Depois
de muito refletir sobre esse assunto na vida, me dei conta de que –
aparentemente – existe uma semelhança entre os nossos problemas e
a energia: ambos conservam sua essência, mas assumem formas
diferentes.
Numa
central hidroelétrica, por exemplo, existe água acumulada em forma
de energia potencial. Essa energia, ao passar pelas comportas e
turbinas, fazem estas girarem, se convertendo em energia cinética
(de movimento). Essa energia cinética por sua vez acaba se
convertendo em energia elétrica, através de um gerador. Mas fazendo
os cálculos entre a forma anterior e posterior, percebe-se que a
energia final é menor que a inicial. “Mas ela não se conserva?”,
você vai perguntar já sentindo uma contradição. E eu digo: sim,
ela se conserva. Acontece que parte dessa energia foi perdida para o
ambiente. Ou seja, alguma água não passou pela turbina, houveram
atritos nos eixos da mesma, a transmissão elétrica possui
resistência (que dissipa calor), entre outros fatores.
Mas
afinal de contas, o que isso tudo tem a ver com os problemas de nossa vida?
Irei
construir uma situação fictícia mas provável para ilustrar a
questão.
Imaginemos
um jovem estudante no colegial. Ele possivelmente terá alguns
problemas como passar nas matérias (ou em alguma delas). Se não,
talvez tenha problemas em chegar perto daquela garota para conversar.
Ou decidir o que fará futuramente na vida. Ou coisas do tipo.
Após
alguns anos esse jovem – já menos jovem – está na faculdade e
não precisa mais lidar com algumas coisas mais "chatas" do colegial.
Os professores não cobram um desempenho bom, existe mais liberdade
com o distanciamento dos pais, e ele passa a fazer seus horários.
Porém, esses benefícios requerem uma responsabilidade em se
auto-cobrar nos estudos (caso contrário ele será reprovado); em
lidar com problemas sócio-afetivos, morais e materiais sem uma
orientação (de familiares), que geralmente é muito desafiadora; e
em saber o que se quer da vida, a título de buscar fazer atividades
que lhe agradem e permitam seu desenvolvimento. Esses são problemas
de outra ordem.
Vamos
passar mais alguns anos e supor que esse jovem – menos jovem, já
adulto – tenha se casado e tenha uma criança. E que soube escolher
de forma adequada o que queria fazer da vida como profissional e com
quem se relacionar. Agora ele é independente, ganha seu próprio
dinheiro – que apesar de não muito, possibilita ter uma vida digna
e fazer suas economias e dar conforto a sua prole – e possui uma
espécie de sentido para sua existência, pois está acompanhado de
alguém. No entanto, em sua profissão ele não pode trabalhar do
jeito que deseja e julga mais eficiente (para ele e a sociedade), e a
constante ameaça de desemprego o força a se travestir daquilo que
não é em diversos ambientes para não sofrer possíveis privações
materiais. Além disso ele se dá conta de que o conforto necessário
para a família e ele requerem dele uma grande dose de tempo, que o
impede de fazer as coisas que ele gostava de fazer quando era mais
jovem. Nova troca de problemas.
Passadas
umas duas ou três décadas, esse jovem – já idoso – está
aposentado (junto com sua esposa). Sua criança – que não é mais
criança – já se formou e está trabalhando. Não existem mais os
problemas laborais que lhe consumiam tempo e energia, nem de cuidados
com o filho, já independente. No entanto, a saúde dele já não é
mais como era, impossibilitando-o de certas atividades. Provavelmente
nesse ponto ele começa a olhar para o passado e refletir se sua vida
foi boa ou não. Se ele criou seu filho certo. Se ele tratou bem a
esposa. Se ele poderia ter sido melhor. Se existe ou não algo depois
de sua morte. Como ocupar seu tempo de forma útil – já que na
vida adulta ele nunca teve muita oportunidade de usar. Etc.
Sendo
saudáveis ou não, num momento ele ou ela morrem. Se a conexão
desenvolvida durante a vida foi profunda, isso deve abalar a parte
que permanece no mundo (e no outro, dependendo da sua crença). Mas
as amarguras da vida parecem próximas de acabar, já que a viagem
rumo ao desconhecido está próxima. Outros tipos de problemas. O
último tipo aqui.
O que eu
quero dizer com tudo isso é que, assim que resolvemos um problema na
vida, surgem outros. Como se houvesse uma quantidade fixa de
problemas (inquietantes) disponível para cada um de nós, só que
assumindo formas diferentes em cada momento da vida.
Pode
existir gente que se julgue sem problemas. Eu não acredito em
pessoas que dizem isso – a não ser que se trata de um ser de ordem
celestial em missão neste planeta. O que ocorre é que essa pessoa
provavelmente deve ter problemas (quase insolúveis em alguns casos),
só que ela sempre se enganou ao longo da vida, mascarando-os e
desviando dos mesmos, se revestindo de forma e tomando isso como
conteúdo. Em suma, achou que havia atingido o ponto máximo em
termos de felicidade. Mas se revestiu de matéria e abraçou-a,
ignorando aquelas palpitações espirituais que sempre lhe sondavam a
mente periodicamente, forçando-a a repensar seu caminho.
“E
então, qual a solução?”, você pergunta. Eu repondo o que eu
acho, que é: continuar caminhando incessantemente, usando cada tipo
de problema para sua evolução interna.
Eu vejo
dessa forma: um problema, quando resolvido ou não, se converte em um
de ordem mais complexa, adequado à fase de sua vida, que lhe
possibilitará desenvolver outras habilidades. É como se
caminhássemos em círculos, mas ascendemos a cada volta. Uma espiral
que se eleva a cada volta. Se eleva e se expande. Englobando cada vez
mais. Sentindo cada vez mais. É a espiral do conhecimento.
Os
problemas se comportam como energia. E tem uma espécie de energia –
se é que podemos chamar assim. Precisamos convertê-lo em outra
forma, resolvendo-o e consequentemente absorvendo-o.
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