, comida, bebida, transporte e saúde? Não quero dizer com isso que a distribuição deva ocorrer. Apenas quero dizer que, uma vez que todo ser humano tenha o necessário para a subsistência digna, existe oceano de profundeza abissal para ser desvendado. Um oceano intelectual, moral, espiritual.

Um é a necessidade de manter os pobres aplacados, o que levou os ricos a pregarem, durante milhares de anos, a dignidade do trabalho, enquanto tratavam de se manter indignos a respeito do mesmo assunto.”

Essa frase demonstra que quem mais prega menos pratica. É a sociedade da forma em detrimento do conteúdo.

Nunca ouvi nada do gênero saindo da boca de nenhum trabalhador. Eles encaram o trabalho como deve ser encarado, uma forma de ganhar a vida, e é do lazer que retiram, aí sim, a felicidade que a vida lhes permite desfrutar.”

As pessoas tem medo de falar ou concordar com a afirmativa acima por uma simples razão: vivemos numa DITADURA PULVERIZADA, que vigia, controla e registra cada ato e pensamento dos indivíduos. A própria sociedade adotou esse modo de vida, poupando o esforço das autoridades em manter o consumo enfermo e as relações mercantilistas a todo vapor. 

 















(continua...)


Trecho do livro "O Elogio ao Ócio"*, de Bertrand Russell**, páginas 29 a 31 (parte 3)


Parte 3
O uso judicioso do lazer, devo admitir, é produto da civilização e da educação. Um homem que toda a sua vida trabalhou longas horas irá se sentir entediado se ficar ocioso de repente. Mas, sem uma quantidade adequada de lazer, a pessoa fica privada de muitas coisas boas. Não há mais nenhum motivo pelo qual a maioria da população deva sofrer tal privação, e só um ascetismo tolo faz com que continuemos a insistir no excesso de trabalho quando não há mais necessidade. Mas o que acontecerá quando se chegar à situação em que o conforto seja acessível a todos sem a necessidade de tantas horas de trabalho?
 
No Ocidente, temos várias formas de lidar com esse problema. Não nos empenhamos nem um pouco na realização da justiça econômica, de modo que a maior parte do produto total fica nas mãos de uma minoria, boa parte da qual simplesmente não trabalha.”

Interpretação
O uso judicioso do lazer, devo admitir, é produto da civilização e da educação.”

Claro, uma pessoa culta e inteligente saberá fazer uso excelente de seu tempo livre. Em alguns casos ela produz muito mais – para si mesma e para a sociedade – do que no trabalho, onde os ganhos geralmente vão para um grupo seleto.

Um homem que toda a sua vida trabalhou longas horas irá se sentir entediado se ficar ocioso de repente.”

Naturalmente. Ao nos conformarmos a uma situação durante anos (ou décadas), desaprendemos a viver a vida. Já assistiram um filme chamado “Um Sonho de Liberdade”, com Morgran Freeman e Tim Robbins? Esse filme retrata bem esse caso quando um detento que ficou 50 anos preso tem sua pena cumprida e retorna para a sociedade. Ele obviamente não se adequa ao novo mundo. A tecnologia mudou, as relações mudaram, os amigos morreram, os amores também..É um mundo que não está pronto para receber os velhos. E como resultado, ele não aguenta a exclusão e se enforca. Eis o dilema do modelo de trabalho atual: prendemos um ser durante 30 anos ou mais, forçando-o a estar disponível 10, 12 horas por dia, e depois de aposentado, pouco resta dele. Fisicamente e mentalmente.

O SER se tornou ferramenta do CAPITAL.
 
Mas é o CAPITAL que deve ser ferramenta do SER.

Como se pode ver, não se trata de acabar com o capital, e sim de colocá-lo em seu devido lugar.

O Ser Humano, como obra de uma inteligência superior não deve se submeter às verdadeiras ferramentas (tecnologia, capital, matéria-prima, energia,...).

O Universo é pavoroso para um ser que se acostumou a ficar dez ou onze horas trancado durante anos. Para esse ser, o mundo fora da empresa é improdutivo e monótono, com seus parques, centros culturais, bibliotecas, concertos, filmes, peças de teatros, debates filosóficos, esportes, interações sociais, viagens, estudos livres e etc.

Claro, existe muitos lugares desagradáveis que não citei. Mas a escolha de que meio frequentar é questão de caráter e bom senso.

O fato de haver coisas ruins fora dos feudos privados não anula a beleza das coisas boas.

 







(continua...)

