domingo, 8 de novembro de 2020

A humanidade se purificando

É muito triste, mas às vezes é impossível não manifestar a perplexidade da alma ao ver o modo de (não) funcionar da sociedade em que vivemos. Não é possível escapar de uma análise incisiva da forma mental - que bombardeia as notícias de todas as fontes, os blogs pessoais, as constatações do dia-a-dia, o modo de agir das pessoas, a cultura limitada e limitante hodierna...enfim, que subjuga o ser humano a uma condição precária, na qual o avanço é freado a todo momento. Os atritos são múltiplos, intermitentes e cada vez mais engessantes. Não à toa muitos optam por se adequar - dentro de seu nível, seja ele o mais alto ou mais rasteiro na pirâmide social. Adquirem um modus operandi que viabilize continuar existindo com a minimização do sofrimento. É preciso se iludir num alto grau para que isso se efetive. E os meios abundam.

Nossa espécie está despertando para questões fundamentais. Alguns (ainda raros) veem o ponto central. Percebem o impasse da civilização. Chegaram à conclusão de que o único modo de efetivamente progredirmos como espécie é mudar a forma mental. Isso colima nas mudanças exteriores, que são mais visíveis e desejadas pelas pessoas: alteração da estrutura sistêmica que impera em nosso mundo; que conduz a comportamentos diferentes. Isso levaria (ou melhor...levará) a um cumprimento da legislação*, e a criação de mecanismos cada vez mais visando o auxílio das pessoas, sua cooperação, e a geração de ambientes propícios ao florescimento, desenvolvimento, implementação, difusão e consolidação de ideias verdadeiramente progressistas. 

É impossível dar um passo à frente sem um mínimo de evolução da consciência de uma massa crítica. Isso observa-se na História, em que avanços foram feitos apenas quando os tempos eram chegados. Diz-se "É chegado o tempo dessa ideia!". De fato, muitos profetas vem com antecedência - de décadas, séculos ou mesmo milênios - e descrevem as tristes consequências do desenvolvimento de uma forma mental. A humanidade, até hoje, considerando suas linhas gerais, sempre progrediu

a pena de morte se extingue; 

a guerra se torna cada vez mais indesejada pelo sentimento popular; 

a saúde (física, mental e espiritual) é vista como o bem precioso, como o máximo dos bens no âmbito das coisas terrenas; 

direitos humanos foram criados e se ampliaram; 

as pessoas apreendem sua importância e aprendem sobre sua gênese, função e destino; 

a visão de Deus e Universo começa a se alterar lentamente; 

a Ciência avança e reencontra aquilo que ignorava nas Escrituras Sagradas, vendo-se forçada a dialogar com a Teologia ; 

e essa, percebendo o dinamismo do universo, a importância do pensamento e os grandes erros cometidos pelas religiões monoteístas, se vê forçada am se retrair de sua cruzada e tentar relacionar suas visões com os fatos do mundo. 

Há muito a dizer. Mas a ideia central é essa: o Universo ascende numa marcha com ritmo ditado por uma lei profunda. E a humanidade, que brota (se manifesta) no seio desse cosmos, é (neste planeta) o produto mais elaborado do reino da matéria (do Anti-Sistema, AS). O ser humano é uma etapa intermediária do desenvolvimento do espírito - de sua salvação, sua redenção, sua ascensão.

Como um sábio já disse:

"Somos seres espirituais tendo uma experiência humana, e não seres humanos tendo uma experiência espiritual."

Em suma: nossa essência é espírito. Espíritos individuados, cada qual com sua singularidade, cuja natureza (substância) é idêntica à de Deus.

É preciso que as pessoas adquiram um senso de responsabilidade, independente de sua posição na escada social. Pois mesmo que 1% dominem e trabalhem contra os 99%, em última instância a culpa é de todos.

Uma pessoa sozinha não controla cem. É preciso que haja uma forma mental...uma corrente de pensamento, que esteja aderente à mente de todos(as), ou da maioria. Uma forma mental que é substrato para a manutenção do sistema predominante. Se as pessoas aceitam a realidade como dada do jeito que é, sem possibilidade de transformação, elas irão aceitar as regras do jogo e trabalhar para que um dia (quem sabe...) cheguem ao topo da pirâmide - e ajam exatamente igual àqueles que estão lá. É um em um milhão, ou um em mil, que chegará lá. Tanto faz. Porque de qualquer forma é uma parcela ínfima da sociedade. É tudo uma ilusão que alimenta um sistema cuja data de validade já expirou.

Perceber esse fenômeno profundo não implica em defender o status quo.

A desigualdade é o maior mal (manifesto, factual) que há.

