sexta-feira, 15 de junho de 2018

Vegetarianismo: questão de maturação evolutiva?

Há tempos desenvolvi o assunto dos 5 A's essenciais à vida [1]. Um ser humano, para viver em sua plenitude, necessita apenas desses cinco elementos. Em sua plenitude. O que significa em quantidade necessária e suficiente (nem mais nem menos) e com a qualidade máxima, dando plenitude. Podemos destrinchar cada um deles, revelando tópicos científicos, vistos à luz da ciência, para comunicar melhor ao homem moderno qual a importância de se ter acesso a cada um deles. 


Estilo de vida saudável reflete na
aparência, na disposição, no humor, no
dinamismo. 
O 1º deles (ar) aponta para o aquecimento global, a poluição atmosférica e se liga profundamente com o ciclo da respiração, de inspirar e expirar; O 2º (água) é um dos tijolos fundamentais da vida, constituindo de 60 a 70% de massa do corpo humano. Ela aponta para o saneamento, o ciclo hídrico, a energia hidráulica, a nutrição; O 3º elemento (alimento) é diverso e múltiplo. Ele é o último dos elementos essenciais do ponto de vista animal, formando a tríade elementar que permite ao indivíduo sobreviver. Ele aponta para questões de saúde, nutrição, bem-estar; A partir daí tem-se o 4º elemento (abrigo), que é por vezes sofisticado na vida infra-humana (ex: colônias de formigas) mas não se revela tão indispensável quanto para o ser humano, que se desenvolve numa região de segurança. É onde se dão as atividades intelectuais, de reflexão, de educação, de socialização. É o que se associa à propriedade fixa, de direito, inalienável. É a extensão do corpo. Posse e local de descanso. Essencial à criação da família (propagação da espécie) à nível mais elevado; Até aqui se cumprem a 1ª e 2ª lei da vida (alimento e reprodução), que são tanto melhor cumpridas quanto mais saboroso o alimento e mais bela a mulher. Mas há uma necessidade a mais, que alguns já vislumbram, que vai além do plano do abrigo e das necessidades básicas de ingestão corpórea. Trata-se do afeto: ápice das necessidades. Indispensável para o desenvolvimento das ideias, da formação de valores, da criação de conceitos novos e de atitudes revolucionárias de vida, apontadas para a unificação. Assim temos o ser humano, cujas possibilidades se traduzem na plenitude dos cinco A's.

Gostaria de desenvolver a questão da alimentação, que nos toca de forma muito profunda, já que é um processo que ocorre com frequência e une as pessoas. Além disso, a nutrição se relaciona de forma profunda com a questão ambiental, a saúde e da eficiência energética. Temas centrais à ecologia, à medicina e à economia. Adicionalmente - e principalmente - trata-se de um aspecto que revela, a meu ver, um vetor evolutivo do ser. Logo, podemos adicionar ao estudo a questão espiritual, que vai muito além da abordagem ética. 

O aspecto do alimento em si já é mais sáttvico-rajásico.
Ao contrário de certos alimentos que são tamásicos.
Mais sobre as três gunas, veja em:
https://blavatskytheosophy.com/the-three-gunas/
Os três aspectos humanos (ambiente, saúde, energia) se inter-relacionam. Assim irei abordar o tópico de forma integrada, desmistificando alguns conceitos que as pessoas geralmente tem à primeira vista. Isso tem por objetivo apenas esclarecer do que se trata, sem visões parciais, e sim universais, sem âncoras em correntes de pensamento e tendências humanas. Ver-se-á que é uma questão de alinhamento com uma lei cósmica.

A primeira questão que alguém pode levantar é a necessidade do organismo humano ingerir determinados tipos de proteínas. Me parece justo ter isso esclarecido - já que a saúde é essencial para viver-se com qualidade. Eu vivo sem comer carne há dez anos e não senti nenhuma falta nutricional, seja em vitaminas, sais minerais, funcionamento celular ou disposição. Os últimos exames de sangue revelam que tudo está dentro das faixas da normalidade. Meu peso é baixo mas dentro da faixa considerada saudável. Meu organismo suporta esforços grandes - especialmente em termos psíquico-nervosos. Talvez venha daí a explicação de meu metabolismo hiper-acelerado. Como bem - nem muito nem pouco - e no entanto não apresento tendência de ganho de peso. Minha atividade física é elementar (caminhadas e pedaladas frequentes, para fins utilitários e ginástica de 20 minutos), com frequência dia-sim-dia-não, em média. 

