domingo, 14 de abril de 2019

Profundidade sistêmica - e não multiplicidades específicas.

Existe uma certa dificuldade da mente racional em assimilar o conceito de profundidade sistêmica. Acaba identificando-o com um saber que encampa múltiplas especialidades. Como não é possível saber de fato muitas especificidades, a questão é anatemizada. Condena-se por não compreender do que se trata. Por esses motivos é necessário ser cristalino e direto na exposição dos conceitos e transparente nas intenções.

Estamos diante de uma forma de abordar a realidade que não está mais centrada numa compreensão analítica e reducionista de objetos. A divisão (dos saberes, dos objetos), com estabelecimento de fronteiras (fictícias, criadas pela mente racional), acaba obliterando a capacidade de compreender uma realidade mais profunda, que através de sutis relações gera efeitos que impressionam os sentidos e atordoam a mente. Essas interconexões se dão não apenas entre coisas (objeto-objeto), mas igualmente entre pessoas (sujeito-sujeito) e entre essas e as coisas (sujeito-objeto). Mais: essas relações podem ocorrer entre múltiplas entidades - tornando a compreensão ainda mais fascinante e desafiadora. 

Numa imagem, inspiração para esquemas lógicos, ensaios,
coreografias e atos de liderança.A inteligência integral deve
fazer uso de todas as outras para edificar a si mesma.

Será que os métodos e ferramentas de outrora serão capazes de lidar com essa nova realidade que se desfralda diante de nossos olhos? É possível que, com a nossa forma de raciocinar, sejamos capazes de abarcar a complexidade que se tornou a nossa civilização? Será que o nosso atomismo-cartesiano tem o estofo necessário para lidar de forma madura com as questões da finitude do espaço e do tempo? Com a não-localidade quântica? Com a simultaneidade da transmissão de informação? Com a criação pura...a partir do "nada"? 

Tudo indica que estamos diante de uma fase evolutiva que exige um salto conceitual. Uma travessia fora do comum, que exigirá a conjugação de inteligências múltiplas, guiadas por um senso íntimo de unidade.

Segundo os estudos mais atualizados de especialistas [1], existem sete tipos de inteligências:

1. Linguística
2. Lógica
3. Espacial
4. Musical
5. Motora
6. Interpessoal
7. Intrapessoal

O que as caracteriza exatamente? Como podemos perceber qual é a que temos mais desenvolvida?
Quem tem facilidade na redação, na literatura e em expressar-se em geral, sendo capaz de compreender pontos de vistas distintos, possui potencialidades na (inteligência) linguística;
Quem é capaz de sistematizar processos e modelar (representar) fenômenos de forma matemática e com diagramas, fazendo uso de uma memória apurada e disciplina férrea, tem em seu imo uma inteligência do tipo lógica;
Aquele com facilidade na criação (e visualização) de imagens 2D e 3D, possui habilidades que lhe dão um senso de espaço apurado. Sua inteligência é do tipo espacial;
Aquele que percebe sons de forma apurada, e revela destreza na criação de harmonias sonoras, além de demonstrar uma criatividade na junção de sons, ritmos e melodias, possui em si a inteligência musical;
Quem, com a gesticulação, a postura, os olhares e o movimento, é capaz de transmitir (e despertar) sentimentos e ideias, possui em seu íntimo a inteligência do tipo motora;
Aqueles que conseguem captar facilmente a qualidade dos outros, somando a isso a habilidade inata de coordená-las visando um objetivo terreno comum, tem habilidades de liderança exterior, possuindo uma inteligência de gestão, ou interpessoal;
Aqueles que, com a sua essência, são capazes de influenciar os outros através de ideias, ao longo do tempo, de forma muito sutil, porém efetiva, tem dentro de si uma das inteligências mais raras (e magníficas): a intrapessoal.
Lidar com estudos sistêmicos envolve tangenciar com cada uma dessas inteligências, compreendendo-as e utilizando-as para lidar com a (percepção da) realidade, cada vez mais vasta e misteriosa. 

