Raros
são os filmes de conteúdo (de lazer e intelectual) que tem a
oportunidade de serem propagados pelos meios comerciais. Felizmente,
existem aqueles que conseguem encontrar fendas no sistema comercial,
– não sei exatamente como – trazendo um pouco de diversão e
ampliação de horizonte para milhões de pessoas. Um desses filmes é
o francês “Intocáveis”.
Bom, a
primeira coisa: se trata de um filme sobre uma amizade aparentemente
impossível – à primeira vista – que se concretiza e se reforça
e encanta e convence cada um de nós (a mim convenceu) de sua real
possibilidade. Uma amizade de início inviável. Mas que, ao longo do
tempo, se consolida. Justamente devido aos extremos. Extremos....de
forma. Mas, por outro lado, de substância idêntica. Essa substância
é a busca de preenchimento. De sentido. De emoção. De vida.
Observamos
duas pessoas de etnias e meios sociais completamente distintos. E –
como é de se esperar – de comportamentos igualmente diferenciados.
E adicionando a isso um incidente inesperado, tem-se o pontapé
inicial para uma jornada repleta de aventuras e auto-conhecimento.
Eis o verdadeiro milagre da vida.
Um ser
que aparentemente é a antítese do outro. Um negro. Outro
caucasiano. Um muito rico. Outro muito pobre. Um com acesso a toda
cultura. O outro com um impedimento a quase toda ela. Um cheio de
enfermidades. Outro (apesar de tudo), sadio como um touro. Mas ambos
com o desejo de ser alguém e de viver a vida da melhor forma
possível. Dois seres em busca de libertação – não se sabe
exatamente do que a princípio. Incompreendidos. E frágeis sozinhos.
Mas juntos, intocáveis.
Não sou
francófilo. Sou internacionalista. Mas devo admitir que o cinema
francês é e sempre foi um destaque. Sua capacidade de encantar e
fazer a platéia pensar é difícil de ser igualada. Sem atores
famosos. Sem recursos fartos. Sem efeitos especiais – exceto a
roteiro fantástico.
Por que
esse filme me tocou? Simplesmente porque o assunto é o assunto da
moda em todos os tempos e lugares: a busca de uma verdadeira amizade.
E convenhamos, nos dias atuais, está cada vez mais difícil
estabelecer uma amizade verdadeira. E se uma nasce, seu
desenvolvimento sempre é dificultado por razões materiais ou
críticas infundadas ou incompreensão de um dos dois.
De
qualquer forma, desde a cena inicial nos deparamos com uma cena de
ação.
Dois
caras correndo a alta velocidade num carro possante. O motorista,
jovem e saudável. O “co-piloto”, um senhor de idade enfermo.
Eles parecem se conhecer. A polícia os persegue – com dificuldade.
As manobras e acelerações do jovem são muito elegantes e rápidas.
Mas num momento eles são pegos. E...não vou contar o resto (vejam o
filme).
Mas a
questão é: da primeira à última cena existe uma energia que
parece infinita. Ela está lá, na atmosfera, sem necessidade de
esforço de ninguém. Só o desenrolar da vida de cada personagem
basta para iluminar tudo.
Os dois
atores (François Cluzet e Osmar Sy) dão uma performance fora do
comum. São realmente seres humanos. Se conhecendo. Graças a um
incidente inicial. Contra todas expectativas. Que passam a se
completar devido às suas diferenças. Suas realidades radicalmente
opostas se equilibram entre si. Pura magia. Puro Cinema. Queremos ver
o que vai acontecer com a vida de cada um deles.
Um filme
com tanta profundidade deve ter uma música à altura. Com a trilha
sonora banhada por um belíssimo piano de Ludovico Einaudi, tem-se um
dos filmes mais belos dos últimos tempos.
É uma
amizade tão preciosa, tão rara, tão breve, que é intocável.
É
divino.
Nenhum comentário:
Postar um comentário