Trecho do livro "O Elogio ao Ócio"*, de Bertrand Russell**, páginas 29 a 31 (parte 2)


Parte 2
"Se o assalariado comum trabalhasse quatro horas por dia, haveria bastante para todos, e não haveria desemprego – supondo-se uma quantidade bastante modesta de bom senso organizacional. Essa ideia choca as pessoas abastadas, que estão convencidas de que os pobres não saberiam o que fazer com tanto lazer. Nos Estados Unidos, os homens costumam trabalhar longas horas, mesmo quando já desfrutam uma ótima situação, e ficam sinceramente indignados com a ideia do lazer para os trabalhadores, a não ser na forma do castigo cruel do desemprego. Na verdade, eles rejeitam o lazer até para os seus filhos. De um modo muito estranho, ao mesmo tempo que desejam que seus filhos trabalhem tanto que não tenham tempo de se civilizarem, esses homens não se importam que suas esposas e filhas não se dediquem a trabalho algum.

A inutilidade esnobe, que nas sociedades aristocráticas se estende a ambos os sexos, numa plutocracia é limitada às mulheres. Isto porém não torna a inutilidade mais de acordo com o bom senso."


Interpretação
Se o assalariado comum trabalhasse quatro horas por dia, haveria bastante para todos, e não haveria desemprego”

Essa afirmação não é solitária e encontra muitos adeptos. J.M. Keynes – Prêmio Nobel da economia do Século XX e teorizador do Estado de Bem-Estar social – foi (e ainda é) um dos maiores defensores da redução da jornada para a solução de diversas chagas sociais, culturais e ambientais. [leiam o discurso “Perspectivas Econômicas para nossos Netos”, de 1930, proferido por Keynes em Madrid]. 



Aparentemente radical ou utópica – porém nunca implementável – para a grande maioria da humanidade, essa proposta é analisada detalhadamente por Russell num capítulo específico de seu livro, explicando o porquê da necessidade de redução de jornada.

Não pretendo entrar em detalhes porque não conheço a fundo o pensamento desse grande acadêmico e humanista, mas posso esboçar algumas ideias e desmistificar os lugares-comuns adotados pelos “realistas” e “práticos” que abundam no mundo.

O primeiro ponto é o seguinte: graças a mecanização e a automação, há cada vez menor necessidade de manter as pessoas presas em trabalhos repetitivos e perigosos. Isso inculsive se aplica aos trabalhadores de escritório, com ensino superior e/ou pós-graduação. O único (e mais evidente) motivo para manter as pessoas presas GRANDE PARTE de seus dias numa tarefa que não requer tanto está no fato de que atrelou-se a SOBREVIVÊNCIA do trabalhador ao LUCRO da empresa.

LUCRO → 
SOBREVIVÊNCIA DO “GRUPO” →
GARANTIA DE EMPREGO →
 POSSIBILIDADE DE VIVER DIGNAMENTE

Dessa forma, uma pequena redução da (dita) produtividade causaria uma perda de competividade da empresa, e com isso suas vendas decairiam e a receita seria diminuida – gerando corte de vagas. Esse argumento, aparentemente coerente e pleno de razão, contém uma série de erros.
 
O primeiro erro é que esse tipo de análise desconsidera a NÃO-LINEARIDADE da produtividade. Ou seja, ficar mais horas dentro de um lugar não irá gerar mais. Especialmente se o trabalho for do tipo criativo – como desenvolvimento, pesquisa, artes, ensino, decoração, etc.
 
Segundo erro: a análise desconsidera a MULTIDIMENSIONALIDADE humana. Cada vez mais os jovens afirmam e seguem a filosofia de não se prender a uma atividade a vida inteira. E consciente ou inconscientemente, seguem o rumo do progresso – que, apesar de alguma desorientação em alguns campos, é o melhor que pode-se ter atualmente. Reduz-se o tempo na fábrica para que a pessoa possa exercer outras POTENCIALIDADES e VERTENTES de sua vida. Algumas delas são a:

Afeitividade
Sociabilidade
Atividades físicas
Viagens
Estudos diversos (línguas, música, artes, filosofia, espiritualidade...)
Cultura e Lazer (esportes, teatro, shows, concertos, cinema,...)

Essas áreas são FUNDAMENTAIS para o desenvolvimento de um ser humano. E demandam tempo. São inclusive geradoras de RIQUEZAS INTANGÍVEIS. Ter pouco tempo e praticamente uma ninharia de energia para se dedicar a elas é, a meu ver, a causa primária da INEFICIÊNCIA que impera na maioria dos meios de trabalho.

Não é possível esperar que um ser humano dê o máximo de si sem que sua vida afetiva, social, sua saúde e suas necessidades básicas estejam em ordem.

O terceiro erro é que conseguiu-se inculcar (a fundo) na mente de muitas pessoas a ideia de que a finalidade de tudo é a geração de lucro e o crescimento econômico 'ad infinitum'. Qualquer pessoa de bom senso percebe a incoerência desse objetivo. E – pior de tudo – infelizmente estamos profundamente atrelados a essa lógica.

A humanidade vem construindo um edifício com fundações frouxas (desde o fim do Estado de Bem-Estar, na década de 70, 80,...). Um modelo de vida tão atraente quanto inacessível é apresentado a muitos. E para quem consegue atingi-lo, logo logo percebe que a felicidade ganha é temporária. E que essa felicidade é insustentável. Internamente e globalmente – daí a razão de ser temporária.

