segunda-feira, 24 de maio de 2021

Compreensão exige maturação

É interessante observar que, à medida que vamos descendo da grande visão (síntese) às particularidades de nosso mundo (análise), divergências começam a surgir. Parece que, quando a pessoa faz um esforço de relacionar as questões mais substanciais à vida quotidiana, seja ela lógica econômica, pedagogia, política, sociedade, psicologia, entre muitas outras, fica mais difícil obter concordância. Não é à toa que muitos que possuem grandes visões optam por ficar longe do campo dos exemplos e aplicações mais concretas: há uma ferocidade (=inconsciência) muito grande nesse nível. Mas é - ainda - o degrau em que a média da humanidade se encontra.

Fig.1: Compreensão exige sensibilidade. Sensibilidade depende do grau de maturação.

Fonte: [1]

Já falei alhures sobre o problema da comunicação. Não temos uma gramática comum - o que já dificulta muito a comunicação entre duas pessoas ou grupos. A mesma palavra tem significados distintos para cada indivíduo, grupo, cultura ou nação. Como resultado, jamais seremos capazes - com os meios de comunicação atuais, via voz ou texto ou coisas relacionadas aos sentidos - de passar exatamente o que desejamos. Isso torna a comunicação profunda muito difícil (se não impossível para alguns casos). Somada a essa barreira verbal, há ainda o problema da constituição dos indivíduos, que por ser muito particular, traz uma diversificação ainda maior.

Como sabemos através da obra de Pietro Ubaldi, somos produto de quatro fatores: o meio (geográfico e cultural); os genes (pai e mãe) e o nosso passado (espírito, subconsciente, atavismos, vícios e virtudes adquiridas). Se a diversidade de vivências já é grande considerando apenas um deles, ao fazermos uma análise combinacional de cada possibilidade em cada dimensão, iremos obter uma diversidade atordoante de personalidades. Com isso a compreensão entre dois ou mais indivíduos se torna um verdadeiro desafio. 

Mas há ainda mais um fator: o número.

Vivemos um momento especial em nossa civilização. Um momento de transição planetária. É preciso mudar tudo: como nos relacionamos com a natureza, dieta, rotina de trabalho, conceito do que é trabalho, cidades, transporte, energia, escolas, universidades, papel do Estado, limites dos mercados, etc. É algo tão grave, tão urgente e tão fundamental, que se não tomarmos a decisão certa, coletivamente, logo, iremos acabar com o pouco que construímos de civilização. 

Para realizar essa mudança, é preciso que o corpo coletivo aja como um só. Ou ao menos surja uma massa crítica, em todos níveis hierárquicos, com potência suficiente para dar um impulso contínuo e vigoroso, que não permita a reversão do que se iniciaria. Logo, a questão de uma transição suave (=menos dolorosa possível para tudo e todos) passa pelo campo da política, da economia e da cultura - acima de tudo esta última. Ai é que entra o número.

O número é a quantidade de indivíduos alinhados em termos de premissas, objetivos e valores comuns;

O número é o que dá força para o sonho interno do espírito se materializar na forma e nas realizações, mudando o externo.

Por quê?

Porque isso é monismo: todos por um e um por todos; o todo em você e você no todo.

Vocês percebem? 

Não dá para ter vergonha ou medo ou preguiça no momento de expressar a sua opinião. O único porém é que essa opinião deve ser sincera, englobar a visão mais vasta e ser sustentável.

Surge um equívoco na mente de muitas pessoas - inclusive bem intencionadas, mas pouco aprofundadas na raíz dos movimentos históricos - que consiste em julgar pelas palavras e pela forma, pinçando 'palavras proibidas', 'personagens proibidos' e 'ideologias proibidas'. A questão é que ninguém é perfeito, e cada parcela, seja religião, teoria científica, movimento artístico, obra literária, corrente filosófica, pessoa, forma de amar, possui um aspecto da verdade e outros de equívocos. 

