domingo, 21 de outubro de 2018

Adoção: mudança de paradigma

Fato 1: nós vivemos num mundo prestes a sofrer uma mudança de paradigma. Uma alteração abrupta que será sentida por todos, de forma intensa e sem precedentes em termos de escala, complexidade e dinamicidade. A última mudança de paradigma de nossa espécie se deu há cinco séculos, quando passamos do modelo teocêntrico para o antropocêntrico. Daí se deram desdobramentos importantes, cujos efeitos se manifestaram na potenciação da atividade econômica, nos sistemas políticos e na globalização. A ciência avançou e a tecnologia veio logo atrás. Os sistemas humanos não acompanharam. E não acompanharam porque o ser humano não melhorou moralmente em 500 anos.

O mundo irá sofrer uma bifurcação. Uma
transição planetária está a ocorrer. Toda forma
será desfeita. Isso irá doer a princípio, para
todos - mas quem está obrando a nova civilização
do 3º milênio provavelmente terá sua vaga.
Para o joio, uma regressão em um mundo muito
pior do que a Terra. Para o trigo, a possibilidade
de continuar caminhando para o futuro... 
Fato 2: o desemprego cresce e o custo de vida sobe para a imensa maioria de pessoas desse planeta. A estabilidade de carreiras e profissões de outrora desvanecem num átimo. A importância delas se torna mais turva para a mentalidade coletiva. O que era tendência da parcela pobre e com poucos anos de estudo se torna cada vez mais democratizada ao longo da pirâmide (cada vez mais desigual) social: classe média empobrece. Mas seu empobrecimento material não é o que mais preocupa - o que nos leva ao fato 3.

Fato 3: o nível de consciência geral daqueles que mais tem condições de progresso decaiu. Defendo a tese de que o grosso dessa parcela de seres tiveram suas potencialidades latentes obliteradas pelas novidades que o mundo foi gerando ao longo dos séculos. Mas até algumas décadas não poderíamos dizer que estávamos piorando (ou melhor, sendo capturados pela nossa criação) de fato. É apenas nas últimas décadas que o fenômeno vem se tornando cada vez mais evidente - e preocupante. 

Em dois mil anos de Evangelho pouco se fez no sentido de implementá-lo. As doses foram mínimas. Reduzidas a níveis atômicos. E os tempos são chegados. 

Não é possível continuar mascarando a intenção através de desfiles de razão. As máscaras podem ser várias, mas elas são cada vez mais difíceis de se sustentarem. Os métodos artificiais drenam recursos preciosos. A natureza aponta nossas misérias. Os seres percebem cada vez melhor - mesmo que usem isso para revelar as fraquezas dos outros. A repetição de discurso é praxe quando não somos capazes de confrontar com uma verdade que não nos agrada. Recorremos a repetição e ao número. Caso isso não resolva efetivamente, pode-se recorrer à violência - que se faz com o número. Isso é o que se vê no século XXI. O Brasil é uma mera caricatura do que a sociedade humana tem escondido no seu íntimo ao longo dos últimos anos. Nosso país é aquele que parece pronunciar de forma mais explícita, clara, destemida, visual, sonora e despudorada o arcabouço do subconsciente humano.

A relação não perdura sem que haja o
elemento espiritual. As almas devem
estar numa faixa próxima.
Sintonia, não sensação.
Afinidade, não atração.
Quanto mais o subconsciente coletivo se manifesta nas redondezas, mais clara fica a arquitetura do catástrofe que está a ser edificada. Mais cristalina se torna a sua inexorabilidade. Isso é preocupante para todos. Mas há uma hierarquia. Alguns estão na linha de frente e serão abatidos logo de princípio, com uma série de reformas para "melhorar o país" - esses se levam pelos instintos ao aderirem a passeatas. Outros estão mais atrás, poderão se virar de algum jeito na nova "ordem" que se apresenta- mas ainda sofrerão, sem contudo perceber a relação entre sua ignorância e o ambiente degradado em que vivem. Outros ainda, muito pouco numerosos, poderão se virar muito bem. Estes são menos do que um centésimo da população do país. Todos irão pagar, de uma forma ou de outra, no âmbito da matéria. Alguns terão crédito no campo do espírito. Pouco posso fazer contra um vômito instintivo - muito posso fazer para compreender a natureza humana a partir dele. Mais ainda: infinito pode ser feito para a construção das bases de um novo país...um novo mundo. Porque este mundo irá perecer, com a destruição de toda forma. Quem se desprende da forma, se salva. 