A finalidade do ser humano não deve ser o ganho.

A economia deve servir a sociedade. Não o contrário. As suas tem suas finalidades e são essenciais. Mas os fins e os meios não estão em seus devidos lugares nas mentes de muitos a muitas. Isso deve ser mudado.

(continua...)

Trecho do livro "O Elogio ao Ócio"*, de Bertrand Russell**, páginas 29 a 31 - uma análise pessoal (parte 1)


JUSTIFICATIVA PARA ESSE MINI-TRABALHO
 
Pretendo aqui apenas revelar a uma parcela diminuta da população os pensamentos de um dos (a meu ver) maiores sábios do século XX, e dar uma interpretação particular dos mesmos. Farei isso baseado em minha vivência de 29 anos. Pouca mas intensa. Intensa porque nos últimos dez ou doze anos percebi que executei – inconscientemente – um trabalho de constatação. Agora é o momento de colocar alguns dos resultados obtidos.

Sou louco suficiente para falar o que penso e sinto. No entanto, não tenho medo ou vergonha de dizê-lo porque sinto do fundo de minha alma que a intenção é induzir a movimentos que visem o Progresso desse mundo.

Fazer as coisas de modo muito cuidadoso pode ser sensato. Na maioria das vezes é. Mas nem sempre podemos ser assim. Surgem momentos em que uma pessoa sente uma força interior MUITO FORTE, que não é produto de um simples instinto, e sim uma profunda intuição de como tudo poderia ser.
 
Espero que com essa pequena série de textos interpretados eu traga mais esclarecimento do que revolta. Mais convergência do que divergência. De todas pessoas, independente da classe social, escolaridade, etnia, crença, idade, ideologia ou ocupação.

Como permanecer neutro é não evoluir (ou consentir com o estado atual das coisas), decido ser atacado ferozmente no presente para ter paz no futuro, sabendo que fiz algo útil para o Universo.

Nisso eu acredito.

   
Parte 1
"A ideia de que os pobres devem ter direito ao lazer sempre chocou os ricos. Na Inglaterra do início do século XIX, a jornada de trabalho de um homem adulto tinha quinze horas de duração. Algumas crianças cumpriam, às vezes, essa jornada, e para outras a duração era de doze horas. Quando uns abelhudos intrometidos vieram afirmar que a jornada era longa demais, foi-lhes dito que o trabalho mantinha os adultos longe da bebida e as crianças afastadas do crime. Eu era ainda criança quando, pouco depois de os trabalhadores urbanos terem conquistado o direito de voto, e para a total indignação das classes superiores, os feriados públicos foram legalmente instituídos. Lembro-me de uma velha duquesa exclamando: 'O que querem os pobres com esses feriados? Eles deviam estar trabalhando.' Hoje em dia as pessoas são menos francas, mas o sentimento persiste, e é fonte de boa parte de nossa confusão econômica.

Não pretendo insistir no fato de que, em todas as sociedades modernas, fora a URSS, muita gente consegue escapar até mesmo de um mínimo de trabalho: os que vivem de herança e os que casam por dinheiro. Eu penso que o fato de se permitir que essas pessoas sejam ociosas não é nem de longe tão nocivo quanto o fato de se exigir dos assalariados que escolham entre o sobre-trabalho e a privação.”

Interpretação
"A ideia de que os pobres devem ter direito ao lazer sempre chocou os ricos.”

Sim. Vendo muitos documentários e filmes sérios, e ouvindo de vez em quando conversas de pessoas abastadas, pude perceber que as pessoas detentoras do capital sempre ficaram chocadas com o fato dos pobres que trabalham arduamente quisessem ter mais tempo para se dedicarem a outras vertentes da vida. No entanto, esses mesmos endinheirados nunca se olharam no espelho, medindo o seu nível de conforto (e oportunidades) e sua RESPONSABILIDADE pelo bem-estar daqueles economicamente abaixo deles na pirâmide social.

Quando uns abelhudos intrometidos vieram afirmar que a jornada era longa demais, foi-lhes dito que o trabalho mantinha os adultos longe da bebida e as crianças afastadas do crime.”

De fato, essa observação contêm alguma verdade. No entanto, ela foi proferida há quase um século, época em que a educação universal começava a ser instituída e o Estado de bem-estar social era inexistente.Outro ponto relevante: será que essa afirmativa não era uma desculpa para manter a ordem atual das coisas? Porque todos sabemos que um problema (bebida, prostituição) tem várias soluções. Manter crianças trancadas em fábricas para produzir é uma delas - a pior, a meu ver. 