Em geral, no meio acadêmico, quem acredita em Deus é tido como imbecil;

Em geral, nas igrejas, quem pertence a outra crença é considerado errado e não tem jeito;

Em geral, nos partidos, quem pertence a um acha que só o seu deve estar no poder e vencer;

Em geral, nas filosofias, quem vive todas (filosofias) é visto como paradoxal;

Em geral, na vida, quem se cristalizou numa uma forma mental acha que aquele que evolui a sua está errado.

Nós dificilmente nos abrimos para além daquilo que estamos preparados.

A expansão da consciência é justamente isso: abarcar cada vez mais perspectivas, formando uma forma mental orgânica, complexa e toda ordenada (hierarquizado) que consegue marchar com mais ímpeto e agilidade.

Fig.2: Um dos últimos livros de Ubaldi. Nele, experiências profundas e verdades incríveis. 
Unificação e amor. Tudo fica claro. Quem sente, ama e se regozija. 

Por exemplo, vamos ver o que Pietro Ubaldi fala sobre o 'comunismo':

"Se os cristãos tivessem sido verdadeiramente cristãos, como o foram nos primeiros séculos, o comunismo não lhes poderia ter roubado a ideologia da justiça social – a sua maior força – e não teria, portanto, as massas ao seu lado" Um Destino Seguindo Cristo, Cap. II

"Se o cristianismo tivesse realizado o programa evangélico, teria havido um comunismo com base no amor, e não no ódio de classes, um comunismo de paz, e não de guerra."  Um Destino Seguindo Cristo, Idem

É inegável que existam dois comunismos: um de amor, outro de ódio. Como o mundo não atingiu o comunismo através da paz e do amor - isto é, através do diálogo, da reflexão, do bom senso de que deve haver uma organização saudável para que não hajam atritos - ele surge à força, através de povos que absorvem apenas a bandeira de justiça social mas usam da força, do arsenal bélico e da astúcia para imprimir o princípio da justiça social - ainda de forma deficiente e incompleta. A culpa seria mais da Igreja e do Capitalismo nascente do que do próprio comunismo do século XX.

O que impressiona é que dos poucos - pouquíssimos - leitores da obra ubaldiana, uma boa parcela realmente não se atentou (ou não quis se atentar) para certos trechos de suas palavras, por demais evidentes. São ideias brilhantemente escritas, que de per si são cristalinas. O fato de não se atentar implica que ainda estamos presos a formas mentais que impedem conhecer a obra em sua plenitude. 

No ensaio 'Socialismo: sonho ou destino?' citei um vídeo final para exemplificar uma possível aproximação para um mundo socialista. Melhor dizendo, através de ideias exibidas seria possível ao leitor compreender elementos germinais que, se desenvolvidos de forma ordenada e relacionada, permitiriam ao mundo chegar a um patamar mais desenvolvido. Claro: haveria necessidade de outras verdades como a questão ecológica (não foi tratada) e a espiritual (também não). Mas requerer uma síntese tão grande de pessoas ligadas a igrejas, política, economia, correntes filosóficas ou grupos de pesquisa seria pedir de mais. Isso no entanto não significa que existam pessoas de bom senso e boa intenção nos grupos.

No vídeo (para quem realmente assistir e absorver) é possível perceber que um dos valores fundamentais para o entrevistado é a liberdade (que ele define como sagrada, bem no final). O hibridismo é muito bem vindo (ex.: mercados e Estado; público e privado). Infelizmente, quando um 'inimigo' nosso profere verdades difusas, mas profundas (expressando a visão monista, mesmo sem sabê-lo), não aceitamos de jeito nenhum. Eu pergunto: quem perde com esse jogo de relativismos?

Este é um espaço que exige maturação. É um esforço titânico, de esclarecimento através de sistematizações (gráficos, lógica, teorias), de poesia, de leitura histórica, de ciência, de filosofias diversas e de vivência íntima. É um laboratório de experimentos que visa esboçar novas possibilidades de sentir, de pensar, de andar. É uma mescla da vida profunda do autor com os conceitos mais altos do monismo. É um incessante relacionamento, repensar, ressurgir, chorar, sorrir. É um oásis para quem está disposto a se despir de todos preconceitos e refletir sobre o que o outro está apresentando.

