Existe
uma diferença muito grande entre consumo e consumismo. Enquanto o
primeiro é algo natural e necessário não só para a manutenção
da vida, mas também um meio eficaz para proporcionar bem-estar ao
indivíduo; o segundo se caracteriza quando o primeiro cruza a
fronteira do bom senso e passa a se tornar um fim em si. Ele passa a
ser o objetivo final. A felicidade em si. Isso desestabiliza o
indivíduo e a sociedade, tornando-a dependente de coisas fúteis.
Todos
nós consumimos. Em termos naturais ou humanos. Sem esse fenômeno
não estaríamos vivos.
Ao
respirarmos estamos consumindo oxigênio, vital para nossas células,
que o recebem através de nosso pulmão, que se comunica com o
sistema circulatório. Assim as células "alimentam" nossos
órgãos, e o produto final dessa troca é o dióxido de carbono. Eis
uma relação de troca biológica.
Consumimos
alimentos para mantermos a energia e nutrientes a título de
executarmos atividades vitais. Nosso cérebro é alimentado
energeticamente, consumindo a maior parte da energia que adquirimos
através dos alimentos (eu por exemplo estou escrevendo esse artigo
graças a isso). Isso é bom se aplicarmos todos os ganhos para um
fim útil.
Síntese do comportamento humano predominante atual. |
Nossas
casas e meios de transporte consomem energia. Esta é empregada de
forma direta e indireta. Direta porque utiliza-se combustíveis,
eletricidade, entre outras formas de energia, para funcionarem
adequadamente. E indireta porque é ela (energia, humana ou
não-humana) que deve ser aplicada na superfície terrestre para
deslocar os recursos naturais, transformá-los, conformá-los,
transportá-los e reorganizá-los para a construção dos aparatos.
Em suma, a vida é impossível sem o consumo.
Agora, a
segunda questão é o consumismo, que é completamente diferente do
consumo - apesar de ambos estarem relacionados. Ele é uma
extrapolação do consumo. Passa a fronteira que separa o necessário
/ suficiente do supérfluo. Se seguirmos um modo de vida consumista
tendemos a adicionar coisas desnecessárias à nossa vida. E a um
custo que tende a se tornar exponencialmente alto. E mudar nossa
percepção, pois sempre o mercado imprimirá em nossa mente de que
"precisamos" de algo a mais. Nas propagandas o supérfluo
se torna necessário. E ficamos presos.
As
razões de abraçarmos o consumismo são múltiplas. Se por um lado
somos induzidos "naturalmente" a comprar cada vez mais
coisas que desconhecemos e não precisamos, por outro nos sentimos
pressionados a adquirir bens que toda pessoa "normal" deve
ter. Dessa forma temos a questão da inserção social e da criação
de um significado para nossa existência através da ocupação de
comprar itens ou serviços.
No mundo
atual, devemos ter coisas que todo mundo tem para não sermos (ou nos
sentirmos) excluídos. Quanto aos bens de luxo, é normal desejarmos
eles - mesmo se nunca tenhamos condições de pagar por um décimo
deles ao longo de nossas vidas. É uma espécie de ditadura. Só que
essa ditadura é difusa. Como neblina. Está lá, mas não
conseguimos pegá-la. Mas no entanto sabemos - ou temos uma intuição
- que ela está lá. Exercendo sua influência.
Talvez a
faceta mais destrutiva do consumismo esteja no fato dele tornar tudo
- e todos(as) - consumível(eis). Temos um ótimo exemplo observando
o fenômeno da mercantilização dos sistemas de saúde de muitos
países. Isso vem gerando conseqüências perversas para o bem-estar
da população que habita esses países, comprometendo uma maior
parcela de sua (já escassa) renda para adquirir um bem que
constitucionalmente deve ser universal, gratuito (considerando que já
se paga imposto para isso) e garantido para todos. Para qualquer tipo
de caso. Isso abriu portas para a conversão do Direito-Saúde em
Mercado-Saúde.
Uma reflexão materializada nas ruas. |
Quanto a
outros bens (teoricamente) universais como Educação, Segurança
Social, Segurança Física e Ciência e Tecnologia, a situação é
semelhante. Dessa forma o cidadão comum se tornou um refém completo
de grandes corporações.
Com a
mercantilização da saúde, da educação e de outros serviços de
proteção social, o consumismo passa a se impor para todos. Mesmo
quem deseje (ou está) tendo sucesso em levar uma vida simples e sem
preocupações materiais, a cada ano que passa - nas últimas 2 ou 3
décadas, pelo menos - seguir esse caminho ou ter esse desejo está
se tornando cada vez mais difícil e desanimador, respectivamente. As
fendas que possibilitam o crescimento do indivíduo como um ser se
estreitam progressivamente, sem dar sinais de desaceleração - até
que todas brechas estejam fechadas. O ser humano passa a ser
condicionado a uma mera ferramenta de acumulação (trabalho
alienado) e gastos (consumo doentio) para a própria subsistência, a
título de alimentar um sistema (neoliberalismo) incapaz de gerar
nada para o planeta a não ser instabilidade e dor em sua essência.
Num
mundo sensato o ideal seria, uma vez atingido um grau de consumo
satisfatório, buscar-se desenvolver ao máximo o SER com os recursos
disponíveis.
Todo
excesso faz mal.
O
EQUILÍBRIO é pré-requisito para verdadeiro desenvolvimento do
indivíduo e da sociedade. E consumir por consumir não traz esse
equilíbrio.
A
Humanidade ainda se comporta como uma criança em idade pré-escolar
que se recusa a crescer. Uma criança que, não aprendendo a usar
brinquedos e fazer brincadeiras mais elaboradas, prefere se manter
num nível primário, pois não consegue enxergar sentido em nada
além daquele comportamento. Em suma: ela estacionou na existência.
Muitos
já estão prontos para seguir adiante. Mas para isso se CONCRETIZAR
a maioria deve se CONSCIENTIZAR do fato - cada vez mais visível.
Vamos
seguir adiante?
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