A falta de consciência é o maior mal (não-manifesto, substancial) que há.

O segundo leva ao primeiro. Logo, para mudarmos nossa realidade sistêmica deplorável, é mister adquiri um grau de consciência mínimo: Uma massa crítica com esse grau será o limiar que definirá o acionamento de uma onda de transformação irrefreável que se arrastará pelo mundo. Nesse arrastão de consciência, as forças do AS não serão páreo. O Sistema (S) terá a predominância, viabilizando a elevação efetiva das condições mundiais. Ou seja, o AS será um pouco menos AS, aproximando-se (dimensionalmente) do S.

Isso ainda não está claro para muitos. E se as pessoas (leia-se, todo o povo) não se esforçarem para compreender, correrão o risco de retroceder séculos em qualidade de vida e possibilidades. O dever é de todos. Independente da escolaridade ou salário ou CEP ou patrimônio ou etc., é mister que as pessoas busquem despertar para uma realidade mais profunda. A consciência não depende inteiramente do intelecto. É claro que o desenvolvimento da razão, da sistematização, do bem-estar, das conquistas terrenas pode nos levar às portas da intuição, dum altruísmo maior, duma visão sistêmica, da bondade, entre outras coisas maravilhosas. Mas não necessariamente. 

Já vi muitas pessoas extremamente inteligentes (razão, análise, comunicabilidade, etc.) com baixo grau de consciência. E muitos com poucas vantagens terrenas (salário baixo, sem escolaridade, sem posses, etc.) com consciência de dar inveja a muitos engenheiros, advogados, médicos, e etc. (isso sem falar de diretores, CEO's, estadistas, e criaturas do tipo). Logo, não podemos esperar o povo adquirir um grau de bem estar de uma parcela pequena (digamos 10%) da população. É preciso iniciar agora, com o que se tem: a substância divina que reside em tudo e em todos.

 

Ubaldi desenvolve, numa de suas obras, um pensamento muito profundo que exprime o modo de agir das forças da vida. Diz ele que:

"A Vida prefere um magro evoluído do que um gordo involuído."

Sem querer menosprezar as pessoas pelo peso, o místico da Umbria quis dizer o seguinte:

"A Inteligência que auxilia o mundo (substância divina na criatura, Deus imanente) está orientada a construir um biótipo consciente, desperto, dono das forças da Vida, mesmo que para isso ele tenha de ter dificuldades materiais; e não um biótipo cheio de regalias, no bem estar, mas inconsciente e alienado das reais questões da existência, de sua origem, de seu destino e da Lei de Deus."

Ou...

"A Vida prefere um consciente sem bem estar do que um inconsciente com confortos materiais."

 

É preciso tomar muito cuidado ao lermos certos termos. As palavras servem para exprimir uma ideia mais profunda. Por vezes, mal interpretada, acreditamos que o autor quis dizer exatamente o que as palavras são a entender (interpretação literal). Mas, como diz Rohden, o símbolo (representação) sempre é uma degradação do simbolizado (realidade).

Quem assimila corretamente conclui que o caminho das pedras é muito óbvio. Por exemplo, vê-se com muita clareza que certas pessoas são exemplo de dedicação ao próximo e buscam promover isso na árdua batalha do cotidiano, contra as forças dos meios de comunicação, do dinheiro, das corporações, enfim...dos interesses. Guilherme Boulos é um claro exemplo disso. Ele é o único candidato a prefeito de São Paulo cuja trajetória é limpa. Eu diria quase imaculada (se compararmos às de seus adversários). Mas no entanto muitas pessoas ainda estão presas a aspectos secundários, sem importância (leia-se fake news). O poder vendeu a essas pessoas uma forma mental apodrecida (vencer no mundo é esmagar o outro, é focar no lucro, é prezar pela ordem que mantêm tudo como está); uma narrativa falsa (movimentos sociais são a baderna, quem fala em socialismo é um monstro, quem incomoda as instituições deve ser eliminado, quem quer diminuir a desigualdade deseja implantar a ditadura da esquerda, e etc.). Assim, com muita facilidade aderem aos ditames do poder e com muita dificuldade assimilam e se alinham com aqueles que desejam um mundo melhor para todos. 


Na minha visão, falta ao Boulos apenas uma coisa: perceber o aspecto mais profundo do fenômeno. Talvez ele já o perceba, de forma inconsciente. O avanço que ele tenta é árduo porque não vai à origem do bem e do mal; não atinge a fenomenologia do cosmo; não percebe que as pessoas (o povo), também deve se mexer.