Voltando mais um pouco à questão: por que surgiu o comunismo em sua forma violenta?

"Em primeiro lugar Cristo não era contra o uso de bens, mas contra o abuso que deles se costuma fazer. Também nós, quando vemos alguém fazer mau uso de uma coisa, somos levados, para remediar o problema, a destruí-la e até a eliminar quem de tal modo a usa. É por essa razão que, com o comunismo, parte da humanidade queria abolir o instituto da propriedade em todo o mundo e, onde pôde, eliminou os ricos." 

Um Destino Seguindo Cristo, Cap. III (grifos meus)

Percebam: um extremo acaba gerando outro. Oscilação. Vibrações...Alguma coincidência com a TTMF? (Trajetória Típica dos Movimentos Fenomênicos)

Fig.3: Tudo oscila. É necessário a polaridade (dualismo) para criar esse jingar (dança) de ascensão.
Uma dança conduzida pela unidade do Todo. Uma dança que deve ser feita de forma saudável.

Para compreender é preciso ter evoluído interiormente. A maturação é a maior sabedoria. Mais do que saber, é preciso ver o significado do que se sabe. Seu progredir na esteira do tempo. 

Democracia e comunismo podem ser implementados em grau máximo pela humanidade, pois são duas faces da mesma moeda. Me chame de louco, mas chamem o autor desse trecho de louco também.

"Independentemente de qualquer programa político, a tendência ao coletivismo é hoje fenômeno universal. Esta nova posição da humanidade em forma de sociedade orgânica não é problema de democracia ou comunismo, mas sim uma questão biológica, que corresponde a uma fase de amadurecimento evolutivo, a qual está sendo atravessada por toda a sociedade humana, em todos os pontos do globo. A cisão entre o que parece ser dois opostos, democracia e comunismo, é devida apenas ao fato de representarem eles os dois extremos do mesmo problema, tal como os dois pólos do mesmo planeta.

Um Destino Seguindo Cristo, Cap. VII (grifos meus)

Inteligência não é mera racionalidade. É pensar em longo prazo. É perceber o transformismo das coisas. É afirmar, não negar. É se abrir para o outro, para o desconhecido.

Inteligência é, em última instância, capacidade de compreender - e isso exige maturação. 

O monismo não se difunde no mundo com a rapidez desejada porque a compreensão é muito baixa. Assim, tudo se torna um grande desafio. Logo, avançar um passo é um grande triunfo. Mas de conquista em conquista, iremos preencher o mundo de compreensão, base do amor, essência de Deus.

Esse espaço é para todos, de todos, e por todos. Tudo se aceita, exceto ódio que divide e desgasta.

E...para aqueles que detestam algo ou alguém, uma mensagem de amor:

Fig.4: Tudo tem um significado na vida. Se algo nos incomoda, o melhor a fazer é compreender 
à fundo aquilo. Esse é o método da absorção do mal(=segregação) pelo bem (=unificação).

6 comentários:

  1. é O ANONIMO DE NOVO. Leonardo, não deixei de compreender seu texto por estar preso a "forma mentais". Voce escreveu novamente defendendo o comunismo. Ora meu amigo, assim como há um capitalismo de ódio, existe um capitalismo de amor também. Explico: se as pessoas do mundo capitalista tiverem conhecimentos aprofundados do monismo, o mal desse regime economico seria totalmente anulado pelo bem que as pessoas fariam uma as outras. Enfim, sendo o mundo ocidental capitalista e democratico em suas raizes , seria ilógico acreditar numa mudanca social em direcao ao comunismo atualmente.
    Eu sei o que Pedro fala sobre comunismo e capitalismo, de forma resumida, ele diz que comunismo e capitalismo sao dois regimes economicos, no que tange ao seus aspectos, com falhas e acertos , porém, em evolucao, e que se complementam nas suas diferencas ideologicas. Na verdade, o que importa é a forma mental das pessoas, a compreensao espiritual da vida. Do jeito que voce coloca suas ideias esta sendo parcial demais, fazendo restricoes em relacao a pessoas que nao conhecem a obra de Ubaldi direito mas que podem ter uma repulsa por talvez voce estar associando-a ao comunismo. Enfim, o pensamento de Pedro é universal, o comunismo perfeito pode até existir, mas num mundo onde as pessoas sao evoluidos (mentalidade do S) e nao num mundo com mentalidade de AS.