O vegetarianismo / veganismo leva a um uso mais eficiente
do solo. Respeita a diversidade das espécies e evita sofrimento
desnecessário. Não é o que o sistema atual diz construir?
O intestino trabalha bem, já que a carne é de digestão lenta e os vegetais, legumes e grãos são digeridos rapidamente. Além disso a disposição - sinto - é acima da média, com menos necessidade de sono pós-refeições. Logo, em termos de disposição e indicadores corporais, tudo está em perfeita ordem. Adicione-se a isso a minha capacidade de manter um dinamismo fora do comum para tarefas além das obrigatórias (trabalho formal, manutenção do lar e lazer), criando textos de várias vertentes, desenvolvendo cursos inéditos e conversas profundas (e intensas), ler, estudar e refletir livros/filmes profundos, realizar doutorado, ouvir música e me exercitar. Essa energia a mais pode ser consequência tanto da alimentação frugal e vegetariana, do círculo de contatos selecionado (por sintonia) e da seletividade das tarefas. Dez anos de vegetarianismo não me afetou nada em termos de saúde e aparentemente melhorou minha disposição.

O próximo passo é definir os graus de vegetarianismo. De modo geral existem cinco categorias diferentes. O que as une é a ausência do consumo de carne de qualquer tipo: bovina, suína, caprina, aves, peixes, moluscos, etc. A diferenciação parte desde aqueles que aceitam ovos, leite e derivados e mel em sua dieta (ovolactovegetarianos) até aqueles que não aceitam nada de origem animal - inclusive o mel que as abelhas produzem. Estes últimos são denominados veganos.

Um vídeo da acadêmica Sabrina Fernandes [2] explica de forma cristalina o vegetarianismo/veganismo. O diferencial é a relação do veganismo com o anti-capitalismo. À primeira vista poderá parecer uma tentativa de concatenação forçada entre o ideal socialista de justiça social (lógica redistributiva) com a vertente ambientalista (lógica de redução da produção), que se dá pelo fato da moça ser ecossocialista, mas trata-se de uma relação real, que possui uma lógica férrea, conforme irei mostrar mais à frente. Recomendo que vejam tanto o vídeo extenso quanto o complementar da mesma autora [3].


Porque quando se fala em gado se usa o termo "indústria agropecuária"? Primeiro: a agricultura (o "agro") é o que sustenta a pecuária: o gado consome mais grãos do que a humanidade. Muito mais. Logo, a nossa agricultura serve muito mais como alimento indireto do que direto. O que leva a concluir que o bife que se come possui centenas ou milhares de quilos de grãos "embutidos", pois o boi / a vaca comeu muitas toneladas de grãos ao longo de seus 3~4 anos de vida. Segundo: nossa espécie não se alimenta mais de carne em função da necessidade, mas sim devido à fatores culturais (hábito / imposição familiar / crença na "força" e "vigor" que a carne dá) e uma lógica de consumo para manter o sistema econômico vigente - braço direito do paradigma capitalista - operacional. Vive se para comer - não se come para viver. Se aplica a todos alimentos, mas a carne tem um protagonismo muito grande. Por esses motivos se usa o termo supracitado: a pecuária "puxa" violentamente (demanda) o setor agrícola e a lógica industrial-produtivista. Esse é o primeiro ponto.

Já começamos a perceber o papel que a economia tem na questão do consumo da carne. Adicionemos a questão ambiental.

Segundo dados da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) a pecuária é responsável pela emissão de 14,5% dos gases de efeito estufa (metano, CH4) que causam o aquecimento global. Isso supera o setor de transporte. O metano, é bom lembrar, é o gás com maior impacto dentre todos, pois uma mesma quantidade (e aumento) de ppm's (partes por milhão) na atmosfera causa mais aumento de temperatura média global do que os demais gases (greenhouse gases), incluindo o dióxido de carbono (CO2) emitido pelo setor de transportes, que já por si não é muito eficiente.

"o metano é mais eficiente na captura de radiação do que o CO2. O impacto comparativo de CH4 sobre a mudança climática é mais de 20 vezes maior do que o CO2, isto é, 1 unidade de metano equivale a 20 unidades de CO2." [4]

A mesma fonte diz que o CO2 é o gás de maior emissão (78% do total), o que pode causar confusão para quem lê por cima. Lembrem-se: maior emissão é causa. maior impacto é consequência. São coisas diferentes. Logo, emitir 10 vezes menos ppm de CH4 do que CO2 no fundo significa que o primeiro está causando maior parcela de aquecimento do que o segundo. Ele é (digamos) muito mais 'letal' em termos de aumento de temperatura.