De certa forma, o povo é culpado por suas misérias porque não sabe perceber o jogo profundo que está ocorrendo. E assim apoia políticas monstruosas que o leva a uma miséria maior, com menos emprego, salários rebaixados, empregos (se houverem) degradantes, transportes ineficientes, escolas e hospitais e médicos mais afastados, piores e em menor quantidade; e etc.

Não podemos eximir os 90% (ou 99%) da culpa do estado atual.

Se todos esses 90, 99% enxergassem de fato o que ocorre no mundo agora, na manhã seguinte haveria o início de uma revolução sem precedentes, global. Uma revolução que cujo cerne não seria a remoção do poder de alguns, para serem substituídos, mas na alteração da estrutura do poder. Para que todos possam ter condições mínimas de vida e - principalmente - um contexto no qual o progresso interior seja não apenas uma quimera, mas uma ralidade alcançável.

No fundo se trata de uma questão de número: basta haver uma massa crítica que enxergue a Realidade. A questão é que parece muito difícil se atingir esse estado de conscientização.

Muitos (dos poucos) buscam o meio externo, como Boulos, Eduardo Moreira, Alysson Mascaro e Valdete Severo.

Alguns buscam o meio interior, como os santos e místicos e monges. Como Francisco de Assis, Masaharu Taniguchi e Allan Kardec.

Mas conheço pouquíssimos que agregam os dois: reforma íntima que colima em atuação social - e mudança social visando despertar da consciência.

Nós só iremos avançar com essa magnífica combinação. Não apenas na teoria (mente), mas na prática. Vivendo essa realidade mais profunda. Pois a realidade é integral, como diz Ken Wilber. Logo, o íntimo e o exterior estão jungidos, conforme preconiza a Teoria de Ubaldi.

 

Devemos espiritualizar a matéria.

Devemos ascender espiritualmente e manifestar essa mudança de estado.

Manifestar é agir no mundo. Ascender é conscientizar.

É muito simples. O que dificulta é fazer isso acontecer de fato. 

O povo está na panela em termos materiais. Mas na análise profunda que fazemos, não podemos recear de colocá-lo também na panela (das responsabilidades).

Porque somente assim a pessoa pode acordar e começar a agir de fato.

Como muitos sábios já o disseram:

"É melhor uma sinceridade áspera do que uma falsidade suave."

 

O povo não pode ser o objeto de cristal intocável para os progressistas. Quem deseja o predomínio das trevas age assim. Mas não o pode quem deseja o progresso da humanidade. 

Não se trata de atacar o povo, e sim de fazê-lo despertar para a realidade, tratando-o como um ente com real poder, responsável pelos seus atos e capaz de diferenciar uma crítica feroz de um ataque de ódio. 

Esse é o significado mais profundo de V, De Vingança. Todo processo de despertar de Evey (Natalie Portman) envolveu certa dose de violência intensa por parte de V - no entanto, ela despertou de forma magnífica, mais forte do que nunca. Precisamos de um catalisador forte. Um V. Capaz de fazer despertar aquele espírito que está latente nas pessoas. Esse V pode ser um movimento, ou um evento que desencadeie um processo irreversível.


E para isso dar certo as pessoas precisam adquirir a capacidade de fazer sua autocritica.

Não é apenas uma religião ou um partido ou uma pessoa que precisa fazer autocrítica (como diz ou sugerem os pútridos meios de comunicação). É toda a humanidade! Especialmente aqueles que mais concentram poder (que não são expostos pela grande mídia, que é inclusive parte desse poder). Essa avaliação deve ser feita com severidade compatível à posição hierárquica de cada grupo, classe social e pessoa.

É preciso que todos sejamos jogados na panela. Porque nada melhor para despertar uma humanidade sedada (quase) por completo do que dar um abalo profundo e incisivo. 

Não sei quem ou qual grupo iniciará esse movimento. Mas que fique registrado aqui a visão mais profunda que brotou de uma vivência intensa, de ritmo frenético, para que futuramente uma humanidade mais evoluída, que atravessou um período triste, possa caminhar de forma mais orientada. 


É hora de iniciarmos a fusão dos grandes pilares do progresso: Evolução íntima com Revolução sistêmica.

 

Só se purifica purgando. Nesse estágio ainda é necessário - ao que parece - a querida irmã dor. Único meio de salvação no estágio hodierno da humanidade. Após os grandes eventos que aguardam este planeta, espera-se que os saltos evolutivos sejam mais suaves. Assim o progresso será cada vez mais uma tendência natural, e as pessoas se entenderão com mais facilidade. 

Assim o é (a Lei), assim o será (na nossa marcha).

Compreenda-o quem o puder.

 

Observações:

* Muitos artigos de nossa constituição não são implementados por falta de vontade política, que por sua vez se perpetua graças à inconsciência da população.

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