Nos dias atuais a veracidade dessa afirmativa é muito menor. Primeiro porque existem INÚMERAS possibilidades de afastar as crianças e adultos das drogas, da bebida e da prostituição sem submetê-las a um regime que as vê como engrenagens. Bibliotecas públicas, SESC, SESI, mostras de cinema, de teatro, viradas culturais, concertos (gratuitos) ao ar livre, shows de jazz, folk, rock, blues, pop, etc, etc, cinemas alternativos, aulas gratuitas de ioga, meditação, cursos livres,...Existe estrutura, condições e capacidade administrativa para grande número de cidades desenvolverem espaços públicos com ênfases variadas e estimularem a instalação de unidades sócio-culturais – estes últimos no caso do Brasil. O resultado pode não ser aceito pelo mercado dominante, mas sem dúvida existem GANHOS INTANGÍVEIS para o SER, a SOCIEDADE, o MEIO-AMBIENTE. 
 
(continua...)

sábado, 29 de março de 2014

DAR O PEIXE e ENSINAR A PESCAR? OU DAR O PEIXE ou ENSINAR A PESCAR?

Muito se tem comentado a respeito da proteção social oferecida pelos Estados. Há críticos e defensores de políticas assistencialistas. E de certa forma ambos tem razão em seus pontos de vista. No entanto, o extremismo gerado pelos lados – pelo que tenho visto na mídia, o lado do contra é mais feroz do que o lado a favor. mas isso é a "opinião" da mídia – não tem auxiliado muito na convergência dessa temática.

Enquanto os críticos do assistencialismo defendem que você deve ensinar a pescar ao invés de dar o peixe, os defensores dizem que você deve dar o peixe para que depois o assistido saiba pescar. E existem os defensores que acabam se concentrando mais no “dar” e esquecem no “aprender”, mas creio que se trata de um número reduzido de pessoas. Mas é em cima desse grupo reduzido que a propaganda anti-assistencialista se apóia para destacar os (possíveis) efeitos negativos da mesma.

Em linhas gerais, o que deve-se ter em mente é que não se trata de uma coisa OU outra (dar OU ensinar). Trata-se de uma coisa E outra (dar E ensinar). São atitudes que devem trabalhar em conjunto, com uma precedendo a outra.

Explico melhor.

É fato que todo ser humano deve aprender a obter recursos através de suas próprias habilidades e aptidões. No entanto é interessante nos lembrarmos dos bebês para compreendermos a delicadeza do tema.

Uma criança (da espécie humana) precisa de uma série de cuidados antes de poder andar e tomar decisões por conta própria. Isto é, o bebê irá necessitar de um forte assistencialismo (dos pais ou tios ou avós,..de alguém) de saúde, alimentação, abrigo, vestimenta, educação, afetividade, entre outros itens, para que futuramente possa ser capaz de executar atividades úteis para ela mesma e para a sociedade. Sem esse assistencialismo inicial – que dura vários anos – o pequeno ser corre risco de morrer ou se desenvolver em desacordo com as expectativas dos cuidadores.

Estendendo esse assistencialismo para o mundo, observamos que ele é necessário da mesma forma. Por que? Simplesmente porque nosso sistema arcaico, centrado no lucro, consumo e trabalho alienado gera uma desigualdade de condições tão funesta que existe uma miríade de seres em todas idades que não tem condições mínimas de melhorar sua condição presente. Não possuem escolaridade nem saúde, e sua etnia, crença ou cultura tornam sua empregabilidade menor, quer os empresários admitam isso ou não. Os exemplos são numerosos e podem ser encontrados nas ruas de qualquer cidade.

Não é possível que uma pessoa faminta, sem moradia fixa, nem saúde, com família para cuidar e problemas dessa natureza possa executar um trabalho. Sua mente estará preocupada com problemas de sua realidade. Mesmo porque os empregadores, que poderiam fazer isso, dificilmente o farão (o norte de uma empresa é o lucro, não a fraternidade). E muitos daqueles dispostos a fazer esse "favor" tiram proveito dessa situação de vulnerabilidade do indivíduo, submetendo-o a exploração. Em suma, uma neo-escravidão.

É portanto imprescindível que pessoas em condições desfavoráveis sejam assistidas por uma entidade que (teoricamente) representa e trabalha pelo povo: o Estado. O intuito, claro, é que esse programa seja bem conduzido de modo a tornar a pessoa financeiramente independente e com um nascente senso crítico a médio e longo prazo. E nesse aspecto o Bolsa Família foi um passo importante [1], [2].

Segundo um estudo publicado na revista CartaCapital (não me lembro a edição, mas sei que foi do ano passado), para cada R$ 1,00 do PIB investido gerou-se, alguns anos de pois, R$ 1,44 de retorno. Os números são a comprovação de que tal política - ao contrário do que as classes abastadas acostumadas a serem servidas querem propagar - aumenta a produtividade do país, com 44% de retorno. Apesar de não ser a solução de todos problemas, é um componente fundamental da mesma.