A Juliana do Boho Beautiful tem uma dieta vetorizada para
o vegetarianismo. E uma vida simples. 
Luiz Marques nos lembra que o aumento de temperatura global se dá de forma desigual: a água aquece muito mais lentamente do que a porção continental - devido à sua capacidade térmica, entre outros fatores [5]. Logo, concentra-se um maior aumento de temperatura nos continentes, - onde vive a humanidade - o que agrava a questão. Iremos sentir um aumento maior do que a média prevista, e isto irá afetar a produção agrícola, promover aumento do nível do mar, que por sua vez causará migrações em massa e deteriorar os sistemas produtivos mais ainda. É bom que saibamos disso. Pois quando certas coisas começarem a ocorrer, ao menos saberemos o porquê e poderemos apontar melhor os responsáveis: nós mesmos, em larga medida. Mas quem detém o poder talvez seja mais responsável, pois sabe e tem condições de reorientar os sistemas humanos, mas pouco ou nada faz para isso - pois é muito trabalhoso se pensar em mudanças profundas...especialmente de paradigma.

A questão hídrica é igualmente crítica.

"Quem se torna vegetariano ou vegano economiza água de maneira significativa: para se produzir um quilo de soja, são gastos 500 litros de água, enquanto para um quilo de carne bovina, são necessários 15 mil litros do líquido." [6] (grifos meus)

A lógica é simples. Podemos perceber a "produção" pecuária puxando o consumo de água (H2O), da agricultura, aumentando as queimadas (emissão de CO2) e trazendo malefícios para a saúde humana.

Até mesmo os onívoros admitem que o consumo excessivo é prejudicial à saúde. Muitos admitem que o excesso de carne é pior do que o não-consumo da mesma.

Ernst Gotsh tem 70 anos (parece?). Longe da atribulada vida
dos afazeres e obrigações forçadas, trabalha a terra com
alegria e criatividade. 
Outro argumento frouxo usado por alguns (para justificar os matadouros) é que 'se todos fossem vegetarianos haveria excesso de animais', e assim teríamos uma crise e seria necessário que alguém comesse os bovinos, os suínos, as aves e cia. No entanto me pus a pensar e imagino que, à época em que a nossa espécie "chegou" no planeta, não havia uma inundação de animais. A quantidade de bois, porcos, cabras, galinhas, etc estava estável e em equilíbrio - há milhões de anos creio eu. Logo, só se pode concluir o seguinte: nossa lógica de produção-consumo leva ao aumento da quantidade de animais. A quebra dessa lógica não faria aumentar o número. Talvez até diminua.

Mas se todos se tornassem vegetarianos e veganos do dia para a noite, haveria um forte impacto econômico inicial. Talvez o baque fosse muito forte, como atestam estudos [7]. É uma questão sistêmica que pode ser prevista com modelos*. O baque seria no impacto aos empregos (economia-social), que afetaria muito mais os pobres do mundo e os países pobres, levando à fome muita gente. Portanto o roteiro evolutivo que proponho deve levar em consideração uma transição gradual [8]. Mas ela deve se dar o mais rápido possível, e ser bem conduzida.

Quanto à questão ética, podemos simplesmente afirmar o seguinte: será que os animais precisam morrer em massa para que vivamos bem? Isso poderia ser verdade na pré-história, quando a dificuldade em certas regiões para se encontrar frutas era difícil - e então matava-se o animal para sobreviver. Hoje em dia isso não é mais necessário. Nossas técnicas de produção são modernas. Plantamos diversas culturas em grande quantidade. Temos conhecimentos para criar sistemas agroflorestais sintrópicos, com lógica de retroalimentação [9]. O filme abaixo dá uma visão da gravidade e poder de nossos tempos.


A questão biomássica bioenergética também diz algo - tentarei desenvolver isso em outro ensaio.

Quanto mais vemos em profundidade, maior
o nosso poder de alavancagem. Isso eu mostro,
ensino e propago. É o que posso fazer na
minha humilde posição. 
O capitalismo está profundamente relacionado à lógica do consumo de carne. Assim como à lógica do transporte individual. Assim como à lógica do consumo conspícuo de diversos bens e serviços.  Assim como à lógica de privatização de setores diretamente relacionado aos Direitos Humanos: como educação, saúde e segurança. Assim como à baixa intensidade de nossas democracias. Entre outros. É mister perceber isso e admiti-lo à raíz.