O paradigma racional-analítico, filho do casal atomismo-cartesianismo, tende a considerar inteligência apenas as de tipo 1 (linguística) e 2 (lógica), que permeiam em boa medida as ciências, a matemática e a filosofia. No entanto é preciso se dar conta de que as outras cinco tem um papel muito importante para apoiar essas duas - e vice-versa. 

Existem relações muito profundas entre a escala de desenho técnico (espacial) e a de simulação (lógica + motora). 

A quantidade de pessoas que apresentam em grau mais
desenvolvida um tipo de inteligência. Nos testes de QI
são avaliadas apenas as duas primeiras. Fonte: [3].
A (inteligência) motora está relacionada ao movimento. Este, para se dar, necessita de um substrato dimensional que o viabilize: o tempo. Logo, a simulação, que nada mais é do que a reprodução de um modelo (construído com a inteligência lógica) no tempo, envolve a combinação de duas inteligências. Só que a motora se relaciona não ao movimento do sujeito, mas ao da natureza infra-humana (o fenômeno estudado). Como vimos no ensaio anterior [2], a relação entre escalas é evidente. 

É interessante também perceber que as duas últimas (inter e intrapessoal) não envolvem nenhuma capacidade sensória ou de atuação concreta, mas sim de coordenação eficaz (sociabilidade) e de edificação da essência (sensibilidade social). Elas se demonstram de forma mais sutil, sendo mais intangíveis, não-documentáveis. A última é mais profunda ainda, pois tem um quê de misterioso. Não à toa é aquela que menos indivíduos possuem razoavelmente desenvolvida, compondo um grupo que encampa apenas 2% da humanidade [3].

É interessante perceber que nossos sistemas (institucionais e subconsciente) de avaliação consideram apenas as duas primeiras inteligências - que em conjunto compõem as habilidades mais proeminentes de quase 60% da espécie. Segue-se a motora e espacial. Musical, interpessoal e intrapessoal são relegadas à não-avaliação, geralmente. Esse é um dado interessante, porque mostra que nossos sistemas de avaliação estão ancorados no número de pessoas que se destacam num dado campo - como se esse percentual frente ao todo fosse indício de superioridade qualitativa. 

Observando-se as seis primeiras inteligências, é admissível que a mensuração de cada uma seja possível - de alguma forma. A dificuldade em identificar habilidades parece crescer à medida que menos indivíduos demonstrem possuí-la. Não apenas isso, mas sinto que essa valorização (e capacidade de avaliar com precisão) de cada inteligência reside em sua potencialidade para ser convertida em algum tipo de ganho econômico, seja ele tangível ou intangível. Eu diria que é na transformabilidade da inteligência em um poder a ser usado que reside a sua capacidade de ser reconhecida como importante.

Para aqueles com inteligência espacial mais desenvolvida, apresento a mesma informação da tabela anterior de forma linguística-numérica, ao lado. O motivo é dar ao leitor (visualizador) a percepção de que existem diferenças na hora de capturar algo. A depender da natureza da pessoa, pode ser muito mais compreensível capturar algo numa forma que lhe seja mais admissível (dada sua constituição fisio-dinâmico-psíquica). 

Ao que tudo indica, a capacidade de adquirir uma visão sistêmica se relaciona diretamente com a habilidade de "passear" entre essas diversas inteligências, experimentando-as para conseguir reconstituir uma visão mais vasta e profunda da realidade. 

Já falei anteriormente a respeito das limitações do paradigma hodierno para abordar questões que transcendam o já vivenciado (conquistas do passado). A objetividade fica difícil de ser aplicada à física subatômica, no reino quântico, e nas relações entre coletividades humanas e casos de diferenciação evolutiva - ainda raros. A estabilidade dos modelos econômicos é frouxa para delinear metas e meios para uma civilização verdadeiramente sustentável, e assim perde espaço para a termodinâmica de sistemas abertos, governados pela lei da entropia. Esses sistemas "vivem" em zonas de não-equilíbrio, através de processos que aumentam a entropia do meio às custas de um aumento de complexidade interno.  

Isso tudo nos leva ao propósito da vida, que aponta para o desconhecido - e irresistível - destino que nos aguarda...



Referências:

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