Quanto às críticas - aparentemente sensatas e ferozes - contra o Estado de Bem-estar, faço um convite à reflexão em relação a alguns pontos:

  • Se o assistencialismo é ruim, porque todos países europeus que o adotaram como prioridade tem uma qualidade de vida alta, com seu povo desfrutando de renda alta, produtividade e muitas horas livres e opções de lazer? (pelo menos antes de vários governos adentrarem nessa onda neoliberal ditada pelo lucro...). E por que países ditos desenvolvidos que não adotaram essa política tem indicadores sociais baixos entre boa parte da população (como EUA, por exemplo).
  • Segundo estudos, 99,5% dos pesquisados [3] não deixaram de trabalhar, e muitos crianças passaram a ir para a escola, pois a família percebeu que isso é importante. Quanto àqueles que se recusaram ao trabalho, trata-se de pessoas que adquiriram consciência e não querem mais se submeter a um trabalho degradante (escravo). Isso é, a meu ver, um progresso. A recusa a ser explorado jamais deve ser vista como ato de vagabundagem, e sim como o despertar da consciência - e convenhamos...para quem se acostumou a usufruir de mão-de-obra barata, é muito difícil aceitar a libertação mental de seus servos assalariados.

É óbvio que uma pessoa que passa a ter consciência de que sua realidade passada era miserável e alvo de lucro de grupos corporativos nefastos vai se recusar a "trabalhar" para tal sistema. Ela demandará um trabalho DIGNO, que pague um salário compatível com sua dedicação, e com possibilidades de crescimento - se uma pesquisa aprofundada for feita nesse campo, como Bertrand Russell, Noam Chomsky, Domenico De Masi e etc fazem, eu garanto que poucas são as empresas no mundo atual dispostas e interessadas em dar essa possibilidade a seus funcionários...

Devemos ter em mente de que os problemas de violência somente cessarão definitivamente, em todos os campos, a partir do momento que começarmos a construir uma sociedade FRATERNA. E SAPIENTE.

Essa frase contêm a essência do artigo.
Antes de tudo precisamos compreender a fundo a realidade de todos e nos abrir para a TRANSFORMAÇÃO, nos despojando de instintos de exploração e percebendo do "fraco", no "incapaz", no "pobre", um ser como nós, que simplesmente vive outra realidade. Uma realidade mais árdua em vários aspectos.

É difícil? É. Muito. Mas esse me parece ser o único caminho. Aquele que ataca as causas. Um caminho sensato, a meu ver.







Referências

[1] http://www.cartacapital.com.br/sociedade/bolsa-familia-nao-desestimulou-procura-por-emprego-diz-estudo

[2] http://www.cartacapital.com.br/economia/por-que-o-bolsa-familia-e-importante-1636.html

[3] http://www.viomundo.com.br/politica/recordar-e-viver-rebatendo-as-criticas-ao-bolsa-familia.html

quarta-feira, 19 de março de 2014

MONISMO ou DUALISMO ?

Antes de começar, as definições:

MONISMO: vem do grego “mónos” (sozinho, único). É o nome dado a todas teorias filosóficas que acreditam na unidade da realidade. Para quem segue essa linha de pensamento, existe uma única substância fundamental (matéria, ideias,...) que podem assumir vários modos. Por exemplo, o bem e o mal teriam a mesma essência, porém assumiram modos completamente diferentes de – digamos assim – perceber e atuar no mundo. Ou seja, o mal é o avesso do bem.

DUALISMO: baseia-se na presença de dois princípios (ou substâncias) OPOSTAS – Deus-Diabo; bondade-maldade; belo-feio; forte-fraco; etc – irredutíveis entre si e INCAPAZES de uma síntese final.

O meu objetivo aqui é justificar a minha crença no monismo. Farei isso baseado no pouco que estudei e vivenciei até hoje.

Segundo Humberto Rohden [1] o CRER é precursor do SABER. E o IGNORAR é precursor do CRER. De forma que temos a seguinte gradação evolutiva num ser:

IGNORAR → CRER → SABER

Muitas pessoas já sabem diversas verdades (ainda que superficiais) a respeito do mundo material. E sabem operar razoavelmente bem nele – e do ponto de vista dele. Mas antes que essa sapiência fosse assimilada foi necessário um extenso trabalho de mentes que ignoraram por muitos anos verdades que hoje são tidas como irrefutáveis. Essas mentes, cansadas de ignorar – e já sentindo algo a mais – passaram a crer na existência de Leis. Logo abaixo de seus pés. Dos pés de todos nós (estou sendo metafórico). E apoiados em verdades consolidadas e em vias de consolidação, atingiram o saber. E o passar dos séculos permitiram a propagação desse saber para milhões – como por exemplo as leis da física, da biologia, etc.

Humberto Rohden: filósofo, educador
e teólogo. Precursor do espiritualismo
universalista.
No entanto, – e infelizmente – isso não significou sabedoria plena. Porque a verdadeira sapiência envolve um campo ainda pouco sondado: a espiritualidade.