Digo tudo isso porque irei discorrer sobre a questão de ter filhos. Mas...o que tudo isso tem a ver com filhos e adoção?

Aqueles que acompanham os escritos do autor desde o princípio poderão perceber o porquê desse discurso introdutório. Se houveram pessoas que - indo muito mais longe do que ficar aqui nesse espaço - alçaram vôo com a Obra ubaldina, mais fácil será compreender o que estou prestes a dizer.

O místico da Umbria desvendou - ou melhor, sintetizou - as três leis seguidas pela humanidade: conservação individual (fome), conservação da espécie (sexo) e evolução (trabalho, no sentido mais forte do termo). A primeira se desdobra em aquisição de propriedades, títulos, bens e demais atributos; a segunda pode ser vista no aspecto do desejo, ou seja, o subconsciente que está apavorado com o "fim da vida" e por isso precisa se propagar; e a terceira pode ser sentida como um senso de dever sincero e honesto. Uma intuição. Uma capacidade de criar em meio a dores terríveis e vivências amargas.

Nós não geramos seres. Apenas a Fonte Infinita possui essa capacidade. Ela gerou os espíritos. Todos os seres. Nós humanos somos meros canais que permitem que certas individuações (espíritos) adquiram uma roupagem temporária. Esse conceito é cada vez mais compreendido pelos seres humanos. Foi introduzido pela doutrina espírita e muito aperfeiçoada por Pietro Ubaldi e Huberto Rohden, que precisaram bem os porquês e os desenvolvimentos. Não se trata de uma verdade relativa - trata-se de um conceito profundo cada vez mais evidente.

Os filhos não são uma soma dos pais. Podemos dizer que possuem características orgânicas muito próximas. Mas o DNA não define um ser em sua integridade. Caso contrário como se explicaria o fato de muitos pais bons terem filhos perversos - e vice-versa? Mesmo tendo dado todas as condições e amparo afetivo (1º caso) ou nada disso (2º caso). Por que será que Cristo afirmou categoricamente à sua mãe terrena e irmão - quando estes pediam sua presença para com eles - que sua família eram todos aqueles que estavam reunidos com ele, em sintonia fraterna? O Nazareno disse muito bem que a família verdadeira se faz por afinidade. 

É evidente que um casamento apoiado em interesses que sejam exclusivamente terrenos tenderá a se desgastar e (provavelmente) terminar. O único recurso de manter construção tão efêmera em pé é colocar combustível material nessa fogueira de ilusão. Empregar mais ilusões, mais força, mais desgaste. Tudo isso acaba desorientando ambas as partes, que fingem estar tudo bem para não lidar com a realidade da relação. Não houve um mínimo de sintonia vibratória para garantir uma construção sólida a partir de um alicerce firme. 

O caminho inicial é largo mais o fim é estreitíssimo.

Um casal que possui uma visão mais vasta da vida não irá ver diferença entre adotar um bebê ou ter um. Sabe que aquele que será criado é único, e as relações mais fortes se forjam no terreno do afeto - que é a porta de manifestação dos valores espirituais. Se adicionarmos as grandes questões mundiais, - que o século XXI está evidenciando tão bem - há de fato uma sensatez maior em adotar. 

