Estação Espacial MIR. |
Não
escrevo esse artigo como especialista e sim apenas como uma
pessoa que teve uma breve (mas intensa e prazerosa) vivência no
setor espacial brasileiro. Como estudante de pós-graduação.
Bom,
a primeira coisa que vem à mente de alguém quando se fala em
foguetes e satélites e estações espaciais e coisas do tipo é uma
espécie de misto entre fascinação e temor. Fascinação por ser
algo que nos leva aos mais elevados limites científicos,
tecnológicos e – por que não – filosóficos e religiosos. E
temor porque tudo isso está aparentemente além da nossa capacidade
de compreender.
Mas
afinal de contas, qual é a relação entre o desenvolvimento da C&T
espacial e nosso dia a dia?
Na
incessante procura da “conquista” do espaço, milhares de
benefícios tecnológicos acabam e acabaram migrando para a
sociedade. Alguns com objetivos nobres, outros nem tanto. Mas a
aplicação pouco judiciosa dos recursos não desmoraliza a natureza
deles em si. Mas sem dúvida desmoraliza aqueles que usam esses
recursos para tirar vantagem de seus semelhantes e outras formas de
vida.
À
medida que os processos e conceitos científico-tecnológicos que
permeiam o desenvolvimento de um produto aumentam, o preço do mesmo
começa a se elevar na mesma proporção. Logo, se este produto tiver
uma utilidade fundamental, seu comércio se torna mais vantajoso.
Isso é muito visível no setor aeroespacial, exemplo máximo de
tecnologia de ponta – juntamente com o setor de biotecnologia,
materiais e computação.
A
tabela abaixo revela a importância de se investir em áreas que
produzem produtos de alto valor agregado.
Segmento
|
US$ / kg
|
Agrícola
|
0,30
|
Automotivo
|
10,00
|
Eletrônico
|
100,00
|
Defesa
|
200,00
|
Aeronáutico
|
1.000,00
|
Espaço
|
50.000,00
|
Fonte:
Associação das Industrias Aeroespaciais
do
Brasil.
O
que isso nos revela? Nos revela que, se alguém detém a capacidade
de gerar produtos de alto valor agregado, pode adquirir outros
produtos menos tecnológicos em quantidades muito grandes com a venda
de apenas poucos componentes sofisticados. Construa e venda um
satélite bom de 500 kg e US$ 25 milhões estarão disponíveis em
seu caixa. Com esse dinheiro é possível comprar 83.000 toneladas de
grãos para alimentar a sua comunidade. Considerando que uma pessoa
se alimente de 1 kg de grãos por dia – só para efeito de
simplificação – é possível alimentar 227 mil pessoas por um ano
inteiro.
O
problema de tudo isso é que para possuirmos um setor de ponta
desenvolvido e saudável, existe necessidade de se investir muito
nele. Especialmente em seus primeiros anos de vida. Tal como um bebê,
que jamais poderá se revelar alguém capaz de gerar algo para a
sociedade se não receber um constante incentivo (material e
espiritual) por parte de seus pais e – por que não – da
comunidade próxima. Ou seja, o resultado é de longo prazo.
E
como investir?
Bom,
a primeira coisa seria a geração de empregos estáveis, com
remuneração e reajustes condizentes e a possibilidades de
crescimento acadêmico-profissional-social na área espacial. As
pessoas precisam ver um sentido e um horizonte no que fazem. E a
geração de empregos na área deve ser a uma taxa que permita a
manutenção do "knowhow" adquirido ao longo
dos anos.
O
segundo passo – considerando o primeiro já consolidado – seria o
fomento a Bolsas de pesquisa de valor digno, além de uma constante
divulgação por parte de órgãos públicos e por pessoas que
trabalham em áreas correlatas da importância da área espacial.
O
terceiro passo – e de mais longo prazo – seria incorporar ao
sistema educacional uma série de tópicos que permitam relacionar
essas tecnologias fantásticas com o que as crianças começam a
aprender nas salas de aula. Isso inclusive poderia servir de
trampolim para a criança buscar outras áreas (igualmente
fantásticas) para atuar na sociedade.
Sabe-se
que o setor espacial é pluridisciplinar e é possível trabalhar
nele (ou com ele) das mais diversas formas. Geólogos são
importantes para criar métodos que descrevem os fenômenos
magnéticos e gravitacionais em nosso planeta; matemáticos e
cientistas da computação criam métodos numéricos, programas,
analisam fenômenos e permeiam todo desenvolvimento tecnológico;
químicos, físicos e engenheiros de materiais descobrem novos
materiais e aplicam-os em componentes para serem mais eficientes;
engenheiros em geral pesquisam e desenvolvem novas tecnologias de
propulsão, controle, equilíbrio térmico, aquisição e transmissão
de dados, geração e distribuição de energia, entre outros;
astrofísicos desvendam fenômenos dos confins do Universo para que
um dia possamos ver alguma aplicação prática nos mesmos; biólogos
fazem experimentos em condições inimagináveis na superfície
terrestre; antropólogos e sociólogos, através das mudanças
climáticas, que afetam a geração de energia, levando a uma
alteração na dinâmica da economia, que por sua vez muda os
investimentos sociais, analisam os impactos sócio-culturais; e por
aí vai. Nada nem ninguém está isolado.
Mas
essas mudanças só podem ser implementadas com muita vontade
política. E o que nós, meros mortais, podemos fazer, é divulgar o
conhecimento e resistir à inércia alienadora sempre que
necessário.
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