No campo espiritual (mais profundo, mais desconhecido), a maioria das pessoas está no primeiro estágio (ignorância). Mas muitos já creem em Leis ainda desconhecidas. Intuem que existem assuntos “vazios” que valem a pena ser discutidos; caminhos estranhos a ser percorridos; ideias a serem revistas; e loucuras do tipo.

Quem compreende e vivencia a espiritualidade já sabe sobre o que muitos creem. Esses comprovaram por experiência de vida Leis desconhecidas pelas massas. E tem plena segurança sobre suas concepções de mundo. Pietro Ubaldi [2] e Humberto Rohden são pessoas que chegaram nesse estágio.

Bom...tudo isso pra falar que eu, na posição intermediária – como milhões e milhões – não posso atestar certeza sobre o que vou dizer. Mas é minha ideia sobre o assunto.

Um dualista pode facilmente derrubar os argumentos de um monista afirmando (por exemplo) que o Bem e o Mal são independentes e portanto irredutíveis a um ponto comum. De fato. Mas o que é o Bem e o Mal?

Não existe pessoa 100% má ou 100% boa. Porém percebemos atitudes com intenções integralmente boas ou más. Nesse caso não podemos afirmar que o Bem (ou o Mal) é característico de uma ou outra pessoa. E sim que ele (bem / mal) é uma ATITUDE.

A atitude que leva uma pessoa a praticar uma atitude boa ou má depende de sua história de vida (a), o meio em que está inserida (b) e (principalmente) no que ela crê (c). Crer no sentido de acreditar em algo (amor, felicidade, paz, sistema político, modo de vida,...) para melhorar ela mesma e o seu entorno.

Muito bem. Mesmo sendo uma atitude, até aqui Bem e Mal continuam sendo coisas distintas.

Existe uma palavra chamada “intenção” que serve para descrever os desejos mais profundos de nossa alma quando agimos no mundo. Existem inteções boas e más. Mas se você investigar a fundo o que levou uma pessoa a agir de uma forma – boa ou má – tenderá a descobrir que todos querem o melhor para si – mesmo que muitos (bilhões...) não saibam o que é o melhor para si mesmo.

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Agora, vejam bem:
Quando alguém quer o melhor para si (todos queremos) mas julga que afetar negativamente o entorno para obter esse melhor não é errado, essa pessoa é classificada de má. Será?

Quando alguém quer o melhor para si (todos queremos) mas julga que afetar negativamente o entorno para obter esse melhor é errado, essa pessoa é classificada de boa. Será?
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(se alguém chegou até aqui peço calma. não quero defender o terror.)


Pra começar: sabemos de fato o que é melhor para nós mesmos? Ou buscamos satisfazer nossos sentidos a curto prazo? Não sei...Mas se agimos de modo aparentemente prazeroso a curto prazo e sofremos (por causa do mesmo ato) a longo prazo, mesmo sem nos dar conta disso, acredito que não saibamos o que estamos buscando.

Um outro ponto é: pode-se afetar o entorno negativamente E positivamente, (sim, ao mesmo tempo) dependendo do ponto de vista de cada pessoa sobre a atitude. E então? Como avaliar?

Pietro Ubaldi: espiritualista e universalista.
Escreveu diversas obras sobre filosofia e
religião, sem no entanto se desconectar com
o mundo. Suas obras tangenciam tópicos de
ciências naturais, humanas, lógica, linguagística,
revelando a interconexão entre fenômenos e seres.
O fato da pessoa tomar uma atitude “esperta” num momento provavelmente trará muito arrependimento e prejuízo ao longo dos anos – a reação é lenta mas vem. Essa pessoa “esperta” é classificada de má se usar de violência física para atingir os fins; ou de sagaz se usa de meios comunicativos para atingi-los. Na verdade os dois tipos são iguais em essência (querem ganhar à custa do outro). A diferença é: o primeiro ainda não chegou ao tipo de inteligência do segundo, e este já passou pela experiência do primeiro tipo (em existências anteriores). De um ponto de vista superficial, os dois são mais. De um ponto de vista universal, pode-se dizer que os dois ainda estão na ignorância – apesar do segundo tipo ser valorizado atualmente, justamente porque a grande maioria das pessoas só compreende as leis da sagacidade e crê que estas sejam o máximo do estágio evolutivo humano.

Dessa forma, percebe-se que o bem e o mal são diferentes, porém a substância de ambos é a mesma. A diferença é que um é o avesso da outro.


Essa ideia é difícil de digerir. Ainda mais para quem não dispõe de tempo e energia para pensar nos assunto – e ainda precisa viver outras experiências. Mas vivenciando e constatando os pormenores da vida minha inclinação ao monismo é cada vez maior. 


