terça-feira, 1 de janeiro de 2019

Diferenciação e seus desdobramentos

O futuro da humanidade é a diferenciação. Em termos profissionais, fala-se em especialização. Mas não se muda o ponto, que consiste em criar uma heterogeneidade cada vez mais pronunciada com a evolução. A grande arte consiste em saber coordenar tamanha diversidade de modo a obter o máximo rendimento de cada elemento, colimando numa sociedade verdadeiramente civilizada.

Qual é a essência do fenômeno evolutivo? A vida me diz: se destacar cada vez mais da mediocridade do tipo médio, hoje predominante. Não se trata de uma avaliação de indivíduos, mas de níveis de consciência, que todos irão superar, cedo ou tarde, à força ou por boa vontade. Logo, aqui não há julgamentos - apenas constatações que levam a confirmações.

A natureza dá pistas se olharmos na essência.
Padrões, analogias e semelhanças.
Ser diferenciado leva a um afastamento da sociedade. A uma diminuição do discurso. A se pronunciar em raríssimos momentos, em ocasiões específicas, quando se é convocado a tal. A participação é em silêncio, com vistas a não chamar atenção de ninguém. A interação faz com que o mundo perceba a verdadeira natureza do ser. Isso o coloca numa posição de perigo, já que a incompreensão neste mundo toma formas muito obscuras. Logo, inconscientemente, o ser minimiza a possibilidade de encontros. Quem fizer isso com elegância e sapiência terá certo sossego ao longo da vida. Será um enigma, mas permanecerá em paz.

Aquele que se diferencia começa a perceber a urgência da igualdade jurídica e social. Isso significa garantir a todos as necessidades comuns à manifestação da vida humana em suas mais variadas formas: alimento, abrigo, água, higiene, vestimenta, saúde, educação, segurança, transporte, etc. E que todos terão o mesmo tipo de tratamento perante a lei, independentemente de seu patrimônio, cultura, intelecto, escolaridade, renda, raça, etnia, gênero, orientação (política, sexual, ideológica,...), idade e estado de saúde. Mas antes, - como pré-requisito - para perceber essa necessidade premente, é mister ter se destacado em termos de sensibilidade. Somente essa maturação é capaz de trazer visões mais profundas, do funcionamento íntimo do universo.

"Um princípio que guia a forma na ascensão evolutiva, oposto ao das unidades coletivas e da recomposição, é o da diferenciação, pelo qual a evolução ocorre passando do indistinto ao distinto; do genérico ao específico, ao particular; do homogêneo ao diferenciado. Essa tendência à multiplicação dos tipos, à subdivisão da unidade, encontra seu contra-impulso compensador, com o qual se reconstrói o equilíbrio, na tendência à reorganização e reunificação, devida ao princípio das unidades coletivas. Esse processo de reorganização implica uma progressão constante da complexidade. Tais princípios são forças-tendências, que se manifestam como um instinto, uma necessidade do devenir, no sentido de ser segundo esse próprio princípio. Muitas vezes eles se conjugam como contrários, balanceando-se assim em perfeito equilíbrio."
P. Ubaldi - A Grande Síntese, Cap. XL (grifos meus)

O processo evolutivo é constituído de ciclos. São etapas que, vistas numa escala de tempo limitada, com olhos materialistas, pode parecer sem sentido e desagregador. E por isso combatido - se se chegar ao ponto de se sentir ameaçado pelo mesmo. No entanto, trata-se de uma série de ciclos diferenciação-reorganização, ordenados em níveis macro e micros na escala de tempo.

A ascensão é o primeiro passo dado por raros espécimes. A seguir, esses pioneiros devem se consolidar em sua posição, erguendo novas formas de vidas, relendo ideias, gerando conceitos, inventando,...deixando uma obra que seja assimilável àqueles logo abaixo, ainda juntos à imensa maioria, mas cujos olhos estejam perscrutando os mistérios do imponderável. Cria-se um liame que garante a retomada da semente deixada. A gestação dolorosa nos tormentos das obrigações mundanas jamais deve ser em vão. Mas quem garante essa continuidade - apesar de todos empecilhos - são forças desconhecidas, operando de modo misterioso e majestoso. Tão sutil que ninguém se sente ameaçado por ela - tão íntima que se torna irresistível às ferramentas que as viabilizam. As etapas subsequentes estão já mais próximas ao nível humano. Os herdeiros deverão assimilar aquilo que lhes impactou outrora, revivendo em suas mentes e corações o significado do fenômeno ímpar, acionado por aquele que ascendeu a outro nível de percepção.

A busca por si leva à unificação com o outro.
A diferenciação edifica os caminhos da igualdade.
A "febre" se espalha e torna-se algo mais comum. Cria-se um circuito de ideias e conceitos. Uma corrente de pensamento nova paira na rede de informação do plano racional. Sua forma ainda revela traços incomuns, de envergadura delirante e com afirmativas por demais fortes. No entanto sente-se, intuitivamente, algo de novo, fascinante, por parte de alguns indivíduos já exaustos dos me´todos do mundo. Uma força nova, que pode finalmente pôr em marcha a inércia generalizada em que a espécie se encontra. Algo que ordene a desordem do sistema humano, através de uma revolução biológica, que convida o indivíduo a (antes de tudo) ser. Somente a partir daí é possível  fazer algo com teor substancial. Isso atrairá as reais necessidades. Chega-se ao significativo ter. Logo, esboça-se na minha mente o processo de difusão do novo na horizontalidade do mundo:

Ser => Fazer => Ter

É preciso antes de tudo transformar a essência da personalidade. Somente assim os atos serão verdadeiramente novos, sustentados por uma força (subconsciente novo, que superou em parte um instinto não mais dominante) irrefreável, que garante sua reprodução no mundo. Assim atinge-se o estado de autopoiesis [1], típico da vida orgânica - ainda em ensaio a nível psíquico. A realização verdadeiramente atraente é sustentada por uma essência.

Teilhard de Chardin mostra através de seus estudos que a biosfera já se consolidou. A noosfera [2], no entanto, está se formando. Trata-se de uma "atmosfera" de pensamentos. Correntes de conceitos que circulam no planeta. Fluxos de informação e conhecimento gerados pela espécie humana.

Fazer com intensidade e determinação atraí o que é necessário para a execução. Adquirir algo de modo seguro exige uma essência pura (natureza superior) aliada a uma execução fervorosa (no plano consciente). O resto é consequência natural do processo.

Assim temos, de modo sintético, o porquê da diferenciação do indivíduo, seus mecanismos íntimos, e quais as etapas subsequentes. Num dado momento, a humanidade será obrigada, por força de circunstância, a estabelecer diretrizes gerais de novos sistemas no que tange a aspectos éticos,  jurídicos, econômicos, políticos, normas sociais, natureza das religiões e orientação da ciência. De forma que podemos afirmar, com segurança, que a diferenciação é a gênese do processo que leva o sistema a se plasmar definitivamente, em nível evolutivo, para algo melhor. Ou seja, capaz de lidar com mais contradições internas - e portanto sobreviver.

Referências:
[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Autopoiese
[2] https://pt.wikipedia.org/wiki/Noosfera

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