Não proponho nenhuma alternativa 100% esquematizada. Nenhum plano total. Proponho apenas a reflexão de cada um. E colocar esses temas em pauta, seja via cursos (extensão), via textos (blog), seja conversas, seja leituras profundas, seja postura firme e convicta de vida. Estamos realmente melhorando nossa qualidade de vida ao seguir o que a maioria segue? Ao nos deixarmos (inconscientemente) seremos sugeridos a ter um carro caríssimo (que traz gastos enormes), comer demasiadamente e mal, repor eletrodomésticos mais frequente do que o normal?

Estamos nos antípodas. A vida, como deve ser para alcançarmos a felicidade que tanto dizemos ansiar, passa pela mudança radical dos conceitos. Trata-se de uma mudança de paradigma. Do modelo mental para a estrutura sistêmica. Desta gerar-se-ão novos comportamentos. Estes farão coisas (eventos) fantásticos ocorrerem. Demora mas se concretiza. É preciso ter paciência. O bom-senso é  o primeiro passo.

Tratarei adiante da questão ambiental, que se relaciona muito com políticas públicas (democracia), movimentos sociais, transporte, alimentação, turismo, consumo de bens, entre outros. Desde já deixo uma matéria muito interessante da BBC que revela um estudo para lá de interessante feito por uma mulher [10].

Enfim, vegetarianismo é um dos fatores que apontam para uma possível maturação evolutiva?

Não o saberia dizer. Mas as evidências apontam que sim. Rohden afirmava a inutilidade da dieta moderna, repleta de excessos e carnes. Ubaldi também. Tinha inclusive uma alimentação frugal, restrita ao mínimo e indispensável para se manter vivo - era um verdadeiro seguidor de Francisco de Assis. Inclusive se formos investigar todos os santos, místicos e muitos gênios, iremos notar que sua alimentação era muito voltada para alimentos leves, mais próximos de nós na pirâmide da biomassa e bioenergia. O mercado para esse nicho cresce [11] e a tendência reforça o nível de conscientização da humanidade.

Se trata sobretudo de viver uma vida (um pouco mais) plena.

Referências:
[1] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com/2015/11/ar-agua-alimento-abrigo-afeto.html
[2] https://www.youtube.com/watch?v=VS4dJL5syRA
[3]https://www.youtube.com/watch?v=buBa0mylJyc&index=2&list=PLPZ4y7b7MwOsms0-ly6MNIFo2BUqfWyNG
[4]https://www.google.com.br/search?ei=frYjW4-1LMqcwASvypHYDQ&q=FAO+gases+efeito+estufa+do+gado&oq=FAO+gases+efeito+estufa+do+gado&gs_l=psy-ab.3...110988.115246.0.115435.0.0.0.0.0.0.0.0..0.0....0...1c.1.64.psy-ab..0.0.0....0.zcpxmnJIH-c
[4] http://www.oeco.org.br/dicionario-ambiental/28261-gases-do-efeito-estufa-dioxido-de-carbono-co2-e-metano-ch4/
[5] https://www.youtube.com/watch?v=6F4xbz5v0tE
[6] https://www.ecycle.com.br/component/content/article/63/3908-muito-alem-da-exploracao-animal-criacao-gado-promove-gastos-recursos-naturais-danos-ambientais-em-escala-estratosferica-emissoes-gases-uso-agua-terra-alimento-desmatamento-pastagem-residuos-contaminacao-exploracao-excessiva-fome-pesticidas-pegada.html
[7] https://www.bbc.com/portuguese/vert-fut-38129638
[8] http://leonardoleiteoliva.blogspot.com/2018/01/roteiro-evolutivo.html
[9]https://www.google.com.br/search?source=hp&ei=J78jW9q-O8GawQS1xo3IAg&q=agricultura+sintr%C3%B3pica&oq=agricultura+sintr%C3%B3pica&gs_l=psy-ab.3...742.4409.0.4460.0.0.0.0.0.0.0.0..0.0....0...1c.1.64.psy-ab..0.0.0....0.G2Dle7ZjHM8
[10] https://www.bbc.com/portuguese/geral-42005695
[11] https://emais.estadao.com.br/blogs/comida-de-verdade/mercado-vegano-cresce-40-ao-ano-no-brasil/

Notas:
* Dou exemplos do tipo no meu curso de Iniciação à Ciência dos Sistemas (ICS), no IFSP-SJC.

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