Referências:

[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Huberto_Rohden
[2] http://pt.wikipedia.org/wiki/Pietro_Ubaldi

domingo, 16 de março de 2014

QUANDO O PÚBLICO SE TORNA PRIVADO E O PRIVADO SE TORNA PÚBLICO

Zygmunt Bauman [1] é um sociólogo polonês com uma visão muito clara do mundo em que vivemos. Essa clareza foi revelada (a mim) quando ele falou sobre um fenômeno que vem se pronunciando cada vez mais. Se trata da inversão de valores em nossa sociedade.

É evidente para qualquer pessoa de bom senso de que em nossa sociedade existem elementos que devem ser públicos e outros que devem ser privados (ou pessoais). Para avaliar o que deve ser uma coisa ou outra basta fazer a si mesmo uma pergunta simples: trata-se de algo singular, que só diz respeito a ti, ou a algo universal, cuja apropriação tende a prejudicar outros?

Apesar de simples, me parece que essa pergunta não vem sendo feita por nós mesmos quando emitimos – ou omitimos – nossas opiniões a respeito desse tema. E mesmo pelo modo com o qual atuamos na sociedade.

A primeira distorção – muito evidente – se encontram nos famosos “reality shows”, na qual a vida privada de um grupo de pessoas (de preferência jovens, com corpos que atendam os padrões de beleza, com “sonhos” e com uma inteligência suficiente apenas para não ameaçar o 'establishment') é exposta diariamente para milhões. As cenas mais banais, que não dizem nada a respeito de nossas vidas, são divulgadas e comentadas por milhões de pessoas.

Outra distorção do tipo pode ser vista nas revistas que mostram milhares de fotos de pessoas famosas e “bem sucedidas”, com seus filhos, netos, amigos, amigas e etc, em seus iates e carros de luxo e restaurantes de luxos e namoradas(os) com roupa e corpos da moda e coisas do tipo (interessante que essas pessoas parecem não estudar nem trabalhar...). E todos esses fatos importantes são despejados em público. Gasta-se milhões na divulgação de algo que, ao invés de elevar a humanidade como um todo, desperdiça recursos materiais e energéticos (1), desperdiça tempo das pessoas que veem e divulgam isso (2) e – mais lamentável – aprisiona a mente da grande parcela das pessoas “sem sucesso”, colocando um norte que não condiz com a sua real vontade (3). Muito menos com o progresso do mundo.

E eis um dos efeitos mais petrificantes: quando o que deveria ser privado se torna público, me parece (não sei se há alguma correlação) que o que deveria ser público começa a ser incorporado pelo mundo privado. Exemplos abundam: criação de condomínios fechados via anexação de áreas públicas; aumento do espaço (ruas, avenidas, estacionamentos) dedicado a meios de transporte individual em detrimento de calçadas, praças, parques e ciclovias; educação básica e superior; saúde; espaços culturais (bibliotecas, museus,...); apresentações musicais publicas; e muito mais. Isso gera efeitos nefastos na sociedade, conforme irei explicar a seguir.

Quando vemos o mundo privado (o mercado) mercantilizando bens universais e de direito de todo ser humano [leiam a Declaração dos Direitos Humanos segundo a ONU*], começa-se um processo de EXCLUSÃO SOCIAL. E como esse próprio mundo, para ter seu sucesso (relativo e restrito) acaba, por sua própria natureza insustentável, gerando um grupo de pessoas sem condições de “pagar pelos seus direitos” [vejam que paradoxo], ele comprova sua própria insustentabilidade e incompatibilidade com os princípios morais estabelecidos há 2 mil anos.

Em troca a sociedade recebe inúmeros “benefícios” via meios de comunicação: vida de astros, de celebridades, dicas de como ser, como levar sua vida, como ser bem sucedido, como ser forte e rico e etc. Forma sem conteúdo. Dicas vazias. Dicas que soterram e não libertam. Dicas que aprisionam. Que induzem a pessoa a se tornar uma peça do sistema vigente, fazendo-a atuar em benefício de uma economia que é insustentável e anti-fraterna. E – ao mesmo tempo – fazendo a pensar que está satisfazendo seus sonhos.

Agora eu tenho uma notícia animadora: perceber todos esses fenômenos não requer erudição nem um tijolo de títulos. Basta ter BOM SENSO e VONTADE.


Conheço pessoas cultas, estudadas, especilaistas e experientes, com muitos recursos e tidas como bem sucedidas que, no entanto, são incapazes de perceber as necessidades de mudança e a relação entre seres. Ao mesmo tempo, já ouvi pessoas sem qualificação alguma e muito ignoradas que ao se expressarem revelaram os traços da mais fina SABEDORIA. Isso remete ao que Montaigne ** disse a respeito de sabedoria: ela não está diretamente relacionada ao grau de estudo atingido ***.

Através de anos de observação eu pude constatar esses fatos. E apoiado nas observações de pessoas como Z. Bauman, M. de Montaigne, B. Russell e J.S. Mill pude comparar suas observações com esses fatos. E daí concluí que a teoria descreve o que vem acontecendo.