Os pais não devem ver os filhos como
uma extensão de si mesmos.
Devemos ver além de nós no outro.
Isso é se desprender.
Isso é realmente construir no
universo do espírito. 
Há muitas crianças órfãs no mundo. Pobres, portanto. Desamparadas não apenas em termos materiais, mas afetivos. Elas "nascem" com os conflitos bélicos intra e entre nações, e a violência social. São frutos de refugiados que tiveram a infelicidade de terem suas vidas dilaceradas. Famílias incompletas, separadas, fragmentadas. E a tendência, com a extrema direita crescendo ao redor do mundo, é que esses órfãos aumentem. 

Ter uma criança própria e deixar outras à míngua é algo que fere o bom senso nascente em muitos e muitas. Qual a diferença, afinal? Para o biótipo atual, é simples: eles não são carne da nossa carne. E portanto "jamais poderia amar alguém que não tenha vindo de mim". Essa é a resposta padrão, que muitos darão após volteios eloquentes. Trata-se no fundo de estar preso à matéria. A partir daí me dou conta de que o grau evolutivo de nossa espécie é ainda muito baixo - e isso traz consequências nefastas.

Poderíamos estar exercendo o dever da criação da forma mais eficaz e bela possível. A única coisa que nos impede não são os recursos - o dinheiro seria o mesmo. Não é a falta de opção (os órfãos estão aí, aos montes). Nenhuma restrição real - exceto aquela imposta pela nossa mente. E nada é mais desafiador do que superar a própria mentalidade. Essa mentalidade se reforça para fazer prevalecer um instinto que não quer morrer. Aquele que diz "eu sou o meu corpo!". Mas não somos nosso corpo. Nem nosso nome. Nem nossa profissão. Nem nossos títulos. Nem nada do que escrevemos, compomos ou realizamos no mundo. Somos algo diverso, mais profundo, cuja manifestação mais sincera é um canto harmônico capaz de reunir diversas criaturas num amplexo de amor infindável. Somos donos de uma alma que anseia por potência na manifestação, sinceridade no dizer, força no agir e ímpeto no descobrir. Somos o que nem imaginamos. Somos o que queremos quando nos dispomos a abraçar a dor sem temor e a partir desse contato gerar uma nova forma de vida. 

Acima de tudo, somos capazes de transcender. 

A população mundial ainda cresce. A renda se concentra. O ódio se manifesta. O meio ambiente dá sinais de que em breve a carência de muitos hoje - que poderia ser evitada - poderá ser uma realidade inexorável do amanhã, para muitos e muitas. O que estamos criando de fato para lidar com um mundo em vias de renovação?

Qual é a nossa verdadeira construção, que sobreviverá às tempestades das balas, à erosão dos valores, ao desaparecimento dos conceitos, à desintegração das instituições sociais? 

Criamos os filhos para nossa diversão / distração / perpetuação nos tempos, OU
Para a evolução de ambos (nossa e deles)?

O senso de posse deve terminar para que a verdadeira criação se dê.

Criar é um ato independente da organicidade. É algo muito mais profundo. A matéria não pode guiar o nosso destino.

Grandes catástrofes se armam em todos cantos do mundo - no momento o Brasil parece ser o epicentro. Cedo ou tarde, esse batismo de fogo despertará muitos. 

Adotar um ser excluído por um sistema - que vive gerando órfãos - é um ato revolucionário do ponto de vista da ética e do misticismo.

Eticamente estaremos contribuindo para equilibrar as dores do mundo.
Misticamente estaremos evoluindo efetivamente, sem recorrer às muletas materiais.

Não se trata de condenar quem tem (filhos). Apenas se lamenta o instinto daqueles que julgam a atitude de criar um "desconhecido" estranha. Afinal de contas, somos todos uns estranhos aos outros. Não é a genética que nos une de verdade. O cimento espiritual é o laço mais forte deste universo.

Quando descobrirmos isso inciar-se-á a verdadeira e definitiva revolução da humanidade.

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