    ResponderExcluir
  2. O evangelho surgiu para transformar o homem. O homem, na sua animalidade, transformou o Evangelho. É também Ubaldi quem o diz.
    De modo que o nosso trabalho é uma cruzada. Poderíamos até dizer, uma revolução. Não uma revolução contra o próximo, contra os núcleos espiritualistas organizados. Não é uma revolução contra os ideais políticos, quer os do mundo ocidental ou oriental, quer do mundo soviético ou do mundo democrático. Tudo isso são aspectos superficiais da verdade que os homens necessitam. A nossa grande revolução é uma revolução baseada na transformação do homem. Porque, meus senhores, mudem-se os sistemas, e deixem os homens como estão. Os sistemas serão sempre prostituídos. Não adianta criar sistemas sem transformar o homem. O homem bom faz o bom o mau sistema. O homem mau faz mau o bom sistema.

    ResponderExcluir
  3. corrigindo.
    * O homem bom faz bom o mau sistema. O homem mau faz mau o bom sistema.

    Por ocasiao do meu comentario, sabia que tinha algo relacionado numa conferencia que Jose Bonifacio Alexandre proferiu por improviso em 13/3/67 realizada no II Encontro em Brasilia, que comemorou a visita feia por Pedro a capital, a fim de se realizar o que intitulou de "Nossa oferta simbolica ao Brasil e aos Povos da America Latina".

    ResponderExcluir
  4. O evangelho surgiu para transformar o homem. O homem, na sua animalidade, transformou o Evangelho. É também Ubaldi quem o diz.
    De modo que o nosso trabalho é uma cruzada. Poderíamos até dizer, uma revolução. Não uma revolução contra o próximo, contra os núcleos espiritualistas organizados. Não é uma revolução contra os ideais políticos, quer os do mundo ocidental ou oriental, quer do mundo soviético ou do mundo democrático. Tudo isso são aspectos superficiais da verdade que os homens necessitam. A nossa grande revolução é uma revolução baseada na transformação do homem. Porque, meus senhores, mudem-se os sistemas, e deixem os homens como estão. Os sistemas serão sempre prostituídos. Não adianta criar sistemas sem transformar o homem. O homem bom faz bom o mau sistema. O homem mau faz mau o bom sistema.

    (Jose Bonifacio Alexandre)

    se quiser digito para voce tudo e vc republica aqui, voce vai gostar dessa Conferencia. é um achado.

    ResponderExcluir
  5. Anônimo, a transformação é interna - eu compreendo. Mas ela irá refletir na mudança do sistema (externa), que também é necessária - pois o monismo inclui tudo, ou seja, devemos espiritualizar a matéria = melhorar o sistema. A questão é que deve começar e terminar pela maturação interior.

    Como você disse:

    "Enfim, o pensamento de Pedro é universal, o comunismo perfeito pode até existir, mas num mundo onde as pessoas são evoluidos (mentalidade do S) e nao num mundo com mentalidade de AS."

    ResponderExcluir
  6. Novamente, não defendo o comunismo com unhas e dentes, o justifico como destino de uma forma de organização mais evoluída (não precisamos nem chegar ao reino de Deus, mas a um patamar muito mais próximo a ele).

    Precisamos tomar cuidado para não gerar divergências enquanto outros se aproveitam disso. Leia meu último ensaio sobre a questão ecológica (em especial o vídeo do Luiz Marques) para ter uma ideia melhor da minha visão.

    ResponderExcluir