segunda-feira, 8 de outubro de 2018

As Três Gunas: o que são?

As gunas são os três aspectos da natureza deste universo (na terminologia de Ubaldi, o Anti-Sistema AS). Elas se aplicam a tudo que existe, com as devidas diferenciações. Pode ser vista na natureza infra-humana, no comportamento humano ou no estado mental. A Bhagavad Gita esclarece muito bem a natureza de cada guna e os caminhos de desconstrução, construção e aprimoramento de cada uma delas. 

À primeira vista parece simples de compreender a natureza de cada guna. Mas acredite: demora muito (mas muito) tempo para compreendermos à fundo. A princípio pode-se colocar três perguntas fundamentais a respeito disso:

(a) o que são as gunas?
(b) como elas se manifestam e se inter-relacionam - em nós especialmente?
(c) por que elas existem?

O porquê é o último passo nessa descoberta por ter sua resposta situada na mais profunda das causas ( a causa-prima). O "como" está interessado no mecanismo de funcionamento. Como se dá o transformismo de uma em outra - no ser? Como elas se ligam? Como reagem aos estímulos de Maya (mundo ilusório)? Qual uso deve ser feita de cada uma para melhorar minha vida? E por aí vai. Mas antes de saber a causa das causas (por que) e a mecânica que carateriza o comportamento desse tripé (como), deve-se procurar saber à rigor o que elas são de fato.

As três gunas influenciam nosso ser. Desde a fera
até o santo, existe pelo menos um pouco de sattva
(fera) e tamas (santo). Elas operam em momentos
distintos e nos prendem ao ciclo nascimento-
morte-renascimento. 
O significado tem relação com os símbolos, que descrevem de forma sintetizada algo, seja ele conceito, fenômeno ou personalidade. Trata-se de uma sabedoria antiga que delineia aspectos fundamentais que se destacam no ser humano. Não existe pessoa portadora de características integrais de uma guna e ausência das outras. Nem duas sozinhas. Elas sempre estão em conjunto, em graus variados. A intensidade própria de cada uma - sua proporção no tripé - é o que guia um indivíduo em sua existência.

As gunas são: Sattva, Rajas e Tamas. Cada uma possui um conjunto de caraterísticas. Já li alguns artigos que detalham sobre elas muito interessantes ([1], [2]).

Tamas está relacionada à inércia. Uma pessoa preguiçosa, que se recusa a executar até mesmo as atividades mais básicas da vida, (como comprar um pão na esquina) é tamásica no aspecto atividade. Se alguém é indiferente até aos mais próximos, se preocupando apenas com questões imediatas e superficiais, como se esbaldar no comer ou no prazer ou na vingança. Se a pessoa tem dificuldade em enxergar a relação entre os seus atos e suas consequências - mesmo que próximas. Todas essas caraterísticas são de tamas. O amor é egoísta, restrito apenas ao indivíduo, que se vê completamente separado do universo. Ela é a guna da ignorância.

Rajas se associa ao movimento. O tipo humano médio possui essa guna em destaque. Ela é paixão e desejo. É atividade incessante. É ambição. É esforço intelectual e/ou físico. Dinamismo intenso. Trabalho executado apenas visando uma recompensa. A mente está inquieta e não é capaz de perceber aspectos que vão além do mundo tangível, seja material ou das ideias. O amor é restrito à família e é baseado numa troca de prazeres. É a guna da atividade.

Sattva é o equilíbrio. Bondade, claridade de pensamento, inteligência, discernimento e inspiração a caraterizam. Pessoas que colocam a saúde em primeiro plano. Que visam escutar mais do que falar. Refletir antes de executar. Que buscam ser livres e dar liberdade para os outros se exprimirem. Que tenham uma alimentação balanceada e hábitos mais naturais, espontâneos, sem contudo ser impulsivo. Essas são características de uma pessoa sáttvica. Não visa recompensa - trabalha por amor e sente na criação a própria recompensa. O amor é universal, indo além da família, do grupo de amigos, da cidade, da nação. É um amor desinteressado. É a guna da harmonia.