A descrição profunda, em sua substância, indo muito além das aparências, foi feita por um conjunto de sábios que permeiam nossa história recente. Mas ao mesmo tempo os meios de eliminar as mazelas foram apresentados.

Minha recomendação é a seguinte: se você se sente um pouco inquieto com o rumo que alguns (ou muitos) acontecimentos vem tomando, vá à biblioteca ou livraria ou internet e começe a ESTUDAR esses sábios. É um medicamento muito bom que pode prevenir e remediar males. É inclusive, na minha opinião, a base para a reforma planetária. E após sua compreensão, recomenda-se a APLICAÇÃO dos ensinamentos.


Os sábios, ao contrário dos poderosos, libertam sua mente.


A que grupo daremos atenção daqui pra frente?



Fontes:
* http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm
**http://pt.wikipedia.org/wiki/Michel_de_Montaigne
*** Quando Montaigne disse que a sabedoria não se relaciona unicamente com grau de estudo ele não estava excluindo o importante papel das universidades na formação de pessoas, e sim dizendo que esta instituição não irá necessariamente trazer sabedoria a uma pessoa, pois esta pode ser encontrada de várias formas.

[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Zygmunt_Bauman

domingo, 2 de março de 2014

TÃO PERTO, TÃO LONGE

Existem inquietações que são capazes de gerar um incômodo intermitente e sublime em qualquer indivíduo. Ao mesmo tempo. Sublime por possuírem uma importância de tal grandeza nas questões mais íntimas da vida que é quase impossível não senti-la. Intermitente porque elas sempre voltam a sondar algumas mentes em momentos de dificuldade, por mais que a descartemos em busca de soluções rápidas e “eficazes”.

Aplicar ensinamentos orientados para a espiritualidade na vida cotidiana é considerado um ato de insensatez e loucura se levado a cabo. Pregá-los e não praticá-los no dia-a-dia é considerado normal – e até admirável, desde que você leve uma vida “certa” e não dê espaço para que sua mente se aprofunde em questões pouco exploradas até hoje. Portanto, a segunda atitude não deve trazer problemas de nenhum tipo e permitirá a pessoa seguir sua vida sem empecilhos. No entanto, para alguns indivíduos (creio eu) paira na mente a incoerência: propagamos frases sublimes de pessoas igualmente sublimes, mas não EXPERIMENTAMOS essa sublimidade. A vivência inexiste.


Quando enxergamos o mundo de verdade nos entristecemos.
Mas pode ser o começo da verdadeira alegria interior.
Existe um grupo diminuto de seres que enxergam claramente essa incoerência e se empenham em diminuir sua magnitude, mesmo que discretamente – apesar de externamente não aparentarem isso. Porque, a meu ver, esse tipo de indivíduo se sente num vácuo. Equidistante dos pólos material e espiritual. Atraído forçosamente pela força gravitacional da matéria em que está inserido. Mas disposto a ir em direção contrária: a da espiritualidade. Como a matéria possui forte influência, a jornada se torna extremamente difícil e a fadiga frequentemente bate as portas desse ser. Desgaste e tristeza. E esse é o segundo funil em direção ao Progresso.

No entanto, existe um grupo (mais diminuto!) de seres que persiste nesse voo desgastante. Talvez por enxergarem algum sentido nessa sua atividade. Talvez por loucura. Talvez por desocupação. Talvez por não serem capazes de se inserirem ao mundo. Talvez por – mesmo capazes de se inserirem nele – não desejarem seguir os caminhos conhecidos que levam ao “sucesso” e “felicidade”.

No atual estágio de evolução (involução) de nosso mundo, muitas pessoas iluminadas, ao longo de várias décadas observando e constatando, perceberam que quem está nesse voo desgastante cruza um deserto de extensão imensurável. Um deserto no qual vez ou outra é possível, com sorte, encontrar pequenos oásis para reabastecer a confiança e aumentar o conhecimento, e assim continuar a viagem – infinita – rumo a algo incompreendido pela razão mas sentido pela intuição.

Nessa viagem o viajante se sente ora perto ora longe desse desconhecido destino.
Perto nos curtos momentos interação com um outro viajante cujo objetivo final é idêntico.
Longe nos extensos momentos de deserto espiritual onde a solidão é vivenciada.


Será que o vermelhinho está triste POR DENTRO?
Será que os amarelinhos estão felizes POR DENTRO?
Será...?
O sentir perto para suportar o sentir longe.

O sentir longe para encontrar o perto.

E assim indefinidamente.
É uma jornada de bela tristeza ESPIRITUAL que um dia se converterá numa bela alegria.
Que é preferível a horrível alegria MATERIAL, que tende a se tornar uma horrível tristeza.

Porque a bela tristeza tem a semente da felicidade, que se cultivada tende a germinar futuramente.

Enquanto a horrível alegria é vazia e não tem nada a oferecer na eternidade.


A escolha é nossa...