Nosso sistema econômico fracassou. Basta ter olhos para ver: os resultados são evidentes.
Nossa civilização é incapaz de lidar com um vírus. Por quê? Simplesmente pelo fato de não termos desenvolvido as estruturas adequadas para enfrentar as ameaças - criadas pelo nosso próprio modo de existir como espécie.
Que estruturas (ou lógicas sistêmicas) seriam essas?
Tudo aquilo que garante a todo ser humano um fluxo contínuo de bens e serviços essenciais à vida e ao desenvolvimento psíquico:
- Saúde universal de qualidade;
- Creches e cuidado infantil;
- Aposentadoria;
- Pensão;
- Renda universal;
- Mobilidade urbana multimodal;
- Matriz energética predominantemente renovável;
- Saneamento básico;
- Agricultura orgânica;
- Moradias decentes para todos;
- Centros de pesquisa;
- Segurança alimentar;
- Acesso à cultura;
- Democratização dos meios de comunicação;
- Etc.
Vou trazer aqui alguns conceitos elementares de economia para dar uma ideia da insanidade da mentalidade do tipo-médio.
Segundo Umair, existem três pontos vitais na condução de uma economia:
1º) A relação Consumo-Investimento;
2º) O tipo de investimento: se para utilidades ou inutilidades;
3º) O tipo de distribuição: se equitativa ou desigual.
Uma civilização que consuma mais do que investe não terá futuro. Além disso, à medida que ela se aproxima de seu término o convívio entre seus elementos ficará cada vez mais tenso, doloroso e mortal. É possível perceber isso hoje em dia com a ascensão do fascismo em vários pontos do globo; com a desintegração das famílias; com as altas taxas de suicídio; com o elogio à imbecilidade; com a superficialidade nas relações; com a incapacidade de síntese.
A economia global é 75% consumo e 25% investimento. Isto é, consumimos três vezes mais do que investimos. Para ser sustentável, essa relação deveria ser 1:1. E a nação com a maior economia do globo, mais influente (devido ao baixo grau de consciência coletivo), puxa a média para baixo: os EUA são 80% consumo, 20% investimento. E com isso fica coroado a falência do modelo econômico hodierno.
Consumir é importante e necessário, sim. No entanto, ele deve estar pareado com a capacidade de investir. E investir significa tudo que dará frutos no futuro, seja ele próximo ou distante. É a possibilidade de continuar o desenvolvimento humano. De abrir brechas para tentarmos coisas novas, que nos elevem para um patamar de vida mais digno, com maiores realizações em todos campos: arte, ciência, religião, filosofia, administração, afeto,...Ou seja, investir e consumir são dois lados de uma mesma moeda - que aponta para evolução. Elas precisam estar em equilíbrio.
Podemos até ter um nível de investimento maior do que o de consumo (ex.: China, com proporção 70:30). Mas isso pode ser prejudicial para a sociedade, que poderia ter melhores condições básicas de vida. A Europa, no geral, tem um equilíbrio (50:50), e isso se reflete no grau de qualidade de vida que as famílias possuem. Pergunte a qualquer pessoa sã onde ela prefere viver, trabalhar e criar uma família: nos EUA, na Europa ou na China? (estou falando em motivos concretos, de estruturas sistêmicas, e não em termos de afinidades amorosas ou culturais)
No entanto, essa não é a solução completa (proporção C-I saudável). É preciso que o investimento seja em coisas úteis, isto é, que gerem riqueza.
Riqueza é tudo aquilo que é útil no presente - ou poderá sê-lo no futuro. Frutas, grãos, escolas, laboratórios, hospitais, teorias, livros, filmes (bons!), músicas (decentes!), artigos, projetos, máquinas (construtivas!), etc.
Aplicativos que alienam e segregam não são úteis; tampouco livros permeados de ódio e mal escritos, músicas que afloram os instintos, mísseis, tanques, armas; ideias emborcadas; e tudo nessa linha.
Falo de utilidade em seu sentido mais amplo, universal, extrapolando os limites do utilitarismo econômico. Afirmo um utilitarismo vital, que perpassa o nível do concreto, adentrando no campo do intelecto, do sentimento e - mais alto - do espírito, situado no abstrato.
Nesse quesito até a rica e idosa Europa decai. Quantas pessoas não são reféns de acessórios que mais travam a inspiração do que a liberam? Quantos não podem ir além por estarem ofuscados por obrigações e métodos que aprenderam a buscar e segurar? Nesse campo o mundo todo cai ainda mais um pouco...se aproximando do fundo do poço...
Mas ainda não acabaram as análises econômicas: resta a questão da distribuição. Nesse quesito algumas nações se recuperam um pouco. Mas como já foi dito, o que interessa - para a sobrevivência de todos como civilização minimamente decente - é a média global. E com isso antevê-se a ruína.
O nível de desigualdade no mundo cresce. O acesso aos meios básicos de vida exigem peripécias infindáveis e inumeráveis de todos. Uma humilhação perpétua para poder comer, beber, deitar...Sempre sob a alegação de que devemos dar duro antes de merecermos algo. E os fatos saltam aos olhos: há algo de errado, apesar das grandes narrativas da mídia. Há algo que a humanidade (ainda) não foi capaz de captar. Algo de essencial...para sua sobrevivência como civilização...
E ainda eu colocaria um quarto fator: o arranjo sistêmico.
Podemos fazer mais para todos (em termos de qualidade e quantidade) simplesmente com uma organização sistêmica que gere sinergia. É uma questão de relação mais do que de técnica. De como usar o que se tem - e não criar novos elementos para solucionar desarranjos funcionais.
Eu falo sobre essa questão em meus cursos. Naqueles mais técnicos, de modo mais indireto. Nos mais sistêmicos e filosóficos, de modo mais direto. Tudo adaptado ao contexto, claro. Mas a transmissão ocorre a todo momento, em todo lugar, de forma cada vez mais majestosa, segura e criativa.
O arranjo sistêmico trata justamente de procurar meios de nos organizarmos de modo mais inteligente com o que já temos - em termos de conhecimento, tecnologia, habilidades e cultura. Mas para isso ocorrer é necessário estarmos de acordo em pontos fundamentais.
Que pontos seriam esses?
Precisamos partir das mesmas premissas (princípios norteadores) e desejar os mesmos fins (meta suprema). Devemos ser sinceros quando afirmamos algo. Não podemos mais falar em ecologia e igualdade e progresso e etc. da boca para fora e na prática nos colocarmos à serviço de uma lógica que vai contra tudo isso (mesmo que disfarçadamente, de forma muito elegante). É preciso começar a pensar, a refletir; a não ter medo de sentir e conviver com a dor.
Não há uma fórmula mágica. Nem uma receita complexa, acessível a poucos. É só uma questão de maturação interior.
Percebendo isso começamos a caminhar de verdade.
É isso.
Referências:
[1] https://eand.co/why-economics-says-our-civilization-is-going-to-collapse-b3bc6fc8973e
[2] https://gestaosistemica.files.wordpress.com/2011/02/roda-do-pensamento-sistemico1.jpg
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