A Gita discorre extensivamente sobre
as gunas. É preciso estar sensível à
realidade mais profunda para
compreender o que Krishna explica
a Arjuna. 
É interessante perceber que o assunto parece, à primeira vista, uma simples abstração dos livros sagrados, sem relação com a nossa vida pessoal. Mas à medida que se lê sobre elas e percebendo suas características múltiplas, começa-se a perceber a profundidade e importância de tudo isso.

Não há em nós o domínio de uma guna. Possuímos as três, em graus diversos. Mas o grosso da humanidade tem seu centro gravitacional em rajas. Os mais esclarecidos, espíritos de maior maturidade, já possuem muitos atributos sáttvicos. Outros, mais presos na matéria, ainda possuem fincada com força em sua alma tamas. Aqueles rajásicos, se presos ao nível dessa guna e ignorando a guna superior (sattva), acabam desenvolvendo caraterísticas tamásicas, como é de se esperar. Isso explica muitas coisas em nossa sociedade.

A atividade constante, a ambição, o desejo incessante, acaba causando cansaço. Se todo dia algum desejo não é atendido surge a perturbação, e com isso o desejo de compensação, que pode assumir aspecto muito voraz a depender das circunstâncias. Assim pratica-se o mal para aliviar um instinto. É a consequência de um ser rajásico-tamásico. Sattva ainda é muito fraca para exercer influencia.

Se alguém se observar à fundo (de verdade!) perceberá o quão difícil é ascender de tamas para rajas e desta para sattva, intensificando cada vez mais a guna superior; controlando a do meio e minimizando a de baixo. O assunto parece inesgotável quando inicia-se o estudo da própria personalidade. Mas o que de fato é infindável é saber identificar as próprias características e se transformar, dia-a-dia, ao longo dos anos e décadas e existências, num esforço contínuo que demanda resiliência, criatividade e perseverança sem trégua. 

As emoções não são propriedades de uma ou outra guna. Elas estão em todas - da mesma forma que o mundo animal (inferior) e o mundo angelical (superior) sente. Tudo irá depender da nossa intenção e de como manifestamos ela.

Sattva tira uma poesia daí. Extrai uma ideia para uma teoria.
Rajas pensa em como ganhar algo. Vê sentido apenas em
utilidade imediata. Tamas é indiferente. 
Se trabalhamos arduamente com a intenção de magoar alguém - física ou emocionalmente - estamos agindo tamasicamente. Se nosso esforço é feito visando um ganho pessoal (salário, promoção, reconhecimento, etc), ele é rajásico. Mas se estamos trabalhando sem pensar nas consequências e sequer passa pela nossa cabeça se alguém um dia irá reconhecer o que estamos fazendo, operamos no nível sáttvico. A mesma atividade em três níveis. Não é questão do ato visível exterior - é questão de foro íntimo.

Existe uma página com um teste que pode dar uma ideia da constituição mental da pessoa [3]. Para cada característica, escolhe-se um de três níveis. Ao final soma-se cada um deles e tem-se uma ideia do percentual de cada guna. É importante responder ao teste sabendo exatamente o que significa cada coisa (compreensão cristalina) e - acima de tudo! - honestamente. Caso contrário estaremos nos enganando e perdendo o nosso tempo.

Quem deseja se melhorar deve abrir sua alma e expor suas misérias para que elas sejam tratadas. 

Para fazermos uma auto-terapia psíquica é mister fazer o teste de forma sincera. Caso contrário estaremos fazendo um pseudo-tratamento (a perda de tempo será ainda maior, assim como o autoengano).

Na vida tudo é sério, especialmente os temas abstratos. Estes, por serem intangíveis à mentalidade comum a imperceptíveis ao sentimento médio, passam despercebidos, sendo classificados como coisas fracas e sem efetividade prática.

Na continuação irei discorrer sobre a inter-relação entre as gunas e sua manifestação nos vários níveis evolutivos. 

Referências:
[1]http://www.unbrokenself.com/the-three-gunas-a-revolutionary-model-for-mastering-your-mind-and-life/
[2] https://www.spiritualresearchfoundation.org/spiritual-research/the-universe/sattva-raja-tama/
[3] http://leilagusmao.com.br/sattva-rajas-tamas/

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